Acórdão nº 50012607320228210041 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 23-02-2023

Data de Julgamento23 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50012607320228210041
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003195687
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001260-73.2022.8.21.0041/RS

TIPO DE AÇÃO: Seguro

RELATOR: Desembargador NIWTON CARPES DA SILVA

APELANTE: RIO GRANDE SEGUROS E PREVIDENCIA S.A. (RÉU)

APELADO: CAMILA SANTOS DE OLIVEIRA MOREIRA (AUTOR)

APELADO: ARTHUR DE OLIVEIRA MOREIRA (AUTOR)

APELADO: ISABELLI DE OLIVEIRA MOREIRA (AUTOR)

RELATÓRIO

CAMILA SANTOS DE OLIVEIRA MOREIRA, ARTHUR DE OLIVEIRA MOREIRA e ISABELLI DE OLIVEIRA MOREIRA, ajuizou a presente ação de cobrança cumulada com indenização por danos morais em face de RIO GRANDE SEGUROS E PREVIDÊNCIA S.A., igualmente qualificados. Asseverou, em síntese, que são filhos e viuvá do segurado, Sr. Paulo Roberto Ferreira Moreira, que veio a óbito, em 02/07/2021, morte natural (apólice de nº 93.704.864, proposta e certificado individual de nº 930020113810 - Banrisul Seguro Vida Empresarial Mais), cujo montante do capital global total segurado seria na quantia de R$ 72.745,34 (...). Aduziram que após a morte do segurado, a demandada teria refutado o emolumento do prêmio, sob a alegação de carência de cumprimento de exigência contratual, visto que, para fins de contratação do supracitado seguro, careceriam a participação de ao menos três segurados principais, e a proposta de adesão preenchida pelo de cujus em 23/04/2018, informava que a empresa deteria de dois funcionários e um sócio principal.Todavia, foi apurado que consoante a GFIP/SEFIP do mês da contratação do seguro (04/2018), consistiria somente o empresário individual, isto é o segurado principal.Mencionaram que a proposta foi integralizada pelo Banrisul, que sabia a profissão do segurado e que o mesmo pesquisava sobre seguro de vida. Requereram AJG. Juntou documentos.Postularam a procedência da demanda, a fim do pagamento do prêmio securitário e das despesas com o funeral, bem como indenização por danos morais.

Sobreveio sentença que julgou parcialmente procedente, a pretensão dos autores e condenou a requerida ao pagamento da indenização securitária, corrigido monetariamente pelo IGP-M, desde o a data do falecimento e acrescido de juros de 1% ao mês, a contar da citação. Ante a sucumbência recíproca, condenou a parte autora ao pagamento de 30% das custas e dos honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da condenação, nos termos do artigo 85, §2º, do CPC. De outro lado, condenou o réu ao pagamento de 70% das custas processuais e dos honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da condenação. Suspensa a exigibilidade em face do autor ser beneficiário da gratuidade de justiça.(evento 39, SENT1).

O réu opôs embargos de declaração consoante (evento 50, EMBDECL1), contudo os aclaratórios foram desacolhidos (evento 63, SENT1).

A seguradora, em suas razões, sustentou que a indenização securitária não é devida, uma vez que, conforme previsto no contrato de seguro, não é permitida a manutenção desta apólice, composta exclusivamente por um único sócio.Disse que o segurado informou que havia 1 sócio e 2 funcionários no ato da contratação da apólice o que não retrata a realidade da empresa, uma vez que comprovado, através da GFIP\SEFIP, que a empresa só tinha um único funcionário, o próprio de cujus. Assim, alegou o agravamento do risco com as informações incorretas do segurado, postulando o julgamento de improcedência dos pedidos (evento 72, APELAÇÃO1).

Foram apresentadas contrarrazões (evento 78, CONTRAZAP1).

Os autos vieram-me conclusos em 30/11/2022 .

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas. Trata-se, como visto do sumário relatório, de ação de cobrança de indenização securitária, assistência funeral e danos morais, referente ao contrato de seguro de vida empresarial, julgada parcialmente procedente na origem.

Pretende a seguradora ré desincumbir-se da obrigação de pagamento da indenização securitária decorrente de contrato de seguro de vida empresarial, celebrado pela empresa do segurado, (apólice n. 93.704.864) - Banrisul Seguro Vida Empresarial Mais, consoante (evento 1, DOC7) argumentando, para tanto, que as partes autoras forneceram informações inexatas quando da contratação, consistente no número de colaboradores da empresa, o que impede o pagamento da indenização.

Assinalo, ab initio, que o caso em testilha deve ser apreciado à luz do Código de Defesa do Consumidor, na medida em que se trata de relação de consumo, consoante traduz o artigo 3º, §2º do CDC, sic:

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. (grifei)

Sendo assim, é inocultável a incidência e regulação do Código de Defesa do Consumidor, em vista de que se trata de típico contrato de adesão, sendo manifesta a fragilização da pacta sund servanda, uma vez que o contrato, embora bilateral, resultou em margem mínima de discutibilidade por parte da aderente, utente da garantia e, nessa condição, inferiorizada contratualmente.

Logo, possível é a adequação dos contratos de seguro aos ditames legais, de modo a viabilizar inclusive, se for o caso, a decretação da nulidade pleno iure das cláusulas que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou seja, incompatíveis com a boa-fé ou a equidade (artigo 6º, inciso V c/c artigo 51, inciso IV do Código de Defesa do Consumidor).

Nesse sentido, aliás, tem se manifestado o magistério jurisprudencial deste egrégio Tribunal de Justiça, expressis verbis:

APELAÇÃO CÍVEL. SEGUROS. AÇÃO DE COBRANÇA DE COBERTURA SECURITÁRIA. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. INVALIDEZ FUNCIONAL PERMANENTE TOTAL POR DOENÇA - IFPD. PERDA DA CONDIÇÃO DE VIDA INDEPENDENTE. ABUSIVIDADE. INDENIZAÇÃO DEVIDA. 1. Comprovada a invalidez permanente do autor para o serviço militar, em razão de doença incurável, mostra-se devida a indenização securitária. 2. Aplicação do artigo 47 do CDC, que determina a interpretação das cláusulas contratuais de maneira mais favorável ao consumidor. 3. Abusividade da cláusula contratual que estabelece a necessidade de perda da existência independente do segurado para o recebimento da indenização. Dever de cobertura mantido. 4. Prequestionamento da legislação invocada conforme estabelecido pelas razões de decidir, seguindo compreensão do disposto no art. 1.025 do CPC. 5. Sucumbência recursal devida, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70076913466, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Isabel Dias Almeida, Julgado em 28/03/2018)

APELAÇÃO CÍVEL. REEXAME NECESSÁRIO. SEGUROS. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. INVALIDEZ FUNCIONAL PERMANENTE POR DOENÇA. AÇÃO DE COBRANÇA. A CONCESSÃO DE APOSENTADORIA PELO INSS FAZ PROVA RELATIVA DA INVALIDEZ, CABENDO PROVA PERICIAL A FIM DE COMPROVAR A INCAPACIDADE DO SEGURADO. PRECEDENTES DO EGRÉGIO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INVALIDEZ FUNCIONAL POR DOENÇA. APLICAÇÃO DO CDC. IMPOSSIBILIDADE DE VINCULAÇÃO À PERDA DA EXISTÊNCIA INDEPENDENTE DO SEGURADO. ABUSIVIDADE DA REFERIDA CLÁUSULA. COBERTURA SECURITÁRIA DEVIDA DE ACORDO COM O PACTUADO. POR MAIORIA, NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. (Apelação e Reexame Necessário Nº 70064890304, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ney Wiedemann Neto, Redator: Rinez da Trindade, Julgado em 27/08/2015)

Acrescente-se, ainda, ser um direito básico do consumidor a informação clara e adequada sobre os produtos e serviços disponibilizados no mercado pelos fornecedores, nos termos do artigo 6º, inciso III, do Estatuto Consumerista, in verbis:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(...)

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

Caso a seguradora estivesse em desacordo com alguma informação lançada na proposta realizada pela requerente, especialmente quanto ao número de empregados na empresa, cabia a ela checar a informação no ato da contratação e se fosse o caso não aceitar a realização da apólice. Caberia também a seguradora cientificar o segurado formalmente sobre a não aceitação da proposta e do pagamento do prêmio, o que não foi realizado, não podendo agora alegar ausência de atendimento aos requisitos do seguro contratado, com o único intuito de não pagar a indenização devida.

Ademais, de acordo com art. 47 do CDC as cláusulas contratuais devem ser interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor, e em se tratando de contrato de seguro, a seguradora só poderá se exonerar de sua obrigação se ficar comprovado o dolo ou a má-fé do segurado, agravamento ou exclusão do risco, situação não verificada nos autos, sic.

Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.

A situação retratada nos autos demonstra a boa-fé por parte do segurado, a qual contratou o seguro de vida para garantir indenização em caso de invalidez, morte e auxílio funeral, efetuando regularmente o pagamento do prêmio. Entendimento contrário afrontaria o referido princípio, além de gerar insegurança aos consumidores, os quais mesmo pagando...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT