Acórdão nº 50013123220178210013 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sétima Câmara Cível, 30-06-2022

Data de Julgamento30 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50013123220178210013
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Sétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001538070
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

17ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001312-32.2017.8.21.0013/RS

TIPO DE AÇÃO: Condomínio

RELATOR: Desembargador GIOVANNI CONTI

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto pro TATIANE ZAPPANI ARALDI, contrário a sentença prolatada nos autos da ação de cobrança/fixação de aluguel, ajuizada em desfavor de ONIR ROBERTO ARALDI, seu genitor, em razão deste fazer uso exclusivo de bem deixado pelo falecimento da esposa do requerido, mãe da requerente.

A sentença julgou improcedentes os pedidos formulados pela autora, condenando-a ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais foram fixados em 10% sobre o valor da causa - suspensa a exigibilidade, em razão da gratuidade concedida (SENT8, evento 3, do processo originário - processo digitalizado n.º 013/1.17.0005839-7).

Em suas razões recursais, pontuou que o direito real de habitação visa proteger o cônjuge sobrevivente, garantindo-lhe uma morada, mesmo que o bem seja partilhado. Enfatizou que o art. 1.414 do CC dispõe que aquele que detém o direito de habitação somente pode fazer uso do imóvel, sendo-lhe vedado a locação ou empréstimo, bem como que em se tratando de imóvel rural, há diferença crucial com relação aos urbanos, pois a propriedade não é formada apenas pela moradia, mas é composta por significativa área agricultável. Afirmou que possui direito de perceber rendimentos sobre a produção realizada na área agricultável, que é comercial, e não para única subsistência do apelado. Aduziu, ainda, que o seu genitor mantém gado leiteiro na propriedade, atividade que é exercida com intuito comercial e lucrativo e que apenas seu pai e seu irmão (condômino) exploram a propriedade que é composta por 20ha e 700m². Por tais razões, pugnou pelo provimento do recurso, para que sejam julgados procedentes os pedidos formulados na petição inicial, com o reconhecimento da obrigação de o genitor pagar os rendimentos advindos da produção agrícola sobre a fração ideal dos imóveis de propriedade da apelante. Como pedido subsidiário, requereu sejam pagos os rendimentos advindos da produção referente ao segundo imóvel (APELAÇÃO9, idem).

Intimado, o apelação apresentou contrarrazões (CONTRAZ10, evento 3, do processo originário).

Após, subiram os autos a este Tribunal de Justiça, tendo sido distribuídos a minha relatoria.

Cumprido o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC/2015, vieram conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas.

Como visto do relatório, busca a apelante a modificação da sentença a fim de que o apelado, réu na ação principal, seja condenado ao pagamento de aluguel pela utilização exclusiva do bem imóvel indivisível (imóvel rural), eis que ambos são herdeiros (filha e pai).

Com efeito, quando do falecimento da mãe da autora, por força do princípio da Saisine, ocorre imediatamente a transmissão, como um todo unitário, dos respectivos direitos de propriedade e de posse aos herdeiros que, até que a partilha seja finalizada, são tratados como condôminos, nos termos do art. 1.791, caput e parágrafo único do Código Civil:

"Art. 1.791. A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros.

Parágrafo único. Até a partilha, o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio."

Desta forma, em relação ao pedido para arbitramento de locativos (também denominados como aluguéis ou indenização) pelo uso exclusivo de bem comum por parte de apenas um dos herdeiros, é perfeitamente possível a fixação do montante a ser pago por quem se o utilizava ou permanece no uso nas mesmas condições (AgInt no AREsp nº 889.672/RS, Relatora a em. Ministra Maria Isabel Gallotti, da 5ª Turma do STJ).

Importa relembrar que o direito ao recebimento dos alugueres decorre do condomínio existente entre as partes surgido a partir do falecimento, transmitindo-se a herança a todos os herdeiros por força da saisine.

Saliente-se que não há qualquer controvérsia sobre a qualidade dos herdeiros, sendo certo que a autora (filha) é herdeira do de cujus (mãe), bem como o réu (marido).

Na exordial, narra a autora, ora apelante, que o demandado/apelado faz uso exclusivo do único bem imóvel que integram o acervo hereditário da de cujus Inês, sua genitora, sobre os quais a autora da herança tinha direito, a título de meação. Refere que, apesar de o imóvel estar em condomínio entre o demandado, seu irmão e a autora, ela não está gozando do bem, pois somente o requerido está residindo e fazendo uso do local (imóvel rural), fato incontroverso os autos, eis que tal argumentação não foi impugnada pelo recorrido.

Com efeito, a jurisprudência é no sentido de que a procedência do pedido de fixação de aluguel pela utilização exclusiva do bem indivisível exige demonstração da posse exclusiva do condômino quanto ao uso do bem.

Neste sentido, trago a baila julgados do colendo STJ e deste Tribunal de Justiça:

"Direito civil. Recurso especial. Cobrança de aluguel. Herdeiros.

Utilização exclusiva do imóvel. Oposição necessária. Termo inicial.

- Aquele que ocupa exclusivamente imóvel deixado pelo falecido deverá pagar aos demais herdeiros valores a título de aluguel proporcional, quando demonstrada oposição à sua ocupação exclusiva.

- Nesta hipótese, o termo inicial para o pagamento dos valores deve coincidir com a efetiva oposição, judicial ou extrajudicial, dos demais herdeiros.

Recurso especial parcialmente conhecido e provido." (REsp 570.723/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/03/2007, DJ 20/08/2007, p. 268).

"PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DAS COISAS. CONDOMÍNIO. PAGAMENTO DE ALUGUERES. FRUTOS. EXERCÍCIO DO DIREITO. CONCOMITÂNCIA. IMPEDIMENTO DO USUFRUTO. RESISTÊNCIA REAL. COBRANÇA.

1. Ação cujo objeto mediato revela pretensão de condômina-herdeira ao pagamento de alugueres em razão do uso exclusivo de bem imóvel recebido como herança inviabilizando o uso comum por outros condôminos.

2. O artigo 1.319 do novo Código Civil, correspondente ao artigo 627 do Código Bevilácqua, assim dispõe: "Cada condômino responde aos outros pelos frutos que percebeu da coisa e pelo dano que lhe causou".

3. A exegese do referido dispositivo pressupõe relação negocial onerosa entre um dos condôminos e o terceiro, posto cediço em doutrina que "o não uso da coisa comum por alguns dos condôminos não lhe dá o direito a aluguer, ou prestação, que fique em lugar de uso que teria podido exercer, salvo negócio jurídico entre os condôminos" (Pontes de Miranda, in "Tratado de Direito Privado", Borsoi, Tomo XII, 1955, pág. 41).

4. O uso exclusivo do condômino que enseja a pretensão de percebimento de aluguéis pressupõe oposição daquele titular em relação aos demais comunheiros, os quais, na forma da lei, podem postular a alienação judicial do bem em face da indivisão incompatível com a coabitação.

5. É que o condômino que habita o imóvel comum engendra exercício regular de direito somente encetando "abuso de direito" se impede os demais do manejo de qualquer dos poderes inerentes ao domínio.

6. Isto por que, o instituto do Condomínio assenta-se na idéia de comunidade de direitos e tem como primado a possibilidade de todos os condôminos exercerem a um só tempo os atributos da propriedade, desde que de forma compatível com a situação de pluralidade de proprietários.

7. In casu, no exercício da ampla cognição a Turma que lavrou o acórdão embargado assentou que, : "na hipótese dos autos, uma única moradora, em imóvel de 130 m² não impede, pela sua simples presença no local, que outro condômino usufrua do bem e, como não há notícia de possível resistência a esta utilização, impõe-se a conclusão de que a utilização exclusiva, neste período, se deu por total desinteresse dos demais interessados, situação que não pode ensejar o pagamento de valores a título de aluguel da fração ideal." 8. Subjaz, assim, consectária com a justiça da decisão, que o condômino deve comprovar de plano qual o cerceamento ou resistência ao seu direito à fruição da quota parte que lhe é inerente do bem imóvel, a fim de justificar a cobrança de frutos em razão de aluguel, o que inocorreu in casu.

9. Embargos de divergência desacolhidos." (EREsp 622.472/RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, CORTE ESPECIAL, julgado em 05/10/2005, DJ 07/11/2005, p. 73).

"APELAÇÃO CÍVEL. CONDOMÍNIO. EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO. COBRANÇA DE ALUGUEIS. Gratuidade da justiça. Falta de interesse recursal no ponto, uma vez que à parte foi deferido o benefício pelo julgador “a quo”. Cobrança de alugueis. Arbitramento de aluguéis pelo uso exclusivo do imóvel pelo condômino Leonardo que gera o dever de indenizar, sob pena de enriquecimento sem causa. Termo inicial dos locativos. Alteração, no caso concreto, em conformidade com os elementos trazidos aos autos. APELAÇÃO PARCIALMENTE CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA." (Apelação Cível, Nº 70085210128, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Heleno Tregnago Saraiva, Julgado em: 30-11-2021).

"APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR ALUGUEIS E ALIENAÇÃO JUDICIAL DE BEM IMÓVEL. CONDOMÍNIO ENTRE HERDEIROS. UTILIZAÇÃO EXCLUSIVA DA PROPRIEDADE COMUM. Nas circunstâncias do caso, em que demonstrada a construção de casa de alvenaria custeada pela demandada e seu ex-marido em terreno do qual todos os litigantes são coproprietários, prevalece que a casa de alvenaria deverá ser avaliada em liquidação de sentença, de modo que, com a...

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