Acórdão nº 50013783620208210068 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50013783620208210068
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001772775
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001378-36.2020.8.21.0068/RS

TIPO DE AÇÃO: Fornecimento de medicamentos

RELATORA: Desembargadora LUSMARY FATIMA TURELLY DA SILVA

APELANTE: UNIMED VALE DO CAI - SOCIEDADE COOPERATIVA DE SERVICOS DE SAUDE LTDA (RÉU)

APELADO: ANA LUCIA DEBASTIANI VEIT (Espólio) (AUTOR)

APELADO: BERNARDO DEBASTIANI VEIT (AUTOR)

APELADO: TASSIANA DEBASTIANI VEIT (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação cível interposto por UNIMED VALE DO CAI - SOCIEDADE COOPERATIVA DE SERVICOS DE SAUDE LTDA, nos autos desta ação que lhe move ANA LUCIA DEBASTIANI VEIT (ESPOLIO), contra a sentença (evento 110, SENT1 processo originário) que julgou procedente a demanda.

Adoto o relatório da r. sentença, que bem narrou o presente caso:

ANA LUCIA DEBASTIANI ajuizou ação cominatória c/c indenizatória por danos morais e materiais em face de UNIMED VALE DO CAÍ, ambas devidamente qualificadas nos autos. Narrou ter contratado plano de saúde ambulatorial e hospitalar com a ré, tendo sempre honrado com suas obrigações contratuais. Referiu ser portadora de melanoma de mucosa anal, CID 10 C43, necessitando realizar quimioterapia, com indução de medicamentos (Carboplatina, Paclitaxel). Requisitou autorização para o tratamento, o que foi negado pela ré verbalmente, sob o fundamento de que os medicamentos não estariam no rol daqueles fornecidos pelo plano de saúde. Requereu, já em sede de tutela de urgência, fosse determinado o fornecimento dos medicamentos necessários ao tratamento prescrito. Subsidiariamente, postulou o pagamento ou ressarcimento de valores para aquisição particular dos fármacos. Pugnou pela condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morias, em valor não inferior a vinte salários-mínimos. Atribuiu à causa o valor de alçada. Juntou documentos (evento 1).

Deferido o pedido de tutela de urgência (evento 8).

Citada, a requerida apresentou contestação, sustentando a impossibilidade de custear medicamento sem embasamento científico para o caso apresentado (off label). Colacionou entendimento jurisprudencial sobre o tema, especificamente acerca do rol da ANS. Referiu a impossibilidade de ampliação da cobertura contratual, mencionando que o plano de saúde não pode responder por todas as mazelas da autora. Refutou o pedido de dano moral. Requereu a revogação da tutela e a improcedência da ação (evento 17).

Oportunizada a indicação de provas a produzir (evento 22), a requerida postulou a expedição de ofício à Agência Nacional de Saúde Suplementar (evento 26), ao passo que a parte autora nada requereu.

Determinada a expedição de ofício (evento 33), sobrevieram respostas (eventos 46, 47, 48, 70 e 73).

As partes manifestaram-se (eventos 52 e 61), tendo a procuradora da parte autora informado o falecimento de sua cliente.

Determinada a intimação do espólio para manifestar interesse na sucessão processual (evento 74), os herdeiros acostaram procuração (evento 81), tendo a requerida impugnado o pedido de habilitação (evento 86).

O feito foi extinto com relação aos pedidos de medicamento, restando determinado o prosseguimento no tocante à reparação por danos morais (evento 91).

Foram habilitados os herdeiros do "de cujus".

Determinada a juntada do contrato do plano de saúde, sendo este acostado ao evento 104.

Vieram conclusos para julgamento.

E o dispositivo sentencial foi exarado nos seguintes termos:

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a ação ajuizada por ESPÓLIO DE ANA LUCIA DEBASTIANI VEIT, BERNARDO DEBASTIANI VEIT e TASSIANA DEBASTIANI VEIT, em face da UNIMED VALE DO CAI/RS - COOPERATIVA DE ASSISTENCIA A SAUDE LTDA para o fim de condenar o demandado ao pagamento de danos morais em favor da parte autora, no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), montante que deverá ser acrescido de correção monetária pelo IGP-M a partir da condenação, bem como de juros de mora de 1% ao mês, a partir da negativa de concessão do tratamento.

CONDENO a requerida ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios, estes equivalentes a 15% do valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC.

Diante do que disciplina o parágrafo 3º do artigo 1.010 da Lei 13.105/2015, acaso seja interposto recurso de apelação, intime-se a parte contrária para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo de 15 dias (art. 1.010, § 1º, CPC). Se o apelado interpuser apelação adesiva, intime-se o apelante para contrarrazões igualmente no prazo de 15 dias (art. 1.010, §2º, CPC). Adotadas as formalidades legais, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça.

Em suas razões recursais (evento 116, APELAÇÃO1 do processo originário), a parte ré, inicialmente, tece um breve relato dos fatos que originaram a lide. Cita diversas decisões do e. STJ a fim de embasar a legitimidade da negativa de cobertura. Menciona o julgamento do REsp nº 1.733.013/PR pela 4ª Turma do e. STJ acerca da taxatividade do rol da ANS. Afirma que a própria ANS, em resposta ao ofício enviado pelo Juízo, esclareceu que a utilização dos medicamentos postulados pela autora - Carboplatina e Paclitaxel - configura uso off label. Defende a taxatividade do rol da ANS, referindo a legislação aplicável ao caso. Aduz a expressa exclusão no contrato para cobertura de medicamentos off label, alegando seu uso experimental. Argumenta que a recusa da operadora não configura ofensa a direitos imateriais. Pondera a inexistência de danos morais indenizáveis, asseverando se tratar de mera negativa de cobertura em decorrência de interpretação de cláusula contratual. Requer o provimento do recurso com a improcedência do pleito indenizatório ou, subsidiariamente, com a redução do quantum arbitrado.

Sobrevieram contrarrazões (evento 120, CONTRAZAP1 do processo originário), em que pleiteada a majoração do quantum indenizatório para valor não inferior a quarenta salários mínimos.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

Tendo em vista a adoção do sistema informatizado, os procedimentos previstos nos artigos 931, 932 e 934 do Código de Processo Civil foram simplificados, porém cumpridos na sua integralidade.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Por primeiro, o pedido veiculado pela parte autora em contrarrazões concernente à majoração do quantum indenizatório não deve ser conhecido.

Isso porque a autora, inconformada com o resultado do decisum proferido pelo juízo de origem, deveria ter interposto o recurso legal cabível, sendo inadmissível a insurgência por meio de peça contrarrecursal, razão pela qual deixa-se de analisar o pleito.

Por seu turno, o recurso da parte ré deve ser conhecido, porquanto preenchidos os pressupostos de sua admissibilidade, sendo tempestivo e comprovado o preparo (Evento 118 do processo originário).

Com efeito, cumpre referir que houve a extinção do feito sem resolução do mérito em relação ao pleito de fornecimento dos medicamentos Carboplatina e Paclitaxel, em virtude do falecimento do parte autora ( evento 91, DESPADEC1 do processo originário).

E, considerando que não houve a interposição de agravo de instrumento pelas partes em face da referida decisão que extinguiu parcialmente o feito sem resolução do mérito, resta configurada a preclusão da matéria, à luz do disposto no parágrafo único do art. 354 e do art. 507 ambos do Código de Processo Civil, in verbis:

Art. 354. Ocorrendo qualquer das hipóteses previstas nos arts. 485 e 487, incisos II e III , o juiz proferirá sentença.

Parágrafo único. A decisão a que se refere o caput pode dizer respeito a apenas parcela do processo, caso em que será impugnável por agravo de instrumento.

(...)

Art. 507. É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão.

Nesse sentido, jurisprudência deste e. Tribunal de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE COBRANÇA. Carência de ação por ausência de interesse de agir e impossibilidade jurídica do pedido. Preliminares já refutadas em sede de saneador, sem recurso da parte interessada, a culminar na preclusão da matéria. Mérito. Ação de cobrança devidamente instruída com documentação comprobatória do fato constitutivo do direito do autor, sem que a ré logre infirmar a prova que dá sustento à pretensão vertida na inicial. APELAÇÃO DESPROVIDA.(Apelação Cível, Nº 70069765907, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mylene Maria Michel, Julgado em: 24-11-2016)

Nessa senda, há de se considerar que a matéria devolvida a este Tribunal em grau recursal restringe-se ao dever de indenizar os alegados danos morais. Não obstante, tendo em conta que o pleito indenizatório está adstrito à negativa de cobertura dos fármacos, faz-se necessário analisar a regularidade - ou irregularidade - da recusa por parte da operadora ré.

Passo ao mérito do recurso.

Inicialmente, cumpre referir que não há mais dúvida quanto à aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de seguros e de planos de saúde1. Trata-se de entendimento sumulado pelo e. STJ que, em 2010, editou a Súmula n. 469, que assim dispõe: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde”. Observo que o entendimento foi mantido com a edição da Súmula n. 608 do e. STJ2, a qual cancelou a anterior, tendo a última apenas criado exceção para os casos dos planos de autogestão.

Dessa forma, tornou-se clara a identificação das seguradoras ou operadoras de planos de saúde como fornecedoras de serviço e do beneficiário (segurado) como destinatário final (consumidor), nos termos do que dispõem os artigos 2º, “caput”3, e 3º, §2º4, da legislação consumerista.

Com efeito, os contratos de seguro e planos de assistência à saúde devem se submeter às regras constantes na legislação...

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