Acórdão nº 50012019820208210124 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Criminal, 03-02-2022

Data de Julgamento03 Fevereiro 2022
ÓrgãoSétima Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50012019820208210124
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001469423
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5001201-98.2020.8.21.0124/RS

TIPO DE AÇÃO: Estupro de vulnerável CP art. 217-A

RELATORA: Desembargadora GLAUCIA DIPP DREHER

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Na Comarca de Santo Cristo, perante a 2ª Vara Criminal, o Ministério Público denunciou N.S.S.J (nascido em 02/10/1991, com 28 anos de idade à época dos fatos), como incurso nas sanções dos artigos 217-A, §1°, e art. 215-A, ambos do Código Penal, pela prática dos seguintes fatos delituosos:

1º FATO:

Em data não precisamente citada nos autos, mas certamente no ano de 2020, na localidade de Barra do Ouro, interior do município de Alecrim/RS, o denunciado N.S.S.J, praticou ato libidinoso diverso da conjunção carnal contra a vítima J.P.S., seu irmão, o qual, por ser deficiente mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato (conforme Avaliação da APAE fls. 107/108).

Segundo consta nos autos, o denunciado, por reiteradas vezes, aproveitando-se da vulnerabilidade da vítima, seu irmão (portador de debilidade mental, déficit cognitivo), manteve relações sexuais recorrentes com ofendido, proferindo que iria matar a vítima enforcado caso contasse das referidas relações sexuais para alguém, (conforme Termo de Declarações da folha 08).

2º FATO:

Em data não precisamente citada nos autos, mas certamente no ano de 2020, na localidade de Barra do Ouro, interior do município de Alecrim/RS, o denunciado N.S.S.J praticou contra J.E.S., sua irmã, com 14 anos de idade, e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia. Na ocasião, o denunciado, irmão da ofendida, agarrou a vítima por trás e começou a simular atos sexuais, proferindo “vem aqui”. A ofendida, assim que percebeu o ato libidinoso praticado pelo denunciado, fugiu correndo do local e contou o fato a sua genitora, (conforme Termo de Informações da folha 10)."

Foi decretada a prisão preventiva do acusado para garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal em decisão proferida em 24/11/2020, cujo mandado de prisão foi cumprido em 02/12/2020.

Denúncia recebida em 12/01/2021.

Citado, o réu apresentou resposta à acusação por intermédio da Defensoria Pública.

Não sendo caso de absolvição sumária, o magistrado singular designou audiência instrutória.

Durante a instrução criminal, foram ouvidas as vítimas, as testemunhas de acusação, bem como foi interrogado o réu.

As partes apresentaram memoriais, inicialmente o Ministério Público e, após, o réu por intermédio da Defensoria Pública.

Sobreveio sentença, de lavra do Juiz de Direito, Dr. Roberto Laux Junior, julgando procedente a denúncia, para condenar o réu nos lindes do artigo 217-A, §1º, do CP, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 12 anos de reclusão, em regime inicial fechado. O réu foi condenado em metade das custas processuais, suspensa a exigibilidade do pagamento em razão do benefício da AJG que lhe foi concedido. Ainda, foi negado ao réu o direito de apelar em liberdade. A dosimetria da pena foi realizada nos seguintes termos:

"A pena base deve ser fixada segundo a análise dos vetores do art. 59 do Código Penal.

A pena cominada para o delito previsto no art. 217, §1º, do Código Penal, é de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

Pena base:

Quanto aos antecedentes (Evento 2, OUT1, fls. 241/243), o acusado não ostenta condição que autorize que tal circunstância seja valorada negativamente. A conduta social do réu não foi desabonada nos autos. No que diz com a personalidade do agente, nada há no processo que permita sua análise, pelo que não a tenho como desfavorável. O motivo determinante da prática do delito é inerente ao tipo que o abriga. As circunstâncias do crime revelam-se normais à espécie. A respeito das consequências do crime, nada a referir. Relativamente ao comportamento da vítima, constata-se que não houve atitude significativa por parte dela, que facilitasse ou instigasse, de alguma forma, o cometimento do fato. Por derradeiro, no que diz respeito à culpabilidade – entendida como grau de reprovabilidade da conduta, nada a registrar. Desse modo, analisadas conjuntamente todas as circunstâncias do art. 59 do Código Penal, bem como atendendo ao critério da necessidade e suficiência para prevenção e reprovação do crime em espécie, tenho por pertinente fixar a pena-base em 08 ANOS DE RECLUSÃO.

Pena Provisória: Ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes, a pena-base resta provisória. Nesse aspecto, apesar de o Ministério Público requerer o reconhecimento das agravantes previstas no artigo incisos "e" e "f", do CP, encontra-se demonstrada a causa de aumento prevista no art. 226, inciso II, do mesmo diploma, que prefere as agravantes.

Pena Definitiva: tendo em vista que o acusado é irmão da vítima e, inclusive, um dos irmãos mais velhos, o que denota autoridade sobre ela, até mesmo em razão de referida condição, aumento a pena de metade, nos termos do artigo 226, inciso II, do Código Penal, sendo a pena definitiva em 12 ANOS DE RECLUSÃO.

Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, uma vez que não estão presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, particularmente no tocante ao montante da pena aplicada.

Da mesma forma, não é possível conceder ao réu a suspensão condicional da pena, tendo em vista que não se verificam os requisitos do art. 77 Código Penal.

Reconheço o caráter hediondo do delito, nos termos do art. 1º, inciso VI (estupro de vulnerável), da Lei nº 8.072/1990, com as demais consequências previstas no mesmo Diploma Legal.

O regime inicial de cumprimento da pena deverá ser o fechado, considerando a pena fixada, conforme preconiza o art. 33, §2º, alínea "a", do CP.

Defiro a detração penal estabelecida pelo art. 387, parágrafo 2º, do CPP, devendo ser descontado da pena definitiva os dias em que o réu permaneceu segregada preventivamente.

Nesse toar, considerando que o réu permanece preso desde 02.12.2020 até a data de hoje (22.09.2021), ou seja, 09 meses e 25 dia, RESTAM, PORTANTO, A SEREM CUMPRIDOS APROXIMADAMENTE 11 ANOS, 02 MESES e 05 DIAS DE RECLUSÃO.

Desse modo, ainda, que, aplicada a detração no presente momento, a pena ainda a ser cumprida é considerável, bem como que, somados aos fatores acima, não indicam a fixação do regime inicial outro que não o fechado."

Sentença proferida em 25 de setembro de 2021.

Partes intimadas: o Ministério Público, a defesa e o réu, pessoalmente.

Inconformada, a Defensoria Pública interpôs recurso de apelação, recebida pelo juízo a quo.

Em suas razões, a defesa roga pela absolvição do réu, suscitando insuficiência probatória. Destaca que os prints da tela do celular com mensagens do aplicativo whatsapp são consideradas provas inválidas, pois além do celular não ter sido objeto de apreensão, não foram submetidas a perícia, de modo que o conteúdo não pode ser vinculado ao acusado de forma segura. Salienta que não há provas de que a vítima não tenha entendimento e autodeterminação para consentir com eventual prática sexual. Destaca que a vítima não foi ouvida na forma do depoimento sem dano, o que acarretou respostas decoradas e mecanizadas, sem qualquer credibilidade.

O Ministério Público contra-arrazoou o recurso defensivo.

Autuado no sistema de processo eletrônico (eProc) deste Tribunal de Justiça, o apelo foi distribuído à minha Relatoria.

Nesta Corte, o Ilustre Procurador de Justiça, Dr. Sérgio Santos Marino, exarou parecer pelo desprovimento do apelo defensivo.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Conheço do apelo defensivo, eis que presentes os requisitos de admissibilidade.

Sem preliminares a serem apreciadas, passo ao exame do mérito.

A prova da materialidade e autoria está demonstrada pelo boletim de ocorrência policial, termos de reclarações, laudo de violência sexual, declaração da APAE, relatório policial e prova oral colhida em audiência de instrução.

A fim de evitar desnecessária tautologia, com relação a prova oral colhida em audiência de instrução, transcrevo trecho da sentença que bem analisou a questão:

"Nesse sentido, ouvida em juízo, a vítima J.P.S. confirmou o fato descrito na denúncia. Para melhor entendimento da questão, transcrevo trechos de seu relato, que foi nos seguintes termos:

"Ministério Público: o que o Natalicio fazia contigo? J.P.S: ele me estuprou. Ministério Público: descreve para mim o que era esse estuprar que tu falou. J.P.S.: me comer. Juiz: ele colocava na tua bunda, chegava a colocar? J.P.S.: sim." (...) "Juiz: o que ele disse pra fazer isso? J.P.S.: se não era pra mim fazer isso ele ia me matar."

Questionado, respondeu que o fato aconteceu em apenas uma oportunidade. Disse que morava com os pais na época e que não contou o acontecido para ninguém,...

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