Acórdão nº 50010033920128210028 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 16-02-2023

Data de Julgamento16 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50010033920128210028
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003166676
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001003-39.2012.8.21.0028/RS

TIPO DE AÇÃO: Usucapião Ordinária

RELATOR: Desembargador HELENO TREGNAGO SARAIVA

APELANTE: GESSI COSTA DOS SANTOS (RÉU)

APELANTE: MARINO FERREIRA DOS SANTOS (RÉU)

APELANTE: ODIVA COSTA DOS SANTOS (RÉU)

APELANTE: SANDRA GESOELA DOS SANTOS (RÉU)

APELANTE: SILVIO PERES DOS SANTOS (RÉU)

APELANTE: DARCI COSTA DOS SANTOS (RÉU)

APELANTE: ESPÓLIO DE URBANO LAMARQUES DOS SANTOS (RÉU)

APELANTE: IVO COSTA DOS SANTOS (RÉU)

APELANTE: MARLI SANTOS GRENZEL (RÉU)

APELANTE: OLIVERIO COSTA DOS SANTOS (RÉU)

APELANTE: OLIVIA FERREIRA DOS SANTOS (RÉU)

APELANTE: PLINIO FERREIRA DOS SANTOS (RÉU)

APELANTE: SERGIO PERES DOS SANTOS (RÉU)

APELADO: LOURENCO COSTA DOS SANTOS (AUTOR)

APELADO: VALACIR DOS SANTOS (AUTOR)

RELATÓRIO

GESSI COSTA DOS SANTOS E OUTROS interpuseram recurso de apelação, nos autos da ação de usucapião em que demandam com VALACIR DOS SANTOS E OUTRO, em face da sentença de procedência do pedido, constando em seu dispositivo:

Dispositivo

Pelo exposto, julgo PROCEDENTE a demanda para declarar que Valacir dos Santos e Lourenço Costa dos Santos são os legítimos proprietários do imóvel objeto desta demanda.

Condeno a parte requerida ao pagamento das custas, das despesas e dos honorários advocatícios do patrono da parte autora. Fixo estes em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, forte no art. 85, § 2º, incisos I a IV, do CPC.

Com o Trânsito em julgado:

a) expeça-se mandado ao Oficial do Serviço Registral de Santa Rosa/RS para que proceda à devida transcrição da sentença, observando-se o que dispõe o artigo 226 da Lei nº 6.015/73, satisfeitas previamente eventuais obrigações fiscais;

b) após, arquivem-se os autos com baixa na distribuição.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Alegam os apelantes, em suas razões recursais, que a sentença deve ser modificada quanto à revogação do benefício da gratuidade da justiça aos réus, bem como quanto ao reconhecimento da prescrição aquisitiva da posse em relação ao imóvel, objeto da lide. Aduzem que basta apenas a declaração da hipossuficiência para o deferimento do benefício da AJG, e, entendendo não ser suficiente, deve o magistrado solicitar às partes os documentos que considera essenciais à análise do pedido, conforme dispõe o § 2º, do artigo 99 do CPC. No mais, defendem que não é possível computar o tempo em que o presente processo transcorre, pois foi ajuizada ação de inventário, a qual ficou suspensa por força desta ação. Sustentam que inexiste o requisito temporal para o reconhecimento da prescrição aquisitiva da posse. Ainda, aduzem que inexiste a posse mansa e pacífica, pois, havia um acordo verbal de partilha, sendo que Lourenço ludibriou a todos referindo que cuidaria da área até todos possuírem condições financeiras de partilhar o bem. Por fim,, afirmam que deve ser modificada a sentença na parte que afastou o pedido de condenação de Lourenço por litigância de má-fé.

Em contrarrazões, a aprte apelada aduziu que o benefício da AJG não foi concedido aos apelantes, motivo pelo qual deve ser rejeitado o presente recurso, pois proposto sem o recolhimento das custas. No mais, requerem o desprovimento da apelação.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

De início, não é o caso de deixar de conhecer do presente recurso, uma vez que o benefício da AJG foi indeferido quando do julgamento dos embargos de declaração, os quais foram acolhidos para reconhecer a existência de omissão na sentença, sendo parte integrante daquele decisum (Processo Judicial 12).

Assim, uma vez que indeferido o beneficio da AJG em sentença e sendo tal decisão objeto do recurso de apelação, não há falar em deserção.

Atendidos os pressupostos de admissibilidade, recebo o presente recurso.

Pelo que se depreende dos autos, os autores ajuizaram a presente ação de usucapião em face do Espólio de Urbano Lamarques dos Santos. Aduzem que possuem a posse, uso e ocupação de forma mansa, pacífica e sem interrupção da área de 31.625,00 m², há mais de 15 anos, do imóvel matriculado no Registro de Imóveis n. 17.564. Sustentam que o imóvel está registrado em nome de Urbano Lamarques dos Santos, falecido, e que não deixou ascendentes, nem descendentes, apenas três irmãos. Apontam que sempre ocuparam a terra objeto de usucapião e requerem a procedência do pedido.

A sentença julgou procedente o pedido, razão da presente inconformidade.

Para a declaração de propriedade, como se sabe, é indispensável para a procedência do pedido a prova da posse exclusiva com “animus domini”, de forma mansa e pacífica, pelo lapso temporal previsto em lei.

Segundo a lição de Francisco Eduardo Loureiro, na obra Código Civil comentado1, são requisitos da posse :

Dois elementos estão sempre presentes, em qualquer modalidade de usucapião, o tempo e a posse. Não basta a posse normal (ad interdicta), exigindo-se posse ad usucapionem, na qual além da visibilidade do domínio, deve ter o usucapiente uma posse com qualidades especiais, previstas no art. 1.238 do Código Civil: prazo de quinze anos, sem interrupção (posse contínua), nem oposição (posse pacífica), e ter como seu o imóvel (animus domini).”

O mesmo doutrinador esclarece acerca do animus domini 2:

Deve o usucapiente possuir animus domini, ou, na dicção da lei, “como seu” o imóvel. Controverte a doutrina sobre o exato sentido do animus domini, consistente na vontade de tornar-se dono, de ter a coisa como sua, de ter a coisa para si – animus rem sibi habendi. Existem autores que entendem que o elemento animus domini da usucapião estaria ligado à teoria subjetiva de Savigny. Predomina a corrente, porém, que entende o animus estar essencialmente ligado à causa possessionis, à razão pela qual se possui, não constituindo elemento meramente subjetivo. Possui a coisa como sua quem não reconhece a supremacia do direito alheio. Ainda que saiba que a coisa pertence a terceiro, o usucapiente se arroga soberano e repele a concorrência ou a superioridade do direito de outrem sobre a coisa.

Acerca da matéria dispõe o Código Civil:

Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.

Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.

Com efeito, ao que tudo indica, a permanência dos autores no imóvel se deu em razão da relação de parentesco, isto é, por tolerância dos familiares. É que, para afastar tal conclusão, a prova deve ser robusta, o que não ocorreu no caso em tela.

E, como é cediço, nos termos do art. 1.208 do Código Civil os atos de mera permissão ou tolerância não induzem posse.

É nesse sentido o parecer da ilustre Procuradora de Justiça, o que aqui reproduzo e integro como razões de decidir:

Com efeito, os demandantes ajuizaram a presente demanda pretendendo obter a declaração de domínio sobre parte uma área rural de 31.625,00 m², situada no Município de Santa Rosa, matriculado no Registro de Imóveis do referido Município sob o nº 17.564. Aduzem, na inicial, que exercem posse, forma mansa e pacífica, sem interrupção, há mais de 15 anos, sobre o bem em questão.

A usucapião, como se sabe, é forma originária de aquisição da propriedade, sendo dotada de caráter erga omnes a sentença que determina o acolhimento da pretensão. Nesse contexto, a procedência da demanda não prescinde da produção de prova robusta, vale dizer, aquela que não enseja dúvidas acerca da satisfação de todos os requisitos previstos na legislação.

Entre os requisitos para o reconhecimento da prescrição aquisitiva é de notável relevância o elemento anímico do possuidor, que deve ter a coisa como sua, com animus domini.

No caso dos autos, data venia do entendimento do Julgador a quo, a parte autora não preenche os requisitos necessários para a aquisição do imóvel pela prescrição aquisitiva. Ou seja, não se desincumbiu de demonstrar, de forma segura, o exercício de posse com animus domini sobre a área usucapienda, não logrando comprovar os fatos constitutivos do direito alegado.

Analisando a prova oral produzida durante a instrução da presente ação de usucapião, observa-se que as testemunhas, de maneira geral, confirmam que a parte autora reside no imóvel sub judice há longa data.

No entanto, o acervo probatório revela que a posse dos autores decorre de permissão ou tolerância, no âmbito de relação familiar. Veja-se que o demandante Lourenço é sobrinho de Urbano Lamarques, que era o proprietário registral do imóvel sub judice.

De fato, é preciso ter presente que a existência de relação familiar entre os possuidores e o titular do domínio (no caso, Maria Luiza, herdeira do proprietário e tia do demandante Lourenço) contraindica, em princípio, a existência do elemento anímico qualificado, dependendo da produção de prova robusta para ensejar conclusão em sentido contrário, o que, como visto, não ocorreu na espécie.

Assim, do contexto probatório trazido aos autos, inferese, salvo entendimento diverso, que a posse dos demandantes é precária, decorrente de mera permissão e tolerância por parte dos seus tios. E, nos termos do disposto no artigo 1.208 do Código...

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