Acórdão nº 50012170920188210064 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Criminal, 23-03-2022

Data de Julgamento23 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50012170920188210064
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001745080
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5001217-09.2018.8.21.0064/RS

TIPO DE AÇÃO: Furto (art. 155)

RELATOR: Desembargador Sérgio Miguel Achutti Blattes

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Na comarca de Santiago, perante a Vara Criminal, o Ministério Público ofereceu denúncia contra DAVI CORREIA DIAS, dando-o como incurso nas sanções do artigo 155, caput, na forma do artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, pela prática do seguinte fato delituoso:

No dia 19 de março de 2018, por volta das 11h30min, na Rua Tito Becon, nº 479, no interior do Supermercado Rede Vivo, em Santiago/RS, o denunciado DAVI CORREIA DIAS tentou subtrair, para si, coisas alheias móveis, consistentes em 06 (seis) barras de chocolate de marca Alpino, pertencentes ao estabelecimento SUPERMERCADO REDE VIVO, apenas não consumando o delito por circunstância alheia à sua vontade.

Na oportunidade, o denunciado, no interior do estabelecimento comercial, passou a esconder as referidas mercadorias em sua roupa e, ao notar que seria abordado por um fiscal da loja, tentou fugir do mercado sem pagar pelos produtos.

O delito apenas não se consumou por circunstância alheia à vontade do agente, uma vez que um funcionário do mercado notou as atitudes suspeitas do denunciado e conseguiu impedir que ele saísse do estabelecimento.

A res foi apreendida em poder do denunciado (auto de apreensão, fl. 05 do I.P.), sendo avaliada em R$ 34,74 (trinta e quatro reais e setenta e quatro centavos - auto de avaliação da fl. 12 do I.P.) e restituída ao estabelecimento vítima (auto de restituição, fl. 06 do I.P.).

Denúncia recebida em 26.06.2018.

Citado, o acusado apresentou resposta à acusação por intermédio da Defensoria Pública.

Durante a instrução, procedeu-se à oitiva da vítima e de duas testemunhas arroladas pela acusação, bem como ao interrogatório do réu.

Atualizados os antecedentes criminais.

Encerrada a instrução, o Ministério Público e a defesa apresentaram alegações finais escritas.

Sobreveio sentença, julgando procedente a pretensão acusatória, ao efeito de condenar o réu como incurso nas sanções do artigo 155, caput, na forma do artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, impondo-lhe pena de 08 meses de reclusão (basilar fixada em 01 ano, 02 meses e 07 dias, atenuada em 02 meses e 07 dias pela confissão espontânea e minorada em 1/3 em razão da tentativa, tornada definitiva diante da ausência de outras causas modificadoras), em regime inicial aberto, cumulada com multa de 10 dias-multa, à razão unitária mínima.

Substituída a pena privativa de liberdade por uma restritiva de direito consistente em prestação pecuniária no valor de 01 salário-mínimo.

Concedido o direito de recorrer em liberdade.

Sentença publicada em 27.04.2020.

Intimadas as partes, a Defesa interpôs recurso de apelação.

Em suas razões, requer a absolvição do réu (i) pela aplicação do princípio da insignificância ou (ii) pela irrelevância penal do fato. Subsidiariamente, pretente o redimensionamento da pena-base ao mínimo legal, a incidência das atenuantes da menoridade e da confissão espontânea, a aplicação da minorante da tentativa em seu grau máximo, o reconhecimento da privilegiadora insculpida no §2° do artigo 155 do Código Penal e a isenção da pena de multa.

Apresentadas as contrarrazões.

Nesta instância, emite parecer a douta Procuradoria de Justiça, manifestando-se pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas:

A defesa de Davi Correia Dias interpõe recurso de apelação em face da sentença que o condenou pela prática do crime de furto tentado.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do apelo.

De modo a introduzir o exame do mérito, transcrevo a síntese da prova produzida pelo juízo sentenciante:

Na hipótese concreta, a MATERIALIDADE restou devidamente comprovada através do registro de ocorrência (fls. 03/04); do auto de apreensão (fl. 05); do auto de restituição (fl. 06); do auto de avaliação indireta (fl. 12), bem como pela prova oral coligida nos autos.

No que tange à AUTORIA, igualmente está sobejamente comprovada e, incontestavelmente, recai sobre o denunciado Davi.

Do interrogatório:

O denunciado DAVI CORREIA DIAS, em juízo, confirmou a prática delitiva. Informou que, no dia do fato, entrou no mercado, pegou as barras de chocolate e tentou escondê-las na cintura. Mencionou que foi flagrado por alguns funcionários, que o levaram para a Delegacia. Alegou que pretendia trocar os chocolates por entorpecentes. Destacou que, à época do fato, era viciado em “crack”. Asseverou que faz tratamento para drogadição, sendo que, hoje em dia, não usa mais entorpecentes (fl. 45).

Da prova oral:

A testemunha CLÁUDIO GIOVANI DA SILVA, fiscal do mercado, em juízo, contou que, no dia do fato, visualizou o denunciado praticando o furto, oportunidade em que o levou para uma sala e chamou a polícia. Alegou que tentou fugir (fl. 53).

A policial militar DAIANE IBAIRROS MACHADO, em juízo, declarou que foram chamados, via 190, por um funcionário do mercado que havia detido o réu. Asseverou que ele viu o acusado pegando várias barras de chocolate e colocando dentro da roupa. Asseverou que não presenciou o fato, apenas conduziu o acusado para a Delegacia de Polícia. Contou que, quando chegaram, o acusado já não estava mais na posse dos chocolates. Frisou que conhece o denunciado de outras abordagens, pois ele ostenta várias ocorrências relativas a furto e posse de drogas. Disse que não tem conhecimento se os chocolates foram restituídos (fl. 109).

Pois bem.

Como se pode verificar, materialidade e autoria restam incontestes nos autos, tratando-se de réu confesso.

O cerne da questão consiste em aferir-se a aplicabilidade, ao caso concreto, do princípio da insignificância.

Consoante entendimento doutrinário e jurisprudencial, ao reconhecimento do princípio da insignificância é indispensável o preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos: i) mínima ofensividade do fato; ii) inexistência de periculosidade social; iii) reduzido grau de reprovabilidade da conduta; e iv) relativa inexpressividade da lesão ao bem jurídico. Ainda, no que tange ao delito de furto, a jurisprudência dos Tribunais Superiores é assente quanto à inaplicabilidade do aludido princípio nas hipóteses de reiteração delitiva e reincidência, estabelecendo, ainda, o standard objetivo de que a res furtivae não perfaça valor superior a 10% (dez por cento) do salário mínimo nacional vigente à época dos fatos. Nesse sentido, precedentes do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FURTO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. MULTIREINCIDÊNCIA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA DO ACÓRDÃO RECORRIDO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

Deve ser mantido o decisum reprochado, no que concerne à impossibilidade de aplicação do princípio da insignificância, pois, conforme "[a] jurisprudência desta Corte Superior está firmada no sentido da não incidência do princípio da insignificância nas hipóteses de reiteração de delitos e reincidência, como é o caso dos autos" (AgRg no AREsp n. 896.863/RJ, Sexta Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, DJe de 13/06/2016). Agravo regimental desprovido.

(AgRg no AREsp 1651813 / SE; Relator: Ministro FELIX FISCHER - Quinta Turma; Julgado em 19.05.2020)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FURTO QUALIFICADO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. CRIME IMPOSSÍVEL. SÚMULA N.º 567/STJ. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA N.º 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. O valor do bem subtraído - duas jaquetas avaliadas em R$ 459,80 - é muito superior a 10% (dez por cento) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Desse modo, a referida quantia, nos termos do entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça, não pode ser considerada insignificante.

2. O crime de furto foi qualificado pelo concurso de agentes. Assim, consoante o entendimento desta Corte Superior, a incidência da referida qualificadora objetiva denota a maior reprovabilidade da conduta e...

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