Acórdão nº 50009777920148210025 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Número do processo50009777920148210025
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001662010
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação/Remessa Necessária Nº 5000977-79.2014.8.21.0025/RS

TIPO DE AÇÃO: Fornecimento de medicamentos

RELATORA: Desembargadora LUCIA DE FATIMA CERVEIRA

APELANTE: MUNICÍPIO DE SANTANA DO LIVRAMENTO (RÉU)

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

APELADO: CLAUDIA JEANET CRUZ DA SILVA (AUTOR)

RELATÓRIO

MUNICÍPIO DE SANTANA DO LIVRAMENTO apela da sentença proferida nos autos da ação de obrigação de fazer (fornecimento de ventilação mecânica não invasivo) ajuizada por CLAUDIA JEANET CRUZ DA SILVA, que assim dispôs:

Pelo exposto, confirmo a tutela antecipatória concedida e julgo PROCEDENTE o pedido aforado por CLAUDIA JEANET CRUZ DA SILVA, contra o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e MUNICÍPIO DE SANT'ANA DO LIVRAMENTO, com resolução de mérito, forte no art. 487, I, do CPC, a fim de condenar os demandados a fornecer o aparelho de ventilação não invasiva tipo CPAP, sob pressão de 10 cm H20, necessário à recuperação e/ou manutenção da saúde a autora.

Condeno os demandados ao pagamento de honorários advocatícios equivalente a R$ 600,00 (seiscentos reais), pro rata, com base no art. 85, §8º, do CPC, corrigido pelo IPCA-E e acrescido de juros aplicados à caderneta de poupança, a contar do trânsito em julgado desta decisão (art. 85, §16, CPC).

Fica isenta a Fazenda Pública da Taxa Única de Serviços Judiciais, nos termos do art. 5º, I, da Lei n.º 14.634/2014 e Ofício-Circular n.º 060/2015-CGJ. Porém, em face de ter sucumbido na demanda, deve o ente público sucumbente reembolsar eventuais despesas judiciais levadas a efeito pela parte contrária, na forma do parágrafo único do artigo 5º da Lei n.º 14.634/14, as quais, na hipótese, não se evidenciam, porquanto a parte adversa litigou sob o pálio da AJG.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Decisão sujeira ao reexame necessário, nos termos do art. 496, §3º, II, do CPC.

Em razões recursais, alega o ente municipal que não é o responsável pelo fornecimento do equipamento de ventilação mecânica solicitado, devendo ser considerado parte ilegítima para figurar no polo passivo da ação. Por fim, postula a redução do valor arbitrado a título de honorários advocatícios. Pede provimento.

Com contrarrazões, o Ministério Público opina pelo desprovimento do recurso.

Vêm conclusos os autos para julgamento.

Observado o disposto nos arts. 931 e 934 do CPC.

VOTO

Fornecimento de tratamento elencado na lista do SUS - Tema 793 do STF

Primeiramente, consigno que estou alterando minha posição em relação à possibilidade de redimensionamento da obrigação de fornecimento do medicamento/tratamento, passando a observar as divisões e atribuições administrativas do funcionamento do SUS, bem como o ente legalmente responsável pelo financiamento da obrigação principal, para fins de definir qual ente público é o responsável pelo custeio da obrigação de saúde.

Isso porque o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº 855.178/SE (Tema 793/STF), sob a sistemática do art. 1.036 do CPC, firmou o entendimento de que:

“Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”. Grifado.

O Ministro EDSON FACHIN, designado para redigir o acórdão, em seu voto, estabeleceu seis conclusões, cabendo destacar o seguinte excerto:

“1ª) a obrigação solidária de prestar o serviço de saúde decorre da competência material comum contemplada no art. 23, II, c/c os arts. 196 e ss. da Constituição Federal;

2ª) por força da solidariedade obrigacional, a parte autora poderá propor a demanda contra quaisquer dos entes da Federação, isolada ou conjuntamente. No entanto, cada ente tem o dever de responder pelas prestações específicas que lhe impõem as normas de organização e funcionamento do SUS, as quais serão observadas pelo órgão judicial em suas consequências de composição do polo passivo e eventual deslocamento de competência;

3ª) ainda que as normas de regência (Lei n. 8.080/1990 e Decreto n. 7.508/2011) imputem a determinado ente a responsabilidade principal (financiamento e aquisição), é lícito à parte incluir outro ente no polo passivo como responsável pela obrigação, Agravo de Instrumento nº 0016817-26.2020.8.16.0000 para ampliar sua garantia como decorrência da adoção da tese da solidariedade pelo dever geral de prestar saúde;

4ª) se o ente legalmente responsável pelo financiamento da obrigação principal não compuser o polo passivo da relação jurídico-processual, sua inclusão deverá ser levada a efeito pelo órgão judicial, ainda que isso signifique deslocamento de competência;

5ª) se a pretensão veicular pedido de tratamento, procedimento, materiais ou medicamentos não incluídos nas políticas públicas, a União comporá necessariamente o polo passivo, considerando que o Ministério da Saúde detém competência para a incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos, procedimentos, bem como constituição ou alteração de protocolo clínico ou diretriz terapêutica. De modo que recai sobre ela [União] o dever de indicar o motivo ou as razões da não padronização, e eventualmente iniciar o procedimento de análise de inclusão;

6ª) a dispensação judicial de medicamentos, materiais, procedimentos e tratamentos pressupõe a ausência ou ineficácia da prestação administrativa, e comprovada necessidade, observando, para tanto, os parâmetros definidos no art. 28 do Decreto Federal n. Agravo de Instrumento nº 0016817-26.2020.8.16.0000 7.508/2011.

Com se vê, o egrégio STF, não obstante reafirme a solidariedade existente entre os entes da Federação nas demandas por tratamento de saúde, exige do julgador que avalie, conforme as divisões e atribuições administrativas e de funcionamento do SUS, qual ente público seria o responsável pelo custeio da obrigação de saúde, para fins de integrar o polo passivo da ação.

A respeito, transcrevo julgado recente proferido pelo STF, ratificando a tese firmada no julgamento dos embargos de declaração no Recurso Extraordinário nº 855.178/SE (Tema 793/STF), in verbis:

AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO NÃO ADOTADO NO REGULAMENTO DO SUS. INCLUSÃO DA UNIÃO DO POLO PASSIVO. TEMA 793 DA REPERCUSSÃO GERAL. 1. O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, no julgamento do RE 855.178 (Rel. Min. LUIZ FUX, Tema 793), examinou a repercussão geral da questão constitucional debatida nestes autos e reafirmou a jurisprudência desta CORTE no sentido da responsabilidade solidária dos entes federados do dever de prestar assistência à saúde. 2. Posteriormente, ao rejeitar os embargos de declaração opostos em face deste acórdão, o SUPREMO fixou a seguinte tese: “Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro". 3. No caso concreto, ao determinar a inclusão da União no polo passivo da demanda, com a consequente remessa dos autos à Justiça Federal, o Tribunal de origem seguiu a tese de repercussão geral. 4. Agravo Interno a que se nega provimento. (RE 1299773 AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 08/03/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-050 DIVULG 15-03-2021 PUBLIC 16-03-2021). Grifado.

Oportuno transcrever, outrossim, a decisão idêntica proferida também pela Primeira Turma do STF, da relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, nos autos do ARE 1301670, no dia 13/04/2021, conforme, DJE nº 71, divulgado em...

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