Acórdão nº 50010040320218210030 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarto Grupo de Câmaras Criminais, 13-06-2023

Data de Julgamento13 Junho 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualEmbargos Infringentes e de Nulidade
Número do processo50010040320218210030
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuarto Grupo de Câmaras Criminais

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003790373
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4º Grupo Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 5001004-03.2021.8.21.0030/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5001004-03.2021.8.21.0030/RS

TIPO DE AÇÃO: Roubo (art. 157)

RELATOR: Desembargador LUIZ MELLO GUIMARAES

EMBARGANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

EMBARGADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de embargos infringentes opostos, através da Defensoria Pública, por MAICON MOREIRA GOMES, inconformado com a decisão que deu parcial provimento ao seu apelo.

Pede que prevaleça o voto vencido por ocasião de referido julgamento, proferido pelo e. Des. Leandro Figueira Martins, que dava parcial provimento ao recurso em maior extensão, reconhecendo em seu favor a atenuante da confissão espontânea. Tece argumentação a respeito, citando entendimento do STJ. Requer a reforma do Acórdão embargado, "a fim de que esteja em conformidade com as razões do Desembargador Leandro Figueira Martins, cujo voto foi vencido, sendo reconhecida a atenuante de confissão espontânea, com a redução da reprimenda fixada ao ora embargante, inclusive com a compensação dela com a agravante da reincidência."

A douta Procuradoria de Justiça, em parecer, opina pelo desprovimento dos embargos.

É o relatório.

VOTO

Entendo que a confissão espontânea, quando parcial ou qualificada, enseja a incidência da atenuante correspondente na aplicação da pena, se a respectiva versão do acusado não se mostrar irrelevante no contexto fático-processual, efetivamente colaborando para sua condenação.

E a jurisprudência das Cortes superiores não diverge desse entendimento. No STJ, há súmula no mesmo sentido,1 além de recorrentes precedentes, ao passo que no STF, ainda que refutada a atenuanção em diversos casos de confissão parcial, qualificada ou retratada, é expressamente ressalvada a hipótese de a versão de autodefesa contribuir para o convencimento do julgador.

A título exemplificativo, cito os seguintes precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS COUS. PENAL E PROCESSO PENAL. FEMINICÍDIO. PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. OFENSA NÃO CONFIGURADA. TRIBUNAL DO JÚRI. VÍCIO NA QUESITAÇÃO. MATÉRIA PRECLUSA. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO. PRINCÍPIO PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF. DEFESA TÉCNICA DEFICIENTE. INOCORRÊNCIA. PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ E DA LEALDADE PROCESSUAIS. DEVER DE OBSERVÂNCIA. USO DE ALGEMAS. SÚMULA VINCULANTE Nº 11/STF. ACATAMENTO. CIRCUNSTÂNCIA QUALIFICADORA DO FEMINICÍDIO. TIPIFICAÇÃO ADEQUADA. CRIME PRATICADO EM CONTEXTO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR (CP, ART. 121, § 2º, VI, C/C O § 2º-A, I). REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. MATÉRIA PRÉ-EXCLUÍDA DO DOMÍNIO COGNITIVO DO WRIT. DOSIMETRIA DA PENA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. MAJORANTE DO ART. 121, § 7º, III, DO CP. INCIDÊNCIA. CRIME PRATICADO NA PRESENÇA DOS FILHOS DA VÍTIMA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO IDENTIFICADO.

[...] 10. A jurisprudência desta Suprema Corte “adverte que, tratando-se de confissão parcial, qualificada ou retratada em juízo, não se mostra aplicável a atenuante prevista no art. 65, III, ‘d’, do Código Penal, salvo quando essa circunstância for efetivamente utilizada como fundamento para a condenação penal, considerada a finalidade do instituto, dentre outras, de facilitar a persecução penal (RHC 186.084/RS, Rel. Min. Celso de Mello, DJe de 09.9.2020). [...] (Grifei) (STF, RHC 189088AgR, Primeira Turma, Rel. Ministra ROSA WEBER, julgado em 03/08/2021)

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ROUBO. CONFISSÃO PARCIAL.
SÚMULA N. 545/STJ. ATENUANTE CONFIGURADA.
1. Consoante a Súmula n. 545/STJ, a atenuante da confissão espontânea deve ser reconhecida, ainda que tenha sido parcial ou qualificada, seja ela judicial ou extrajudicial, e mesmo que o réu venha dela se retratar, quando a manifestação for utilizada para motivar a sua condenação.
2. Nos termos da jurisprudência desta Corte "embora a simples subtração configure crime diverso - furto -, também constitui uma das elementares do delito de roubo - crime complexo, consubstanciado na prática de furto, associado à prática de constrangimento, ameaça ou violência, daí a configuração de hipótese de confissão parcial" (HC n. 396.503/SP, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 24/10/2017, DJe 6/11/2017).
3. Agravo regimental improvido. (Grifei) (STJ, AgRg no REsp 2001651/MG, Sexta Turma, Rel. Ministro JESUÍNO RISSATO, DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT, julgado em 15/05/2023)

No caso em tela, o réu confessou que tentou subtrair o patrimônio da ofendida, mas negou ter anunciado um assalto ou empregado a violência que lhe foi imputada na denúncia. Logo, admitiu a prática de um furto tentado, e não da tentativa de roubo que lhe atribuiu o parquet, caracterizando-se uma confissão parcial - motivo da negativa de incidência da atenuante prevista no art. 65, III, d, do CP, pela maioria do Acórdão embargado.

Ocorre que, para começar, a relevância probatória dessa confissão parcial do réu (tanto sobre a existência como sobre a autoria criminosa) não pode ser sumariamente descartada nos presentes autos, considerando que a tentativa de subtração imputada não deixou vestígio material e ele não foi preso em flagrante, tampouco encontrado em situação que o incriminasse naquelas questões que optou por admitir.

De resto, mais de uma vez a sentença condenatória referiu a mencionada confissão, e em ao menos três ocasiões utilizou-a, claramente, como parte dos respectivos fundamentos. Veja-se (com grifos meus):

[...] Em seu interrogatório, o réu MAICON MOREIRA GOMES confirmou a prática delitiva. Disse que na época estava "perdido na droga"(sic) e cometia furtos e roubos. Declarou que estava sem noção. Não chegou a tocar na vítima e nem falou nada, asseverando que apenas tentou tomar-lhe o celular. Após não conseguir subtrair o aparelho, fugiu do local. Acredita que ninguém tenha visto o fato. Confirmou ser tarde da noite. Usa drogas desde os 13 anos de idade e tem registros na FASE desde tenra idade.

[...]

Nesse contexto, considerando os apontamentos acima, bem como o imediato e regular reconhecimento pessoal do acusado pela vitima, a culminar na identificação como autor do delito, bem como confessando ele, em juízo, ainda que parcialmente, a prática delitiva, resulta inequivocamente demonstrada a autoria que lhe é imputada.

[...]

Diante dessa prova oral colhida, não se cogita, com a devida vênia da Defesa Técnica, insuficiência probatória a justificar a pretendida absolvição do acusado, tampouco a desclassificação para o crime de furto. Primeiro, porque o próprio réu confirmou a tentativa da substração do aparelho celular da vítima, sendo que a ofendida logrou êxito em desvincilhar-se da conduta delitiva, inviabilizando a ação subtrativa. Em segundo lugar, extrai-se da prova oral produzida que o réu empregou violência na tentativa de roubo, notadamente visando À possibilidade, ainda que falha, de subtração da res furtiva, subsumindo-se a conduta do acusado ao tipo legal do roubo, e não ao de furto.

[...]

No caso em tela, tanto a prova testemunhal como a própria confirmação do imputado demonstraram que MAICON tentou subtrair para si coisa móvel alheia, consistente no aparelho celular e no capacete que a ofendida trazia consigo, utilizando-se, para tanto, de violência e grave ameaça à pessoa, abordando-a e pegando-a pelas costas, com violência e de forma abrupta e inesperada. [...]

Nesse passo, entendo estar-se diante de confissão espontânea que, mesmo parcial, enseja a incidência da atenuante correspondente; afinal, além de não se mostrar irrelevante no contexto fático-probatório dos autos, contribuiu concretamente para fundamentar a sentença condenatória prolatada contra o acusado.

Consequentemente, estou acolhendo o pedido de prevalência do voto minoritário do Acórdão embargado, no ponto específico.

Já a compensação da citada circunstância legal com a agravante da reincidência, na segunda etapa da dosimetria, é efeito automático da presente decisão, restando prejudicado o requerimento em tal sentido.

Com efeito, mencionada compensação foi expressamente determinada e procedida no voto vencido, não chegando a ser abordada na divergência da douta maioria ou, tampouco, na sentença a quo; então, a matéria desborda totalmente dos limites deste recurso, não comportando discussão.

Por fim, necessário consignar que o voto minoritário também entendia por aumentar a fração redutora da tentativa para 1/2; porém, nesse aspecto não foi objeto da infringência, reclamando o embargante que o entendimento vencido prevaleça, exclusivamente, no tocante à atenuante da confissão. Logo, na última etapa da fixação da pena permanece a diminuição de 1/3, como estabelecido pela maioria do colegiado.

E o digo apenas para esclarecer, diante das assertivas contidas na inicial, que o acolhimento destes embargos...

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