Acórdão nº 50009274320138210072 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50009274320138210072
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001902155
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000927-43.2013.8.21.0072/RS

TIPO DE AÇÃO: Usucapião Extraordinária

RELATOR: Desembargador DILSO DOMINGOS PEREIRA

APELANTE: GINA ROSANE MIRON BRENTANO (AUTOR)

APELANTE: JORGE DANIEL BRENTANO (AUTOR)

APELADO: MIRON & CIA LTDA. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de embargos de declaração opostos por GINA ROSANE MIRON BRENTANO E OUTRO contra o acórdão que desproveu a apelação cível autuada sob o n. 5000927-43.2013.8.21.0072, constando na ementa (Evento 36):

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. ÔNUS DA PROVA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA.
I. A PROVA É UMA FACULDADE ATRIBUÍDA ÀS PARTES, PARA QUE COMPROVEM OS FATOS ALEGADOS. NESSE VIÉS, OS APELANTES NÃO SE DESINCUMBIRAM DO ÔNUS DE PROVAR OS FATOS CONSTITUTIVOS DE SEU DIREITO, NOS TERMOS DO ART. 373, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
II. TRATANDO-SE DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO, PREVISTO NO ART. 1.238 DO DIPLOMA CIVIL, DEVEM SER ATENDIDOS, DE FORMA CONCOMITANTE, OS SEGUINTES REQUISITOS: POSSE PACÍFICA E ININTERRUPTA SOBRE O IMÓVEL USUCAPIENDO, COM ÂNIMO DE DONO, POR 15 ANOS OU - OBSERVADA A REGRA DE TRANSIÇÃO DO ART. 2.028 DO CÓDIGO CIVIL - POR 20 ANOS, PRAZO PREVISTO NO CC/1916.
III. NA HIPÓTESE DOS AUTOS, O CONJUNTO PROBATÓRIO É INSUFICIENTE PARA DEMONSTRAR O INEQUÍVOCO PREENCHIMENTO DE TAIS REQUISITOS, IMPONDO-SE A MANUTENÇÃO DO JULGADO SINGULAR.
IV. ANTE O RESULTADO DO JULGAMENTO, NECESSÁRIA A MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS, NOS TERMOS DO ART. 85, §11, DO CPC.
APELAÇÃO CÍVEL DESPROVIDA.
UNÂNIME.

Em suas razões (Evento 44), destacam a ausência de manifestação a respeito de elementos capazes de infirmar a presunção de ocupação permitida. Alegam a existência de prova de pagamento ao falecido PAULO MIRON, ainda no ano de 1999, quando a filial da empresa embargada encerrou suas atividades. Citam que, após o encerramento da filial de Torres/RS, o embargante depoistou para PAULO MIRON a quantia de R$ 2.727,79. Ressaltam que o acórdão seria omisso quanto ao recibo em questão. Pontuam que, de acordo com os comprovantes carreados ao feito, a construção do imóvel foi custeada pelos recorrentes, que venderam seu patrimônio em Cruz Alta/RS e investiram suas economias sobre o imóvel em questão. Sustentam que o construtor do imóvel reconhece os apelantes como proprietários, assim como o antigo proprietário. Asseveram que o acórdão foi omisso em relação à conduta das partes como meio de prova. Salientam a ausência de violação aos limites da demanda, especificamente quanto à possibilidade de julgamento de parcial procedência.

Ao final, pugnam pelo acolhimento dos embargos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

De plano, adianto que não merece acolhimento a pretensão das partes ora embargantes.

Perscrutando a peça recursal, não verifico a presença das hipóteses de interposição elencadas no art. 1.022, do Código de Processo Civil, eis que não caracterizada qualquer omissão, obscuridade ou contradição no decisum embargado.

Sobre a suposta omissão, observa-se que o acórdão ora embargado expressamente se manifestou quanto à impossibilidade de reconhecimento da prescição aquisitiva (Evento 36):

(...) No caso concreto, os autores, ora apelantes, buscam ver reconhecida a prescrição aquisitiva em relação ao imóvel objeto da matrícula n. 57.241 do RI de Torres/RS, de propriedade da apelada MIRON & CIA LTDA, posteriormente à cisão da VULCANIZADORA PROGRESSO - RECAPAGEM E CONSERTO DE PNEUS, proprietária do imóvel desde 12/07/2001, após reconhecimento de usucapião datado de 1994 (Evento 3, Doc. 2, p. 8/9, na origem).
De plano, antecipo o voto no sentido de que não merece guarida a irresignação.

A propósito da controvérsia, os requisitos para aquisição da propriedade mediante usucapião vêm estabelecidos no art. 1.238 do Código Civil:
(...)
Na espécie de usucapião em comento devem, portanto, coexistir os seguintes elementos: (1) posse pacífica e ininterrupta, (2) por, no mínimo, 15 ou 10 anos (ou - observada a regra de transição do art. 2.028 do Código Civil - por 20 anos, prazo previsto no CC/1916), conforme as circunstâncias e (3) com animus domini, que corresponde ao ânimo de possuir como seu o imóvel.

Compulsando os autos, entretanto, verifica-se que, nada obstante as alegações em sentido contrário, os autores não lograram êxito em demonstrar inequivocamente, como lhes incumbia, por força do art. 373, I, do CPC, deter a posse do imóvel objeto da ação com animus domini desde a década de 1990.

Na hipótese dos autos, como bem apontado na sentença e no parecer do Ministério Público, a prova produzida no curso da ação evidencia que os ora apelantes residem no imóvel há muitos anos, utilizando o bem para comércio próprio.

Todavia, a relação de parentesco ente os usucapientes e os sócios da empresa titular registral, PAULO e NELCI, pais da autora GINA, indica que se trata de ocupação permitida, não induzindo posse, circunstância que inviabiliza o acolhimento da pretensão autoral.

Sobre o tema, peço venia para transcrever o seguinte trecho da sentença ora apelada (Evento 3, Doc.
14, p. 31/34):

(...) Nesse sentido, cabe registrar-se inicialmente não só a absoluta ausência de prova do alegado acerto de contas entre o autor e o representante da empresa, por meio do qual o imóvel teria ficado para os autores “como forma de reparação pelos serviços prestados e benfeitorias realizadas” (último parágrafo da fl. 05), como a existência de fortes indícios de que não havia razão para a celebração desse acordo, de que Paulo Miron nunca teve a intenção de doar o imóvel aos autores, e de que esses, por seu turno, também não se consideravam os proprietários do bem em questão.
Senão, vejamos:
O autor manteve vínculo empregatício com a empresa Miron & Cia.
Ltda. pelo período de 14 anos, de 01-9-1985 a 06-9-1999 (fl. 67), e, a princípio, conforme os docs. das fls. 509/521, percebeu todos os seus direitos trabalhistas, inclusive as verbas rescisórias; logo, não havia direito trabalhista do autor pendente de pagamento, tampouco a ação de usucapião se presta a reparar, por via transversa, eventual lesão nessa seara.
Depois, a autora Gina Rosane, em seu depoimento pessoal, reconheceu a participação financeira do pai e do irmão Gilmar na construção da obra principal; assim, também não existia razão para que o representante da empresa recompensasse exclusivamente os autores, em prejuízo próprio, da empresa e do filho Gilmar.
(...)
Ainda, no que diz com o pagamento do IPTU, indicativo importante do “animus domini”, já que o adimplemento das despesas de água, energia elétrica e telefone decorrem do simples uso do imóvel, a prova revela que dos catorze exercícios financeiros que separam a época do fechamento da filial da empresa em Torres, no ano de 1999, e o ajuizamento desta ação, no ano de 2013, os autores pagaram apenas o exercício de 2006 (fl. 45), deixando em aberto um total de treze exercícios; destarte, é de se concluir que os requerentes também não se consideravam donos do imóvel na medida em que não cumpriam com as obrigações tributárias geradas pelo bem, não lhes socorrendo a justificativa de que assim não o fizeram porque passaram por dificuldades financeiras no período em que os filhos cursaram faculdade, já que treze anos é um período
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