Acórdão nº 50012725920208210073 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 24-06-2022

Data de Julgamento24 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50012725920208210073
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002320727
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001272-59.2020.8.21.0073/RS

TIPO DE AÇÃO: Promessa de Compra e Venda

RELATORA: Desembargadora MYLENE MARIA MICHEL

APELANTE: LUCIANA SILVA MARIANE (EMBARGANTE)

APELADO: PAULO BILOUS (EMBARGADO)

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por LUCIANA SILVA MARIANE contra sentença de parcial procedência proferida nos autos da Embargos de Terceiro que propôs em face de PAULO BILOUS.

Eis o dispositivo da sentença:

"Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE os embargos de terceiros opostos por LUCIANA SILVA MARIANI em face de PAULO BILOUS.
Condeno a embargante ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.500,00, devidamente atualizados pelo IGP-M, com juros moratórios de 1% ao mês, a partir da data do trânsito em julgado da decisão, forte no que dispõe o artigo 85, § 8º, do CPC, e que vai suspensa a exigibilidade do pagamento, pois litiga ao abrigo da Gratuidade Judiciária.

Diante da nova sistemática do Código de Processo Civil e, diante da inexistência de juízo de admissibilidade, (art. 1010, § 3º do NCPC), em caso de interposição de recurso de apelação, proceda-se na intimação da parte apelada para que apresente contrarrazões, querendo, no prazo de 15 dias.
Decorrido o prazo, subam os autos ao E. Tribunal de Justiça do Estado do RS.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se."

Nas razões recursais (evento 44 da origem), a parte apelante afirma que o imóvel litigioso foi adquirido por seu irmão, Jessimel Silva Marioni, em 14/01/2008, com quem mantinha contrato de sociedade, pelo valor de R$ 41.500,00, dos quais seriam pagos R$ 8.000,00 mediante entrada e o saldo residual em 100 parcelas de R$ 339,00. Referiu que seu irmão - adquirente do imóvel - faleceu em 2009, mas que as parcelas devidas continuaram sendo pagas até 14/02/2012. Assevera que o apelado, ao tomar conhecimento do falecimento, recusou o o pagamento das parcelas devidas, ingressando com ação de rescisão contratual em 2018 "não só para apropriar-se do imóvel, mas, também, para não devolver os valores pagos pela recorrente". Assevera que a sentença comporta reforma, na medida em que comprovado pela petição inicial do feito principal que o apelado recebeu o pagamento relativo a 49 das 100 prestações devidas. Assevera que o contrato de sociedade acostado aos autos, segundo o qual lhe tocaria 50% do imóvel litigioso - demonstra que esses pagamentos foram por ela realizados. Defende a necessidade de reforma da sentença para que seja oportunizado o depósito dos valores devidos e a purgação da mora. Requer o provimento do recurso.

Regularmente intimado, o apelado apresentou contrarrazões (evento 48 da origem) suscitando preliminar de não conhecimento do recurso porque não impugnados os fundamentos da sentença. Aponta a necessidade de recebimento do recurso em seu efeito meramente devolutivo. Quanto mérito, afirma ter proposto a ação de resolução contratual nº 073/1.18.0006287-9 em face do Espólio de Jessimel Silva Mariani, a qual foi julgada procedente para resolver o contrato, condenar o espólio ao pagamento de indenização por perdas e danos e determinar a sua reintegração na posse do bem. Sustenta que a apelante não se desincumbiu do ônus de comprovar que tenha adquirido o imóvel litigioso com seu irmão, inexistindo qualquer vínculo contratual entre as partes. Afirma que a contestação apresentada os documentos que a instruíram não foram impugnados pela apelante, tratando-se de fatos incontroversos. Requer o desprovimento do recurso.

Remetidos os autos a esta Egrégia Corte, o recurso foi distribuído.

Vieram conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso, porquanto preenchidos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade aplicáveis à espécie.

Cuida-se de Embargos de Terceiro opostos pela apelante.

Em apertada síntese, a apelante se opõe ao cumprimento de mandado de reintegração de posse expedido nos autos da Ação de Resolução Contratual nº 073/1.18.0006287-9, proposta pelo apelado em face do Espólio de Jessimel Silva Marini, tendo por objeto o imóvel localizado na Rua Muçum, nº 3001, Bairro Centro, Imbé/RS.

Sustenta a apelante ter adquirido o bem juntamente com Jessimel, seu irmão, já que existente contrato de sociedade entre ambos.

Conforme relatório supra, a sentença julgou improcedentes dos Embargos de Terceiro.

Inicio o exame do recurso pela preliminar contrarrecursal.

1. Preliminar Contrarrecursal:

A preliminar não prospera.

Consoante previsão expressa contida no art. 1.010 do CPC, o recurso de apelação deverá conter:

"Art. 1.010. A apelação, interposta por petição dirigida ao juízo de primeiro grau, conterá:
I - os nomes e a qualificação das partes;
II - a exposição do fato e do direito;
III - as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade;
IV - o pedido de nova decisão."

Como se observa, o dispositivo em comento impõe à parte apelante ônus de impugnar especificamente os fundamentos da decisão guerreada, expondo não só os fatos e o direito, mas também, "as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade".

Porque extremamente pertinentes ao julgamento do presente recurso, transcrevo os comentários de Nelson Nery Júnior1 a respeito desse dispositivo:

"4.Direito de ação. O recurso é a reiteração do exercício do direito de ação, no segundo grau de jurisdição. Assim, pode-se fazer análise comparativa entre os requisitos exigidos pela norma ora analisada para que seja admitia a apelação: a0 partes (CPC 1010 I); b) exposição do fato e do direito (CPC 1010 II); c) fundamentação (CPC 1010 III), que seria comparável à causa de pedir; c) pedido de nova decisão (CPC 1010 IV). Sem a presença destes elementos, a apelação não pode ser conhecida. Note-se que, em comparação com o antigo CPC/73 514, há um requisito a mais; na realidade, o CPC/1973 514 II foi desdobrado nos CPC 1010 II e III: os 'fundamentos de fato e de direito' agora expressamente divididos em 'exposição do fato e do direito' e 'razões do pedido de reforma ou decretação de nulidade'.(...)

III:7. Fundamentação. O apelante deve dar as razões, de fato e de direito, pelas quais entende deva ser anulada ou reformada a sentença recorrida. Sem as razões do inconformismo, o recurso não pode ser conhecido."

No caso em apreço, ainda que reitere os argumentos expostos na petição inicial, o recurso preenche de modo satisfatório os requisitos exigidos pelo art. 1010 do CPC, impugnando os fundamentos da sentença, expondo as razões do inconformismo e postulando pela sua reforma.

Rejeito, portanto, a preliminar contrarrecursal.

2. Dos Embargos de Terceiro:

O recurso não comporta provimento.

Os Embargos de Terceiro constituem instrumento processual colocado à disposição daquele que, não sendo parte no processo, sofre os efeitos de ato de constrição, ou da sua ameaça, sobre bens de sua posse ou propriedade.

Nesse sentido, calha invocar o disposto no art. 674 do CPC, in verbis:

"Art. 674. Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro.
§ 1º Os embargos podem ser de terceiro proprietário, inclusive fiduciário, ou possuidor.

§ 2º Considera-se terceiro, para ajuizamento dos embargos:
I - o cônjuge ou companheiro, quando defende a posse de bens próprios ou de sua meação, ressalvado o disposto no art. 843;
II - o adquirente de bens cuja constrição decorreu de decisão que declara a ineficácia da alienação realizada em fraude à execução;
III - quem sofre constrição judicial de seus bens por força de desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente não fez parte;
IV - o credor com garantia real para obstar expropriação judicial do objeto de direito real de garantia, caso não tenha sido intimado, nos termos legais dos atos expropriatórios respectivos."

A respeito da natureza e do cabimento dos Embargos de Terceiro, se revela oportuna a lição de Araken de Assis2:

"Os arts. 674 e 681 do NCPC disciplinam o remédio processual outorgado aos terceiros para livrar as coisas do seu patrimônio objeto de constrição judicial. Esse remédio recebe a designação de embargos de terceiro.(...)
Como quer que seja, a existência de um meio específico para separar bens que não se sujeitam, concretamente, a atos judiciais no processo, representa necessidade palpável no comércio jurídico.
Essa é a nota distintiva dos embargos - concebidos como demanda de 'separação' interventiva, por intermédio da qual o órgão judicial apreciará a condição jurídica dos bens objeto de constrição judicial.(...)
Enquanto remédio possessório, os embargos se diferenciam de outras demandas porque o esbulho e a turbação derivam de ato judicial.
Portanto, o 'réu' nos embargos, a rigor, é quem ordenou a constrição - autoridade judiciária. Nos interditos, a ofensa à posse decorre de ato do particular."

Conforme dicção do art. 677 do CPC, cabe ao embargante demonstrar de forma suficiente a sua posse ou domínio sobre a coisa litigiosa:

"Art. 677. Na petição inicial, o embargante fará a prova sumária de sua posse ou de seu domínio e da qualidade de terceiro, oferecendo documentos e rol de testemunhas.
§ 1º É facultada a prova da posse em audiência preliminar designada pelo juiz.

§ 2º O possuidor direto pode alegar, além da sua posse, o domínio alheio.

§ 3º A citação será pessoal, se o embargado não tiver procurador constituído nos autos da ação principal.

§ 4º Será legitimado passivo o sujeito a quem o ato de constrição aproveita, assim como o será seu adversário no processo principal quando for sua a indicação do bem para a constrição
...

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