Acórdão nº 50012679320168210035 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50012679320168210035
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002287054
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001267-93.2016.8.21.0035/RS

TIPO DE AÇÃO: Adicional de horas extras

RELATOR: Desembargador NELSON ANTONIO MONTEIRO PACHECO

APELANTE: NADIR ROSA DA SILVA (AUTOR)

APELADO: FUNDACAO DE SAUDE SAPUCAIA DO SUL (RÉU)

APELADO: MUNICÍPIO DE SAPUCAIA DO SUL (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por NADIR ROSA DA SILVA, pois inconformada com a sentença que julgou improcedente o pedido formulado na ação de conhecimento por ela ajuizada contra a FUNDAÇÃO HOSPITAL MUNICIPAL GETÚLIO VARGAS, pretendendo o pagamento de diferenças salariais decorrentes de horas extras cumpridas e incorretamente adimplidas (3.8, fls. 41-8).

Em suas razões, a apelante sustentou a legitimidade do Município de Sapucaia do Sul, já que após a extinção da autarquia Hospital Municipal Getúlio Vargas voltou a fazer parte do quadro da Secretaria Municipal de Saúde. Quanto à matéria de fundo, destacou que não foram observadas as alterações legislativas que modificaram a carga horária dos servidores municipais e defendeu o seu direito ao pagamento de horas extras, pois laborava em turnos de 12 horas ininterruptas e não realizava intervalos intrajornada para descanso e refeições. Pediu o provimento do recurso (3.9, fls. 02-11).

Intimada, a parte apelada ofertou contrarrazões pugnando pela manutenção da sentença (3.9, fls. 15-20).

Após, foram os autos remetidos a esta Corte, indo com vista ao Dr. Altamir Francisco Arroque, Procurador de Justiça, que opinou pelo improvimento da apelação (7.1).

Vieram os autos.

É o relatório.

VOTO

Encaminho voto no sentido de negar provimento à apelação.

De início, tenho que a questão referente à legitimidade do Município de Sapucaia do Sul para compor o polo passivo da demanda está preclusa.

É que a matéria já foi discutida no AgInst nº 70072748668, interposto pela própria Fundação Hospital Municipal Getúlio Vargas, contra a decisão que reconheceu a ilegitimidade do Município de Sapucaia do Sul, cuja ementa do julgado restou assim redigida:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR PÚBLICO. AÇÃO ORDINÁRIA. FUNDAÇÃO HOSPITAL MUNICIPAL GETÚLIO VARGAS. SERVIDORA QUE EXERCE AS SUAS ATIVIDADES NA FHMGV E É REMUNERADA EXCLUSIVAMENTE POR TAL FUNDAÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO DE SAPUCAIA DO SUL PARA RESPONDER PELO PAGAMENTO DE EVENTUAIS COMPLEMENTOS SALARIAIS. DECISÃO RECORRIDA MANTIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.
(Agravo de Instrumento, Nº 70072748668, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jerson Moacir Gubert, Julgado em: 29-03-2019).

Embora a apelante sustente que após a extinção da autarquia passou a fazer parte do quadro da Secretaria Municipal de Saúde, o fato é que a entidade hospitalar foi transformada em fundação pública de direito privado, por meio da Lei-SS nº 3.224/101, restando sucessora da referida autarquia, conforme previsão do art. 2º da citada legislação2.

Quanto à matéria de fundo, como sempre digo em meus votos ao analisar a relação entre o servidor e os entes municipais, o que não é diferente neste caso concreto, a Administração é livre para organizar o quadro de seus servidores em virtude da estrutura do Direito Administrativo se fundar na perspectiva de que as relações mantidas entre a Administração e seus funcionários não se baseiam em qualquer vínculo puramente privado, dito contratual; no âmbito da Administração todas as relações com os servidores são marcadas pela natureza institucional do vínculo. A propósito disso, é importante referir que “o Estado, ressalvadas as pertinentes disposições constitucionais impeditivas, deterá o poder de alterar a legislativamente o regime jurídico de seus servidores, inexistindo a garantia de que continuarão sempre disciplinados pelas disposições vigentes quando de seu ingresso. Então, benefícios ou vantagens, dantes previstos podem ser ulteriormente suprimidos. Bem por isso, os direitos que deles derivem não se incorporam integralmente, de imediato, ao patrimônio jurídico do servidor... (Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo, Malheiros, 28ª Ed, p. 286).

Em segundo lugar, destaco que a Administração, ao contrário do que sucede com os particulares, só pode atuar conforme a lei (art. 37 da CF-88 e 19 da CE-89). É a materialização do que a doutrina e a jurisprudência chamam de primado da legalidade, consoante a lição de Hely Lopes Meirelles, in verbis:

A legalidade, como princípio de administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e dele não pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil ou criminal, conforme o caso.

(...).

Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa “poder fazer assim”; para o administrador público significa “deve fazer assim”. (in Direito Administrativo Brasileiro, 30ª edição, p. 87-8).

Em terceiro lugar, a atuação administrativa também deve se pautar pelo respeito ao princípio da proporcionalidade (razoabilidade), mesmo não estando expresso diretamente em quaisquer dos artigos da CF-88, opera como critério de interpretação inseparável da Constituição e de aplicação obrigatória pelo administrador em seu agir, estando agora inserido expressamente no art. 19 da CE-89.

Na hipótese, a apelante é servidora pública, aprovada em concurso público para o cargo Artífice, com a função de Cozinheira do Hospital Municipal Getúlio Vargas (3.4, fl. 07-8). Ajuizou a presente demanda pretendendo o reconhecimento da jornada de trabalho de 30 horas semanais, com o consequente pagamento de horas extras das horas excedidas dessa carga horária, bem como o pagamento de horas extras em decorrência de intervalos supostamente não gozados na integralidade.

No âmbito municipal, a jornada de trabalho dos servidores que laboram na entidade hospitalar restou definida na Lei-SS nº 2.499/02, quando ainda autarquia, in verbis:

Art. 9º A carga horária semanal dos servidores públicos da Autarquia Hospital Municipal Getúlio Vargas será de 24 h para todos os cargos de Médico, 36 h para os cargos de Enfermeiro e Auxiliar de Enfermagem e de 24 h para os cargos de Técnico de Radiologia e Operador de Câmara Escura.
§ 1º - Para os demais cargos a carga horária semanal será de 40 h. (Redação dada pela Lei nº 2530/2003)

Após a edição da Lei-SS nº 3.224/2010, que a transformou em fundação pública de direito privado, a situação dos servidores passou a ser regulamentada por esta lei, no que importa considerar:

Art. 32 A Fundação Hospital Municipal Getúlio Vargas poderá solicitar, de forma permanente, sem ônus para a origem, a cedência servidores públicos da Secretaria Municipal da Saúde.

(...)

Art. 33 A cessão de pessoal, bem como outras formas de cooperação entre a Fundação Hospital Municipal Getúlio Vargas e o Poder Público, deverá ser ajustada mediante convênio ou instrumento congênere.

Art. 39. Os atuais servidores estatutários e celetistas, do Hospital Municipal de Sapucaia do Sul, passarão a compor Quadro de Pessoal Especial vinculado à Secretaria Municipal de Saúde, mediante redistribuição de lotação, mantidos os correspondentes direitos, atribuições e restrições, na forma da legislação a que se acham submetidos.

Parágrafo Único – Esses servidores poderão ser cedidos à Fundação Hospital Municipal Getúlio Vargas, na forma do artigo 32 desta Lei.

Como visto, existe legislação específica para aqueles que atuam na antiga autarquia, hoje transformada em Fundação Hospital Municipal Getúlio Vargas, em específico para o cargo da autora, cuja carga horária é de 40 horas semanais.

Assim, não há falar em redução da jornada de trabalho e consequente pagamento de horas extras daquelas excedidas a 30 horas semanais.

Nesse mesmo sentido são os seguintes precedentes, senão vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL. MUNICÍPIO DE SAPUCAIA DO SUL. FUNDAÇÃO HOSPITAL MUNICIPAL GETÚLIO VARGAS. AUXILIAR DE ENFERMAGEM. HORAS EXTRAS E INTERVALO...

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