Acórdão nº 50013726220178213001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50013726220178213001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001911038
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001372-62.2017.8.21.3001/RS

TIPO DE AÇÃO: Cartão de Crédito

RELATOR: Desembargador JORGE MARASCHIN DOS SANTOS

APELANTE: AGLAIR TERESINHA GONÇALVES ROCHA (AUTOR)

APELANTE: BANCO CSF S/A (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

AGLAIR TERESINHA GONÇALVES ROCHA e BANCO CFC S/A interpõem apelações cíveis em face da sentença que julgou parcialmente procedente em parte a ação revisional que contendem ambas as partes, e da qual assim constou:

Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação movida por AGLAIR TERESINHA GONÇALVES ROCHA para revisar o contrato ora analisado, para o fim de limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado à época da contratação (7,65% a.m.), condenando o réu à devolução dos valores cobrados em excesso, subtraindo-os, se for o caso, das parcelas vincendas, com a repetição simples do indébito caso exista crédito em favor da parte autora após a compensação dos valores, rejeitando os demais pedidos.

Sucumbência parcial e recíproca, autoriza a divisão, metade para cada parte, das custas processuais. Honorários de cada patrono, fixados em R$10(Í0,00 (um mil reais) custeados pela parte adversa. Suspensa a exigibilidade à autora, em razão da AJG. Transitada em julgado e nada requerido, arquive-se com baixa. Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Dr. José Luiz Leal Vieira, Juiz de Direito da Comarca de Porto Alegre.

Em suas razões, a parte autora sustenta:

a) a descaracterização da mora;

b) a vedação de inscrição negativa junto aos órgãos de proteção de crédito; e

c) a majoração dos honorários advocatícios.

A parte ré, por sua vez, alega:

a) ausência de abusividade a justificar a limitação dos juros remuneratórios;

b) o afastamento da repetição do indébito, com a compensação de valores.

Oferecidas contrarrazões por ambas as partes, vieram os autos conclusos para julgamento.

Foram cumpridas as formalidades dos artigos 931 e 935 do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015).

VOTO

ADMISSIBILIDADE

Os recursos são tempestivos, sendo o do banco preparado e o da autora dispensado de preparo, diante da gratuidade deferida na origem, restando preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade recursal.

RELAÇÃO CONTRATUAL SUB JUDICE

Trata-se de ação revisional que tem por objeto:

  • Cartão de Crédito Carrefour Visa Internacional nº 4061.xxxx.xxxx.2783, com fatura constando parcelamento do débito datada de 10/02/2016 (evento 3 - processo judicial 4 -fl.15), no valor de R$ 13.196,21, ajustada com entrada no valor de R$ 1.470,00 e o restante em 24 parcelas de R$ 1.011,66. Ao período da normalidade incide juros remuneratórios de 6,90% ao mês. Juntadas faturas (evento 3 - processo judicial 4 e 5).

APELAÇÃO DA RÉ

ENCARGOS DA NORMALIDADE

JUROS REMUNERATÓRIOS

No tocante aos juros remuneratórios, as orientações do Superior Tribunal de Justiça, extraídas do julgamento do Recurso Especial n. 1.061.530/RS, datado de 22/10/2008, enfrentado para os efeitos do art. 1.036 do CPC são:

(...)

I – JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO

I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO

1 - JUROS REMUNERATÓRIOS

a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;

b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.Afinado a isso, o entendimento desta câmara é o de que a taxa de juros remuneratórios contratada somente deve ser limitada quando for superior à taxa média de mercado, registrada pelo BACEN, somada ao percentual de 30% (trinta por cento), tido como a margem tolerável.

(...) (Grifou-se)

Afinado a essas orientações do Superior Tribunal de Justiça, o entendimento desta Câmara é de que o percentual de juros remuneratórios deve ser limitado à taxa média de mercado registrada pelo Banco Central do Brasil – BACEN à época da contratação e em conformidade com a respectiva operação.

Esse posicionamento, aliás, decorre da observância da orientação vinda do julgamento do Recurso Especial n. 1.112.879/PR, julgado em 12/05/2010, que, para os efeitos do art. 1.036 CPC, assim expôs:

(...)

I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE.

ORIENTAÇAO - JUROS REMUNERATÓRIOS

1 - Nos contratos de mútuo em que a disponibilização do capital é imediata, o montante dos juros remuneratórios praticados deve ser consignado no respectivo instrumento. Ausente a fixação da taxa no contrato, o juiz deve limitar os juros à média de mercado nas operações da espécie, divulgada pelo Bacen, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o cliente.

2 - Em qualquer hipótese, é possível a correção para a taxa média se for verificada abusividade nos juros remuneratórios praticados.

II - JULGAMENTO DO RECURSO REPRESENTATIVO

- Consignada, no acórdão recorrido, a abusividade na cobrança da taxa de juros, impõe-se a adoção da taxa média de mercado, nos termos do entendimento consolidado neste julgamento.

(...) (Grifou-se)

Importante referir que este colegiado adotou como parâmetro para apuração da existência de abusividade na contratação sujeitada à revisão, a taxa média de mercado registrada pelo Banco Central do Brasil – BACEN à época da contratação e em conformidade com a respectiva operação somada do percentual de 30% (trinta por cento), tido como a margem tolerável.

No mais, oportuno mencionar que as taxas médias de mercado estão disponíveis na página eletrônica do Banco Central do Brasil - BACEN no endereço https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries

Com efeito, a fim de se aferir a abusividade, ou não, dos juros remuneratórios contratados pelas partes, necessário traçar um paralelo entre as taxas pactuadas e aquelas divulgadas no site1 do Banco Central do Brasil, conforme segue:

OPERAÇÃO DATA DA CONTRATAÇÃO TAXA PACTUADA MÉDIA BACEN +30%
1 Cartão de Crédito Carrefour Visa Internacional nº 4061.xxxx.xxxx.2783, com fatura constando parcelamento do débito datada de 10/02/2016 (evento 3 - processo judicial 4 -fl.15), no valor de R$ 13.196,21, ajustada com entrada no valor de R$ 1.470,00 e o restante em 24 parcelas de R$ 1.011,66. Juntadas faturas (evento 3 - processo judicial 4 e 5).

10/02/2016


6,90% ao mês



7,79% ao mês




10,12% ao mês


Importante ressaltar que a operação de crédito revisanda trata-se de contrato de cartão de crédito parcelado, considerando que a parte autora optou por realizar o parcelamento do débito, na data de 10/02/2016, no valor de R$ 13.196,21, com entrada de R$ 1.470,00 pago em 08/02/2016, e o restante a ser pago em 24 parcelas de R$ 1.011,66 (evento 3 - processo judicial 1 - fl.26).

No caso, considerando que as taxas de juros remuneratórios constantes no contrato revisando foram pactuadas abaixo da taxa média de mercado divulgada pelo Bacen (25478 - Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Cartão de crédito parcelado), ainda que acrescidas de 30%, tem-se como não caracterizada a alegada abusividade, devendo ser mantidos os juros remuneratórios contratados.

No ponto, recurso provido.

REPETIÇÃO DO INDÉBITO/COMPENSAÇÃO DE VALORES

Estabelece o art. 876, caput, do CC:

"Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir (...).

E assim dispõe o artigo 368 do CC:

Art. 368. Se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem.

Em respeito aos princípios que vedam o enriquecimento sem causa e a restituição integral, cabível a compensação de valores a ser efetivada entre as parcelas prestadas ineficazmente pelo consumidor e o eventual débito pendente em razão dos negócios jurídicos celebrados com o fornecedor.

Assinale-se, estando preenchidos os requisitos do instituto, os objetos das prestações recíprocas têm igual natureza, decorrendo a compensação de causa legal, evitando-se o enriquecimento sem causa do fornecedor que recebeu indevidamente quantias decorrentes de cláusulas inválidas.

Tal repetição, no entanto, é cabível na forma simples.

Ocorre que, em recente decisão, a Corte Especial do STJ aprovou tese no sentido de que a restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que cobrou valor indevido, revelando-se cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva.

Não obstante, tratando-se de demanda revisional, tal entendimento não se aplica, uma vez que até a decisão que revisa o contrato o débito mostra-se hígido, não havendo falar em cobrança de valor indevido.

No caso, diante da ausência de modificação contratual, mostra-se incabível a compensação de valores e a repetição do indébito.

No ponto, recurso provido.

APELO DA PARTE AUTORA

ENCARGOS DO INADIMPLEMENTO

DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA.

Acerca da possibilidade de descaracterização da mora e afastamento dos encargos dela decorrentes, existem orientações do...

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