Acórdão nº 50009317420198210006 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sétima Câmara Cível, 30-06-2022

Data de Julgamento30 Junho 2022
ÓrgãoDécima Sétima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50009317420198210006
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002183941
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

17ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000931-74.2019.8.21.0006/RS

TIPO DE AÇÃO: Direito de Vizinhança

RELATORA: Desembargadora ROSANA BROGLIO GARBIN

APELANTE: THEREZINHA CHRISTINO DE CARVALHO (AUTOR)

APELANTE: MARIA CRISTINA DE CARVALHO (AUTOR)

APELANTE: NORA REGINA CRISTINO DE CARVALHO (AUTOR)

APELADO: CATIA ELZIRA WIOPPIOLD FRITZ MICHELS (RÉU)

APELADO: DIEGO EVERSON ZIEMANN MICHELS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por THEREZINHA CHRISTINO DE CARVALHO e OUTROS frente à sentença em que, apreciando ação de nunciação de obra nova cumulada com pedido indenizatório ajuizada em face de CATIA ELZIRA WIOPPIOLD FRITZ MICHELS e DIEGO EVERSON ZIEMANN MICHELS, o Magistrado a quo julgou improcedentes os pedidos iniciais, condenando os demandantes ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios da parte adversa, estes fixados em 15% do valor atualizado da causa - verba suspensa em razão da AJG (evento 98, SENT1).

Em razões recursais (evento 107, REC1), os demandantes aduzem haver prova robusta do alegado na exordial, inclusive com prova técnica que jamais foi considerada pelo juízo ou mesmo impugnada pela parte recorrente. Contextualizam que "os apelados iniciaram construção de obra exatamente na divisa do terreno e sem justificativa plausível, prejudicando a ventilação e insolação do avarandado dos autores ora recorrentes". Sustentam que os elementos coligidos ao feito são suficientes para atribuir à área sob exame a condição de servidão de luz e ar. Ponderam que "as fotos juntadas, e inclusive laudo técnico apresentado, não impugnada pela apelante, comprova que área lateral da casa se encontra coberta e com abertura para a divisa do terreno, há mais de 30 anos e que a casa sempre possuiu aquela fachada, lá se encontrando há mais de 30 anos, sem oposição por parte dos apelados" (sic). Afirmam não ser cabível qualquer juízo acerca da pertinência construtiva do imóvel da parte autora, pois constituída servidão negativa por simples decurso do prazo (art. 1.379 do CC). Aduzem que "a servidão é direito real sobre coisa alheia, em virtude do qual um prédio (denominado serviente) suporta um encargo (utilidade ou serviço, ou seja, fruição e gozo) em favor de outro prédio (denominado dominante) de proprietário diverso". Colacionam jurisprudência sobre servidão de mais de duas décadas. Pontuam que a pretensão de obstar a obra nova vizinha tem por fundamentos os direitos de vizinhança do Código Civil, em especial os artigos 1.299 a 1.301 do referido diploma, sendo clara a vedação de abrir janelas a menos de metro e meio. Tergiversam sobre as conclusões do laudo por eles produzido e sobre alegado não atendimento pelo juízo a quo de requerimentos de produção de prova, de modo que, aduzem, haver cerceamento de defesa por ter deixado o Julgador de analisar pedido de produção de prova documental. Pugna, assim, pela anulação do processo deste o requerimento de prova do Evento 42. Chama atenção para o parecer da Secretaria Municipal nº 275/2019 opinando pelo embargo da obra. Pleiteiam a fixação de honorários em relação à extinção da reconvenção. Requerem, ao final, o provimento do apelo.

Não foram apresentadas contrarrazões.

Remetidos os autos eletrônicos a este Tribunal, vieram conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, passa-se à análise da irresignação.

Cuida-se de ação de nunciação de obra nova proposta por THEREZINHA CHRISTINO DE CARVALHO e OUTROS em face ELZIRA WIOPPIOLD FRITZ MICHELS e DIEGO EVERSON ZIEMANN MICHELS.

Aduziram os autores serem proprietários do imóvel da rua Sete de Setembro, nº 553 e que os réus são vizinhos, proprietários do imóvel lindeiro, registrado sob o nº 555, na mesma rua. Contaram que os demandados iniciaram a construção de edifício em desacordo com as restrições de vizinhança e normas administrativas, pela existência de janelas junto à divisa, não tendo o réu observado o recuo, em afronta ao disposto no art. 1.301 do CC. Ponderaram que a área lateral de sua casa encontra-se coberta e com abertura para a divisa do terreno, há mais de trinta anos, entendendo, assim, pela existência de servidão aparente, suscetível de aquisição pela prescrição aquisitiva. Referiram que houve parecer da Secretaria Municipal pelo embargos da obra, o que nunca aconteceu. Pleitearam a concessão da tutela de urgência para que fosse embargada a construção e, ao final, seu desfazimento, com pagamento de danos morais no valor de R$ 300.000,00.

Citados, os réus apresentaram contestação e recovenção, esta última cancelada (vide evento 68, DESPADEC1).

Instruídos o feito, concluiu o Juízo de origem por julgar improcedente a nunciação de obra nova, contra o que se insurgem autores, nos termos acima relatados.

Pois bem.

Nos termos do art. 1.277 do Código Civil, "O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha."

Na mesma linha, o art. 1.299 do Diploma Civil preconiza que "o proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha".

Daí porque plenamente possível a limitação do direito de propriedade, neste abarcado o direito de construir, por meio do manejo de uma ação de nunciação de obra nova, valendo-se o autor das disposições do direito de vizinhança.

Para a avaliação do mérito do recurso, impende discorrer sobre o direito à prova, eis que imprescindível à questão do convencimento, este primordial para a efetivação da prestação jurisdicional.

O art. 373 do CPC, nos seus incisos, preconiza que, a rigor, incumbe ao autor o ônus da prova quanto ao fato constitutivo de seu direito, enquanto ao réu caberia a demonstração da existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do demandante.

De acordo com Nelson Nery Junior1, "não existe obrigação que corresponda ao descumprimento do ônus", "o não atendimento do ônus de provar coloca a parte em desvantajosa posição para a obtenção do ganho de causa".

Não há, portanto, um dever de provar, nem à parte contrária assiste o direito de exigir a prova da parte adversa; há um simples ônus, de forma que o litigante assume o risco de não ter seus pedidos acolhidos se não demonstrar os fatos sustentados e dos quais dependem a existência do direito subjetivo que pretende resguardar por meio da tutela jurisdicional.

Não por outro motivo o ônus da prova "é visto como uma regra de julgamento a ser aplicada pelo juiz, no momento de proferir a sentença, no caso de a prova se mostrar inexistente ou insuficiente"2.

O diploma processual civil, embora prevendo orientações acera do tema, adota a forma dinâmica da distribuição do ônus da prova, de modo a direcioná-lo a quem se mostre mais apto a produzi-la (§1º do art. 373 do CPC); ainda que não esteja o demandante, em absoluto, eximido de evidenciar a prova mínima do direito que alega.

Ao deslinde de controvérsia instaurada em demandas de nunciação de obra nova, como regra, os subsídios técnicos apresentam-se de curial relevância, ostentando valor preponderante. Concretamente, no entanto, a pretensão autoral vem amparada em parecer técnico unilateralmente produzido pela parte demandante, não tendo sido oportunamente requerida a prova pericial nos autos, o que, por certo, não milita em favor dos requerentes.

Malgrado o parecer...

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