Acórdão nº 50014152020238217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 24-02-2023

Data de Julgamento24 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualHabeas Corpus
Número do processo50014152020238217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003291661
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Habeas Corpus (Câmara) Nº 5001415-20.2023.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Promoção, constituição, financiamento ou integração de Organização Criminosa

RELATOR: Desembargador IVAN LEOMAR BRUXEL

PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

IMPETRADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de Habeas Corpus em favor de EDERSON STOLZ DA ROSA, preso desde 15/12/2022, pela prática, em tese, dos crimes do artigo 2º, caput, da Lei n. 12.850/13 (1º fato), artigo 1º, caput, e § 4º, da Lei n. 9.613/98 (2º fato), artigo 180, §§ 1º e 2º, do Código Penal (5º fato) e artigo 15, caput, da Lei n. 7.802/89 (6º fato). Denúncia recebida em 19/01/2023.

Alega ausência dos requisitos autorizadores da prisão, principalmente a contemporaneidade. Destaca os predicados pessoais favoráveis e a possibilidade de substituição da segregação por medidas cautelares diversas.

Liminar indeferida.

Prestadas informações.

Parecer pela denegação.

É o relatório.

VOTO

Esta a decisão que decretou a prisão preventiva (fotografias suprimidas):

Vistos.

​Trata-se de representação da Autoridade Policial, oriunda da DRACO de São Luiz Gonzaga, no âmbito do inquérito policial nº 62/2021/152971, visando:

"a) a decretação da prisão preventiva de: 1) Catherine Schwerz Barcellos; 2) Cynara dos Santos Ribeiro; 3) Ederson Stolz da Rosa; 4) Emídio Kreuning; 5) Evandro Flores de Melo; 6) Itanir José Frizon; 7) Jaime de Lima Pavão; 8) Márcio André Eberhardt; 9) Rafael Flores de Melo; 10) Rodrigo Pereira Moreira; e 11) Walfredo Cocaro Martins;

[...]"

O Ministério Público manifestou-se favorável aos pedidos (evento 328, PROMOÇÃO1 e evento 333, PROMOÇÃO1).

Em 26/09/2022, foi declinado a competência para processamento e julgamento do feito à 1ª Vara Estadual de Processo e Julgamento dos Crimes de Organização Criminosa e Lavagem de Dinheiro (evento 337, DESPADEC1).

Contudo, o referido Juízo entendeu ser o caso de manutenção da competência desta Vara, em face da prevenção, em razão do deferimento de medidas cautelares anteriores (evento 354, DESPADEC1).

É o breve relato.

Decido.

I - Da competência

Compulsando os autos, verifico que o objeto principal dos autos envolve produto vindo do estrangeiro de forma ilegal, que é adulterado e revendido no Brasil, no comércio espúrio.

Embora se saiba que os agrotóxicos são de origem estrangeira, não aportou aos autos provas de que os Representados tenham sido os responsáveis pelo ingresso dos defensivos agrícolas no país, o que de pronto afasta a competência da Justiça Federal para julgar o caso em comento. Isso porque não há nenhum indício de contrabando nos autos da investigação, e sim da venda criminosa de agrotóxicos proibidos no Brasil.

Nesse sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ):

[...]

Compulsando os autos, percebe-se que, de fato, o contexto fático apresentado revela que os acusados não foram os responsáveis pela internacionalização dos agrotóxicos, demonstrando-se apenas que receberam os produtos já no Brasil.

Dessa forma, conheço a competência deste Juízo para julgamento do caso em comento.

II - Da prisão preventiva

De acordo com o disposto no Código de Processo Penal, a prisão preventiva tem cabimento para garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria (art. 312), desde que nos casos previstos no art. 313 do CPP:

"Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:

I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;

II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal;

III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência;

IV - (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).

Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida."

No caso em tela, a acusação atribuída aos Investigados é de prática dos crimes ambientais (arts. 56 e 60 da Lei n.º 9.605/1998), organização criminosa (art. 1º, § 1º, c/c art. 2º da Lei n.º 12.850/2013), lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei n.º 9.613/1998), transporte e comercialização ilegal de agrotóxicos (art. 15 da Lei n.º 7.802/1989), receptação qualificada (art. 180, § 1º, do Código Penal) e crimes contra as relações de consumo (art. 7º, incs. II e III, da Lei n.º 8.137/1990). Tratam-se de crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade, sendo que nos delitos de organização criminosa, lavagem de dinheiro, receptação qualificada e contra a ordem tributária, a pena prevista é superior a 04 anos e passível, portanto, da decretação da prisão preventiva (art. 313, inciso I, do CPP). Além disso, a soma das penas máximas dos delitos sob investigação igualmente autoriza a decretação da segregação cautelar.

Compulsando os autos da representação, verifico que a Autoridade Policial investiga, desde o ano de 2021, a atuação dos Investigados na comercialização de agrotóxicos proibidos no Brasil.

O relatório de investigação que embasa o presente pedido é bastante extenso e detalhado e contém indícios da autoria e materialidade dos delitos, suficientemente aptos a ensejaram o decreto prisional cautelar, requerido pela Autoridade Policial e sustentado pelo Ministério Público.

Pois bem.

Segundo o expediente, tramita na DRACO de São Luiz Gonzaga o Inquérito Policial n.º 62/2022/152971/A, no qual os Representados são suspeitos de praticarem os delitos supramencionados em diversos municípios do Rio Grande do Sul, além de alcançarem outros Estados, em especial, o estado da Bahia.

Em suma, consta no expediente que, os Investigados passaram a adquirir agrotóxicos proibidos no Brasil, especificamente o Paraquat e o Emamex (benzoato de amamectina, cujo registro inexiste neste país), para, posteriormente, revendê-los a diversos produtores rurais.

Os agrotóxicos comercializados ilegalmente pelos Representados são proibidos no Brasil por ser um produto nocivo à saúde daqueles trabalhadores que fazem o manejo do defensivo e, por óbvio, de toda a sociedade que fica exposta à ação química.

Vale ressaltar que, nos presentes dias, com o avanço da agricultura (tecnológico e comercial), as cidades interioranas estão cada vez mais próximas da terras próprias para o plantio e, por vezes, a área urbana faz limite com lavouras. Assim, defensivos agrícolas utilizados para o controle de plantas daninhas são disseminados através do ar, fazendo que, acidentalmente, toda a população faça a ingestão da substância.

Por isso é que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), no assunto em questão, faz a regulamentação dos defensivos que podem ou não ser utilizados nas atividades agrícolas.

Nessa toada, sabendo que o polo da presente demanda, fato gerador de todos os crimes aqui mencionados, se faz necessário mencionar o relatório de investigação juntado aos autos no Evento 321, OUT5, Páginas 111/115, dada a importância da análise técnica dos produtos:

"Em relação a utilização de agrotóxico contendo o princípio ativo PARAQUATE, o Art 1º da Resolução da ANVISA – RDC nº 177, de 21 de setembro de 2017 proíbe a utilização conforme transcrito a seguir.

Art. 1º Estabelece a proibição do ingrediente ativo Paraquate em produtos agrotóxicos no País e as correspondentes medidas transitórias de mitigação de riscos.

Ainda, o Art 2º da Resolução da ANVISA – RDC nº 177, de 21 de setembro de 2017, alterada pela Resolução da ANVISA – RCD nº 428, de 7 de outubro de 2020, define o prazo para importação, produção e comercialização dos produtos conforme transcrito a seguir.

Art. 2º Ficam proibidas, após 3 (três) anos, contados a partir da data de publicação desta Resolução, a importação, produção e a comercialização de produtos técnicos e formulados à base do ingrediente ativo Paraquate. (Redação dada pela Resolução – RDC nº 428, de 7 de outubro de 2020).

O Art 4º da Resolução da ANVISA – RDC nº 177, de 21 de setembro de 2017, alterada pela Resolução da ANVISA – RCD nº 190, de 1 de dezembro de 2017, encerra os prazos para pedido de avaliação toxicológica, conforme transcrito a seguir.

Art. 4º Ficam encerrados, a partir da data de publicação desta Resolução, os pedidos de avaliação toxicológica, para fins de registro, de produtos técnicos e formulados à base do ingrediente ativo de agrotóxico Paraquate em tramitação na Anvisa. (Redação dada pela Resolução – RDC nº 190, de 1º de dezembro de 2017).

O PARAQUATE é um herbicida para uso agrícola em plantas infectantes pósemergentes ou como dessecante de diversas culturas. De acordo com publicação da Secretaria de Agricultura do Rio Grande do Sul, a relação de produtos contendo o princípio ativo PARAQUATE em sua composição e que tiveram o cadastro proibido no Estado foram: Flak 200 SL, Gramokink, Gramoxil, Gramoxone 200, Helmoxone, Laredo, Nuquat, Orbit, Paradox, Paraquate alta 200 SL, Quatdown, Severobr, Sprayquat e Tocha. Em relação a utilização de agrotóxico contendo o princípio ativo BENZOATO DE EMAMECTINA, inicialmente cabe ressaltar que a ANVISA emitiu um “Parecer Técnico de Indeferimento do Produto Técnico a Base do Ingrediente Ativo Benzoato de Emamectin”. Tal indeferimento foi...

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