Acórdão nº 50012952520148210005 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 27-04-2022

Data de Julgamento27 Abril 2022
ÓrgãoNona Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50012952520148210005
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001931994
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

AGRAVO INTERNO EM Apelação Cível Nº 5001295-25.2014.8.21.0005/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano material

RELATOR: Desembargador TASSO CAUBI SOARES DELABARY

AGRAVANTE: COOPERATIVA VINÍCOLA AURORA LTDA. (RÉU)

AGRAVADO: JOAO PAVAN (AUTOR)

RELATÓRIO

Vistos.

Trata-se de Agravo Interno (art. 1.021 do CPC/2015) interposto por COOPERATIVA VINÍCOLA AURORA LTDA. em face de decisão monocrática que, nos autos da Apelação Cível nº 5001295-25.2014.8.21.0005/RS interposta em face de JOAO PAVAN, não conheceu do recurso diante da falta de impugnação suficiente dos fundamentos da sentença em ofensa ao princípio da dialeticidade.

Em suas razões [Evento 15, AGRAVO1], a demandada agravante aduz que, diversamente do que restou consignado na decisão, houve a impugnação dos fundamentos utilizados na sentença, apontando os fundamentos de fato e de direito que entendia suficientes para ocasionar a reforma da sentença, inclusive mencionando sobre a prova carreada nos autos e a sua desconformidade às preliminares que foram afastadas, devendo ser conhecido seu recurso. Ao final, pugnou pela reconsideração da decisão ou o exame pelo colegiado, com o provimento integral do seu recurso.

O prazo de apresentação das contrarrazões ao recurso transcorreu in albis e, em seguida, vieram-me os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas.

Conheço do recurso uma vez que preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

Quanto ao objeto, na forma do disposto no §2º do art. 1.021 do CPC, estou por exercer Juízo de retratação em relação à decisão monocrática anteriormente proferida (que não conheceu do apelo por ofensa ao princípio da dialeticidade), considerando que, a par das razões recursais trazerem o mesmo teor do conteúdo das peças processuais anteriormente apresentadas à sentença, possível identificar a contrariedade pelo apelante aos fundamentos da conclusão do sentenciante.

Trata-se de recurso de apelação em ação que envolve pedido de indenização por danos materiais e morais formulados pelo autor em face da cooperativa demandada em decorrência dos prejuízos sofridos com a aquisição de mudas de videiras que não serviram ao fim destinado.

A sentença foi de parcial procedência do pedido, com a condenação da demandada em indenizar os prejuízos materiais sofridos pela parte autora, afastando a pretensão indenizatória por danos extrapatrimoniais.

A demandada recorre e insiste na linha de defesa apresentada, alegando a decadência do direito do autor, a sua ilegitimidade passiva e, no mérito, a falta de responsabilidade pelos prejuízos reclamados pelo autor.

Pois bem. De saída, acerca da ocorrência da decadência suscitada pela demandada-apelante, com base no art. 445 do CC, tenho que a mesma não merece prosperar.

Com efeito, conforme emerge da petição inicial e os pedidos formulados, de se referir que o autor não pretende com esta demanda a redibição do negócio ou o abatimento no preço, mas a indenização por supostos prejuízos de ordem material e moral, decorrentes da aquisição do produto da demandada e que não se prestou ao fim destinado.

Assim, não há que se falar na incidência do prazo decadencial agitado (art. 445 do CC), uma vez que a presente ação é reparatória dos danos sofridos pelo autor, e não ação redibitória.

Relativamente à ilegitimidade passiva arguida pela ré-apelante, igualmente, verifico que falece de sucesso.

Aplica-se, in casu, a teoria da asserção, segundo a qual as condições da ação devem ser aferidas in status assertionis, ou seja, em abstrato, a partir do alegado pela parte autora na petição inicial, sem adentrar na análise do caso, sob pena de apreciação meritória. Com efeito, o que importa é a afirmação do demandante, e não a correspondência entre a afirmação e a realidade, que já seria problema de mérito1.

Como bem explica o processualista Fredie Didier Jr.2, trata-se de análise feita à luz das afirmações dos autores contidas em sua petição inicial, verbis:

Sem olvidar o direito positivo, e considerando a circunstância de que, para o legislador, carência de ação é diferente de improcedência do pedido, propõe-se a análise das condições da ação, como questões estranhas ao mérito da causa, fique restrita ao momento de prolação do juízo de admissibilidade inicial ao procedimento. Essa análise, então, seria feita à luz das afirmações do demandante contidas em sua petição inicial (in statu assertionis). ‘Deve o juiz raciocinar admitindo, provisoriamente, e por hipótese, que todas as afirmações do autor são verdadeiras, para que se possa verificar se estão presentes as condições da ação’. ‘ O que importa é a afirmação do autor, e não a correspondência entre a afirmação e a realidade que já seria problema de mérito’.

Não se trata de um juízo de cognição sumária das condições da ação, que permitiria um reexame pelo magistrado, com base em cognição exauriente. O juízo definitivo sobre a existência das condições da ação far-se-ia nesse momento: se positivo o juízo de admissibilidade, tudo o mais seria exame de mérito, ressalvados fatos supervenientes que determinassem a perda de uma condição da ação. A decisão sobre a existência ou não da carência de ação, de acordo com esta teoria, seria sempre definitiva. Chama-se de teoria da asserção ou da prospettazione.

Aliás, nesse sentido é a jurisprudência do c. STJ:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. ACÓRDÃO QUE, POR MAIORIA, REFORMA SENTENÇA TERMINATIVA E ADENTRA O JULGAMENTO DO MÉRITO. CABIMENTO.

(...)

- Aplica-se à hipótese, ainda, a teoria da asserção, segundo a qual, se o juiz realizar cognição profunda sobre as alegações contidas na petição, após esgotados os meios probatórios, terá, na verdade, proferido juízo sobre o mérito da questão.

(...)

Recurso especial conhecido e provido. (REsp 832.370/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/08/2007, DJ 13/08/2007 p. 366)

Ainda nesta linha, vejam-se os seguintes precedentes do STJ: REsp 1.678/GO, 4ª Turma, Rel. p/ acórdão Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 13.02.1990; REsp 2.185/GO, 4ª Turma, Rel. Min. Barros Monteiro, DJ de 14.05.1990; REsp 86.441/ES, 1ª Turma, Rel. Min. José de Jesus Filho, DJ de 07.04.1997; REsp 103.584/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 13.08.2001, e também no âmbito desta Corte: Apelação Cível Nº 70052300084; Apelação Cível Nº 70048188197.

Na situação dos autos, a partir do alegado na exordial, verifica-se a pertinência subjetiva dos sujeitos na lide, pois o autor afirma ser cooperado da demandada e buscou junto a ela as mudas de videiras adquiridas para a realização do plantio, as quais apresentaram mau desempenho de desenvolvimento e prejuízos aos autor, razão pela qual subsiste a legitimidade passiva.

Superadas essas premissas, passo ao exame do mérito.

E a esse respeito, de se assentar que a relação dos autos não se submete aos ditames do Código de Defesa do Consumidor, pois a parte autora não pode ser considerada como destinatária final dos produtos (art. 2º, CDC). Como está claro na inicial, a parte autora adquire o produto da demandada (mudas de videiras) e utiliza no desenvolvimento de sua atividade de produção rural e comercialização de uva. Em verdade, a natureza da relação entre as partes é eminentemente mercantil/comercial, escapando do microssistema do Direito do Consumidor.

Nesse sentido a orientação do c. STJ:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL. ATO COOPERATIVO TÍPICO. APLICAÇÃO DO CDC. DESCABIMENTO. REVISÃO DE CONTRATOS OBJETO DE NOVAÇÃO. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL VIOLADO OU DIVERSAMENTE INTERETADO. ÓBICE DA SÚMULA 284/STF. 1. Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao contrato de fornecimento de insumos agrícolas celebrado entre cooperativa e cooperado, por se tratar de ato cooperativo típico. Precedente específico desta Corte. Doutrina especializada. 2. A ausência de...

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