Acórdão nº 50012405020198210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 01-03-2023

Data de Julgamento01 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50012405020198210021
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003299079
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001240-50.2019.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Práticas Abusivas

RELATORA: Desembargadora CLAUDIA MARIA HARDT

APELANTE: MARIA MARIBEL DE AGUIAR VIEIRA (AUTOR)

APELADO: ASBAPI-ASSOCIACAO BRASILEIRA DE APOSENTADOS, PENSIONISTAS E IDOSOS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pela autora, MARIA MARIBEL DE AGUIAR VIEIRA, contra sentença de parcial procedência proferida em ação declaratória de inexigibilidade de débito c/c pedido de indenização por danos materiais e morais, ajuizada em desfavor de ASBAPI-ASSOCIACAO BRASILEIRA DE APOSENTADOS, PENSIONISTAS E IDOSOS.

A fim de contextualizar a inconformidade recursal, reproduzo o relatório da sentença proferida pelo eminente Dr. JOAO MARCELO BARBIERO DE VARGAS (3ª Vara Cível da Comarca de Passo Fundo) – evento 67, SENT1:

VISTOS ETC.

MARIA MARIBEL DE AGUIAR VIEIRA ajuizou a presente Ação Declaratória de Inexigibilidade de Débito c/c Indenização por Danos Materiais e Morais em face de ASBAPI - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE APOSENTADOS, PENSIONISTAS E IDOSOS, alegando que obteve confirmação de que entre os meses de novembro/2018 e fevereiro/2019 a instituição ré promoveu cobranças mensais em seu benefício previdenciário (Pensão por Morte), sob a insígnia “CONTRIBUICAO ASBAPI”, sem a sua autorização. Referiu desconhecer relação jurídica que justifique a conduta arrecadatória da ré. Discorreu sobre os danos materiais e morais causados pela conduta da ré, gerando o dever de indenizar. Fundamentou sua pretensão nos arts. 186 e 927 do Código Civil e no art. 5º, incs. X e XXXV, da Constituição Federal. Postulou a procedência da ação, para declarar a inexigibilidade da cobrança dos valores indevidamente descontados do benefício previdenciário nº 041.083.045-3, determinando-se que a ré abstenha-se de promover novos descontos, e condenar a deamndada ao pagamento de uma indenização pelos danos materiais no valor de R$ 217,42 e a título de danos morais no montante de R$ 9.980,00. Juntou documentos.

Após emenda à inicial, foi deferida a gratuidade judiciária.

Citada, a ré apresentou contestação. Sustentou a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, em especial do disposto no art. 42, de modo a afastar a repetição em dobro, e a necessidade de ser respeitado o princípio pacta sunt servanda. Aduziu que a autora autorizou os descontos em seu benefício previdenciário para associação à entidade ré. Mencionou que os descontos foram cancelados, inexistindo obrigação indenizatória, ante a ausência de dolo na sua conduta. Refutou o pedido de condenação a título de danos morais e materiais. Postulou a improcedência da ação. Acostou documentos.

Houve réplica, onde a autora rebateu os argumentos da contestação.

Instadas as partes a manifestarem-se sobre o interesse na produção de outras provas, ambas postularam o julgamento antecipado do processo.

O julgamento foi convertido em diligências, a fim de determinar a expedição de ofício ao INSS e intimar a parte ré para juntada de comprovante de rendimentos.

Sobreveio resposta do INSS, com vista às partes, e foi deferida a gratuidade judiciária à ré.

E o dispositivo sentencial assim estabeleceu:

ISSO POSTO, julgo parcialmente procedente a pretensão da autora, para declarar a inexigibilidade do débito referente aos descontos sob a denominação “Contribuição ASBAPI”, determinar o cancelamento definitivo dos descontos mensais realizados no benefício previdenciário percebido pela demandante e condenar a demandada a restituir em dobro os valores indevidamente cobrados e adimplidos pela demandante relativamente a essa rubrica, corrigidos monetariamente pelo IGP-M desde os respectivos desembolsos/descontos no benefício previdenciário e acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês a contar da citação.

Outrossim, diante da recíproca sucumbência (art. 86, “caput”, do CPC), condeno ambas as partes a arcarem com as custas processuais, na proporção de 70% para a ré e 30% para a autora, e honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, arbitrados estes 15% sobre o valor atualizado da causa, considerando o trabalho exigido e a natureza da demanda, observados a mesma proporção das custas e os parâmetros do art. 85 do Código de Processo Civil, vedada a compensação com base no art. 85, § 14, do Código de Processo Civil, cuja exigibilidade fica suspensa em relação à autora por litigar ao abrigo da gratuidade judiciária (art. 98, § 3º, do CPC).

Em suas razões recursais, a autora alega estar configurado o dano moral, uma vez que a cobrança ilícita de contribuições, mediante desconto em benefício previdenciário, promoveu a privação de verba alimentar da apelante, causando-lhe lesão à honra e à dignidade. Assevera trata-se de ato doloso, vedado expressamente pelo art. 39, III, do CDC. Pondera que o cenário e as peculiaridades do caso em concreto demonstram que a privação do recebimento da integralidade de seus proventos em razão dos lançamentos ilícitos efetuados pela apelada excede substancialmente o mero dissabor ou aborrecimento. Requer também a majoração dos honorários advocatícios. Pugna pelo provimento do recurso, com a condenação da ré ao pagamento de reparação por danos morais, bem como com a majoração dos honorários advocatícios (evento 71, APELAÇÃO1).

Intimada, a parte ré ofereceu contrarrazões (evento 76, CONTRAZ1).

Vieram os autos à apreciação desta Corte.

VOTO

De início, a peça recursal foi interposta tempestivamente e atende aos requisitos do art. 1.010 do Código de Processo Civil/2015, razão pela qual conheço do apelo.

Em sua peça inaugural, alega a autora que entre os meses de novembro de 2018 e fevereiro de 2019 a instituição ré promoveu cobranças mensais em seu benefício previdenciário (Pensão por Morte), sob a insígnia “CONTRIBUICAO ASBAPI”. Alegou desconhecer relação jurídica que justifique a conduta arrecadatória da ré. Pede a declaração de inexigibilidade da dívida, a devolução em dobro dos valores indevidamente descontados de seu benefício previdenciário, de R$ 108,71 (cento e oito reais e setenta e um centavos), e a condenação da demandada ao pagamento de reparação por danos morais, indicando o valor de R$ 9.980,00.

Analisadas as provas produzidas na demanda, tenho que merece acolhimento a tese da autora.

O Magistrado de origem acolheu o pedido declaratório formulado, e de condenação da associação ré à restituição em dobro dos valores indevidamente exigidos, tendo apenas a demandante apresentado insurgência.

Portanto, superado o exame da fraude perpetrada e da imputação indevida de contribuição associativa, bem como da legitimdade dos descontos.

Relativamente ao pleito de reparação por dano moral, indubitavelmente restaram evidenciados o ato ilícito e o nexo de causalidade, bem como os prejuízos extrapatrimoniais sofridos pela apelante em virtude do desconto de valor de contribuição por associação não demonstrada, restando a autora desprovida de parte de sua verba alimentar, no valor mensal de R$ 19,08, aviltando assim sua dignidade, ainda que de pequena monta, mas tendo em conta o módico benefício, de R$ 954,00 em dezembro de 2018, a ensejar a obrigação da apelada em reparar os danos morais pleiteados na peça inaugural, nos termos dos artigos 186 e 187 c/c art. 927, todos do Código Civil.

Nesse diapasão:

AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. DANOS MORAIS CARACTERIZADOS. QUANTUM INDENIZATÓRIO REDUZIDO. I. NO CASO CONCRETO, O REQUERIDO NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE PROVAR A EXISTÊNCIA DA CONTRATAÇÃO DO EMPRÉSTIMO CONSIGNADO, NA FORMA DO ART. 6º, VIII, DO CDC, E ART. 373, II, DO CPC, RAZÃO PELA QUAL DEVE SER RECONHECIDA A INEXISTÊNCIA DESTA OPERAÇÃO BANCÁRIA. INCLUSIVE, O FATO DE SE TRATAR DE FRAUDE PRATICADA POR TERCEIRO NÃO AFASTA A RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA (ART. 14, DO CDC), A QUAL NÃO ADOTOU MAIORES CUIDADOS AO EFETUAR O CADASTRO DA PARTE AUTORA, DEIXANDO DE SE CERTIFICAR QUANTO A VERACIDADE DOS DADOS PESSOAIS FORNECIDOS. II. ASSIM SENDO, DIANTE DA AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO, É DEVIDA A RESTITUIÇÃO DOS VALORES EFETIVAMENTE DESCONTADOS. NESTE PARTICULAR, DEVE SER MANTIDA A DEVOLUÇÃO EM DOBRO, EIS QUE AUSENTE ENGANO JUSTIFICÁVEL, A TEOR DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO. III. QUANTO AOS DANOS MORAIS, A HIPÓTESE DE DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO CONFIGURA O DANO MORAL IN RE IPSA OU DANO MORAL PURO, UMA VEZ QUE O SOFRIMENTO, A ANGÚSTIA E O TRANSTORNO CAUSADOS PELA PARTE REQUERIDA SÃO PRESUMIDOS, CONFERINDO O DIREITO À REPARAÇÃO SEM A NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE OUTRAS PROVAS. VALE DIZER QUE O PRÓPRIO FATO JÁ CONFIGURA O DANO. IV. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO, TENDO EM VISTA A CONDIÇÃO SOCIAL DO AUTOR, O POTENCIAL ECONÔMICO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, O CARÁTER PUNITIVO-PEDAGÓGICO DA REPARAÇÃO, A GRAVIDADE DO FATO E OS PARÂMETROS ADOTADOS POR ESTA CÂMARA EM CASOS SEMELHANTES. A CORREÇÃO MONETÁRIA PELO IGP-M INCIDE A PARTIR DO PRESENTE ARBITRAMENTO, NA FORMA DA SÚMULA 362, DO STJ, ENQUANTO OS JUROS MORATÓRIOS DE 1% INCIDEM DESDE O EVENTO DANOSO, EM CONFORMIDADE À SÚMULA 54, DO STJ, EIS QUE SE TRATA DE...

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