Acórdão nº 50013930920198210078 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50013930920198210078
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001663583
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001393-09.2019.8.21.0078/RS

TIPO DE AÇÃO: Cartão de Crédito

RELATOR: Desembargador FERNANDO FLORES CABRAL JUNIOR

APELANTE: BANCO ITAUCARD S.A. (RÉU)

APELADO: JOAO PAULO AMBROSI (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por BANCO ITAUCARD S.A. nos autos da ação de reparação de danos com pedido de repetição do indébito proposta por JOAO PAULO AMBROSI, em face da sentença que julgou procedente o feito, nos seguintes termos (Evento 3, PROCJUDIC4, Páginas 9/10):

Isso posto, confirmo as tutelas de urgência deferidas às fls. 34/v e 118/v, para fins de determinar o imediato desbloqueio do cartão de crédito Credicard Cash Back Visa Platinum de nº 4230 7400 6236 6898, e JULGO procedente os pedidos do autor para a) determinar a restituição na forma dobrada do valor indevidamente cobrado a título de anuidade do referido cartão de crédito, o qual deve sofrer incidência de
correção monetária pelo IGP-M, a contar do desembolso, e acrescido de
juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação; b) condenar a demandada ao pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), correspondentes aos danos morais sofridos, com correção monetária pelo IGP-M a contar da publicação da sentença e juros de mora de 1% ao mês,a contar da citação.

Sucumbente, condeno a parte requerida ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao procurador da parte autora, fixados em 15% sobre o proveito econômico obtido, fulcro nas balizadoras do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil.
Destaco, o fato de o valor da indenização não ter alcançado aquele postulado na inicial não importa sucumbência recíproca, até porque mera estimativa, que não vincula o julgador [vg. Apelação Cível nº 70076950617, Décima Segunda Câmara Cível, Relator: Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout, julgado em 10/05/2018].

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Posteriores embargos de declaração opostos pela parte ré foram desacolhidos (Evento 3, PROCJUDIC4, Página 28).

Em razões recursais, o banco réu defende a ausência de falha na prestação de serviços da instituição financeira. Destaca que os documentos acostados com a contestação comprovam que o cartão de crédito de titularidade do autor foi desbloqueado, em 21/11/2018, tão logo fora solicitado o seu desbloqueio. Pondera que, desde tal data, o plástico em questão estava em plenas condições de uso quando da tentativa de transação mencionado pelo demandante. Preconiza que as telas sistêmicas são documentos que possuem força probatória. Alude que o desbloqueio da tarjeta objeto da lide restou incontroverso, na medida em que alega que o próprio autor na inicial afirmaria que tal desbloqueio foi registrado com sucesso. Ressalta que a data de desbloqueio mencionada pelo autor na exordial é a mesma apontada em seu sistema informatizado. Salienta que os documentos juntados pela parte autora afastam a sua teve, sob o fundamento de que atestariam que a impossibilidade de utilização do plástico se deu em razão de digitação incorreta da senha. Argumenta que o autor não conseguiu utilizar o cartão de crédito por sua culpa única e exclusiva. Sustenta a inexistência de ato ilícito ou falha na prestação de serviços a ensejar o dever de indenizar. Postula o afastamento da condenação ao pagamento de indenização por danos morais. Subsidiariamente, pugna pela redução do quantum indenizatório. Assevera o descabimento da condenação à repetição em dobro dos valores cobrados a título de anuidade do cartão de crédito, afirmando que o plástico foi desbloqueado e que o serviço estava disponível para ser utilizado pelo autor. Alternativamente, pleiteia que os juros moratórios e a correção monetária incidam a partir da data de fixação da condenação. Pugna pelo redimensionamentos dos ônus sucumbenciais. Postula o provimento do recurso, a fim de ser julgada totalmente improcedente a demanda (Evento 3, PROCJUDIC4, Páginas 33/39)

Foram apresentadas contrarrazões pela parte autora (Evento 3, PROCJUDIC4, Páginas 44/49).

É o relatório.

VOTO

A apelação interposta no Evento 3, PROCJUDIC4, Páginas 33/39 é tempestiva, pois a disponibilização da nota de expediente de intimação da sentença que desacolheu os embargos de declaração ocorreu em 08/06/2021 (Evento 3, PROCJUDIC4, Página 29) e o recurso foi interposto em 30/06/2021 (Evento 3, PROCJUDIC4, Página 31). Além disso, a parte ré comprovou o recolhimento do preparo (Evento 3, PROCJUDIC4, Página 41). Dessa forma, considerando que o recurso é próprio e tempestivo, recebo a apelação e passo ao exame da insurgência recursal.

RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS NAS RELAÇÕES DE CONSUMO. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. INOCORRÊNCIA.

O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 3º, § 2º, incluiu expressamente a atividade de natureza bancária, financeira e de crédito no conceito de serviço.

Note-se:

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista – grifei.

O entendimento atual, tanto na doutrina como na jurisprudência dos Tribunais pátrios, é tranquilo acerca da aplicação do CDC nas operações bancárias, o que restou sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, inclusive:

Súmula nº 297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

No que diz respeito ao contrato de cartão de crédito, da mesma forma, resta induvidoso que as empresas de cartão de crédito são prestadoras de serviços, não só ao titular, pelo credenciamento e abertura de crédito, como também ao fornecedor pelo agenciamento de clientes.

A respeito da normatização dos contratos de cartão de crédito, Sergio Cavalieri Filho refere que:

“(...) Embora não exista lei específica disciplinando a atividade econômica exercida pelas empresas de cartão de crédito, estão elas enquadradas no Código de Defesa do Consumidor no que diz respeito aos limites das cláusulas do contrato que celebram com o titular do cartão, bem como no pertinente à natureza da sua responsabilidade”1.

Portanto, a responsabilidade contratual do banco, da administradora do cartão de crédito e do estabelecimento comercial é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, de modo que respondem, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços.

Reza o art. 14 do CDC:

O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Trata-se de responsabilidade objetiva fundada na teoria do risco do empreendimento ou da atividade empresarial, segundo a qual, consoante doutrina de Sergio Cavalieri Filho:

“(...) todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. Este dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, bem como aos critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas. A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços. O fornecedor passa a ser o garante dos produtos e serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos"2.

Nesse sentido, vale reproduzir precedente do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.

INSCRIÇÃO...

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