Acórdão nº 50009863420178210058 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 25-05-2022

Data de Julgamento25 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50009863420178210058
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002191944
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000986-34.2017.8.21.0058/RS

TIPO DE AÇÃO: Seguro

RELATOR: Desembargador JORGE ANDRE PEREIRA GAILHARD

APELANTE: MINERACAO PRATENSE LTDA - EPP (AUTOR)

APELADO: MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Mineração Pratense Ltda. - EPP contra a sentença que, nos autos da Ação de Indenização por Perdas e Danos ajuizada contra Mapfre Seguros Gerais S.A., julgou improcedente a demanda, nos seguintes termos:

Sustenta a petição recursal a abusividade da cláusula que restringe o valor da indenização, eis que não prevista na apólice e não redigida em destaque. Assevera que não foram entregues à segurada as condições gerais do seguro, nas quais está prevista a aludida cláusula. Refere que o caso é de relação de consumo, devendo haver a declaração de nulidade das cláusulas abusivas, nos termos dos arts. 46, 54, § 3º e , do CDC. Alega que a ré não juntou nenhum orçamento que pudesse traduzir o valor de mercado do bem que justificasse o valor da indenização a menor do que aquele reclamado pela autora. Pugna pela condenação da requerida a indenizar os danos morais sofridos pela demandante diante da demora no pagamento da indenização securitária.

Requer o provimento do apelo (Evento 3, PROCJUDIC5, fls. 30/41).

Intimada, a apelada apresentou contrarrazões (Evento 3, PROCJUDIC5, fls. 46/50).

Subiram os autos a este Tribunal.

Distribuídos, vieram conclusos.

Cumpriram-se as formalidades previstas nos arts. 929 a 935, do CPC.

É o relatório.

VOTO

O apelo é tempestivo. O preparo está comprovado no Evento 3, PROCJUDIC5, fl. 43.

Cuida-se de demanda na qual a autora pretende a cobranca da complementação da indenização do seguro contratado para um escavadeira hidráulica, modelo 320DL, da marca Caterpillar, ano 2012, em decorrência de sinistro que acarretou na perda total do maquinário, ocorrido em 14.12.2015, bem como a cobrança de indenização pelos supostos danos morais sofridos com a demora no pagamento do seguro.

Pois bem. Maria Helena Diniz (in Tratado Teórico e Prático dos Contratos, Volume 4, 7ª edição, Editora Saraiva, São Paulo, 2013, p. 652) define contrato de seguro da seguinte forma:

O contrato de seguro é aquele pelo qual uma das partes (segurador) se obriga para com a outra (segurado), mediante o pagamento de um prêmio, a garantir-lhe interesse legítimo relativo a pessoa ou a coisa e a indenizá-la de prejuízo decorrente de riscos futuros previstos no contrato. O segurador é aquele que suporta o risco, assumido mediante o recebimento do prêmio, obrigando-se a pagar uma indenização, por isso deve ter capacidade financeira e estar em funcionamento autorizado pelo Poder Público. Assim, prêmio é a quantia pecuniária que o segurado paga à seguradora para obter o direito a uma indenização se ocorrer o sinistro oriundo do risco garantido e previsto no contrato; daí ser denominado, por alguns autores, ágio do seguro; o risco consistirá num acontecimento futuro e incerto, que poderá prejudicar os interesses do segurado, provocando-lhe uma diminuição patrimonial evitável pelo seguro, e a indenização é a importância paga pela seguradora ao segurado, compensando-lhe o prejuízo econômico decorrente do risco e assumido na apólice pela seguradora.

Nessa linha, de acordo com o art. 757, caput, do Código Civil, pelo contrato de seguro, o segurador se obriga a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. Desta forma, os riscos assumidos pelo segurador são exclusivamente os assinalados na apólice, dentro dos limites por ela fixados, não se admitindo a interpretação extensiva, nem analógica.

Sobre o tema, Arnaldo Rizzardo (in Contratos, 3ª edição, Editora Forense, Rio de Janeiro, 2004, p. 844) menciona que:

(...)

Acontece que a apólice é o título do contrato de seguro, devendo as relações estar disciplinadas no contrato.

Os riscos assumidos pelo segurador são exclusivamente os assinalados na apólice, dentro dos limites por ela fixados, não se admitindo a interpretação extensiva, nem analógica.

No caso em tela, são fatos incontroversos a contratação do seguro para a máquina agrícola de propriedade da autora, a ocorrência do sinistro e o pagamento na via administrativa do valor de R$ 290.000,00.

A autora postula o pagamento da complementação da indenização em R$ 50.000,00, uma vez que o gasto realizado para aquisição de uma nova escavadeira foi de R$ 340.000,00. Por sua vez, a seguradora defende que a cláusula contratual 18.1.1 que prevê o pagamento da indenização pelo valor de mercado do bem é válida, estando o pagamento realizado de acordo com o pactuado.

Nessa linha, de fato, a cláusula 18.1.1, das condições gerais da apólice, prevê expressamente que, no caso de pagamento da indenização integral, a indenização será determinada pelo valor de mercado do bem, nos seguintes termos:

CLÁUSULA 18.1.1. No caso de pagamento da indenização integrai, a indenização serpa determinada pelo valor de mercado do bem, apurado na região da propriedade segurada na data da liquidação do sinistro e limitado ao limite máximo de indenização especificado na Apólice/Certificado de Seguro.

Além do mais, ao contrário do que alega a autora, não há falar em abusividade da aludida cláusula contratual com base no Código de Defesa do Consumidor, eis que tal diploma é inaplicável ao caso concreto, já que a autora não é destinatária final dos serviços prestados pela seguradora, pois se utiliza do contrato de seguro para fomentar a sua atividade fim.

Ademais, a aplicação do CDC e a inversão do ônus da prova foi afastada expressamente na decisão do Evento 3, PROCJUDIC5, fls. 12/13, contra a qual a demandante não se insurgiu, conforme a certidão do Evento 3, PROCJUDIC5, fl. 19, estando, portanto, preclusa, a questão.

No entanto, ainda que a referida cláusula seja válida, tenho que não foi respeitada quando do pagamento da indenização, motivo pelo qual merece guarida o recurso, com relação ao ponto.

Ocorre que, ao contrário do que alega a seguradora, não foram juntados aos autos quaisquer comprovantes de que efetivamente o valor de mercado do bem na época da liquidação do sinistro era de R$ 290.000,00, não tendo a colagem realizada no corpo da petição de contestação no Evento 3, PROCJUDIC3, fl. 14 o condão de comprovar o alegado.

De outro lado, a demandante trouxe aos autos o contrato de compra e venda de uma máquina usada e a respectiva nota fiscal (Evento 3, PROCJUDIC2, fls. 17/26), documentos que por si só já são indicativos mais fidedignos do valor de marcado do bem à época.

Dessa forma, deve ser dado provimento ao apelo da autora, neste particular, determinando que seja complementada a indenização securitária em R$ 50.000,00, valor que deve ser acrescido de correção monetária pelo IGP-M, desde o pagamento parcial administrativo, e de juros moratórios de 1% ao mês, desde a citação, por se tratar de relação contratual.

Outrossim, relativamente aos danos morais à pessoa jurídica, Carlos Roberto Gonçalves assevera que (in Responsabilidade Civil, 16ª edição, Editora Saraiva, São Paulo, 2015, p. 507):

A pessoa jurídica, como proclama a Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça, pode sofrer dano moral e, portanto, está legitimada a pleitear a sua reparação. Malgrado não tenha direito à reparação do dano moral subjetivo, por não possuir capacidade afetiva, poderá sofrer dano moral objetivo, por ter atributos sujeitos à valoração extrapatrimonial da sociedade, como o conceito e bom nome, o crédito, a probidade comercial, a boa reputação etc.

O abalo de crédito acarreta, em regra, prejuízo material. Mas o abalo de credibilidade pode ocasionar dano de natureza moral. Nesse caso, a pessoa jurídica poderá propor ação de indenização de dano material e moral.

Desta forma, aqueles danos que podem ser causados exclusivamente à honra subjetiva não são experimentados pela pessoa jurídica, tais como, angústia, dor, sofrimento, abalo psíquico, autoestima, etc.

Assim sendo, indeniza-se o dano moral em função do atentado à honra objetiva da pessoa jurídica, a qual pode ser atingida em seu nome, reputação ou imagem, ou seja, pode sofrer abalo em relação ao conceito público que projeta na sociedade.

Nesse sentido, já foi reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça a possibilidade de a pessoa jurídica ser passível de abalo moral, consoante Súmula 227, in verbis:

Súmula 227. A pessoa jurídica pode sofrer dano moral.

Sobre a matéria, a jurisprudência daquela egrégia Corte:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DEVER DE INDENIZAR. REEXAME DE MATÉRIA DE FATO. NÃO OCORRÊNCIA. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL.

1. A inscrição indevida em cadastro de inadimplentes de pessoa jurídica gera dano moral indenizável. Não incidência da Súmula 7/STJ.

2. Segundo o entendimento majoritário da Segunda Seção, sufragado no REsp 1.132.866/SP (julgado em 23.11.2011), no caso de indenização por dano moral puro decorrente de ato ilícito os juros moratórios legais fluem a partir do evento danoso (Súmula 54 do STJ).

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 1467444 / SP, Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 16/09/2014, DJe 13/10/2014) (Grifei).

Mas, como recomenda a prudência, a questão deve ser examinada caso a caso.

Assim, na hipótese dos autos, não é devida a reparação postulada, pois a situação narrada não foi capaz de atingir a reputação da empresa e o seu conceito perante terceiros.

No caso, não se trata de dano in re ipsa, razão pela qual era ônus da demandante demonstrar os prejuízos gerados pelo descumprimento contratual, na forma do art. 333, I, do...

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