Acórdão nº 50010612720208210007 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 11-02-2021

Data de Julgamento11 Fevereiro 2021
ÓrgãoSexta Câmara Cível
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Número do processo50010612720208210007
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20000465152
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação/Remessa Necessária Nº 5001061-27.2020.8.21.0007/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano material

RELATOR: Desembargador NIWTON CAES DA SILVA

APELANTE: ROZELY BEATRIZ NUNES DE ALMEIDA (AUTOR)

APELANTE: COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE-D (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

ROZELY BEATRIZ NUNES DE ALMEIDA ajuizou ação indenizatória em face de COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE D, alegando ter havido a interrupção do fornecimento de energia elétrica em sua propriedade rural, no dia 21 de Dezembro de 2019 a partir das 16h40min, ocorrendo à normalização do fornecimento de energia elétrica às 17h25min do dia 02 de Janeiro de 2020. mencionou que as estufas elétricas do tipo AF possuíam carga de 1.050 kg de fumo em fase de cura no período da falta de energia elétrica, ocasionando a desvalorização do valor comercial do fumo. Defendeu que a relação havia entre as partes é de consumo, estando amparada no artigo 14 do CDC, bem como que a responsabilidade da demandada é objetiva, consoante determina o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. Postulou, assim, pela procedência da ação, com a condenação da demandada ao pagamento dos prejuízos materiais suportados, no valor de R$7.961,15 (sete mil novecentos e sessenta e um reais e quinze centavos), devidamente corrigido.

Sobreveio sentença de parcial procedência da ação, para condenar a ré a pagar à parte autora a quantia de R$ 2.653,71 (dois mil, seiscentos e cinquenta e três reais e setenta e um centavos), com correção monetária pelo IGP-M a partir da data do laudo e juros de 1% ao mês a contar da citação.Custas na proporção de 2/3 para a parte autora e 1/3 para a parte ré. Quanto aos honorários de sucumbência, restaram fixados em R$ 1.500,00, que serão divididos na mesma proporção das custas (R$ 1.000,00 e R$ 500,00), seguindo os parâmetros do art. 85, §8º, do CPC, não sendo admitida a compensação da verba honorária (art. 85, §14, do CPC). (EVENTO 21)

A parte autora apelou aduzindo ser aplicável o Código de Defesa do Consumidor à relação havida entre as partes. Asseverou que não pode ser penalizado pela má-prestação do serviço de energia elétrica. Defendeu que a demandada dever ser a única responsabilizada pelos prejuízos reclamados na exordial. Mencionou que o tempo de interrupção ultrapassou 24 horas, não havendo comprovação da ocorrência de caso fortuito ou força maior. Discorreu acerca das irregularidades do laudo pericial apresentado pela demandada. Sustentou a impossibilidade de condenação ao pagamento dos ônus sucumbenciais, pois beneficiário da gratuidade de justiça. Requereu, assim, o provimento do recurso (evento 30).

Foram apresentadas contrarrazões (eventos 32 e 33).

Os autos vieram conclusos em 12 de novembro de 2020.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas. Trata-se, consoante sumário relatório, de ação de indenização por danos materiais decorrentes da interrupção no fornecimento de energia elétrica na propriedade do autor, a qual teria causado a perda da qualidade do fumo que estava em processo de secagem em estufa, julgada parcialmente procedente na origem.

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço dos recursos de apelação.

Inicialmente, impende referir que a exordial foi instruída com os documentos mínimos necessários à propositura da demanda, bem como atendeu os seus pressupostos, havendo nos autos causa de pedir articulada de maneira lógica e adequada.

Ademais, como bem ressaltou o juízo a quo, a interrupção do fornecimento de energia elétrica nas datas e horários indicados pela parte autora não foi objeto de impugnação pela ré, pelo que se mostra descabida a alegação de ausência de prova da falha na prestação do serviço.

Sendo assim, a rejeição da preliminar é medida impositiva.

No mérito, mister destacar que a responsabilidade da empresa ré, na condição de concessionária de energia elétrica e prestadora de um serviço público, é objetiva, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, respondendo pelos danos que seus agentes derem causa, seja por ação, seja por omissão, cabendo à parte contrária a prova dos fatos, o nexo de causalidade e o dano.

Nesse sentido, precedentes jurisprudenciais do egrégio Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Estadual, in verbis:

PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS PROPOSTA POR FAMÍLIA DE VÍTIMA DE ACIDENTE FATAL. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA.

(...)

3. Mesmo antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002, já se reconhecia a responsabilidade objetiva da empresa concessionária de energia elétrica, em virtude do risco da atividade, com fundamento no art. 37, §6º, da CF/88.

4. O risco da atividade de fornecimento de energia elétrica é altíssimo sendo necessária a manutenção e fiscalização rotineira das instalações. Reconhecida, portanto, a responsabilidade objetiva e o dever de indenizar.

(...)

9. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, provido.

(REsp 1095575/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/10/2011, DJe 03/11/2011)

AGRAVO INTERNO. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MATERIAIS DECORRENTES DE SUSPENSÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. PERDA DA QUALIDADE DE FUMO POSTO PARA SECAGEM. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. 1. A ré, na condição de pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público de fornecimento de energia elétrica, tem os limites de sua responsabilidade civil estabelecidos no artigo 37, § 6°, da Constituição Federal. Trata-se, pois, de responsabilidade objetiva, cujos elementos a serem examinados são a efetiva ocorrência dos fatos, o nexo de causalidade e o dano. 2. A interrupção no fornecimento de energia elétrica ocorreu em 29.02.2012, às 08:30, regularizando-se a situação em 02.03.2012 às 12:30. A má-prestação do serviço de fornecimento de energia elétrica é fato incontroverso, uma vez que a própria requerida não nega tal fato, sendo estes verificados pelos documentos que acostou aos autos. Limita-se, entretanto, a requerer a exclusão de sua responsabilidade sob a tese de culpa da vítima, o que não é o caso dos autos. 3. A declaração da Sig Levantamentos é prova suficiente de que o demandante sofreu perda da qualidade do fumo posto para secagem, em razão da falta de energia elétrica, e que, por tal motivo, teve prejuízos financeiros. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. UNÂNIME. (Agravo Nº 70056598444, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira, Julgado em 09/10/2013)

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. JULGAMENTO COM FUNDAMENTO NO ART. 557, CAPUT, CPC. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. INTERRUPÇÃO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. CURA DO FUMO. DANOS MATERIAIS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ONUS PROBANDI DA FORNECEDORA DO SERVIÇO. É objetiva a responsabilidade civil da fornecedora de energia elétrica, tanto pelas disposições do Código de Defesa do Consumidor (art. 14, caput, CDC), quanto por força da Constituição Federal (art. 37, § 6º, CF). Não restaram comprovadas quaisquer das excludentes previstas no art. 14 do CDC, ônus que incumbia à ré. Condenação de ressarcimento dos prejuízos na cura do fumo mantida. Obrigação de ressarcimento os danos materiais suportados pelo consumidor. Precedentes do TJRS. RECURSO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE. SEGUIMENTO NEGADO. (Apelação Cível Nº 70056595317, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em 07/10/2013)

Por outro lado, a concessionária de energia elétrica, por se tratar de responsabilidade civil objetiva, ou seja, sem discussão a respeito de culpa, apenas se exime do dever de indenizar os prejuízos suportados pelos consumidores quando comprovar a inexistência de deficiência no fornecimento de energia ou algumas das excludentes do dever de indenizar (culpa exclusiva do consumidor, caso fortuito ou força maior), tendo em vista ser obrigada a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e contínuos, sob pena de ter de reparar os danos causados, nos termos do artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor, aplicável à relação havida entre as partes, sic:

Art. 22 - Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.

In casu, o conjunto fático-probatório colacionado aos autos comprovou o dano material suportado pela autora conforme o laudo de vistoria elaborado por profissional habilitado (evento 01 LAUDO9), desincumbindo-se a requerente do ônus que lhe recaia, conforme o disposto no artigo 373, inc. I, da legislação processual.

Nesse torvelinho, sinalo que, consoante entendimento já manifestado por este Tribunal de Justiça, o laudo firmado por profissional agrícola, inclusive com registro no Conselho Regional de Engenharia e Agricultura, é prova suficiente dos danos sofridos, não havendo razão para que não lhe empreste crédito e verossimilhança, inexistindo qualquer comprovação por parte da demandada de que seja parcial ou suspeito.

Reforça-se que o laudo é suficiente para comprovar o prejuízo material suportado pelo autor, pois indica a quantidade e o valor do fumo perdido, assim como as especificações das classes dos produtos que...

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