Acórdão nº 50012643320148210028 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sexta Câmara Cível, 05-05-2022

Data de Julgamento05 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50012643320148210028
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Sexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002026072
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

16ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001264-33.2014.8.21.0028/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por Dano Moral

RELATORA: Desembargadora VIVIAN CRISTINA ANGONESE SPENGLER

APELANTE: TEODORO ALEXANDRE BURKLE & CIA.LTDA. - ME (AUTOR)

APELADO: BMC HYUNDAI S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por TEODORO ALEXANDRE BURKLE & CIA. LTDA. - ME em face de sentença proferida nos autos da ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada contra BMC HYUNDAI S/A, cujo dispositivo foi assim exarado:

Pelo exposto, julgo IMPROCEDENTE a demanda.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas judiciais, das despesas processuais e dos honorários de sucumbência da parte requerida, que fixo em 10% sobre o valor da causa (que é R$ 100.000,00, conforme incidente de impugnação ao valor da causa nº 028/1.15.0001566-7 – fls. 88/90), em razão da não complexidade do feito, forte no art. 85, § 2º, incisos I ao IV, do CPC/15.

Em seu arrazoado recursal, relata o apelante que adquiriu da parte ré uma retroescavadeira, pelo valor da R$ 220.000,00, mas a máquina apresentou problemas desde o primeiro mês de uso. Apesar de ter passado quatro vezes pela assistência técnica, tendo sido consertada, foi alegado pela requerida o seu mau uso. Mesmo que não seja destinatário final do bem, está em situação de vulnerabilidade em relação à apelada, sendo viável a incidência do CDC no caso dos autos e, portanto, a teoria do risco do empreendimento, prescindindo-se a demonstração de culpa para que o fornecedor de serviços ou bens responda civilmente pelos danos ocasionados. No caso dos autos, foi impossibilitado de realizar serviços durante dois meses (de outubro de 2013 a dezembro de 2013), pois a empresa prestadora de serviços de assistência técnica possui sede em Porto Alegre. Assim, deixou de auferir lucros com a retroescavadeira “parada”, mostrando-se desnecessária a realização de mais provas, pois a demora injustificada ou as manutenções meramente protelatórias para conserto do bem, privando o autor de usufruir dele e de cumprir seus compromissos com clientes, configura dano moral passível de ser indenizado. Pede a reforma da sentença recorrida, a fim de que a ré seja condenada ao pagamento de indenização por danos materiais (lucros cessantes) e danos morais.

Foram apresentadas as contrarrazões.

Subiram os autos a esta Corte para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, passo ao exame do recurso.

Os autos versam sobre ação de indenização por danos materiais e morais proposta por TEODORO ALEXANDRE BURKLE & CIA. LTDA. - ME contra BMC HYUNDAI S/A, sendo descrito na inicial que no dia 19/09/2013 a autora comprou uma retroescavadeira marca Hyundai, modelo H940C, 4x4, com cabine, pelo valor de R$ 220.000,00, sendo paga integralmente. Após receber o bem, este, com menos de um mês de uso, começou a apresentar vários problemas, tendo sido enviado para a assistência técnica (KUNZLER Máquinas Ltda., de Porto Alegre) em quatro ocasiões (25/10/201, 06/11/2013, 11/11/2013 e 04/12/2013), nas quais foram efetuadas as correções dos defeitos constatados. Ainda segundo o autor, mesmo não tendo ocorrido negativa na prestação do serviço, o bem veio com defeito de fábrica, tendo ficado privado de trabalhar ou produzir por vários dias em decorrência disso, impossibilitado de cumprir os contratos de serviços com seus clientes. Pede a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos materiais (lucros cessantes) no valor de R$ 100.000,00 e por danos morais, em valor de até 500 salários mínimos.

Reza o art. 6°, inc. VIII, do Código Consumerista que constitui direito básico do consumidor “a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”.

Primeiramente, a relação das partes não é de consumo, pois a empresa não é destinatária final do produto adquirido da ré, utilizando-o para realizar trabalhos a clientes e auferir lucro, como ela própria admitiu na inicial. Assim, descabe o desiderato de incidência da “Teoria do Risco do Empreendimento”, a prever a responsabilidade objetiva do prestador de serviço/produto (art. 14, caput, do CDC).

Por outro lado, convém frisar que, conforme há muito já decidiu o STJ, é possível a aplicação da “Teoria Finalista Mitigada” para definir o conceito de consumidor, permitindo-se, em algumas situações, a aplicação da Lei n° 8.078/1990 em favor do consumidor intermediário, adquirente de produto ou serviço, para viabilizar sua própria atividade lucrativa. Neste sentido:

“RESPONSABILIDADE CIVIL. CONCESSIONÁRIA DE TELEFONIA. SERVIÇO PÚBLICO. INTERRUPÇÃO. INCÊNDIO NÃO CRIMINOSO. DANOS MATERIAIS. EMPRESA PROVEDORA DE ACESSO À INTERNET. CONSUMIDORA INTERMEDIÁRIA. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA CONFIGURADA. CASO FORTUITO. EXCLUDENTE NÃO CARACTERIZADA. ESCOPO DE PACIFICAÇÃO SOCIAL DO PROCESSO. RECURSO NÃO CONHECIDO.

1. No que tange à definição de consumidor, a Segunda Seção desta Corte, ao julgar, aos 10.11.2004, o REsp nº 541.867/BA, perfilhou-se à orientação doutrinária finalista ou subjetiva, de sorte que, de regra, o consumidor intermediário, por adquirir produto ou usufruir de serviço com o fim de, direta ou indiretamente, dinamizar ou instrumentalizar seu próprio negócio lucrativo, não se enquadra na definição constante no art. 2º do CDC. Denota-se, todavia, certo abrandamento na interpretação finalista, na medida em que se admite, excepcionalmente, a aplicação das normas do CDC a determinados consumidores profissionais, desde que demonstrada, in concreto, a vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica.

2. A recorrida, pessoa jurídica com fins lucrativos, caracteriza-se como consumidora intermediária, porquanto se utiliza dos serviços de telefonia prestados pela recorrente com intuito único de viabilizar sua própria atividade produtiva, consistente no fornecimento de acesso à rede mundial de computadores (internet) e de consultorias e...

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