Acórdão nº 50009255120178210034 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 14-12-2022

Data de Julgamento14 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50009255120178210034
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002542126
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000925-51.2017.8.21.0034/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes contra o Meio Ambiente e o Patrimônio Genético

RELATOR: Desembargador NEWTON BRASIL DE LEAO

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

1. O Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor de VOLNEI JOSÉ PIRES DE OLIVEIRA, dando-o como incurso nas sanções dos artigos 48 caput, duas vezes (1º e 2º fatos) e 38 caput, ambos da Lei nº 9.605/98, pela prática de fatos delituosos assim narrados na inicial acusatória:

"1° FATO: (TC nº 034/2.17.0002256-7)

No dia 01 de maio de 2017, por volta das 08h45min, no KM 559 da BR 285, Restunga Seca, em São Luiz Gonzaga, VOLNEI JOSÉ PIRES DE OLIVEIRA impediu e dificultou a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação, conforme comunicação de ocorrência n° 123/039/05-17, do Comando Ambiental da Brigada Militar.

Na ocasião, o denunciado suprimiu vegetação arbórea nativa, fora de área de proteção permanente, sendo as espécies atingidas identificadas como camboatá, cobrina, canela, coentrilho, unha-de-gato e lajangeira do mato, tudo sem o devido licenciamento ambiental.

2° FATO: (IP nº 034/2.17.0002853-0)

No dia 01 de maio de 2017, por volta das 14h, na Linha Pirajú, s/n°, interior de São Luiz Gonzaga, VOLNEI JOSÉ PIRES DE OLIVEIRA impediu e dificultou a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação, conforme comunicação de ocorrência n° 123/038/05-17, do Comando Ambiental da Brigada Militar.

Na ocasião, o denunciado suprimiu vegetação arbórea nativa, fora de área de proteção permanente, sendo as espécies atingidas identificadas como guajuvira, louro, timbaúva, ipê, aroeira, branquilho e espinilho, tudo sem o devido licenciamento ambiental.

3° FATO: (IP nº 034/2.17.0002853-0)

Nas mesmas circunstâncias de tempo e local do 2° fato acima relatado, VOLNEI JOSÉ PIRES DE OLIVEIRA, com a utilização de máquinas, destruiu e danificou floresta considerada de preservação permanente, conforme comunicação de ocorrência n° 123/038/05-17, do Comando Ambiental da Brigada Militar.

Na ocasião, o denunciado suprimiu vegetação nativa em estágio inicial, médio e avançado de crescimento, classificados como vegetação primária, atingindo três córregos de água e alterando o bioma local, tudo sem o devido licenciamento ambiental."

A denúncia foi recebida pelo Juízo singular em 25.10.2017 (fl. 27, evento 3, PROCJUDIC2).

Após regular tramitação do feito sobreveio sentença julgando procedente a pretensão acusatória para condenar Volnei José Pires de Oliveira como incurso nas sanções dos artigos 48 caput, duas vezes (1º e 2º fatos) e 38 caput, ambos da Lei nº 9.605/98 (3º fato), às penas de 02 anos de detenção, no regime aberto, e de 20 dias-multa (fls. 46/50, evento 3, PROCJUDIC3).

A sentença foi publicada em 03.11.2020 (fl. 02, evento 3, PROCJUDIC4).

Inconformado, Volnei apelou.

Nas razões, preliminarmente, sustentando a prescrição em relação ao 1° e 2° fato, pugna pela extinção de punibilidade. No mérito, alegando ausência de dolo, a incidência do princípio da insignificância e a ausência de perícia técnica a comprovar a materialidade delitiva., requer a absolvição. Subsidiariamente, postula pela aplicação exclusiva da pena restritiva de direitos na modalidade prestação pecuniária (fls. 05/13, evento 3, PROCJUDIC4).

O recurso foi contra-arrazoado (fls. 16/18, evento 3, PROCJUDIC4).

Em parecer, o Dr. Procurador de Justiça, opina pelo desprovimento do apelo defensivo (evento 13, PARECER1).

Esta Câmara adotou o sistema informatizado, tendo sido atendido o disposto no artigo 613, inciso I, do Código de Processo Penal.

É o relatório.

VOTO

2. Há uma questão prefacial a ser enfrentada.

A análise do recurso defensivo está prejudicada em relação aos delitos descritos no 1º e 2º fatos da denúncia, face ao advento da prescrição da pretensão punitiva do Estado, pela pena in concreto aplicada na sentença.

Como cediço, transitada em julgado a sentença condenatória para a acusação, a contagem do prazo da prescrição retroativa tem por base a pena in concreto, entendendo-se como tal a pena individualmente fixada na sentença condenatória, conforme preconiza o artigo 110 § 1º, do Código Penal.

Em relação ao 1º e 2° fato (artigo 48, caput, da Lei nº 9.605/1998), tendo sido aplicada ao apelante a pena de 06 (seis) meses de detenção para cada delito, o quantitativo punitivo retro atrai o prazo prescricional de 03 anos, previsto no inciso VI do artigo 109, do Código Penal.

E esse intervalo de tempo transcorreu entre a data do recebimento da denúncia - 25.10.2017 (fl. 27, evento 3, PROCJUDIC2); e a data da publicação da sentença condenatória, em 03.11.2020 (fl. 02, evento 3, PROCJUDIC4), restando, assim, operada a prescrição retroativa, nos termos do artigo 110 §1º do Código Penal.

Assim, cumpre decretar a extinção da punibilidade do acusado em relação aos delitos narrados nos 1º e 2º fatos denúncia, nos termos do artigo 107 inciso IV do Código Penal.

Em decorrência do reconhecimento da prescrição, resta prejudicado o exame de mérito da apelação defensiva, no ponto.

Já em relação ao delito remanescente, previsto no artigo 38 caput, da Lei nº 9.605/98, considerando que a pena fixada foi de 01 ano de detenção, cumpre examinar o mérito recursal.

E, no particular, entendo deva ser modificada a sentença, pois não comprovada devidamente a materialidade delitiva em relação ao delito contra a flora, de acordo com o hodierno entendimento deste Colegiado.

Explico.

Sobre o tema em questão, verifica-se que, atualmente, o Superior Tribunal de Justiça, ao qual compete uniformizar a interpretação da norma infraconstitucional, passou a entender pela imprescindibilidade de laudo pericial judicial direto para comprovação da materialidade do delito previsto no art. 38, da Lei nº 9.605/98, somente podendo ser dispensado nas hipóteses de desaparecimento dos vestígios ou quando o local dos fatos tenha se tornado impróprio à análise. Cito precedente, verbis:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. CRIME AMBIENTAL. CONDENAÇÃO PELO ART. 38-A, CAPUT, C/C O ART. 53, II, "c", DA LEI N. 9.605/98. AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL. CRIME QUE DEIXA VESTÍGIOS. PRECLUSÃO AFASTADA IN CASU. FUNDAMENTAÇÃO A QUO NÃO IDÔNEA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA, DE OFÍCIO.
I - A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do col. Pretório Excelso, firmou orientação no sentido de não admitir a impetração de habeas corpus em substituição ao recurso adequado, o que implica o não conhecimento da impetração, ressalvados casos excepcionais em que, configurada flagrante ilegalidade, apta a gerar constrangimento ilegal, seja recomendável a concessão da ordem de ofício.

II - Sobre os crimes ambientais em comento, assim se pronunciou esta eg.
Quinta Turma, acerca da imprescindibilidade da perícia: "Para a tipificação dos delitos previstos nos arts. 38 e 38-A da Lei ambiental é necessário que a conduta tenha sido praticada contra vegetação de floresta de preservação permanente (art. 38) e vegetação primária ou secundária, situada no Bioma Mata Atlântica (art. 38-A) [...] O tema é complexo, não facilmente identificável por leigos, sendo imprescindível a realização de perícia na medida em que não é qualquer supressão/destruição que caracteriza o ilícito do art. 38 da Lei Ambiental" (AgRg no AREsp n. 1.571.857/PR, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 22/10/2019).
III - No mesmo sentido, entende a eg.
Sexta Turma desta Corte Superior: "A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça está fixada no sentido de que é necessária a realização de exame pericial em delitos não transeuntes, sendo possível a sua substituição por outros meios probatórios somente quando a infração não deixar vestígio ou se o corpo de delito houver desaparecido, a teor do disposto nos arts. 158 e 167 do Código de Processo Penal (AgRg no AgRg no REsp 1.419.093/DF, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em 10/03/2015, DJe de 26/03/2015; sem grifos no original) [...] O exame de corpo de delito direto somente pode ser suprido por outros meios probatórios, na forma indireta, para fins de comprovação da materialidade dos crimes ambientais de natureza material e não transeunte - no caso, o art. 38 da Lei n.º 9.605/98 -, na hipótese em que houver o desaparecimento dos vestígios ou quando o lugar dos fatos tenha se tornado impróprio à análise pelos experts, circunstâncias excepcionais que não se...

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