Acórdão nº 50009946920218210155 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Criminal, 03-08-2022

Data de Julgamento03 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50009946920218210155
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002445716
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000994-69.2021.8.21.0155/RS

TIPO DE AÇÃO: Extorsão (art. 158)

RELATORA: Desembargadora BERNADETE COUTINHO FRIEDRICH

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação interpostos por JEFERSON PEREIRA DA SILVA e por LUÍS HENRIQUE DA SILVA SOARES contra sentença proferida no processo-crime tombado sob o n. 5000994-69.2021.8.21.0155/RS, contra eles aforado perante a 2ª Vara Judicial da Comarca de Portão/RS, dizendo-os incursos nas sanções do art. 158, §1º, do Código Penal, pela prática do seguinte fato delituoso:

"Desde o dia 29/01/2021 até, pelo menos, 03/03/2021, por volta das 15:00h, na Rua Dom Pedrito, 75, Imigrantes, Capela de Santana/RS, os denunciados Jeferson Pereira da Silva e Luis Henrique da Silva Soares, em comunhão de vontades e conjunção de esforços, constrangeram, mediante grave ameaça, com o intuito de obter vantagem econômica, Vera Vargas Dandolini, Tiago Vargas Dandolini e Jaime Dandolini, a fazerem depósitos bancários, além de entregas pessoais de dinheiro. Inicialmente, Jéferson, amigo de infância da vítima Tiago, aceitou deste o veículo Celta, preto, placas IKO-9909, como pagamento de uma dívida de R$3.500,00; oriunda do consumo de entorpecentes.

Após a entrega do veículo, Jéferson ajustou com o corréu Luís Henrique, que se encontrava recolhido, um golpe para extrair dinheiro das vítimas, alegando que o carro teria sido entregue a traficantes, e que, por pendências em sua documentação, foi apreendido pela polícia, com armas, drogas e dinheiro, sendo que os policiais teriam sido subornados, devolvendo o veículo, mas não os itens em seu interior, causando grande prejuízo à facção.

Enquanto Jéferson foi o mentor do crime, e deu início a este, Luís Henrique aderiu ao plano, realizando chamadas de vídeo, de dentro da penitenciária para a família, se apresentando como chefe da suposta facção e fazendo cobranças agressivas, exigindo altas quantias, a fim de cobrir o falso prejuízo. Além das chamadas, teria enviado vídeos das casas dos familiares, de seus locais de trabalho e fotos de armas, mídias produzidas ou coletadas na internet por Jéferson, causando sério temor, que levou, então, ao registro da ocorrência pela família, quando já haviam alcançado o total de R$ 34.000,00 aos criminosos e continuavam sendo extorquidos.

Após terem recebido o total de R$34.000,00 e ainda aguardando mais R$10.000,00; os criminosos pretendiam continuar com as falsas histórias e prosseguir com a extorsão. As ameaças eram incisivas, dizendo que iriam cortar o nariz de Tiago para que não mais pudesse “cheirar” [cocaína], degolar Tiago, matar toda a família, da qual não sobraria ninguém vivo, visto que matariam até os cachorros da família, o que causou pavor à família e fez com que continuassem entregando os valores exigidos, além de esconder Tiago na casa do avô, em outra cidade. Salienta-se que Luís Henrique já se encontrava recolhido por outros fatos durante a execução do crime que, no tocante à sua parte, foi executado de dentro da penitenciária. Jeferson, por sua vez, já respondia, quando dos fatos, a processo por porte de arma e teve prisão preventiva decretada cautelarmente no presente feito".

Foi decretada a prisão preventiva do réu JEFERSON nos autos do expediente autuado sob p nº 5000813-68.2021.8.21.0155, acolhendo representação deduzida pela autoridade policial.

Recebida a denúncia em 30/03/2021, os acusados foram citados, apresentaram resposta à acusação, sendo que apenas JEFERSON trouxe rol de testemunhas (Ev. 03, 11, 12, 24, 48 do processo originário).

Feriu-se a instrução de forma regular. Foram ouvidas as vítimas, a testemunha arrolada pela defesa e interrogados os acusados (Ev. 69).

Encerrada a instrução. Atualizados os antecedentes dos acusados (Ev. 70).

O debate oral foi substituído por memoriais.

O Ministério Público postulou a condenação do acusado nos exatos termos da denúncia e, as defesas, a absolvição de seus defendidos (Ev. 88, 96, 101).

Sobreveio sentença, publicada em 12/01/2022, julgando procedente a denúncia, para condenar os acusados nas sanções do art. 158, §1º, do CP, à pena de cinco (05) anos e quatro (04) meses de reclusão, em regime semiaberto e a quinze (15) dias multa, valendo cada unidade 1/30 do salário mínimo, indeferindo os benefícios do art. 44 e do art. 77 do CP porquanto não atendidos os requisitos legais, bem como, ao réu JEFERSON, o direito de recorrer em liberdade, afirmando inalterados os motivos que determinaram sua segregação cautelar (Ev. 120).

O Ministério Público, as Defesas e os acusados foram intimados da sentença (Ev. 121, 122, 123, 136, 137).

As Defesas interpuseram recursos de apelação (Ev. 135).

Em suas razões recursais, a defesa de LUIS HENRIQUE insurgiu-se contra a sentença, postulando a absolvição do acusado afirmando insuficiência probatória para sustentar uma condenação. E, do contrário, a desclassificação do crime de extorsão para ameaça e a redução da pena de multa (Ev. 150).

Em suas razões recursais, a defesa do réu JEFERSON postula a desclassificação do crime de extorsão para o de exercício ilegal das próprias razões, a redução da pena pelo reconhecimento da inexigibilidade de conduta diversa, reconhecido seu direito de recorrer em liberdade (Ev. 08 da apelação).

O recurso foi recebido e respondido (Ev. 159 do processo originário).

Nesta instância, o Ministério Público lançou parecer, opinando pelo improvimento dos recursos de apelação (Ev. 14 da apelação).

Em meio a tramitação do processo, foram impetrados habeas corpi, tombados sob os números 52519252420218217000 e 52540497720218217000, pretendendo a soltura do acusado JEFERSON. O primeiro com ordem denegada e, o segundo, julgado extinto monocraticamente por conta de litispendência.

Este Órgão Fracionário adotou o procedimento informatizado, observando o disposto no art. 613, I, do CPP.

É o relatório.

VOTO

Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço dos apelos.

Trata-se de ação penal onde o Ministério Público imputa aos réus a prática do crime de extorsão majorada, porque praticada em concurso de agentes.

A sentença acolheu a denúncia, julgando praocedente a ação penal, conenando os acusados ao cumprimento de pena de reclusão e multa.

Contra essa decisão, insurgem-se as Defesas, postulando a absolvição, a desclassificação paara o crime de ameaça,exercício ilegal das próprias razões e a redução da pena aplicada.

Examino conjuntamente os apelos.

A análise dos documentos encartados ao caderno policial, notadamente capturas de telas de conversas, áudios, vídeos, análises de dados de aparelho celular, devidamente autorizada judicialmente, reconhecimentos operados e comprovantes de depósitos bancários, somados à prova oral colhida com observância do princípio do contraditório judicial, revela a existência de prova bastante à manutenção do veredicto condenatório, porquanto comprovada a materialidade delitiva e que sua autoria recai induvidosa sobre os réus, contrariando por completo as argumentações deduzidas nas razões recursais.

Demonstro.

A testemunha Robson, policial civil, contou que a vítima Vera, mãe da vítima Tiago, procurou a Delegacia de Polícia para registrar ocorrência, noticiando que estavam sendo extorquidos por traficantes. Contou que já tinham feito o pagamento de R$ 34.000,00 (trinta e quatro mil reais), por conta de uma dívida de cerca de R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais) que seu filho tinha contraído com o réu JEFERSON, e que já tinha feito alguns pagamentos, até mesmo entregue seu carro, de valor superior à dívida, para quitação, mas, em razão a problemas na documentação, o carro teria sido parado em uma blitz e gerado, em tese, prejuízo à facção criminosa. Desde, então, passaram a ser ameaçados e compelidos a pagar os valores solicitados por alguém que estava dentro do presídio.

As investigações, especialmente a análise do celular de JEFERSON, relevaram que a pessoa responsável por contatar os familiares de Tiago e ameaçá-los era o corréu LUIS HENRIQUE, mas que era JEFERSON quem fornecia fotografias e vídeos das residências e trabalhos dos familiares do devedor, para reforçar o temor quanto à possibilidade de efetivarem as ameaças contra as vítimas e seus familiares para dar maior credibilidade ao enredo.

O montante pago foi feito através de depósitos em favor de Vitor Bizarro e de Fabiana Nicoloti, tia da esposa/namorada de JEFERSON, além do pagamento em espécie de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) também a Vitor.

Verificaram, também nas conversas entre os réus, que LUIS HENRIQUE enviou contas bancárias para depósitos de outros valores, que, em princípio, não tinham relação com os depósitos da extorsão, sendo essas contas bancárias de sua namorada e da sua própria mãe. As conversas dos aplicativos, assim como as fotografias da galeria, comprovaram a propriedade do celular, possibilitando a identificação de LUIS HENRIQUE, até mesmo captura de tela de videochamada entre eles, sendo ele reconhecido pela vítima Vera.

A vítima Vera disse que seu filho estava devendo um valor em torno de de R$3.000,00 (tres mil reais) para JEFERSON, dívida contraída por aquisição de drogas. Disse que Tiago chegou a entregar o carro para o pagamento da dívida, que valia mais que o valor devido, mas começaram a inventar problemas sobre o carro e a exigir dinheiro. Descreveu que as ameaças consistiam em “matar, picar” o filho e a família, chegando a enviar vídeos e fotografias de sua casa, intimidando-os de que monitoravam e sabiam sobre a rotina da família. Revelou que foram feitos depósitos, cerca de R$3.000,00 e R$4.000,00 em...

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