Acórdão nº 50011775820188210086 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50011775820188210086
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoNona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001792569
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001177-58.2018.8.21.0086/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano moral

RELATOR: Desembargador EDUARDO KRAEMER

APELANTE: CARINA TORRES MIRANDA (AUTOR)

APELADO: BANCO BRADESCARD S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de agravo interno interposto por CARINA TORRES MIRANDA, nos autos da ação ordinária de desconstituição de débito cumulada com pedido liminar ajuizada em face de BANCO BRADESCARD S.A, inconformada com a decisão monocrática (Evento 7) que, de plano, desproveu a apelação interposta pela parte autora, mantendo o julgamento de improcedência da ação.

Em suas razões (Evento 13), pugna pela reconsideração da decisão que negou seguimento ao recurso postulando, preliminarmente, a revogação da multa por litigância de má-fé, porquanto não teria ocorrido nenhuma das hipóteses do art. 80, do CPC. Argumenta que diante da mácula do seu nome no rol de inadimplentes é plausível que o consumidor venha a se insurgir perante o Judiciário. Argumenta que parte autora não reconhece o débito no valor de R$ 3.207,48, não tendo anuído com a dívida em questão. Aduz que o pagamento do cartão era realizado através de débito em conta e que o documento de fl. 82 prova que a parte autora tinha saldo positivo em sua conta, provando que o réu deixou de efetuar o desconto. Aponta falha no serviço da instituição financeira que deixou que debitar os valores atinentes à fatura de dezembro de 2017. Cita precedentes. Requer o provimento do recurso.

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 17).

Registro terem sido cumpridas as formalidades dos artigos 931 e 934, do CPC, considerando a adoção do sistema informatizado por este Tribunal (Ato nº 24/2008-P).

É o relatório.

VOTO

Pretende a parte agravante a reforma da decisão monocrática que desproveu o recurso de apelação por si interposto, mantendo o julgamento de improcedência da ação. Adianto, contudo, que o agravo interno não comporta provimento.

Trata-se de ação de indenização por danos morais em que a parte autora, na exordial, nega a contratação que gerou o débito que culminou com a inscrição do seu nome nos órgãos de proteção ao crédito.

A fim de melhor expor a questão trazida à apreciação do Colegiado, evitando desnecessária tautologia, transcrevo excerto da decisão ora agravada:

"(...)

Cuida-se de ação declaratória de inexistência de dívida com pedido de antecipação de tutela e indenização por danos morais, em que a parte autora alega haver sido surpreendida com a anotação existente em seu nome, promovida pela ré (Evento 3, PROCJUDIC1, Página 16, origem), com quem nega a existência de relação comercial, ao final julgada improcedente.

De acordo com o que dispõe o art. 373 do Código de Processo Civil, incumbe à parte autora o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do direito seu direito (inciso I) e, à parte ré, o ônus da prova quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da parte autora (inciso II).

Diante da negativa da parte autora quanto à existência de relação contratual que teria gerado o débito em discussão junto à ré, cabia a esta comprovar a contratação, ônus do qual se desincumbiu a contento.

Analisados os autos, verifica-se que a parte autora era correntista do banco demandado, tendo contratado cartão de crédito para pagamento mediante débito em conta. Inadimplida a fatura com vencimento em 10/12/2017, porquanto ausente saldo e limite disponíveis na conta corrente da autora, ocorreu a inscrição do nome da autora nos órgaos de proteção ao crédito (Evento 3, PROCJUDIC2, Página 11/50 e PROCJUDIC3, Página 1/36, origem).

Na hipótese, portanto, entendo que o conjunto probatório é suficiente à demonstração da contratação, pela parte autora, junto ao Bradesco que, diante do inadimplemento, inscreveu o nome da parte autora aos órgãos de proteção ao crédito.

Assim, demonstrada a origem do débito, dúvidas não pairam quanto à efetiva existência da dívida que deu ensejo à inscrição do nome da parte autora nos órgãos de proteção ao crédito. Havendo débito vencido e impago, a inscrição do nome do devedor nos órgãos de proteção ao crédito configura exercício regular de direito, sendo lícita, portanto.

A respeito da matéria, trago precedentes deste Tribunal de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. INSCRIÇÃO EM ÓRGÃO DE RESTRIÇÃO DE CRÉDITO. DÍVIDA EXISTENTE. CONTRATAÇÃO PROVADA. EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO. ALTERAÇÃO DA VERDADE DOS FATOS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ CONFIGURADA. Verificada a existência do débito, à luz da prova produzida nos autos, a inscrição restritiva promovida pela parte ré ganha contornos de exercício regular de direito, inexistindo dano passível de reparação. Sentença de improcedência mantida. Litigância de má-fé configurada em virtude da conduta processual da parte autora que violou dever de lealdade ante a alteração da verdade dos fatos configurada pela prova produzida em evidente tentativa de locupletamento. RECURSO DESPROVIDO. APLICADA MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. (Apelação Cível, Nº 70084091909, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em: 09-07-2020)

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. NEGATIVA DE CONTRATAÇÃO. ÔNUS DA PROVA. Em se tratando de alegação de inexistência de relação contratual, compete à parte ré comprovar a contratação e, com isso, a regularidade do registro desabonador. No caso dos autos, o autor ajuizou esta ação contra 4 (quatro) empresas, sendo que três (TIM CELULAR, MAGAZINE LUIZA e FINAN FACTORING) realizaram acordo no curso do processo, restando extinta a demanda contra as mesmas. A quarta demandada - RENOVA COMPANHIA SECURITIZADORA -, porém, reiterou a sua convicção na regularidade da contratação realizada entre o autor e a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, documentos esses que foram enviados pelo próprio banco, mediante requisição do Juízo por ofício. Junto com o contrato, ficha de assinaturas e documento de identidade, o banco enviou a cópia integral da Declaração de Imposto de Renda do autor entregue à Receita Federal relativa ao exercício 2013 (a mais recente em relação à data da contratação). O autor teve vista desses documentos, e silenciou. Quedou-se inerte, presumindo-se, portanto, a veracidade de seu conteúdo. Logo, procede o apelo da ré RENOVA, pois suficientemente demonstrada a regularidade da contratação, bem como a existência da dívida, sendo o registro desabonador exercício regular do credor/cessionário. APELAÇÃO PROVIDA. (Apelação Cível, Nº 70084084847, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em: 29-05-2020)

Dessarte, ausente a ocorrência de ato ilícito a ensejar o dever de indenizar, já que a inscrição levada a efeito se constituiu em exercício regular de direito, a manutenção da sentença de improcedência da ação é medida que se impõe.

E, diante da situação que se apresenta, entendo que a conduta da parte autora se amolda às hipóteses previstas no art. 80 do CPC para a litigância de má-fé, notadamente aquelas dos incisos II e III:

Art. 80. Considera-se litigante de má-fé aquele que:

I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;

II - alterar a verdade dos fatos;

III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal;

IV - opuser resistência injustificada ao andamento do processo;

V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;

VI - provocar incidente manifestamente infundado;

VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.

Assim, tanto porque a demandante alterou a verdade dos fatos de forma manifesta ao sustentar a inexistência de contrato e de débito em aberto com a ré, quanto porque valeu-se do processo para buscar objetivo indevido, a saber, a declaração de inexistência de débito existente, condeno a parte autora ao pagamento de multa por litigância de má-fé, que, forte no art. 81, caput, do CPC, vai fixada em 2% sobre o valor corrigido da causa.

Ressalto que a concessão da gratuidade de justiça não ilide o dever de o beneficiário pagar, ao final da lide, as multas que lhe sejam impostas, na forma do art. 98, § 4º, do CPC.

(...)"

Pois bem.

Cumpre registrar que a tese inicial de inexistência de relação jurídica restou rechaçada pela própria parte demandante, que, a partir da réplica, passou a arguir que se o pagamento do cartão de crédito era mediante débito em conta a ré não teria realizado tentativa de desconto e a autora possuía saldo positivo em sua conta, passando a sustentar a tese de falha no serviço.

Cumpre salientar que a tese inicial vincula a parte demandante, não lhe sendo dado alterar os fundamentos da causa de pedir, inclusive com argumentos...

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