Acórdão nº 50009470220188210026 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Primeira Câmara Cível, 09-02-2022

Data de Julgamento09 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50009470220188210026
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Primeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001535963
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

21ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000947-02.2018.8.21.0026/RS

TIPO DE AÇÃO: IPVA - Imposto Sobre Propriedade de Veículos Automotores

RELATOR: Desembargador ARMINIO JOSE ABREU LIMA DA ROSA

APELANTE: BANCO BV S.A. (EMBARGANTE)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (EMBARGADO)

RELATÓRIO

BANCO BV S/A apela da sentença de improcedência dos embargos à execução fiscal opostos em face do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL.

Nas razões recursais, discorre sobre a ausência de legitimidade passiva em relação ao IPVA objeto da execução, enfatizando a condição de arrendante, que não desfruta do bem, remetendo-se ao trato a respeito da Resolução nº 2.309/96-BACEN, artigos 5º, I e II, e 7º, assim como a Resolução nº 664/84-CONTRAN.

Acentua descaber à legislação local propor conceitos distintos daquele da legislação de regência, art. 110, CTN, especialmente, no caso, aquele de propriedade, artigos 1.226, 1.228 e 1.267, CC/02, resguardando-se, no mais, conceito constitucional do art. 146, III, "a" e "b", CF/88.

Remete-se às disposições do CTN, artigos 124, 128 (esses especialmente no que tratam da responsabilidade solidária), e 130, mencionando que a responsabilidade tributária supletiva, em matéria tributária, reclama (i) expressa previsão legal; e (ii) que a pessoa tida como responsável supletivamente possua vínculo com o “fato gerador da respectiva obrigação” (art. 128, CTN), aludindo ausente esse último, descabendo à lei ordinária local criar hipótese nova de solidariedade passiva.

Invoca, nesta toada, o RE nº 562.276/PR.

Pugna pela atribuição de efeito suspensivo e, ao final, requer o provimento do recurso.

A resposta sustenta concentrar-se a propriedade na pessoa do arrendante, enquanto não consolidada na pessoa do devedor, remetendo-se, no mais, à legislação local e à jurisprudência a respeito, inclusive do Superior Tribunal de Justiça.

É o relatório.

VOTO

Primeiro, obviamente não é caso de agregação de efeito suspensivo ao recurso, havendo procedimento próprio a tal respeito, art. 1.012, § 3º, CPC/15, inobservado pela recorrente, não fosse, ultimando tema, a ausência de verossimilhança, tal como se verá no seguimento.

Aliás, rigorosamente, nem bem se trata de suspender execução do julgado de origem, uma vez radicar-se preocupação da apelante na observância do art. 32, § 2º, LEF, o que de forma alguma está em causa.

Aliás, ao que se pode inferir do exame dos autos houve apropriação do valor depositado para quitar débitos executados, como manifestado pelo exequente (Evento 2 - PROCUJUDIC3 - fl. 81 - autos originários), ao que a ora apelante aludiu ter sido indevido tal levantamento (Evento 2 - PROCUJUDIC3 - fl. 84 - autos originários).

Com isso, seja como for, nenhum sentido há em deferir-se o efeito suspensivo pretendido pelo recorrente em face da realidade dos autos.

Eventual reposição do questionado valor à apelante terá de ser objeto de adequado pleito, que, outrossim, bem poderá ser formulado nestes autos, caso venha ela se sagrar vitoriosa.

No mais, não merece acolhida a pretensão recursal.

Definida a propriedade registral quanto aos veículos, da arrendante, obviamente responde ela como devedora do IPVA, nada mais cabendo, em termos de prova quanto à relação jurídica de que decorre a responsabilidade tributária da apelante.

Ou seja, o exequente desincumbiu-se do ônus probatório que lhe cabia, qual seja, o domínio dos veículos e sujeição passiva da arrendante.

Veja-se que, no ponto, inteiramente inócuo debate em torno de resoluções do CONTRAN ou do BACEN, uma vez radicar normatização do domínio no Código Civil e a incidência do IPVA sobre veículos automotores na legislação tributária própria.

No caso, CTN e Lei Estadual nº 8.115/85.

Por isso, desmerece maior consideração a invocação feita pelo apelante quanto à Resolução nº 2.309/96-BACEN, assim como quanto à Resolução nº 664/86-CONTRAN.

No que importa, a condição de proprietário está enquadrada no fato gerador do tributo, artigo 2º, Lei Estadual nº 8.115/85.

Condição de proprietário essa destacada na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e a responsabilidade quanto ao IPVA.

Assim, o REsp nº 744.308/DF, CASTRO MEIRA:

TRIBUTÁRIO. IPVA. ARRENDAMENTO MERCANTIL. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. ARRENDANTE.
1. O arrendante, por ser possuidor indireto do bem e conservar a propriedade até o final do contrato de arredamento mercantil, é responsável solidário para o adimplemento da obrigação tributária relativa ao IPVA, nos termos do art. 1º, § 7º, da Lei Federal nº 7.431/85. Precedentes: (REsp 897.205/DF, Rel. Min. Humberto Martins, DJU de DJU de 29.03.07; REsp 868.246/DF; Rel. Min. Francisco Falcão, DJU de 18.12.06).
2. Recurso especial provido.

Não é outra a orientação deste Tribunal de Justiça, como se vê da AC nº 70037231990, LUIZ FELIPE SILVEIRA DIFINI:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. IPVA. ARRENDAMENTO MERCANTIL. RESPONSABILIDADE DO ARRENDANTE. INOPONIBLIDADE DE CONVENÇÕES E CONTRATOS PARTICULARES. INTELIGÊNCIA DO ART. 123 DO CTN.
I. O fato gerador do IPVA é a propriedade do veículo automotor.
No caso de automóvel objeto de contrato de arrendamento mercantil, a responsabilidade pelo pagamento do IPVA é do arrendante, porque ele permanece titularizando a propriedade do bem em questão.
II. De acordo com o disposto no art. 123 do CTN, são inoponíveis à Fazenda Pública as convenções e contratos particulares relativos à responsabilidade pelos pagamentos de tributos.

De cujo voto, por exaustivo, permito-me transcrever a seguinte passagem:

“A questão em tela diz respeito à responsabilidade do arrendante pelo pagamento, ou não, do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), incidente sobre veículos automotores objeto de contrato de arrendamento mercantil (leasing).

Primeiramente, insta definir o fato gerador do imposto em discussão. Nesse sentido, a Lei Estadual nº 8.115/85, ao instituir referido tributo, reza em seu artigo 2º: “O imposto, devido anualmente ao Estado, tem como fato gerador a propriedade de veículo automotor”.

Já o seu 5º dispõe que “São contribuintes do imposto os proprietários de veículos automotores sujeitos a registro e/ou licenciamento em órgão federal, estadual ou municipal, neste Estado”.

Por outro lado, há que se fazer breve digressão acerca da natureza jurídica do contrato de arrendamento mercantil, no intuito, notadamente, de verificar se há a transferência a propriedade do bem objeto da contratação.

A Lei n. 6099/74, que dispõe do tratamento jurídico das operações de arrendamento mercantil (leasing), conceitua, em seu artigo 1º, parágrafo único, arrendamento mercantil como “o negócio jurídico realizado entre pessoas jurídicas, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio desta”.

Na doutrina, Arnold Wald define a figura do arrendamento mercantil (leasing) como um contrato misto, pelo qual um financiador adquire e aluga a uma empresa bens de equipamento ou de uso profissional, móveis ou imóveis, a prazo longo ou médio, facultando-se ao locatário a aquisição dos mesmos pelo preço residual.

Como se vê, o leasing é espécie de negócio jurídico complexo (estruturalmente), porque “realiza uma fusão de diversos figurinos ou moldes num só contrato”, com um sentido econômico peculiar e características que o diferenciam da pura e simples locação, atividade com a qual costuma ser confundida.

Com efeito, não se trata de uma simples locação com promessa de venda, como à primeira vista pode parecer. Mas cuida-se de uma locação com uma consignação de promessa de compra e venda, trazendo, porém, um elemento novo, que é o financiamento, numa operação específica que consiste na simbiose da locação, do financiamento e da venda.

A Lei n. 6.099/74, que dispõe do tratamento jurídico das operações de arrendamento mercantil (leasing), conceitua, em seu artigo 1º, parágrafo único, arrendamento mercantil como “o negócio jurídico realizado entre pessoas jurídicas, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio desta”.

A propósito, explica Arnold Wald a distinção entre os dois contratos – locação e leasing –, a despeito da existência de direitos e deveres semelhantes:

O leasing não se confunde com a locação, que, como vimos, é o contrato em que uma das partes se obriga a ceder à outra o uso e gozo temporário de coisa infungível, mediante retribuição. Findo o prazo, salvo acordo ou leis especiais, a coisa deve ser devolvida, ficando extinto o contrato. No leasing, há, no fim do prazo contratual, uma tríplice opção para o usuário: a) renovar a locação; b) adquirir o material; c) restituí-lo. Por outro lado: a) na locação, o risco da coisa é do locador (art. 1.190 do Código Civil); no leasing, é do arrendatário; b) na locação, o aluguel corresponde (ou deve corresponder) ao uso e gozo da coisa; no leasing, as prestações são mais altas, porque garantem também a amortização e os custos do financiamento; c) na locação finda, a coisa deve ser restituída; no leasing, o arrendatário tem opção: renova, restitui ou compra a coisa pelo preço residual; d) na locação, o locador deve garantir o uso pacífico da coisa; no leasing, fica por conta do usuário as medidas para defesa; e) na locação pode haver denúncia vazia; no leasing, não; f) na locação, há apenas um contrato entre o locador e o locatário e, raramente apenas, o locador não é dono da coisa locada; no leasing, a empresa de arrendamento mercantil adquire a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT