Acórdão nº 50010621020178210074 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Primeira Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50010621020178210074
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Primeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003207369
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

21ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001062-10.2017.8.21.0074/RS

TIPO DE AÇÃO: Dívida Ativa

RELATOR: Desembargador ARMINIO JOSE ABREU LIMA DA ROSA

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (EMBARGADO)

APELADO: DARCI DA SILVA OLIVEIRA (EMBARGANTE)

RELATÓRIO

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL apela da sentença de procedência dos embargos de terceiros opostos por DARCI DA SILVA OLIVEIRA, desconstituindo a penhora sobre o imóvel matriculado sob número 15.595 junto ao Registro de Imóveis de Três de Maio, penhorado na execução fiscal nº 50002391720098210074.

Nas razões recursais, argumenta com a incidência do art. 185, CTN, norma específica de acordo com a qual presume-se fraudulenta a alienação de bens por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Púbica por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa.

Afirma que os alienantes Vanderlei Luís Rasia e Ivete Witczak Rasia receberam o imóvel em questão por dação em pagamento em 24.02.2011, de Rosemere Teresinha Schuster Muller, quando está já havia sido citada na execução fiscal nº 50002391720098210074 (antigo 074/1.09.0000157-8), em 06.04.2009, de modo que a devedora estava plenamente ciente da sua obrigação de não esvaziamento patrimonial.

Aponta para o reconhecimento da fraude nos autos da execução, enfatizando, no mais, que transações posteriores não têm o condão de convalidar a fraude perpetrada inicialmente pela devedora Rosemere.

Acrescenta, ainda, desimportar a boa-fé do adquirente do bem para fins de configuração de fraude à execução fiscal, tendo-se em vista o interesse público subjacente ao crédito tributário, não aplicável enunciado da Súmula 375, STJ.

Descabidas, igualmente, "alegações relativas ao elemento surpresa no momento de registro de propriedade com a notícia da penhora, pois o processo de execução fiscal não corre em segredo de justiça. Além disso, é práxis das transações imobiliárias que o vendedor apresente certidões de inexistência de ônus e ações."

Por cautela, invocando princípio da causalidade, sustenta descabida sua condenação ao pagamento dos ônus da sucumbência, postulando, subsidiariamente, a minoração da quantia arbitrada a título de honorários, "dada a singeleza do assunto discutido e a matéria ser eminentemente de direito."

Requer, assim, o provimento do recurso.

Contrarrazões acenam, preliminarmente, com a a intempestividade do apelo, na medida em que publicada a sentença em 16.11.2021, com remessa dos autos para digitalização em 28.04.2022.

Na sequencia, propugnam pela manutenção da sentença, destacando (1) não ter qualquer relação com a dívida que deu ensejo à constrição do imóvel; (2) ser adquirente de boa-fé; não fosse (3) ausência de registro da penhora na matrícula do imóvel ao tempo da aquisição.

Refere que o Sr. Vanderlei Luís Rasia recebeu o referido imóvel como dação em pagamento de dívida contraída pelo casal Sérgio Inácio Muller e Rosemere Terezinha Shuster Muller, em 24.02.2011, conforme R13/15.595, e "para que recebesse este imóvel em dação em pagamento, houve o processo que tramitou nesta comarca junto ao JEC, processo nº 074/3.10.0000742-4, onde foi penhorado no dia 06 de setembro de 2010, conforme encontra-se registrado na matrícula do imóvel, verso de fls. 14 dos autos, no R-10/15.595." E agrega, que a "Averbação da postulação de declaração de nulidade da dação em pagamento no processo nº 074/1.11.0001682-0, conforme AV-16/15.595, fls. 16 dos autos, foi julgada improcedente, conforme sentença do referido processo junta aos autos."

É o relatório.

VOTO

De início, conheço do apelo, uma vez que, em se tratando de Fazenda Pública, o termo inicial da contagem do prazo recursal está na data da intimação pessoal, a qual se dá por carga, remessa ou meio eletrônico, e não pela disponibilização de nota de expediente, tal como dispõe o artigo 183, § 1º, CPC/15.

No caso dos autos, não obstante a publicação da sentença por meio da Nota de Expediente nº 92/2021, disponibilizada na edição nº 7093 no Diário da Justiça Eletrônico do dia 16.11.2021, fl. 48 do Evento 3, PROCJUDIC2 dos autos de primeiro grau, não foi efetivada a intimação pessoal da Fazenda Pública acerca da sentença exarada.

Aliás, encaminhados os autos à digitalização, apenas em 27.06.2022 houve a devida intimação da Fazenda Pública, Evento 6, ATOORD1, autos de primeiro grau, expedida a 29.06.2022, passando a fluir o prazo recursal de 30 dias uteis em 15.07.2022, Evento 8, autos de primeiro grau.

O presente apelo, por sua vez, foi interposto na data de 03.08.2022, Evento 10, autos de primeiro grau, razão pela qual não há falar em intempestividade do recurso, visto que protocolado dentro do prazo legal.

Prosseguindo, passo ao exame da matéria de fundo.

Merece acolhida a pretensão recursal.

De acordo com a orientação traçada pelo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso submetido ao rito do artigo 543-C, CPC/73, então vigente, REsp nº 1.141.990/PR, LUIZ FUX, a alienação de bem em momento posterior à citação válida do devedor ou à inscrição em dívida ativa, conforme a alienação tenha sido efetivada antes ou depois da entrada em vigor da Lei Complementar nº 118/05, sem que existentes outros bens suficientes à satisfação do crédito tributário, caracteriza fraude à execução, nos termos do artigo 185, CTN, inaplicável às execuções fiscais o enunciado da Súmula 375, STJ.

Reproduzo o teor da ementa do referido precedente:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. DIREITO TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL. ALIENAÇÃO DE BEM POSTERIOR À CITAÇÃO DO DEVEDOR. INEXISTÊNCIA DE REGISTRO NO DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO - DETRAN. INEFICÁCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO. INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA. ARTIGO 185 DO CTN, COM A REDAÇÃO DADA PELA LC N.º 118/2005. SÚMULA 375/STJ. INAPLICABILIDADE.
1. A lei especial prevalece sobre a lei geral (lex specialis derrogat lex generalis), por isso que a Súmula n.º 375 do Egrégio STJ não se aplica às execuções fiscais.
2. O artigo 185, do Código Tributário Nacional - CTN, assentando a presunção de fraude à execução, na sua redação primitiva, dispunha que: "Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa em fase de execução. Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados pelo devedor bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida em fase de execução."
3. A Lei Complementar n.º 118, de 9 de fevereiro de 2005, alterou o artigo 185, do CTN, que passou a ostentar o seguinte teor: "Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita."
4. Consectariamente, a alienação efetivada antes da entrada em vigor da LC n.º 118/2005 (09.06.2005) presumia-se em fraude à execução se o negócio jurídico sucedesse a citação válida do devedor; posteriormente à 09.06.2005, consideram-se fraudulentas as alienações efetuadas pelo devedor fiscal após a inscrição do crédito tributário na dívida ativa.
5. A diferença de tratamento entre a fraude civil e a fraude fiscal justifica-se pelo fato de que, na primeira hipótese, afronta-se interesse privado, ao passo que, na segunda, interesse público, porquanto o recolhimento dos tributos serve à satisfação das necessidades coletivas.
6. É que, consoante a doutrina do tema, a fraude de execução, diversamente da fraude contra credores, opera-se in re ipsa, vale dizer, tem caráter absoluto, objetivo, dispensando o concilium fraudis. (FUX, Luiz. O novo processo de execução: o cumprimento da sentença e a execução extrajudicial. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 95-96 / DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 278-282 / MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 210-211 / AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 472-473 / BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 604).
7. A jurisprudência hodierna da Corte preconiza referido entendimento consoante se colhe abaixo: “O acórdão embargado, considerando que não é possível aplicar a nova redação do art. 185 do CTN (LC 118/05) à hipótese em apreço (tempus regit actum), respaldou-se na interpretação da redação original desse dispositivo legal adotada pela jurisprudência do STJ”. (EDcl no AgRg no Ag 1.019.882/PR, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 06/10/2009, DJe 14/10/2009) "Ressalva do ponto de vista do relator que tem a seguinte compreensão sobre o tema: [...] b) Na redação atual do art. 185 do CTN, exige-se apenas a inscrição em dívida ativa prévia à alienação para caracterizar a presunção relativa de fraude à execução em que incorrem o alienante e o adquirente (regra aplicável às alienações ocorridas após 9.6.2005);”. (REsp 726.323/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 04/08/2009, DJe 17/08/2009) "Ocorrida a alienação do bem antes da citação do devedor, incabível falar em fraude à execução no regime anterior à nova redação do art. 185 do CTN pela LC 118/2005". (AgRg no Ag 1.048.510/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 19/08/2008, DJe 06/10/2008) “A jurisprudência do STJ, interpretando o art. 185 do CTN, até o...

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