Acórdão nº 50012461920188210142 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Criminal, 20-06-2022

Data de Julgamento20 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50012461920188210142
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSétima Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002269810
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5001246-19.2018.8.21.0142/RS

TIPO DE AÇÃO: Contravenções Penais

RELATOR: Desembargador HONORIO GONCALVES DA SILVA NETO

RELATÓRIO

Trata-se de ação penal proposta em face de J. P. K., a quem atribuiu o Ministério Público a prática da conduta descrita no artigo 24-A da Lei 11.340/06.

Isso porque:

No dia 27 de novembro de 2018, por volta de 20h30min, na Rua 07 de Julho, Bairro Bom Pastor, no município de Igrejinha/RS, o denunciado J. P. K. descumpriu decisão judicial que deferiu medidas protetivas de urgência previstas na Lei n.º 11.340/06, em prol da vítima C. A. Na ocasião, após ter sido deferida medida protetiva de urgência de proibição de contato e de aproximação com a vítima C. A., nos autos do expediente n. 142/2.18.0002603-0, o denunciado J. P. K., mesmo ciente da decisão judicial (conforme sua intimação no documento em anexo), descumpriu a determinação tentando adentrar na residência da vítima e jogando pedras nos vidros da casa.

Recebida a denúncia, foi o réu citado, apresentando resposta à acusação, por defensor público, sem arrolar testemunhas.

Instruído o feito, foram oferecidos memoriais em substituição aos debates, sobrevindo decisão em que a magistrada, julgando procedente a denúncia, condenou o réu, por incurso nas sanções do artigo 24-A da Lei 11.340/06, à pena de três meses e quinze dias de detenção, em regime aberto.

Irresignado, apela o acusado, suscitando preliminar de nulidade do feito, ante a ausência de citação do acusado. No mérito, pretende solução absolutória, aos argumentos da inconstitucionalidade do delito previsto no artigo 24-A da Lei 11.340/06, por configurar bis in idem em razão da possibilidade de aplicação de sanções processuais como a prisão preventiva. Afirma presente excludente de culpabilidade em razão da drogadição e da embriaguez habitual do réu. Postula solução absolutória também em razão da atipicidade material do fato, ante o desinteresse da vítima na condenação e a reconcilição do casal. Subsidiariamente, requer o afastamento da agravante da reincidência e a redução da pena ao mínimo legal. Por fim, postula a substituição da sanção carcerária por pena restritiva de direitos, ao argumento de que a reincidência não é específica.

Com contrarrazões, manifestou-se o Ministério Público pelo desprovimento da apelação.

VOTO

Vê-se suscitar a defesa, preliminarmente, a nulidade prevista no artigo 564, inciso III, "e", do Código de Processo penal, ao argumento de que o réu não foi citado.

Não lhe assiste razão.

Embora não logrado êxito no cumprimento da carta precatória de citação expedida em 19 de dezembro de 2018 (por ter obtido o réu liberdade provisória), observa-se que o acusado, posteriormente, compareceu em cartório por diversas vezes, nas datas de 24 de abril (fl. 109), 31 de julho (fl. 111, oportunidade em que intimado da audiência de instrução e julgamento, diga-se) e 18 de novembro de 2019 (fl. 120), razão por que tenho por sanada a falta de citação, nos termos do artigo 570 do Código de Processo Penal1.

Vai, pois, repelida a prefacial arguida.

Da mesma forma, revela-se despropositada a alegação de inconstitucionalidade do artigo 24-A da Lei nº 11.340/06, ao argumento da presença de bis in idem, em virtude da possibilidade de decretação de prisão preventiva do acusado.

Vê-se pretender o apelante, em verdade, aplicar, por analogia, o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça e por esta Corte anteriormente à edição da Lei nº 13.641/2018, no que tange a não configuração do delito de desobediência na hipótese de descumprimento de medidas protetivas.

Ora, tal orientação, fundada na inequívoca subsidiariedade que marca o crime de desobediência – tem aplicação somente quando a lei não prever consequências específicas para o descumprimento –, é, à evidência, inaplicável ao particular, especialmente porque o artigo 24-A da Lei nº 11.340/06 traz figura típica que expressamente ressalva que “[o] disposto neste artigo não exclui a aplicação de outras sanções cabíveis (artigo 24-A, § 3º, da Lei nº 11.340/06).

Mais, a possibilidade de o descumprimento de medida protetiva ensejar a decretação de prisão preventiva, por óbvio, não caracteriza o aventado bis in idem, tampouco conduz à inconstitucionalidade alegada, mormente porque a segregação não constitui sanção processual, como alegado, senão que medida cautelar sujeita à verificação de pressupostos de necessidade e adequação.

E, repelida a inconstitucionalidade aventada, não há falar na atipicidade da conduta consistente em “descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência”.

Quanto ao mais, mostra-se evidenciado o fato consistente em que o acusado descumpriu as medidas protetivas de urgência deferidas em prol da ex-companheira, dirigindo-se à residência dessa, gritando e jogando pedras nos vidros.

Tanto resulta das declarações prestadas pela ofendida, que confirma a ocorrência dos fatos da forma como consignados na denúncia.

Veja-se resumo da prova oral contido na sentença:

A vítima C. A. disse ter pedido medidas protetivas e que após isso o réu a procurou algumas vezes. Referiu que na noite em que o réu foi preso esteve em sua casa, tendo sido preso na frente do local. Ressaltou que, na data dos fatos, o réu estava sem tomar os seus remédios, visto que é bipolar. Asseverou que o réu gritou e jogou pedras, chegando a danificar um carro. Ressaltou que a polícia foi chamada e que com isso o réu empreendeu fuga. Aduziu que os policiais encontraram e prenderam joão. Disse não se recordar se ligou para a polícia, acha que podem ter sido os vizinhos. Frisou ter ficado com medo da situação. Declarou não se recordar de quantos registros de ocorrência fez contra o réu e que após o fato se reconciliaram. Contou que costumavam conversar sobre os bens adquiridos pelos dos dois e retomaram o relacionamento depois da soltura do réu.

O acusado não foi interrogado, face à sua revelia, decretada à fl. 53, uma vez que injustificadamente deixou de comparecer na audiência.

Em tal contexto, com respeito ao delito de descumprimento de medida protetiva, tem-se que a ofendida foi categórica ao narrar em juízo – diga-se, tal qual fez em sede inquisitorial – que, após o deferimento das medidas protetivas, o réu procurou-a, dirigindo-se à resiência dela, gritando e jogando pedras contra o imóvel.

Mais, deixa à mostra a ciência do réu quanto ao descumprimento da ordem judicial a intimação quanto à vigência das medidas, datada de 23 de outubro de 2018 (fl. 25 dos autos originais2), oportunidade em que foi cientificado da vigência das medidas protetivas que o proibiam de "se aproximar em distância...

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