Acórdão nº 50013727720148210023 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Câmara Cível, 23-02-2023

Data de Julgamento23 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50013727720148210023
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003244940
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

10ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001372-77.2014.8.21.0023/RS

TIPO DE AÇÃO: Responsabilidade civil

RELATOR: Desembargador JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA

APELANTE: NICOLLE PIMENTEL MONTEIRO (AUTOR)

APELANTE: MUNICÍPIO DE RIO GRANDE (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

De início, reporto o relatório constante da sentença.

Em face do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido inicial, forte no artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil/2015, para CONDENAR o requerido ao pagamento de R$ 3.000,00 à autora, a título de indenização por danos morais. Os valores deverão ser atualizados monetariamente pelo IPCA-E (ADI n.º 4.357/DF) a contar desta data, bem como acrescidos de juros de mora, a contar do evento danoso (19.01.2014), no mesmo percentual incidente sobre a caderneta de poupança, nos termos do art. lº-F da Lei nº. 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09. Em face da sucumbência parcial, condeno a autora ao pagamento de 50% das custas e despesas processuais, bem como ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador do requerido, que fixo em R$2.000,00, conforme artigo 85, §2º e §3º do CPC. Resta suspensa a exigibilidade das verbas, uma vez que já deferido à demandante o benefício da justiça gratuita. Condeno, ainda, o requerido ao pagamento do restante das custas e despesas processuais, estas integralmente e aquelas por metade,' considerando que não mais prevalece a isenção da Fazenda Pública, ante a declaração de inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 13.471/10, consoante decisões proferidas nos autos da Arguição de Inconstitucionalidade 70041334053 e Ação Direta de Inconstitucionalidade n^ 70038755864, bem como ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da autora, que fixo em R$2.000,00, forte no artigo 85, §2º e §3º do Código de Processo Civil.

A autora recorre. Suscita nulidade da sentença por cerceamento de defesa no que diz com o dano estético, pois decidido pela improcedência do pedido por falta de prova, quando deveria ser determinado a produção probatória, conforme art. 357 do Código de Processo Civil. Alude que se o levantamento fotográfico era insuficiente para o julgamento, o feito não estaria apto para a decisão de mérito. Consigna haver requerido perícia para comprovar a extensão das lesões e o prejuízo estético, o que inclusive poderia o magistrado ter verificado na audiência de instrução. Alega cerceamento de defesa também quanto aos danos materiais na forma de pensão vitalícia, igualmente rejeitados ao argumento de falta de provas, uma vez ter a apelante requerido expressamente a perícia médica judicial, no intuito de avaliar a redução da sua capacidade laboral, prova não realizada. No mérito, requer seja observada a gravidade das lesões e o levantamento fotográfico de fls. 65/70, aos fins de se conceder indenização pelos danos estéticos, pois evidente que a partir daqueles ferimentos resultaram cicatrizes grandes, visíveis a terceiros, e que causam constrangimentos à autora. Pede a reforma da decisão para se condenar o Município ao pagamento de R$209,55 (duzentos e nove reais com cinquenta e cinco centavos), direito que constou na fundamentação da sentença, mas não no seu dispositivo. Defende a majoração do valor indenizatório aos danos morais em virtude de o montante fixado estar abaixo do usualmente praticado para casos análogos, destacando a gravidade do sofrimento e do constrangimento sofridos após o acidente, sugerindo a quantia de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), e também assim à ofensa estética, propondo indenização na importância de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Requer, ao fim, o provimento da Apelação em seus termos.

O réu igualmente apela. Historia que o fato trazido como causa de pedir verificou-se às 5h30min, horário no qual apenas os Agentes de Trânsito e os Guardas Municipais atuam, sendo que, à época do indigitado ocorrido, existia Programa Permanente de Controle Populacional de Animais, como forma justamente de evitar maiores problemas à coletividade. Diz que o julgamento a quo se baseou no Boletim de Ocorrência, prova unilateral, e no depoimento de uma única testemunha, namorado da autora quando do fato, sendo que a reportagem trazida aos autos é de cinco meses antes do episódio. Qualifica a prova como frágil, insuficiente para demonstrar o de nexo de causalidade entre o evento e a conduta da Municipalidade. Assevera não ter havido dor psíquica, trauma ou outras ofensas que justifiquem a indenização fixada, a qual diz ser em valor exacerbado. Registra que infecção secundária pode ter resultado de culpa da demandante, que aduziu ter sido mordida em 19.01.2014, sendo o Atestado juntado para demonstrar a infecção datado do dia 23 daquele mês e ano, evidenciando não ter a requerente procurado atendimento médico logo que foi atacada. Solicita, acaso mantida a condenação, seja reduzido o quantum arbitrado, considerando que o valor definido não observou qualquer padrão, e bem assim os honorários advocatícios de sucumbência. Postula, ao final, o provimento do seu recurso.

Ambas as partes ofereceram contrarrazões.

Nesta Instância, o Ministério Público emitiu parecer (1) pelo parcial provimento ao recurso interposto pela autora, para majoração do valor compensatório do dano moral e (2) pelo desprovimento do recurso interposto pelo réu.

É o relatório.

VOTO

Colegas.

Examino ambos os recursos conjuntamente.

De pronto, vai rejeitada a tese de cerceamento de defesa.

Com efeito, ao término da audiência realizada para oitiva da testemunha1, na qual compareceram a autora e sua advogada, houve por bem o Juízo declarar não haver mais provas a serem produzidas, encerrando a instrução e, a pedido das partes, substituiu o debate oral por memoriais.

Nesse passo, tendo a demandante concordado com a finalização da etapa instrutória do feito, submeteu-se aos desdobramentos processuais daí advindos, inclusive no que se refere à rejeição de pedidos indenizatórios por danos materiais e estético sob o fundamento de não terem sido comprovados, na forma do encargo dirigido à demandante, a teor do inc. I do art. 373 do Código de Processo Civil2.

Pertinente ao mérito, tenho que os argumentos deduzidos pelo réu, em Apelação, apresentam-se insuficientes para derrogar os fundamentos expressos na sentença proferida pelo Juiz de Direito MAURO PEIL MARTINS, a quem peço vênia para reproduzir suas motivações, adotando-as como razões de decidir, ipsis litteris:

(...)

Primeiramente, o adequado exame do feito passa, necessária e anteriormente, pela natureza da responsabilidade civil: se é objetiva ou subjetiva. Disso, importantes consequências decorrem, já que, a depender de qual incidirá no caso, não é necessária a análise de culpa, bastando que estejam presentes os demais elementos da responsabilidade civil: dano e nexo causal.

À luz do direito posto, a natureza da responsabilidade civil do Município é, em regra, objetiva, tal como preconizada no art. 37, § 6º da Constituição Federal, in verbis:

§ 6º – As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Acerca da responsabilidade civil do Estado, leciona Sergio Cavalieri Filho1 que em busca de um fundamento para a responsabilidade objetiva do Estado, valeram-se os juristas da teoria do risco, adaptando-a para a atividade pública. Resultou, daí, a teoria do risco administrativo, imaginada originalmente por Léon Duguit e desenvolvida por renomados administrativistas, teoria, essa, que pode ser assim formulada: a Administração Pública gera risco para os administrados, entendendo-se como tal a possibilidade de dano que os membros da comunidade podem sofrer em decorrência da normal ou anormal atividade do Estado. Tendo em vista que essa atividade é exercida em favor de todos, seus ônus devem ser também suportados por todos, e não apenas por alguns.

Todavia, quando se trata de responsabilidade por conduta estatal omissiva, o entendimento majoritário é de que a responsabilidade a ser aplicada é, em regra, a subjetiva, sendo imprescindível, então, a aferição da existência de falha do ente público no dever de agir. Sobre o tema a doutrinadora Fernanda Marinela2 explica:

A teoria subjetiva, conforme apresentada no início do capítulo, conta com o quadro elementos definidores: o comportamento estatal, nesse caso omissivo, o dano, o nexo de causalidade entre a omissão e o dano e a culpa ou dolo. Além desses elementos básicos, orienta-se ainda o cumprimento de outros aspectos fundamentais para que o Estado seja condenado à indenização, para evitar a punição exagerada e desproporcional do ente. Vale observar que a punição pela ausência do Poder Público deve ser ponderada frente à possibilidade de impedir o dano, além da compatibilidade com os padrões possíveis do serviço, frente às dificuldades orçamentárias insuperáveis para o Estado. O fato é que o Estado não pode ser responsável pelas faltas do mundo, não pode ser tratado como anjo da guarda ou salvador universal, por isso os limites são necessários.

No mesmo sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. OMISSÃO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. CULPA OU NEGLIGÊNCIA. AUSÊNCIA DE PROVAS. REEXAME. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. I. Não há falar, na hipótese, em violação ao art. 535 do CPC, porquanto a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida, de vez que o voto...

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