Acórdão nº 50012286520168210013 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 16-02-2023

Data de Julgamento16 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50012286520168210013
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003309191
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001228-65.2016.8.21.0013/RS

TIPO DE AÇÃO: Imissão

RELATOR: Desembargador JOAO MORENO POMAR

APELANTE: ELIANE DA SILVA (RÉU)

APELANTE: IVALINO RODRIGUES (RÉU)

APELANTE: JONATAN DA SILVA PAVLAK (RÉU)

APELADO: CESAR ANTONIO BISQUE (AUTOR)

RELATÓRIO

ELIANE DA SILVA, IVALINO RODRIGUES e JONATAN DA SILVA PAVLAK apelam da sentença proferida nos autos da ação de imissão na posse que lhes move CÉSAR ANTÔNIO BISQUE, assim lavrada:

Vistos.
Cesar Antônio Bisque ajuizou ação de imissão na posse com pedido liminar contra Jonathan da Silva e outros, alegando que adquiriu o imóvel matrícula nº 54.687 do RI de Erechim/RS, por meio de contrato de compra e venda, pelo valor de R$ 35.000,00.
Disse que, no prazo pactuado para tomada da posse, o imóvel estava ocupado por terceiros (réus), o que lhe impediu de exercer esse direito. Requereu tutela de urgência. Postulou a procedência do pedido de imissão. Pugnou pela AJG e trouxe documentos (fls. 10 a 25).
Deferida a AJG e indeferido o pedido liminar (fl. 26), desafiando agravo de instrumento, ao qual foi negado provimento (fls.
68 a 72).
Houve aditamento à inicial (fls.
48 e 49), recebido pelo juízo (fl. 50).
Realizada sessão de conciliação pelo CEJUSC (fl. 77).

Citados, os réus Jonathan, Eliane e Ivalino apresentaram contestação (fls.
79 a 89). Preliminarmente, arguiram a ilegitimidade passiva de Jonathan e Ivalino. No mérito, argumentaram que não firmaram contrato de compra e venda com a parte autora. Disseram que a declaração de quitação foi dada pelo ex-marido de Eliane, Valdecir. Referiram que Eliane foi coagida/ameaçada a assinar os recibos. Mencionaram que sempre residiram no imóvel. Invocaram a nulidade do negócio jurídico. Discorreram sobre a incapacidade da ré Eliane. Requereram a improcedência. Juntaram documentos (fls. 90 a 99).
Em reconvenção (fls.
100 a 109), pediram, em suma, a anulação do contrato de compra e venda e acostaram documentos (fls. 110 a 143).
Deferida a AJG aos réus/reconvintes, recebida a reconvenção e deferida a reintegração de posse dos réus (fl. 150).

O autor/reconvindo apresentou contestação (fls.
158 a 161). Pediu a extinção da reconvenção, pois não observado o litisconsórcio unitário. No mérito, refutou a alegação de nulidade do negócio jurídico.
Houve réplica à ação principal (fls.
162 a 164).
Determinada a intimação dos réus/reconvintes para regularização do polo ativo da reconvenção (fl. 166), manifestando-se pela inclusão e pedido de citação (fls.
168 e 169).
Citado Valdecir (fl. 186), não se manifestou (fl. 187v).

Instadas as partes acerca do interesse na produção de provas (fl. 188), manifestaram-se (fls.
190 e 191; 192 e 193).
Realizada audiência, foi colhida a prova oral e encerrada a instrução (fls.
209 a 211).
As partes apresentaram memoriais (fls.
213 a 215; 216 a 218). O Ministério Público se manifestou (fl. 227).
Convertido o julgamento em diligência, sendo deferida a produção de prova pericial (fl. 229)
Sobreveio o laudo pericial (fls.
238 a 245), manifestou-se a parte autora/reconvinda (fls. 247 a 249).
O Ministério Público opinou pela procedência (fls.
251 a 254).
Vieram-me, então, os autos conclusos para sentença.

É o relatório. Decido.
Ao que se recolhe dos autos, a pretensão do autor CESAR é de imissão na posse do imóvel registrado no RI de Erechim sob nº 54.687, adquirido através de contrato particular de compra e venda (fls. 16 e 17).
O autor, a título de proprietário, busca a posse desse imóvel, jamais adquirida, conforme alega.

Em reconvenção, os réus JONATAN, ELIANE e IVALINO pediram a anulação do contrato de compra e venda, sob o argumento de que ELIANE (alienante), no momento da celebração do negócio, não gozava de capacidade civil plena (arts.
166, I, e 171, I, ambos do CC).
O Ministério Público opinou pela realização de prova pericial (fl. 227), a fim de averiguar se o preço da compra e venda foi compatível com o preço de mercado da época, que foi deferida (fl. 229), sendo confeccionado o laudo (fls.
238 a 245).
Pois bem.
Logo de saída cumpre esclarecer que o preço do negócio, per se, ainda que fosse inferior ao de mercado, não evidenciaria qualquer invalidade, notadamente numa relação jurídica paritária, estabelecida entre iguais, regida pelo estatuto civil ordinário (CC), já que o equilíbrio entre as prestações, nesse caso, deve ser aquilatado unicamente pelas partes que formalizaram a avença, em atenção à liberdade de contratar e ao princípio da pacta sunt servanda.

O preço do negócio pode, assim, na espécie, revelando-se excessivamente discrepante da normalidade, apenas ser examinado como elemento indiciário de eventual falta de discernimento do praticante do ato a respeito das consequências economicamente negativas do negócio celebrado, indicando a incapacidade, essa sim, causa jurídica hábil à sua invalidação (arts. 166, I, e 171, I, ambos do CC).
Isso dito, é de rigor concluir que a parte ré/reconvinte não se desincumbiu de comprovar a pretensa incapacidade de ELIANE ao tempo da contração, ônus que lhe competia (art. 373, I, do CPC), o que impede o acolhimento da pretensão anulatória, conforme parecer ministerial (fls.
251 a 254).
Nesse sentido:

Ementa: Apelação cível. Ação denominada de desfazimento de negócio jurídico. Compra e venda, entre irmãs, de parte de imóvel. Pretensão de anulação da escritura pública de compra e venda. Alegação de lesão no negócio jurídico por vício de consentimento. Incapacidade da parte vendedora. Prova. A parte que postula a anulação de escritura pública de compra e venda de imóvel possui o ônus de provar a perda da capacidade de discernimento da vendedora quando da realização do contrato e da outorga da escritura. Sem demonstração que a vendedora já tinha deixado de gozar de sua capacidade de discernimento quando da compra e venda, julga-se improcedente a ação anulatória. Apelação desprovida.(Apelação Cível, Nº 70074667494, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Cini Marchionatti, Julgado em: 11-10-2017)

A prova oral (fl. 211) não conforta a tese dos réus/reconvintes.
O depoimento de Marcia Bittencourt, assistente social, foi elucidativo, seja com relação à manifestação de vontade de ELIANE, pois afirmou ter sido procurada por ela e pelo autor, pois havia interesse na venda do imóvel, situação possível junto ao município desde que quitados os débitos, seja com relação ao valor, pois esclareceu que as condições de conservação do imóvel eram desfavoráveis, sem manutenção por período de 5 anos.
Sobre eventual coação/ameça, disse que não houve relato de ELIANE a respeito, tanto que ela teria dito que compraria outro imóvel próximo de seu irmão, em outra cidade.
Os demais depoimentos, de vizinhos do imóvel, são consonantes quanto às condições precárias que se encontrava o bem.
Quanto ao negócio em si, não trouxeram elementos que pudessem comprometer o ajuste, como a coação/ameaça alegadamente sofrida por ELIANE.
Para que não passe sem enfrentamento, sinalo que eventual ausência de repasse do valor recebido por VALDECIR (também vendedor) à ELIANE, se for o caso, deve ser resolvida em ação autônoma, não devendo o autor ser prejudicado pelos desacertos havidos entre os vendedores, na época, cônjuges/companheiros.

Quanto ao preço do imóvel, de se dizer que foi vendido por R$ 35.000,00 (fls.
16 e 17), sendo que a avaliação alcançou R$ 72.000,00 para o ano de 2016 (fls. 242).
Embora haja diferença não desprezível entre os valores, certo é que não se pode considerar aquele valor de venda como preço vil, porquanto vil, atualmente, somente se pode reconhecer o preço que esteja aquém de 50% do valor de avaliação, pois é esse o critério eleito pelo ordenamento nos casos de alienação coativa, aplicável analogicamente na hipótese, onde a alienação foi voluntária (art. 891 do CPC).

De outra ponta, a redução do preço de venda, no caso, muito provavelmente estava atrelada ao mau estado de conservação do imóvel e à forma de pagamento do preço, circunstâncias que justificavam o valor transacionado.

Seja como for, repete-se aqui o que ao início se disse: o preço do negócio, per se, ainda que fosse inferior ao de mercado, não evidenciaria qualquer invalidade, notadamente numa relação jurídica paritária, estabelecida entre iguais, regida pelo estatuto civil ordinário (CC), já que o equilíbrio entre as prestações, nesse caso, deve ser aquilatado unicamente pelas partes que formalizaram a avença, em atenção à liberdade de contratar e ao princípio da pacta sunt servanda.

Assim, improcede o pleito reconvencional.

Diante isso, comprovado o pagamento do preço, a imissão na posse é medida que se impõe.

Ante o exposto:
1. julgo procedente o pedido ajuizado por CESAR ANTONIO BISQUE, para determinar a sua imissão na posse do imóvel descrito na inicial; e
2.
julgo improcedente a reconvenção, ficando mantida a medida liminar (fl. 150), contudo, dadas as peculiaridades envolvendo a posse do bem (fls. 26, 68 a 72 e 150), até o trânsito em julgado desta decisão ou a interposição de recurso destituído de efeito suspensivo.
Condeno os réus/reconvintes a pagar as custas processuais e os honorários de advogado, que fixo em 10% do valor atualizado da causa (art. 85, §2º, do CPC), observada a AJG deferida aos réus/reconvintes.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

A decisão foi alvo de embargos de declaração (fls. 262-264) que restaram desacolhidos (fl. 265).

Nas razões sustenta que a decisão deve ser revista, haja vista que conforme fls. 216 e seguintes a parte ré Eliane, bem como, fls 120 e seguintes, ao contrário do alegado por vossa excelência, juntou sim provas de sua incapacidade civil, esta que se deu em um processo conduzido sob o número 01311600044963; que Eliane há muitos anos antes da...

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