Acórdão nº 50009868720168216001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 24-11-2022

Data de Julgamento24 Novembro 2022
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50009868720168216001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002977776
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000986-87.2016.8.21.6001/RS

TIPO DE AÇÃO: Promessa de Compra e Venda

RELATOR: Desembargador HELENO TREGNAGO SARAIVA

APELANTE: FRANCISCO VACCA (AUTOR)

APELANTE: ALPHAVILLE PORTO ALEGRE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA (RÉU)

APELADO: VILLA NOVA DESENVOLVIMENTO URBANO LTDA. (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

ALPHAVILLE PORTO ALEGRE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA e OUTRA e FRANCISCO VACCA interpõem recursos de apelação em face da sentença proferida na ação movida pelo segundo contra as primeiras, nos seguintes termos:

Isso posto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado na ação indenizatória ajuizada por FRANCISCO VACCA em face de VILLA NOVA DESENVOLVIMENTO URBANO LTDA e ALPHAVILLE PORTO ALEGRE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA. a fim de reconhecer a possibilidade de inversão da cláusula penal em favor do consumidor adquirente, condenando as rés, de forma solidária, ao pagamento de 0,5% do valor do contrato, atualizado pelo IGP-M, por mês de atraso na entrega do bem, e ao pagamento de indenização por danos morais arbitrados em valor equivalente a 5% (cinco por cento) do valor do imóvel, a ser corrigido pelo IGP-M, desde a data da presente decisão, e com a incidência de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação (ilícito contratual).

Diante da sucumbência, que considero mínima da parte autora, condeno a parte ré, solidariamente, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 15% sobre o valor da condenação, observados os critérios do art. 85, § 2º, do CPC.

A parte ré apelante sustenta a inexistência de mora a ela imputável, não havendo como vincular ao empreendedor o atraso na entrega da obra em razão do caso fortuito. Diz que, no que tange à aplicação da multa, há necessidade de se avaliar, no caso específico, a proporcionalidade e a razoabilidade. Ressalta que, se o atraso decorrente da morosidade de Poder Público não é suficiente para afastar a responsabilidade das apelantes, deve ao menos ser considerada para fins de mensuração da penalidade. Aponta o art. 413 do CC, aduzindo que o juiz pode mitigar a pena de multa com base no valor efetivamente pago. Sustenta o não cabimento de condenação ao pagamento de indenização por danos morais, pois não houve falha no dever de informação e o dano moral não é presumido, prescinde de efetiva comprovação, o que não ocorreu. Postula a minoração do valor arbitrado a título de indenização pelos danos morais. Requer o provimento do recurso.

O autor argui a nulidade da sentença por "citra petita", uma vez que há pedido expresso em relação à indenização pela desvalorização e/ou pela inocorrência de adequada valorização do imóvel, não examinado pela sentença. No mérito, aduz que, deferido o pedido de aplicação da multa contratual pelo atraso na entrega da obra (item 5.1, alínea "c"), a sentença deixou de reconhecer o direito à incidência dos juros de mora previstos na alínea "b" do item 5.1 do contrato. Salienta a viabilidade de acolhimento em face da impossibilidade de fruição do imóvel. Ressalta que, mesmo diante da impossibilidade de cumulação de incidência de multa e lucros cessantes, possível reconhecer a incidência dos juros de mora, deixando ao consumidor a opção de escolher qual delas exigir das apeladas na fase de cumprimento da sentença. Salienta que ambas as penalidades estão previstas no contrato, mas com campo de incidência exclusivamente em favor das apeladas e que a cláusula penal moratória fixada pela sentença não foi estabelecida em equivalência ao locativo. Destaca a possibilidade de aplicação inversa também da penalidade prevista no item 5.1.4, alínea "c". Defende que o termo inicial dos juros de mora em relação à indenização pelos danos morais é a data do evento danoso, incidindo o art. 394 do CC e a Súmula nº 54 do STJ. Requer o provimento da apelação.

Foram apresentadas contrarrazões.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

A parte autora ajuizou a presente ação postulando: a aplicação inversa das penalidades previstas no item 5.1, alíneas "a" a "c" do contrato, condenando às demandadas ao pagamento de juros de mora, desde a data em que deveria ter sido concluído até a efetiva entrega, e de multa moratória, ambos incidentes sobre o valor do contrato; a aplicação inversa da penalidade prevista no item 5.6.4, alínea "e", do contrato, condenando as demandadas, a título de lucros cessantes, ao pagamento de multa diária pela impossibilidade de disposição do imóvel, em percentual a ser arbitrado; a condenação das demandadas, a título de danos emergentes, ao pagamento de indenização pela desvalorização e/ou pela inocorrência de valorização do imóvel a ser apurada mediante prova a ser produzida durante a instrução; e indenização a título de danos morais.

Na inicial, afirma que, em 24/10/2009, foram realizados o lançamento do Condomínio “Alphaville Porto Alegre Sul”, com previsão de conclusão das obras e entrega do empreendimento em 24 meses, a partir daquela data; que firmou, naquela data, contrato de aquisição do Lote 065; que as rés se comprometeram a concluir a obra em 24 meses, com possibilidade de prorrogação pelo prazo máximo de 180 dias; que cumpriu o pagamento das prestações a seu encargo; que houve inadimplemento quanto ao prazo de entrega, o que ocorreu somente em outubro de 2014, e conduta negligente e omissiva no que diz respeito com o adequado dever de informação perante o adquirente sobre a situação ambiental do empreendimento; que houve prejuízo material e moral.

Acostou a certidão do registro do imóvel matriculado sob o nº 143.812, relativa à unidade autônoma residencial 65 (fls. 20/25); o contrato firmado entre as partes (fls. 26/40); o memorial de incorporação, convenção de condomínio, memorial descritivo, manual de restrições de construção, manual de preservação ambiental, planta de implantação e da unidade autônoma, manual do proprietário, todos relativos ao empreendimento (fls. 41/149); o estatuto social da associação de moradores e regimento interno da área de lazer (fls. 150/170); os materiais de divulgação do empreendimento (fls. 175/270 e 274/275); o informativo a respeito da conclusão da obra (fls. 271/273); o Compromisso de Ajustamento de Conduta firmado nos autos do Inquérito Civil nº 00833.00096/2010 em 25/04/2013 (fls. 276/282); o ofício da SMAM para a Alphaville Urbanismo (fls. 283/285); e documentos relativos ao processo 001/1120250688-8 (fls. 307/363).

Em contestação (fls. 399/424), a ré Villa Nova Desenvolvimento Urbano Ltda. impugna o valor da causa e argui prescrição; no mérito, aponta eventos extraordinários que ocasionaram o atraso na entrega definitiva dos lotes; que inexiste risco ambiental em relação ao lote adquirido; que não é possível a inversão de cláusulas penais; que há ausência de dano material e moral.

Em sua defesa (fls. 618/), a ré Alphaville Porto Alegre Empreendimentos Imobiliários Ltda. argui litisconsórcio ativo necessário e prescrição da pretensão indenizatória; alega nenhuma informação foi sonegada; que todas as etapas obrigatórias do licenciamento ambiental foram cumpridas; que não houve descumprimento de quaisquer das etapas; que desenvolveu todas as atividades exigidas para a reabilitação da área para uso do Condomínio; que a cláusula que permite a prorrogação da entrega do lote é válida; que caso fortuito prejudicou a entrega do lote ao autor, não havendo responsabilidade da é pelo atraso; que não é possível a condenação ao pagamento de multa contratual; que há inexistência de danos materiais por perdas e danos e por danos morais; que não é possível a cumulação de multa contratual e indenização.

A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais da ação e ambas as partes apelaram.

Passo à análise conjunta dos recursos.

Em sede de preliminar, a parte autora apelante argui a nulidade da sentença por "citra petita" por deixar de analisar o pedido de indenização pela desvalorização e/ou pela inocorrência de adequada valorização do imóvel.

Consabido que é vedado ao julgador proferir sentença além (ultra petita), fora (extra petita) ou aquém (citra petita) do que foi pedido. E, de acordo com o art. 141 do CPC, o juiz decidirá o mérito nos limites propostos pelas partes, sendo-lhe vedado conhecer de questões não suscitadas a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte.

Sobre o tema, leciona Nelson Nery Junior (Código de Processo Civil Comentado. 19ª ed. rev. atual. ampl. - São Paulo : Thomson Reuters Brasil 2020 - p. 562):

Fixação da lide. É o autor quem, na petição inicial, fixa os limites da lide. É ele quem deduz pretensão em juízo. O réu, ao contestar, apenas se defende do pedido do autor, não deduzindo pretensão alguma. Quando reconvém, o réu se torna autor da reconvenção., fixando os limites da lide reconvencional na petição inicial desta ação.

No caso, o pedido inicial foi assim formulado pela parte autora (fl. 17):

E, na sentença, o julgador "a quo", sobre os danos emergentes, entendeu pela impossibilidade de cumulação da multa com os danos emergentes.

Portanto, não há como reconhecer a nulidade apontada em razão de sentença "citra petita".

Assim, rejeito a preliminar.

Cabe referir que a relação existente entre as partes é de consumo, portanto, aplicável o Código de Defesa do Consumidor.

Conforme a exegese do art. 14 da Lei 8.078/90, o fornecedor/prestador de serviços responde pelos danos causados ao consumidor, independente de culpa, pois se está diante da hipótese de responsabilidade objetiva. E, para se eximir de tal responsabilidade compete-lhe demonstrar a existência de uma das excludentes do art. 14, § 3º, I e...

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