Acórdão nº 50010359720188210104 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Criminal, 20-06-2022

Data de Julgamento20 Junho 2022
ÓrgãoSétima Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50010359720188210104
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002264130
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5001035-97.2018.8.21.0104/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Trânsito (Lei 9.503/97

RELATORA: Desembargadora GLAUCIA DIPP DREHER

APELANTE: NERI ROQUE KIELING (ACUSADO)

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Horizontina, perante a 2ª Vara Judicial, o Ministério Público denunciou NERI ROQUE KIELING (nascido em 23/08/1970, com 47 anos de idade à época do fato), como incurso nas sanções do art. 302 da Lei nº 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro), pela prática do seguinte fato delituoso:

“No dia 11 de dezembro de dezembro de 2017, por volta das 08h12min, na altura do Km 33 da Rodovia RS – 305, no trevo de acesso à cidade de Horizontina – RS, Neri Roque Kieling, conduzindo o caminhão VW/24.280, placa IXS – 4062, matou, culposamente, a vítima Carmelita Guntzel Immich, ocasionando-lhe politraumatismo torácico e decorrente de choque hipovolêmico com hemorragia interna torácica e abdominal, conforme laudo pericial (fl. 16).

Na ocasião, o acusado Neri dirigia o mencionado caminhão carregado pela referida via pública, em velocidade de aproximadamente 90km/h, acima do permitido para o local (40km/h), no sentido Tucunduva/Crissiumal, quando, logo após uma curva, no trevo de acesso colidiu frontalmente contra a motocicleta Honda/CG 12, placa IDP-2821, conduzida pela vítima, que fazia a travessia da rodovia, consoante levantamento fotográfico das fls. 07-09, causando-lhe traumatismos diversos no tórax e consequente hemorragia interna torácica e abdominal, ocasionando-lhe a morte.

A vítima foi socorrida ao Hospital Osvaldo Cruz desta cidade e, em seguida, ao Hospital Vida e Saúde de Santa Rosa, onde faleceu na mesma data em razão das citadas lesões.

O acusado agiu de forma negligente e imprudente ao volante, infringindo normas de trânsito (especialmente as previstas nos arts. 44, 169 e 220 da Lei nº 9.503/97), já que dirigia o caminhão carregado em alta velocidade, sem atenção aos cuidados indispensáveis à segurança, em se tratando de cruzamento, o que impossibilitou frear o caminhão a tempo de evitar a colisão”.

Denúncia recebida em 07/03/2018.

Citado em 19/05/2018, o réu apresentou resposta à acusação por intermédio de advogado constituído.

Afastadas as hipóteses de absolvição sumária, o magistrado singular designou audiência instrutória.

Com a anuência do Ministério Público, foi autorizada a habilitação de assistente da acusação.

Durante a instrução criminal, foram ouvidas as testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, bem como foi interrogado o réu.

As partes apresentaram memoriais, inicialmente o Ministério Público e a assistência da acusação; e, posteriormente, a defesa.

Sobreveio sentença, de lavra da Juíza de Direito Dra. Cátia Paula Saft, julgando procedente a denúncia, para condenar o réu como incurso nas sanções do artigo 302, caput, da Lei nº 9.503/97, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 02 anos de detenção, em regime inicial aberto, substituída por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de três salários mínimos nacionais. O réu teve suspenso o direito de dirigir pelo período de 06 meses, bem como foi condenado ao pagamento das custas processuais. A dosimetria da pena foi realizada nos seguintes termos:

PASSO À DOSIMETRIA DA PENA:

O réu não possui antecedentes, conforme certidão da fl. 124.

Sua Conduta social restou abonada pelas testemunhas.

Personalidade sem elementos para aferição.

O motivo do crime não foi desvendado, fazendo presumir seja o comum à espécie.

Quanto as circunstâncias, nada há de relevante, considerando que elas foram inerentes à configuração da culpa do réu, incita ao tipo.

As consequências não foram esmiuçadas, constando nos autos apenas as decorrentes do tipo, qual seja, a morte da vítima.

O comportamento da vítima, apesar de não afastar a culpa do réu, contribuiu para o evento, pois restou comprovado que adentrou à preferencial, inobservando a regra de trânsito.

A culpabilidade do réu é mediana, pois sendo indivíduo livre como é, e tendo potencial conhecimento da ilicitude de seu ato, podia, no caso concreto, agir de modo diverso, conduzindo seu veículo em estrita obediência às regras de trânsito.

Assim, atendendo aos vetores indicativos do art. 59 do Código Penal, considerando as circunstâncias judiciais acima analisadas, fixo a pena-base em 02 (dois) anos de detenção, a qual torno definitiva por inexistirem outras causas modificadoras.

O réu deverá cumprir a pena em regime aberto, forte no art. 33, §2º, letra c do Código Penal.

Da penalidade de Suspensão ou de proibição de se obter a permissão ou a habilitação de dirigir veículo automotor:

Corolário lógico da condenação é a suspensão da Carteira Nacional de Habilitação do réu por 6 (seis) meses, observado o disposto no art. 293 do CTB.

Da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (art. 44 do CP):

Destarte, presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal e, principalmente, mostrando-se a medida penalmente suficiente, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistente: a) na prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo período da pena privativa de liberdade, à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, nos termos do art. 46 e seus parágrafos do Código Penal, em local a ser definido pelo Juízo da Execução; b) prestação pecuniária de 03 salários-mínimos nacionais, em prol do Fundo do Poder Judiciário da Comarca de Horizontina (Conta nº 03.013456.06, da agência 0692 do Banrisul, aberta nos termos do Provimento 007/2013-CGJ/RS), podendo o valor ser parcelado, a critério do Juízo da Execução.

Sentença publicada em 07 de abril de 2021.

Partes intimadas. O Ministério Público, a defensoria constituída pelo réu, e o réu, pessoalmente.

Inconformada, a defesa interpôs recurso de apelação, recebido no juízo a quo.

Em razões, a defesa sustenta insuficiência probatória. Destaca que as provas são claras a demonstrar que a vítima não parou no local indicado, vindo a atravessar na frente do caminhão do réu, que trafegava na via preferencial e que ainda tentou evitar o acidente, projetando seu caminhão para o outro lado da pista. Requereu a absolvição do acusado. Subsidiariamente, postula a redução do período da pena de suspensão do direito de dirigir, pois trata-se de motorista profissional, que depende de seu trabalho para o sustento de sua família. Salienta que não há nenhum elemento que permita fixar a pena acima do mínimo previsto legalmente.

O Ministério Público apresentou contrarrazões.

Autuado no sistema de processo eletrônico (eProc) deste Tribunal de Justiça, o apelo foi distribuído à minha Relatoria.

Nesta Corte, o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Sérgio Santos Marino, exarou parecer pelo desprovimento do recurso interposto pela defesa.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

Compulsando os autos para julgamento, foi verificado que o assistente de acusação não havia sido devidamente cadastrado nos autos, nem intimado da sentença, razão pela qual determinou-se a regularização, para fins de evitar futura alegação de nulidade.

Cumprida a diligência, retornaram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Conheço do apelo defensivo, eis que presentes os requisitos de admissibilidade.

Sem preliminares a serem apreciadas, passo ao exame do mérito.

A prova da materialidade e autoria está demonstrada pelo boletim de ocorrência policial, auto de arrecadação, fotografias do local do acidente e dos veículos envolvidos, termos de declarações, auto de restituição, laudo pericial, relatório policial, croqui do acidente de trânsito, leitura do tacógrafo e prova oral colhida em audiência de instrução.

A fim de evitar desnecessária tautologia, com relação a prova oral, transcrevo trecho da sentença que bem analisou a questão:

O acusado Neri Roque Kieling, por ocasião do interrogatório, referiu que saiu da empresa Alibem para ir ao interior de Horizontina e que, no trevo de acesso a esse município, freou o caminhão e visualizou a motocicleta. Disse que a condutora segurou a moto, quase entrando na rodovia e que, quando pensou que a vítima teria parado a motocicleta, ela arrancou e acelerou a moto, cruzando a frente do caminhão. Contou que, ao descer do seu veículo, encontrou a motocicleta da vítima deitada e toda acelerada. Relatou que fez o que estava ao seu alcance para evitar a morte de Carmelita, pois inclusive jogou o caminhão para cima do canteiro, na tentativa de desviar ou de diminuir os danos de um eventual impacto. Afirmou que não havia neblina e o dia era ensolarado. Aduziu que costuma trafegar entre 80 e 90 km/h e que, naquela manhã, trafegava em torno de 80 km/h e, quando se deu por conta, já estava no trevo. Alegou que não há placas que indiquem a proximidade do trevo ou a limitação de velocidade no trecho. Afirmou que é motorista há muitos anos e que não conhecia bem o trajeto. Que faz o trajeto iniciado em São Nicolau e toda a costa, até Ibirubá e Não-Me-Toque, entregando ração, pois não possui uma rota fixa. Confirmou que permaneceu no local do acidente e acionou o socorro, sendo que bombeiros e SAMU chegaram quase ao mesmo tempo, cerca de 10 minutos após a colisão. A Polícia Rodoviária chegou em torno de uma hora depois. Disse que o policial rodoviário fez a leitura do tacógrafo, no local, de maneira digital. Não recordava bem a ordem dos fatos, mas sabia que, tanto a moto quanto o caminhão, foram levados ao guincho, e que o interrogado foi levado à Delegacia. Questionado pelo MP, respondeu que foi informado pelo policial...

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