Acórdão nº 50010877420198210099 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 27-04-2022

Data de Julgamento27 Abril 2022
ÓrgãoOitava Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50010877420198210099
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002038292
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5001087-74.2019.8.21.0099/RS

TIPO DE AÇÃO: Furto (art. 155)

RELATORA: Juiza de Direito CARLA FERNANDA DE CESERO HAASS

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Na Comarca de General Câmara/RS, o Ministério Público ofereceu denúncia contra CRISTIANO DA SILVA, nascido em 10/08/1986, com 32 anos de idade ao tempo do fato, dando-o como incurso nas sanções do artigo 155, §§ 1º e 4º, inciso II, do Código Penal.

Narrou a peça vestibular acusatória, in verbis (processo 5001087-74.2019.8.21.0099/RS, evento 3, PROCJUDIC1, fls. 02/04):

No dia 27 de novembro de 2018, por volta das 05h30min, na Localidade da Volta do Barreto, interior, em General Câmara/RS, o denunciado CRISTIANO DA SILVA, subtraiu, para si, mediante abuso de confiança, uma roçadeira Stihl da vítima EDERSON REIS DE CASTRO.

Na ocasião, o denunciado, aproveitando-se da relação que possuía com a vítima, ingressou no local e subtraiu a “res furtivae” supramencionada, com intuito de trocar o objeto por entorpecentes, vez que é usuário de drogas.

O crime foi praticado durante o repouso noturno, quando estado de vigília é reduzido.

A denúncia foi recebida em 07/01/2020, oportunidade em que decretada a prisão preventiva do acusado (3.1, fls. 39/43), recolhido ao cárcere em 08/01/2020 e posto em liberdade provisória no dia 18/03/2020 (3.2, fls. 13 e 22/25).

O réu foi citado (3.2, fls. 35/38) e, por intermédio da Defensoria Pública, apresentou resposta à acusação (3.2, fls. 39/41).

Afastada a possibilidade de absolvição sumária, seguiu-se a instrução. Em audiência realizada no dia 17/02/2020, foram colhidos os depoimentos do ofendido e da testemunha, procedendo-se, ao final, ao interrogatório do réu (3.3, fls. 13/14).

O Ministério Público e a defesa apresentaram memoriais em substituição às alegações finais orais (3.3, fls. 20/24 e 26/31).

Acostada a certidão de antecedentes criminais do acusado (3.1, fls. 35/38).

Em 30/06/2021, sobreveio sentença, publicada na mesma data (3.3, fls. 33/39), julgando procedente a ação penal e condenando o réu CRISTIANO DA SILVA como incurso nas sanções do artigo 155, § 4º, inciso II, do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos de reclusão, a ser cumprida em regime aberto, substituída por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de um salário mínimo nacional, e à pena de multa de 10 (dez) dias-multa à razão unitária mínima.

Inconformados, o Ministério Público e a Defensoria Pública interpuseram recursos de apelação (3.3, fl. 46 e 3.4, fl. 29).

O réu foi pessoalmente intimado do veredicto (3.4, fls. 49/50 e 3.5, fl. 01).

Em suas razões, o Parquet postulou o recrudescimento da pena-base, destacando que o indigitado ostenta ações penais instauradas por delitos contra o patrimônio, com quatro condenações provisórias, o que revela maior grau de reprovabilidade em sua conduta. Aduziu que a conduta social deve ser tisnada, reputando nocivo o comportamento do denunciado, que agiu com frieza, ausentes sinais de arrependimento. Alegou ainda que o mote delitivo é diferenciado, no caso, o agir do apelante direcionado ao consumo de drogas. Nesse tom, postulou a fixação da basilar em 05 (cinco) anos de reclusão. Por conseguinte, asseverou que o regime expiatório deverá ser estabelecido no inicial semiaberto. Requereu também o afastamento das penas restritivas de direitos, ante o redimensionamento da sanção, não estando preenchidos os requisitos do artigo 44 do Código Penal. Postulou, ao fim, a fixação de indenização em favor da vítima, nos termos do artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal e do artigo 91, inciso I, do Estatuto Repressor (3.3, fls. 49/50 e 3.4, fls. 01/17).

A Defensoria Pública, a seu turno, pugnou pela absolvição do apelante, apregoando insuficiente a prova amealhada fins de demonstrar a autoria delitiva, limitada ao testemunho do policial militar e à palavra da vítima, que registrou a subtração 15 dias depois do fato. Modo subsidiário, pediu o afastamento da qualificadora do abuso de confiança, porquanto comprovado o vínculo empregatício, como admitido pelo ofendido, e a redução da pena provisória para aquém do piso normativo em razão do reconhecimento da atenuante da confissão espontânea. Requereu o arredamento da prestação pecuniária, ou substituição por outra restritiva, e a isenção da pena de multa, uma vez que o imputado não detém condições de adimpli-la sem causar prejuízo à própria subsistência e da família (3.4, fls. 33/47).

Apresentadas as contrarrazões defensivas e ministeriais (3.4, fls. 19/27 e 3.5, fls. 04/22), subiram os autos a esta Egrégia Corte, manifestando-se a Procuradoria de Justiça pelo parcial provimento do apelo ministerial, fins de fixar indenização à vítima, e pelo desprovimento do recurso defensivo (evento 7, PARECER1).

Conclusos os autos para julgamento.

Esta Câmara Criminal adotou o procedimento informatizado utilizado pelo TJRS, tendo sido atendido o disposto no artigo 207, inciso II, do RITJRS, bem como o artigo 609 do Código de Processo Penal.

É o relatório.

VOTO

O voto, adianto, vai no sentido de negar provimento ao apelo defensivo e prover em parte o recurso ministerial.

De plano, ao exame do mérito.

Da suficiência de provas para a condenação.

A existência delitiva veio demonstrada pelo boletim de ocorrência nº 3811/2018/151902 (3.1, fls. 21/22) e pelo auto de avaliação indireta (3.1, fl. 28), bem ainda pela prova oral coligida ao feito.

No tocante à autoria delitiva, o indigitar do réu como autor do crime de furto despontou certeiro a partir da confissão espontânea do increpado nas fases de ausculta, ambas, o seu relato judicial, no que pertine à subtração do maquinário da propriedade, indo ao encontro das declarações do vitimado e do testemunho do policial militar Flávio José A. B.

Dito isso, reproduzo excerto da decisão recorrida, no ponto em que esmiuçou a prova oral coligida, adotando-o como razão de decidir:

A vítima, EDERSON REIS CASTRO, relatou que o acusado morava em sua residência; que o acusado confessou o delito; que o acusado sumiu e, depois que passou uns dias e realizou os furtos; que após dar falta da roçadeira foi questionar o acusado no mesmo dia; que somente ele e o acusado sabem onde ficavam as chaves da residência; que o acusado confessou dentro de delegacia; que não conseguiu reaver a roçadeira; que realizou o registro após 15 dias ao ocorrido; que antes disso acontecer o acusado era de confiança; que o acusado “se perdeu” no mundo; que o prejuízo foi de aproximadamente R$ 3.200,00 reais.

A testemunha, FLÁVIO JOSÉ ALBANUS BECKER, Policial Militar, relatou que participou da ocorrência; que o acusado confessou o delito; que não chegou ir ao local dos fatos; que soube dos fatos em momento posterior; que o acusado trabalhava no local dos fatos.

O acusado, CRISTIANO DA SILVA, em seu interrogatório relatou que confirma os fatos, porém a roçadeira não era da vítima, mas sim de João Bandeira, dono da fazenda; que o acusado e a vítima eram empregados fazenda; que a roçadeira estava no pátio aberto; que trocou a roçadeira por drogas; que está acerca de 1 ano e meio sem drogas; que se arrepende do furto.

Como visto, tal como na esfera investigativa (3.1, fl. 24), em audiência judicial (disponível nos autos eletrônicos), Cristiano da Silva confessou espontaneamente o cometimento do furto da roçadeira, arrebatado da propriedade na qual trabalhara por mais de quatro anos. Nesse toar, apresentou como justificativa para o seu agir ilícito a dependência química, fins de satisfazer o vício. Nesse tom, confirmou a subtração do bem, alegando que o bem pertencia a João Bandeira, e não a Ederson, o qual também era empregado da fazenda. Sustentou ainda que a coisa subtraída estava no pátio, assegurando que o galpão ficava aberto na fazenda, e que cogitara que o fato ia passar batido.

No tópico, é certo que a confissão, fins de convicção e de formação de um juízo condenatório, deverá ser confrontada com as demais provas do processo, mostrando-se com elas concordantes e compatíveis, a teor do disposto no artigo 197 do Código de Processo Penal1. E esse, a meu sentir, é o caso dos autos.

Ressabido, em crimes deste jaez, a palavra da vítima é meio de prova válido, prestando-se à estruturação do convencimento, sobretudo quando não infirmada por substratos outros. Na espécie, a despeito da relação de prestação de serviços estabelecida entre réu e vitimado por mais de 04 anos, a narrativa de Ederson Reis Castro assume valor probante, porquanto revestida de idoneidade. Depreende-se dos elementos ensartados ao feito a inexistência de espírito de emulação, tanto que o próprio réu, na quadra judicial, reputou verdadeira a acusação da prática da subtração. Revelam-se, nesse passo, insuspeitas as suas declarações, interessado o vitimado tão somente no desvelar dos acontecimentos.

Com efeito, Ederson afirmou que Cristiano dormia em sua propriedade, em uma casinha ao lado da sua, trabalhava no local e tinha acesso a todas as chaves e às coisas guardadas na sua própria casa, inclusive dinheiro, sendo, portanto, de sua confiança. Contou que, à época dos fatos, ele se perdeu, não foi mais trabalhar e sumiu no mundo, sendo que, passados uns dias, percebeu a falta da roçadeira. Como ele era o único, além de sua mãe, que sabia onde ficava a chave do imóvel escondida, desconfiou e apertou ele, ocasião em que Cristiano assumiu a prática delitiva, assim procedendo também na Delegacia de Polícia. Advertiu ter percebido a subtração cerca de 15 dias depois de o imputado não mais ter retornado e que,...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT