Acórdão nº 50010872720188210029 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quinta Câmara Cível, 28-02-2023

Data de Julgamento28 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50010872720188210029
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003329948
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

25ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001087-27.2018.8.21.0029/RS

TIPO DE AÇÃO: Cédula de crédito bancário

RELATORA: Desembargadora LEILA VANI PANDOLFO MACHADO

APELANTE: COOPERATIVA DE CREDITO, POUPANCA E INVESTIMENTO SERRO AZUL - SICREDI UNIAO RS (EMBARGADO)

APELADO: ANGELA CRISTINA PROBST (EMBARGANTE)

APELADO: ANGELA CRISTINA PROBST (EMBARGANTE)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por COOPERATIVA DE CREDITO, POUPANCA E INVESTIMENTO SERRO AZUL - SICREDI UNIAO RS, inconformada com a sentença proferida nos embargos à execução opostos por ANGELA CRISTINA PROBST ME e ANGELA CRISTINA PROBST, cujo dispositivo sentencial foi proferido nos seguintes termos:

ISSO POSTO, com base no art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão deduzida por ANGELA CRISTINA PROBST ME e ANGELA CRISTINA PROBST em face da COOPERATIVA DE CREDITO, POUPANCA E INVESTIMENTO SERRO AZUL - SICREDI UNIAO RS, para o fim de:

a) limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado praticada no período da contratação, para os contratos da mesma espécie, nos termos da fundamentação supra;

b) afastar a cobrança da remuneração acumulada no período do CDI, divulgada pela CETIP, assim como dos juros efetivos anuais, estipulando-se exclusivamente como encargos moratórios juros de 1% ao mês e a multa de 2%;

c) determinar o afastamento das cláusulas em que estão previstas as despesas com honorários advocatícios; e

d) permitir a compensação de crédito e repetição do indébito, este na forma simples. Eventual valor deve ser corrigido pelo IGP-M a contar de cada pagamento a maior, com incidência de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação.

Considerando o decaimento mínimo do pedido das embargantes, condeno a embargada ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 550,00 (quinhentos e cinquenta reais), levando em consideração a natureza da ação, o tempo e o trabalho despendidos, além da natureza do órgão que patrocina as embargantes, em conformidade com o disposto no § 2º do art. 85 e art. 86, ambos do CPC. Tais valores serão corrigidos pelo IGP-M a contar desta data e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, a partir do trânsito em julgado.

Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.

Em face da nova sistemática do Código de Processo Civil e, diante da inexistência de juízo de admissibilidade (art. 1010, § 3º, do NCPC), em caso de interposição de recurso de apelação, proceda-se na intimação da parte apelada para que apresente contrarrazões, querendo, no prazo de 15 dias. Decorrido o prazo, subam os autos ao E. Tribunal de Justiça do Estado do RS.

Com o trânsito em julgado, certifique-se na execução.

Oportunamente, arquive-se com baixa.

Em suas razões recursais, a parte apelante sustentou, em síntese, a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso, sob o fundamento de que o crédito adquirido foi utilizado para o fomento da atividade empresarial, que contribuiu para o desenvolvimento da atividade lucrativa. Alegou que, mesmo que se entenda haver confusão entre a pessoa física e a pessoa jurídica, a finalidade de implementar ou incrementar a atividade negocial não se caracteriza como relação de consumo, e sim como atividade produtiva. Destacou tratar-se de relação entre cooperativa e cooperativado, afirmando não serem aplicáveis as normas consumeristas, ao argumento de que o objetivo é estimular a poupança e prestar assistência financeira aos associados e não o lucro. Ressaltou que não há abusividade nos juros remuneratórios cobrados, justificando que estão muito próximos da taxa média de mercado. Argumentou ser possível a cobrança de comissão de permanência, desde que não cumulada com os juros remuneratórios, correção monetária e demais encargos moratórios, apontando que, no caso dos autos, houve somente a cobrança de juros remuneratórios. Observou que os juros moratórios são de livre estipulação, salientando que a multa moratória está sendo cobrada no valor de 2%, em conformidade com os ditames legais. Defendeu a possibilidade de utilização do CDI como indexador monetário do débito, quando expressamente pactuado, requerendo, na hipótese de não ser esse o entendimento, a fixação de outro índice. Disse ser extra petita a sentença, afirmando não ter sido requerida a repetição ou compensação dos valores. Colacionou julgados, pugnando, ao final, pelo provimento do recurso.

Foram apresentadas contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

Da aplicação do CDC ao caso

O Código de Defesa do Consumidor é aplicável ao presente caso, uma vez que as cooperativas de crédito caracterizam-se como fornecedoras, em sua atividade de prestação de serviços financeiros, nos termos do artigo 3º da Lei nº 8.078/901.

A Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça dispõe no mesmo sentido:

O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. (SÚMULA 297, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 12/05/2004, DJ 08/09/2004, p. 129)

Nesta Corte, é pacífica a compreensão:

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. EMBARGOS À EXECUÇÃO. REVISÃO DE CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. APLICABILIDADE DO CDC: As Cooperativas de Crédito, com atuação voltada à realização de operações financeiras com seus associados, equiparam-se àquelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, submetendo-se às disposições da Lei n.º 4.595/64, no exercício de atividades de natureza bancárias, estando sujeitas às disposições do Código de Defesa do Consumidor, conforme dispõe a Súmula nº 297 do STJ. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS: O êxito na cobrança extrajudicial reverte em favor da parte credora que deve arcar com o pagamento da verba honorária e despesas decorrentes, sendo ilegal a imposição ao devedor do pagamento em valor arbitrariamente fixado. Em se tratando de cobrança judicial dos valores devidos, os honorários e as despesas são estipulados pelo Juízo, sendo consequência legal da prestação jurisdicional, mostrando-se ilegal a estipulação contratual nesse sentido. Dicção do art. 51, XI, do CDC. Sentença mantida. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUMCUMBENCIAIS: Valor arbitrado a título de honorários advocatícios que se mostra excessivo diante da singeleza da natureza da causa. Honorários minorados. Descabido o arbitramento de honorários recursais, nos termos do art. 85, §11, do CPC, em razão do êxito parcial do recurso. APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE.(Apelação Cível, Nº 70075548131, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cláudia Maria Hardt, Julgado em: 26-04-2018)

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. AÇÃO MONITÓRIA E REVISIONAL. RAZÕES RECURSAIS RESTRITAS À AÇÃO REVISIONAL. Aplicação do princípio "tantum devolutum quantum appellatum". CASO CONCRETO. As cooperativas de crédito são equiparadas a instituições financeiras quando fornecem crédito a consumidores, não havendo falar em inaplicabilidade do CDC na relação jurídica em questão. APLICABILIDADE DO CDC. O Código de Defesa do Consumidor rege as operações bancárias, por se tratar de relações de consumo. CAPITALIZAÇÃO. No contrato sub judice são aplicáveis as disposições da MP nº 1.963-17/2000, reeditada sob nº 2.170-36/2001, sendo possível a incidência da capitalização mensal, desde que expressamente pactuada. JUROS MORATÓRIOS. São legais os juros moratórios limitados em 12% ao ano. Súmula 379 do STJ. CARACTERIZAÇÃO DA MORA. Não evidenciada a cobrança abusiva relativamente a encargo relativo ao período da normalidade, resta configurada a hipótese de caracterização da mora, consoante orientação emanada pelo Superior Tribunal de Justiça. SUCUMBÊNCIA. Considerando o decaimento de cada uma das partes, deve ser mantida a distribuição dos ônus da sucumbência. APELO PROVIDO, EM PARTE. UNÂNIME.(Apelação Cível, Nº 70052689957, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Otávio Augusto de Freitas Barcellos, Julgado em: 26-06-2013)

É de se destacar, ainda, que vem sendo admitida interpretação flexibilizada da definição de destinatário final, estabelecida no artigo 2º do CDC2, nos casos em que as pessoas jurídicas, por apresentarem alguma vulnerabilidade em relação ao fornecedor, equiparam-se à condição de consumidoras.

Colaciono precedentes a respeito:

APELAÇÕES CÍVEIS. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO - CAPITAL DE GIRO. I - APELAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA - Aplicabilidade do CDC à pessoa jurídica. Conforme a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, em regra, somente o destinatário final do produto, assim entendido o destinatário fático e econômico do bem ou serviço, retirando-o de forma definitiva do mercado de consumo, seja pessoa física ou jurídica, é merecedor da proteção do CDC, excluindo-se, assim, o consumo intermediário, entendido como aquele cujo produto retorna para as cadeias de produção e distribuição, compondo o custo (preço final) de um novo bem ou serviço. Todavia, a Corte Especial, tomando por base o conceito de consumidor equiparado (art. 29 do CDC), vem admitindo uma aplicação mais flexível dessa definição de destinatário final, em determinadas hipóteses, frente às pessoas jurídicas adquirentes de um produto ou serviço, equiparando-as à condição de consumidoras, por apresentarem alguma vulnerabilidade em relação ao fornecedor (REsp nº 1.195.642-RJ). Na hipótese, considerando a vulnerabilidade presumida da empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI), optante pelo SIMPLES, frente ao fornecedor do crédito, equipara-se ela a consumidor, fazendo jus à proteção do CDC. - Juros remuneratórios. A aplicação de taxa substancialmente superior à média de mercado...

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