Acórdão nº 50009704520188210123 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 30-06-2022

Data de Julgamento30 Junho 2022
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50009704520188210123
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002030826
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000970-45.2018.8.21.0123/RS

TIPO DE AÇÃO: Contravenções Penais

RELATORA: Desembargadora VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

LUCIMAR B. DA S., com 39 anos de idade à época do fato, foi denunciado na 2ª Vara Judicial de Santo Augusto, como incurso nas sanções do artigo 24-A da Lei n.º 11.340/06 e no artigo 147, caput, do Código Penal, c/c o artigo 61, inciso II, alínea "f" e artigo 69, caput, ambos do Diploma Repressivo, pela prática dos seguintes fatos delituosos:

Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência

No período compreendido entre os dias 14 e 27 de julho de 2018, em diversos horários, em local não suficientemente esclarecido, no município de Santo Augusto/RS, o denunciado LUCIMAR B.DA S. descumpriu a decisão judicial que deferiu medidas protetivas em favor da vítima indireta ROSIMERI P. B. DA S., seu ex-cônjuge.

Na oportunidade, o denunciado enviou inúmeras mensagens, via aplicativo whatsapp, a despeito de intimado – no dia 21 de junho de 2018, às 17h15min (certidão de intimação da fl. 13 do apenso) – da decisão que deferiu as medidas protetivas de não manter contato com a ofendida por qualquer meio de comunicação.

Ameaça.

Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar do fato anterior, o denunciado LUCIMAR BUENO DA SILVA ameaçou a vítima ROSIMERI P. B. DA S., seu excônjuge, por palavras, de causar mal injusto e grave.

Na oportunidade, o denunciado enviou mensagem de texto para a ofendida, via aplicativo whatsapp, com conteúdo ameaçador, consistente em “se você não ficar comigo não vai ficar com ninguém mais e hoje à noite vamos ter a última conversa”.

O crime de ameaça foi perpetrado no contexto de violência intrafamiliar, baseado no gênero, constituindo violência psicológica, na forma do art. 7º, inciso II, da Lei nº 11.340/2006, uma das formas de violação dos direitos humanos, conforme art. 6º do referido diploma legal.

Foi decretada a prisão preventiva do denunciado, o qual restou segregado em 17/10/2018 (fl. 34, evento 3, PROCJUDIC5) até 12/11/2018, quando aplicadas medidas cautelares diversas (fls. 04, 05, evento 3, PROCJUDIC6).

A inicial acusatória foi recebida em 12/11/2018 (fl. 48, evento 3, PROCJUDIC1).

Regularmente processado o feito, sobreveio sentença (fls. 29/41, evento 3, PROCJUDIC3) da lavra da ilustre magistrada, Dra. Eveline Mileide Boratti, condenando o denunciado como incurso nas sanções do artigo 24-A da Lei n.º 11.340/06 e do artigo 147, caput, do Código Penal, c/c o artigo 61, inciso II, alínea "f", do Diploma Repressivo, às penas de 04 (quatro) meses e 05 (cinco) dias de detenção, em regime inicial aberto, e indenização a título de danos morais no valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

As penas privativas de liberdade foram assim fixadas:

Fato 1 (descumprimento das medidas protetivas): pena-base de 03 (três) meses de detenção, diante da ausência de circunstâncias desfavoráveis a considerar. Presente a atenuante da confissão espontânea, porém não houve redução em face da súmula 231 do STJ. Ausentes majorantes ou minorantes, ficou a pena definitivizada em 03 (três) meses de detenção.

Fato 02 (ameaça): pena-base de 01 (um) mês de detenção, diante da ausência de circunstâncias desfavoráveis a considerar. Presente a agravante do artigo 61, inciso II, alínea "f", do CP, aumentou-se a pena de 1/6, perfazendo 01 (um) mês e 05 (cinco) dias de detenção, definitivizada neste quantum, pois ausentes outras causas modificadoras.

Aplicado o concurso material, as penas foram somadas, totalizando 04 (quatro) meses e 05 (cinco) dias de detenção.

A sentença foi publicada em 14/01/2021 (fl. 41, evento 3, PROCJUDIC3).

Inconformada, a Defensoria Pública interpôs recurso de apelação, requerendo a absolvição do acusado do delito de descumprimento de medidas protetivas pelo princípio da intervenção mínima do Direito Penal, pela atipicidade da conduta, diante da revogação tácita das medidas pelo comportamento da vítima ou pela ausência de dolo. Quanto ao crime de ameaça, alegou insuficiência probatória e atipicidade da conduta, tendo em vista a ausência de temor da vítima. Subsidiariamente, pugnou pelo afastamento da indenização por danos morais à vítima, pois a questão não foi levantada na instrução processual, e a concessão de justiça gratuita, suspendendo a exigibilidade das custas processuais (fls. 01/13, evento 3, PROCJUDIC3).

O Ministério Público ofereceu contrarrazões, propugnando pelo desprovimento do apelo (fls. 17/21, evento 3, PROCJUDIC3).

Neste grau de jurisdição, a nobre Procuradora de Justiça, Dra. Ana Maria Schinestsck, opinou pelo desprovimento do apelo (evento 9, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas, trata-se de recurso de apelação interposto pela douta defesa técnica de LUCIMAR B. DA S., inconformada com a decisão que o condenou pela prática do crime previsto no artigo 24-A da Lei n.º 11.340/06 e do artigo 147, caput, do Código Penal, c/c o artigo 61, inciso II, alínea "f", do Diploma Repressivo.

Examinando detidamente os elementos de convicção constantes do caderno processual, observa-se que a espécie foi muito bem analisada na sentença. Desta sorte, considerando a objetividade e precisão da análise feita pela ilustre magistrada, Dra. Evelise Mileide Boratti, para não incorrer em desnecessário exercício de tautologia, de nenhum efeito prático, contando com seu consentimento, adoto seus fundamentos, integrando-os ao voto como razões de decidir, conforme segue:

Trata-se de ação que visa apurar a responsabilidade do acusado LUCIMAR BUENO DA SILVA pelo cometimento dos delitos de descumprimento de medidas protetivas de urgência (1º fato) e ameaça (2º fato).

A vítima ROSIMERI P. B. DA S., em juízo, confirmou os fatos narrados na denúncia. Relatou que o acusado lhe abordava na rua e pedia para que entrasse no carro. Afirmou que o réu enviou mensagens pelo WhatsApp, que ficou receio. Não reataram o relacionamento. Informou que o acusado não lhe importunou mais. Referiu que não tem mais medo do acusado, pois acredita que este não vai lhe fazer mais nada.

O informante CARLOS A. M., em juízo, relatou que o acusado é seu funcionário, que nunca viu discussão entre as partes, nunca ouviu comentários. Referiu que um ótimo funcionário.

O acusado LUCIMAR B. DA S., ao ser interrogado, narrou que a vítima lhe ligava durante as medidas protetivas, atendia apenas na quarta vez, pois ficava preocupado com filho menor. Referiu que tentava evitar porque sabia que não podia. Confirmou que enviou mensagens para a vítima, para relembrar o que haviam passado juntos, não se recorda do teor das mensagens. Disse que enviou umas duas ou três vezes. Questionado sobre a ameaça, disse que sua intenção era uma última conversa com a ofendida, a fim de resolver a situação. Referiu que a única coisa que conversará futuramente com a vítima é sobre os filhos, pois “quanto mais longe, melhor”.

Essa é a prova oral colhida no feito.

1º Fato: Descumprimento de medidas protetivas de urgência.

A materialidade do crime restou comprovada pelo Registro de Ocorrência n. 911/2018 (fls. 03/04), pela certidão de intimação das medidas protetivas em 21/06/2018 (fls. 16/18), pelo Registro de Ocorrência n. 1257/2018 da prisão preventiva (fl. 23/24), bem como pela prova oral produzida em Juízo.

Consta dos autos que as medidas protetivas deferidas em favor da vítima pelo prazo de 90 dias no dia 21/06/2018 (fl. 10 – processo n. 123/2.18.0000655-8), foram de proibição de aproximação da vítima e seus familiares, bem como proibição de contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas, por qualquer meio de comunicação, sendo o réu intimado no dia 21/06/2018 (fls. 16/18).

Há registro de ocorrência datado de 27/07/2018 (fls. 03/04) dando conta de que o réu enviou mensagens via WhatsApp da vítima, no período de 14/07/2018 a 27/07/2018, no sentido de reatar o relacionamento, o que foi corroborado em Juízo.

Logo, tem-se que o acusado descumpriu a medida protetiva de proibição de contato.

Além do mais, nota-se que foi decretada a prisão preventiva do acusado no dia 27/07/2018 (fl. 20), em razão do novo registro de ocorrência registrado pela vítima, dando conta de que o réu estava descumprindo as medidas protetivas.

Portanto, não há que se falar em insuficiência probatória.

Além do mais, o réu confirmou que enviou mensagens de texto para a vítima, a fim de relembrar o que haviam passado, mesmo ciente das medidas protetivas.

A vítima narrou pormenorizadamente como os fatos aconteceram, sendo que seu depoimento em juízo ratificou, na íntegra, os termos da ocorrência policial.

Não há que se falar em revogação tácita das medidas protetivas pelo fato da vítima ter respondido uma mensagem, após diversas mensagens enviadas pelo réu. Antes dessa mensagem enviada pela vítima o réu já tinha descumprido as medidas várias vezes.

Também não há que se falar em ausência de dolo, pois o réu efetivamente descumpriu as medidas, tendo inclusive confessado o delito.

Nestas condições, tenho que resta demostrada, suficientemente, a materialidade e autoria delitiva, de que o acusado descumpriu a medida protetiva deferida em favor da vítima.

Ainda, não se aplica o princípio da intervenção mínima ao presente caso, pois está diante de descumprimento perpetrada no ambiente doméstico e familiar contra a mulher, e o referido delito, albergado pela Lei Maria da Penha, requer a atuação do Estado, já que diretamente relacionado ao combate contra a violência de gênero. Ademais, o bem jurídico tutelado pelo tipo penal é a incolumidade psicológica do indivíduo, intrínseca à preservação da dignidade da pessoa humana, estando...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT