Acórdão nº 50009325820218210016 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 31-01-2022

Data de Julgamento31 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50009325820218210016
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001522271
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

10º Grupo Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000932-58.2021.8.21.0016/RS

TIPO DE AÇÃO: Cédula de crédito bancário

RELATOR: Desembargador CARLOS CINI MARCHIONATTI

APELANTE: MARILUCI NUNES RIBEIRO (AUTOR)

APELADO: CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS (RÉU)

RELATÓRIO

MARILUCE NUNES RIBEIRO, como demandante, apela da sentença que julgou improcedente a ação de revisão de contrato bancário proposta por si a CREFISA S.A. CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS (evento 13).

A sentença corresponde ao meu modo de entender, que ressalvo diante da orientação da Câmara que devo cumprir.

Em sua apelação, a parte demandante alega: (a) a abusividade dos juros remuneratórios contratados, pois muito superiores à taxa média do Banco Central (b) a descaracterização da mora; e (c) a compensação de valores ou a repetição do indébito. Postula-se, assim, o provimento do recurso para a procedência da ação, inversão dos ônus sucumbenciais e a majoração dos honorários advocatícios (Evento 18).

A instituição financeira demandada apresentou contrarrazões (Evento 22).

VOTO

Reconstitui-se que a presente ação judicial tem por objeto a revisão do contrato de empréstimo bancário nº 033020022704, no valor financiado de R$476,54, a ser pago em 12 prestações de R$ 117,00, a partir de 1-6-2020 até 3-5-2021, com taxa de juros remuneratórios de 22% ao mês e 987,22% ao ano (Evento 1 - CONTR6).

O voto distingue-se em duas partes, na primeira, reconstitui a ação da jurisprudência, na segunda, procede à incidência nas circunstâncias do caso, que concluirá pelo abuso em função da taxa média, como considera a maioria da composição da Câmara.

É vigorosa a ação da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça na questão dos juros remuneratórios dos contratos de crédito bancário em geral e cláusulas análogas.

A Súmula n.º 596 do STF enuncia: “as disposições do Decreto nº 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o Sistema Financeiro Nacional”.

A ADI n.º 4 considerou não ser auto-aplicável o § 3º do artigo 192 da Constituição da República, relativamente aos juros reais de 12% ao ano no âmbito do Sistema Financeiro Nacional, e a Emenda Constitucional n.º 40, de 29-5-2003, revogou o dispositivo constitucional.

Aplicam-se os enunciados das seguintes súmulas do STJ:

Súmula 283: As empresas administradoras de cartão de crédito são instituições financeiras e, por isso, os juros remuneratórios por elas cobrados não sofrem as limitações da Lei de Usura.

Súmula 286: A renegociação de contrato bancário ou a confissão da dívida não impede a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades dos contratos anteriores.

Súmula 294: Não é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão de permanência, calculada pela taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa do contrato.

Súmula 296: Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado.

Súmula 297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

Súmula 379: Nos contratos bancários não regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês.

Súmula 381: Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas.

Súmula 382: A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.

Súmula 472: A cobrança de comissão de permanência – cujo valor não pode ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato – exclui a exigibilidade dos juros remuneratórios, moratórios e da multa contratual.

Súmula 530: Nos contratos bancários, na impossibilidade de comprovar a taxa de juros efetivamente contratada – por ausência de pactuação ou pela falta de juntada do instrumento aos autos -, aplica-se a taxa média do mercado, divulgada pelo Bacen, praticada nas operações da mesma espécie, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o devedor.

Súmula 539: É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.

Súmula 541: A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada.

Há, também, as teses firmadas pelo STJ em regime de julgamento de recursos especiais repetitivos:

CONFIGURAÇÃO DA MORA EM CONTRATOS BANCÁRIOS (Temas: 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36):

ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA:

a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descarateriza a mora;

b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual.

DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO EM CONTRATOS BANCÁRIOS (Temas: 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36):

ORIENTAÇÃO 5 - DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO:

É vedado aos juízes de primeiro e segundo graus de jurisdição julgar, com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários.

JUROS MORATÓRIOS EM CONTRATOS BANCÁRIOS (Temas: 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36):

ORIENTAÇÃO 3 - JUROS MORATÓRIOS:

Nos contratos bancários, não-regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês.

JUROS REMUNERATÓRIOS EM CONTRATOS BANCÁRIOS (Temas: 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36):

ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS:

a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;

b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.

COMISSÃO DE PERMANÊNCIA EM CONTRATOS BANCÁRIOS (Tema: 52):

1. O princípio da boa-fé objetiva se aplica a todos os partícipes da relação obrigacional, inclusive daquela originada de relação de consumo. No que diz respeito ao devedor, a expectativa é a de que cumpra, no vencimento, a sua prestação.

2. Nos contratos bancários sujeitos ao Código de Defesa do Consumidor, é válida a cláusula que institui comissão de permanência para viger após o vencimento da dívida.

3. A importância cobrada a título de comissão de permanência não poderá ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato, ou seja: a) juros remuneratórios à taxa média de mercado, não podendo ultrapassar o percentual contratado para o período de normalidade da operação; b) juros moratórios até o limite de 12% ao ano; e c) multa contratual limitada a 2% do valor da prestação, nos termos do art. 52, § 1º, do CDC.

4. Constatada abusividade dos encargos pactuados na cláusula de comissão de permanência, deverá o juiz decotá-los, preservando, tanto quanto possível, a vontade das partes manifestada na celebração do contrato, em homenagem ao princípio da conservação dos negócios jurídicos consagrado nos arts. 139 e 140 do Código Civil alemão e reproduzido no art. 170 do Código Civil brasileiro.

5. A decretação de nulidade de cláusula contratual é medida excepcional, somente adotada se impossível o seu aproveitamento.

JUROS REMUNERATÓRIOS EM CONTRATOS BANCÁRIOS NOS QUAIS NÃO HAJA PROVA DA TAXA PACTUADA OU A CLÁUSULA AJUSTADA ENTRE AS PARTES NÃO TENHA INDICADO O PERCENTUAL A SER OBSERVADO (Temas: 233, 234):

1 - Nos contratos de mútuo em que a disponibilização do capital é imediata, o montante dos juros remuneratórios praticados deve ser consignado no respectivo instrumento. Ausente a fixação da taxa no contrato, o juiz deve limitar os juros à média de mercado nas operações da espécie, divulgada pelo Bacen, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o cliente.

2 - Em qualquer hipótese, é possível a correção para a taxa média se for verificada abusividade nos juros remuneratórios praticados.

POSSIBILIDADE DE CAPITALIZAÇÃO DE JUROS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO EM CONTRATOS BANCÁRIOS CELEBRADOS APÓS...

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