Acórdão nº 50014202020218210046 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 22-06-2022

Data de Julgamento22 Junho 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Número do processo50014202020218210046
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002256918
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação/Remessa Necessária Nº 5001420-20.2021.8.21.0046/RS

TIPO DE AÇÃO: ITCD - Imposto de Transmissão Causa Mortis

RELATOR: Desembargador RICARDO TORRES HERMANN

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (INTERESSADO)

APELADO: ROGER GOMES KESTERKE (IMPETRANTE)

APELADO: SIMONE GOMES KESTERKE (IMPETRANTE)

APELADO: STEFANIA ROTA KESTERKE (IMPETRANTE)

RELATÓRIO

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL apela da sentença que concedeu a ordem nos autos do Mandado de Segurança nº. 5001420-20.2021.8.21.0046/RS, impetrado por SIMONE GOMES KESTERKE, STEFANIA ROTA KESTERKE e ROGER GOMES KESTERKE, cujos fundamentos transcrevo (EVENTO 45 - SENT1):

MANDADO DE SEGURANÇA Nº 5001420-20.2021.8.21.0046/RS

IMPETRANTE: SIMONE GOMES KESTERKE

IMPETRANTE: STEFANIA ROTA KESTERKE

IMPETRANTE: ROGER GOMES KESTERKE

IMPETRADO: DELEGADO DA RECEITA ESTADUAL - ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - PASSO FUNDO

SENTENÇA

Vistos.

SIMONE GOMES KESTERKE, STEFANIA ROTA KESTERKE e ROGER GOMES KESTERKE impetraram o presente MANDADO DE SEGURANÇA em face do AGENTE FISCAL DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL.

Narrou a inicial que os impetrantes são herdeiros de Claudio Gomes Kesterke, falecido em agosto de 2021. Alegam que foi promovida a abertura do inventário extrajudicial junto ao Tabelionato de Notas de Espumoso/RS, tendo a Receita Estadual efetuado a devolução da DIT a fim de que se fizesse constar no rol de bens os valores recebidos pelos herdeiros na condição de beneficiários dos seguros de vida deixados pelo genitor falecido para fins de incidência de ITCD. Discorreram acerca da não incidência do referido imposto sobre os valores, que não podem servir como base de cálculo.

A medida liminar foi deferida (Ev. 21).

Devidamente notificada, a autoridade coatora prestou esclarecimentos. Defendeu que a regra prevista no artigo 794 do Código Civil é aplicada exclusivamente às indenizações decorrentes de contratos de seguro de vida ou acidentes pessoais para o caso de morte, categorias que não incluem o VGBL, o qual é um plano de seguro com cobertura por sobrevivência (Ev. 32).

O Ministério Público declinou a intervenção no feito (Ev. 38).

É o relatório.

DECIDO.

Com efeito, para a concessão do mandado de segurança necessária a demonstração do direito líquido e certo do interessado e sua ameaça, contra ato do Poder Público ilegalmente praticado ou com abuso de poder, conforme previsto no Artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal e no artigo 1º, caput, da Lei nº 12.016/09:

Art. 5º, inciso LXIX, da CF: Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por ‘habeas corpus’ ou ‘habeas-data’, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuição do Poder Público.

Artigo 1º, caput, da Lei nº 12.016/09: Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.

A respeito do direito líquido e certo nos ensina José dos Santos Carvalho Filho (CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 32 edição. Ver, atual. e ampl. – São Paulo: Atlas, 2018, p. 1102.):

...direito líquido e certo é aquele que pode ser comprovado de plano, ou seja, aquela situação que permite ao autor da ação exibir desde logo os elementos de prova que conduzam à certeza e à liquidez dos fatos que amparam o direito. Se o impetrante não tem esses elementos logo no início do mandado de segurança, não pode valer-se do instrumento, mas sim das ações comuns. Não obstante, nada impede seja concedida a segurança quando há controvérsia sobre a matéria de direito suplanta a matéria de fato, propiciando ao juiz, desde logo, identificar e reconhecer o direito ofendido.

Nesse sentido, é de ser concedida a segurança, de forma definitiva, pelas mesmas razões as quais foi deferido o pedido liminar, eis que aufere-se do feito que não foram colacionados fatos ou elementos de cognição capazes de alterar a decisão prolatada em sede liminar.

Cuida-se de writ em que os impetrantes buscam afastar a incidência do ITDC sobre os valores aplicados em VGBL.

Com razão os impetrantes.

A Lei Estadual nº 8.821/89, ao instituir o Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos - ITCD estabeleceu, no art. 2º, que o imposto tem como fato gerador a transmissão causa mortis sobre os seguintes bens:

Art. 2.º O imposto tem como fato gerador a transmissão causa mortis e a doação a qualquer título, de: I - propriedade ou domínio útil de bens imóveis e de direitos a eles relativos; II - bens móveis, títulos, créditos, ações, quotas e valores, de qualquer natureza, bem como dos direitos a eles relativos.

O plano de previdência VGBL caracteriza-se como seguro de vida individual que tem por objetivo pagar uma indenização, ao segurado, sob a forma de renda ou pagamento único, em função de sua sobrevivência ao período de diferimento contratado.

Nesse sentido, o art. 794 do Código Civil determina o seguinte:

Art. 794. No seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito ”.

Apesar dos argumentos sustentados pela autoridade coatora, a jurisprudência é pacífica no sentido de reconhecer a natureza jurídica de contrato de seguro de vida do plano de previdência privada, ainda que possua a peculiaridade de ser pago em razão da sobrevida do contratante.

Logo, por força do art. 794 do Código Civil, o plano VGBL aqui discutido não deve ser considerado como herança, não estando sujeito, portanto, à incidência do ITCD.

Como já dito na decisão que antecipou os efeitos da tutela, na esteira de precedentes do Superior Tribunal de Justiça, o Eg. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul já decidiu que "não há incidência de ITCMD sobre as aplicações em VGBL, caracterizada como seguro de pessoas pela Superintendência de Seguros Privados - SUSEP". (AgInt nos EDcl no AREsp 947006/SP, STJ, Quarta Turma, Ministro Lázaro Guimarães, DJe 21/05/2018)

Ainda:

APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA NECESSÁRIA. DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ITCD. TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE OS VALORES DE APLICAÇÃO EM VGBL. O VGBL individual – Vida Gerador de Benefício Livre é um seguro de vida individual que tem por objetivo pagar uma indenização ao segurado, sob a forma de renda ou pagamento único. Ou seja, possui natureza de seguro de vida, de forma que não pode ser classificado como herança. Inteligência do artigo 794 do Código de Processo Civil. Considerando que os valores do VGBL possuem natureza jurídica de contrato de seguro de vida, descabe a incidência do ITCD – Imposto de Transmissão Causa Mortis. Precedentes jurisprudenciais. APELO DESPROVIDO. SENTENÇA CONFIRMADA EM REMESSA NECESSÁRIA. DECISÃO MONOCRÁTICA.(Apelação / Remessa Necessária, Nº 70082926809, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira, Julgado em: 07-10-2019)

APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA NECESSÁRIA. DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ORDEM CONCEDIDA. ITCD – IMPOSTO DE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE OS VALORES DE APLICAÇÃO EM VGBL. O VGBL individual – Vida Gerador de Benefício Livre é um seguro de vida individual que tem por objetivo pagar uma indenização ao segurado, sob a forma de renda ou pagamento único. Ou seja, possui natureza de seguro de vida, de forma que não pode ser classificado como herança. Inteligência do artigo 794 do Código de Processo Civil. Considerando que os valores do VGBL possuem natureza jurídica de contrato de seguro de vida, descabe a incidência do ITCD – Imposto de Transmissão Causa Mortis. Precedentes jurisprudenciais. Remessa necessária. A decisão singular que concede a ordem em mandado de segurança está sujeita ao duplo grau de jurisdição, nos termos do § 1º do artigo 14 da Lei nº 12.016/2009. APELAÇÃO CÍVEL DESPROVIDA. SENTENÇA CONFIRMADA EM REMESSA NECESSÁRIA. UNÂNIME.(Apelação e Reexame Necessário, Nº 70080837925, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira, Julgado em: 17-04-2019)

Diante do exposto, CONCEDO A SEGURANÇA para o fim de, confirmando os efeitos da tutela antecipada, declararar que sobre o VGBL não incide ITCD, determinando, assim, em definitivo, o prossseguimento da sobrepartilha extrajudicia sem a inclusão do mesmo no rol de bens.

Isenta a Fazenda Pública da Taxa Única de Serviços Judiciais.

Descabe a condenação em honorários sucumbenciais.

Intimem-se.

Transcorrido o prazo recursal, independentemente de manifestação voluntária das partes, proceda-se à remessa necessária (art. 14, § 1º da Lei nº 12.016/09).

Documento assinado eletronicamente por ROSSANA GELAIN, Juíza de Direito, em 25/11/2021, às 15:32:38, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. A autenticidade do documento pode ser conferida no site https://eproc1g.tjrs.jus.br/eproc/externo_controlador.php?acao=consulta_autenticidade_documentos, informando o código verificador 10013192799v3 e o código CRC c8aaf311.

A inconformidade diz respeito aos seguintes aspectos: (a) alega a incidência de ITCMD sobre o valor do Plano de Previdência do tipo VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre), sustentando que há diferença entre seguros de vida e/ou de acidentes pessoais e o VGBL; defende a não incidência do art. 794 do Código Civil, destacando que o VGBL é assemelhado a um investimento...

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