Acórdão nº 50010203620158210007 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 26-05-2022

Data de Julgamento26 Maio 2022
ÓrgãoSexta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50010203620158210007
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001995370
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001020-36.2015.8.21.0007/RS

TIPO DE AÇÃO: Seguro

RELATOR: Desembargador NIWTON CAES DA SILVA

APELANTE: ENIO LUIS BATISTA DOS SANTOS (AUTOR)

APELADO: MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

ENIO LUIS BATISTA SANTOS ajuizou ação de cobrança em face de MAPFRE VERA CRUZ SEGURADORA S/A, ambas partes já qualificadas. Narrou ser proprietário de um ginásio de esportes e ter contratado cobertura securitária da parte ré para proteção contra incêndio, raio, explosão, implosão, impacto de veículo/queda de aeronaves e vendaval, sendo o contrato celebrado em 03/10/2011 e depois renovado em 03/07/2014. Afirmou que, em 02/05/2015, seu prédio sofreu com um vendaval, tendo parte do telhado arrancado, além de outras partes danificadas, contudo, após promover o aviso de sinistro, a seguradora indeferiu o requerimento, alegando a impossibilidade de indenizar o autor, porque não foi contratada a cobertura para o sinistro “vendaval”. Discorreu acerca do dever de indenizar da seguradora e dos danos extrapatrimoniais experimentados. Ao final, pediu a condenação da ré ao pagamento de indenização referente à cobertura por risco de vendaval, conforme o contratado, no valor de R$ 3.189,00 reais, além de compensação por danos morais no valor equivalente a 40 salários-mínimos. Pediu AJG e inversão do ônus da prova. Juntou documentos.

Sobreveio sentença que julgou improcedente os pedidos. Condenou a parte autora ao pagamento da taxa única dos serviços judiciais e das despesas processuais, bem como em honorários advocatícios em favor do procurador da parte contrária, que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, em razão da singeleza da causa, observando-se os parâmetros do art. 85 do CPC, porém, suspendo a exigibilidade dessas verbas, porque o autor litiga sob amparo da AJG (evento 3, doc 5, pgs. 38-40).

A parte autora apelou postulando pela reforma da decisão. Em suas razões, mencionou que a decisum não comunga com os princípios já consagrados pela jurisprudência. Referiu que restou demonstrado nos autos a contratação, a cobertura do sinistro, bem como a ocorrência do sinistro e a existência dos danos sofridos. Argumentou que o contrato de seguro é a transferência do risco para o consumidor e, portanto, a indenização deve ser a mais completa possível. Invocou o CDC, defendendo que as cláusulas contratuais devem ser interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor. Colacionou jurisprudência. Por fim, requereu o provimento do recurso para que seja julgada procedente a ação (evento 3, doc 5, pgs. 42-45).

A requerida apresentou contrarrazões (evento 3, doc 5, pgs. 48-50 e doc 6, pgs. 1-6)

VOTO

Eminentes Colegas. Trata-se, consoante sumário relatório, de ação de cobrança na qual objetiva a parte autora a condenação da demandada ao pagamento de indenização securitária decorrente de vendaval, julgada improcedente na origem.

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Consabido que a necessidade de observância do princípio da boa-fé nos contratos de seguro possui expressa previsão no Código Civil, dada sua importância, sic:

Art. 765. O segurado e o segurador são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.

A doutrina de SÉRGIO CAVALIERI FILHO assim valora o princípio da boa-fé nas relações securitárias[1], ipsis litteris:

Chegamos, finalmente, ao terceiro e mais importante elemento do seguro – a boa-fé -, que é também o seu elemento jurídico. Risco e mutualismo jamais andarão juntos sem a boa-fé. Onde não houver boa-fé o seguro se torna impraticável. Se nos fosse possível usar uma imagem, diríamos que a boa-fé é a alma do contrato de seguro, o seu verdadeiro sopro de vida.

Dessa feita, extrai-se que as regras contidas nos artigos 765 e 766 do Código Civil, determinam que tanto o segurado quanto à seguradora deve ser regido pela boa-fé e veracidade no contrato.

In casu, compulsados os autos, verifica-se ser incontroversa a relação contratual firmada entre o autor e a seguradora, consoante apólice nº 3355/0024286/18 cingindo-se a controvérsia quanto a cobertura contratada para vendaval.

Outrossim, em que pese o autor tenha contratado inicialmente a proteção do seguro contra o sinistro “vendaval” (apólice n.º 3355/0024286/18 – vigência de 01/10/2012 a 01/10/2013 – fls. 17/18), a cobertura securitária para esse tipo de evento não mais existia quando ocorreu o vendaval no ginásio de esportes, em 02/05/2015, pois a renovação do contrato exclui essa cobertura, conforme se constata a partir da leitura da apólice n.º 3355/0039455/18, com vigência de 03/07/2014 a 03/07/2015 (fls. 88/91).

Nesse diapasão, não se verifica qualquer violação as regras consumeristas, uma vez que comprovado nos autos que a apólice foi renovada e excluída a cobertura que ora se postula, o que é bem comum tratando-se de contrato de seguro, onde as partes, principalmente o segurado, ao contratar ou renovar pode escolher as coberturas que deseja.

Esclareço, nessa senda, que a possibilidade de o segurador excluir determinados riscos do contrato possui previsão legal no artigo 757 do Código Civil, desde que seja dado ao segurado a devida ciência a respeito, ou seja, o contratante deve ter conhecimento, ab initio, dos limites da cobertura securitária.

Isto porque, a liturgia do caput do artigo 757 do Código Civil estabelece que a seguradora obrigar-se-á apenas pelos riscos predeterminados, ou então, riscos assumidos, de sorte que sua interpretação possibilita a eleição de riscos sobre os quais recairá a cobertura securitária, bem como a exclusão daqueles que não pretende garantir, sic:

Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados.

Parágrafo único. Somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada.

Nesse sentido, é o entendimento do egrégio Superior Tribunal de Justiça in verbis:

RECURSO ESPECIAL. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. ESTIPULANTE.
REPRESENTANTE DOS SEGURADOS.
RESPONSABILIDADE DE PRESTAR INFORMAÇÕES AOS ADERENTES. INVALIDEZ PARCIAL. DOENÇA OCUPACIONAL. RISCO EXCLUÍDO NA APÓLICE COLETIVA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. No seguro de vida em grupo, o estipulante é o mandatário dos segurados, sendo por meio dele encaminhadas as comunicações entre a seguradora e os consumidores aderentes.
2. O dever de informação, na fase pré-contratual, é satisfeito durante as tratativas entre seguradora e estipulante, culminando com a celebração da apólice coletiva que estabelece as condições gerais e especiais e cláusulas limitativas e excludentes de riscos. Na fase de execução do contrato, o dever de informação, que deve ser prévio à adesão de cada empregado ou associado, cabe ao estipulante, único sujeito do contrato que tem vínculo anterior com os componentes do grupo segurável. A seguradora, na fase prévia à adesão individual, momento em que devem ser fornecidas as informações ao consumidor, sequer tem conhecimento da identidade dos interessados que irão aderir à apólice coletiva cujos termos já foram negociados entre ela e o estipulante.
3. Havendo cláusula expressa afastando a cobertura de invalidez parcial por doença laboral, a ampliação da cobertura para abranger o risco excluído, e, portanto, não considerado no cálculo atuarial do prêmio, desequilibraria o sinalagma do contrato de seguro.
4. Recurso especial não provido.
(REsp 1850961/SC, Rel.
Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 15/06/2021, DJe 31/08/2021)

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA.
CONTRATO DE SEGURO DE VIDA EM GRUPO.
DOENÇA OCUPACIONAL. COBERTURA SECURITÁRIA. INTERETAÇÃO RESTRITA. CLÁUSULA EXCLUDENTE. RECUSA JUSTIFICADA. SÚMULAS 5 E 7 DO STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. O cerne da controvérsia consiste na obrigação da seguradora de indenizar o autor pelo evento doença profissional que causou incapacidade parcial para o trabalho.
2. Segundo as instâncias ordinárias, a apólice do seguro excluiu da indenização a doença profissional, quando geradora de...

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