Acórdão nº 50014752620198210018 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Terceira Câmara Cível, 28-01-2021
Data de Julgamento | 28 Janeiro 2021 |
Órgão | Décima Terceira Câmara Cível |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50014752620198210018 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20000487484
13ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Cível Nº 5001475-26.2019.8.21.0018/RS
TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária
RELATORA: Desembargadora ELISABETE CORREA HOEVELER
APELANTE: BANCO A.J RENNER S.A. (RÉU)
APELADO: MARIA ELISIA AZEVEDO LOPES (AUTOR)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta por BANCO A.J RENNER S.A.contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos da ação revisional que lhe move MARIA ELISIA AZEVEDO LOPES. Referido decisum (evento 56 - doc. SENT1) teve o dispositivo assim redigido:
"Diante do exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por MARIA ELISIA AZEVEDO LOPES em face de BANCO A. J. RENNER S.A., a fim de (i) reduzir a incidência dos juros remuneratórios à taxa média do BACEN (21.26%); (ii) descaracterizar a mora; (iii) limitar a incidência da comissão de permanência, devida em virtude do inadimplemento, nos termos da fundamentação; (iv) vedar a cobrança de honorários advocatícios na fase extrajudicial; (v) autorizar a compensação/repetição dos valores porventura pagos a maior nas prestações já liquidadas, a serem apurados em liquidação de sentença e (vi) conceder a tutela de urgência, nos demais termos da fundamentação.
Ante o decaimento mínimo da parte autora, condeno a parte requerida às custas e aos honorários advocatícios, que fixo no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais) ao procurador da parte autora, observados os vetores do art. 85, §§ 2º e 8º, do CPC, vedada a compensação, nos moldes do art. 85, § 14.
Diante da contemporânea sistemática trazida pelo Código de Processo Civil e, diante da inexistência de juízo de admissibilidade, insculpida no art. 1010, § 3º do CPC, na eventualidade de interposição de recurso de apelação, proceda o Cartório na intimação da parte apelada para que apresente contrarrazões, se assim entender, no prazo de 15 dias. Decorrido o prazo, com ou sem manifestação, subam os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul."
Nas suas razões de apelação (evento 61 - doc. APELAÇÃO1) a parte ré sustentou a legalidade dos juros remuneratórios contratados. Mencionou que não há falar em abusividade quanto à comissão de permanência, pois não cumulada com outros encargos moratórios. Aduziu estar caracterizada a mora do fiduciante. Postulou o provimento do recurso.
O réu apresentou contrarrazões (evento 65 - doc. CONTRAZAP1).
Subiram os autos à Corte.
Vieram conclusos.
VOTO
Atendidos os requisitos de admissibilidade, recebo o presente recurso.
DO CONTRATO
Cuida-se da Cédula de Crédito Bancário n. 1456562, garantida por cláusula de alienação fiduciária, firmada pelas partes em 10 de abril de 2019 (doc. OUT4 - evento 20).
JUROS REMUNERATÓRIOS
Os juros remuneratórios são devidos como compensação ao mutuante pela disposição do dinheiro ao mutuário, sendo lícita a sua incidência. A discussão, pois, diz respeito ao limite de tais juros e sua abusividade, ou não.
O Sistema Financeiro Nacional (SFN) tem como regra a não aplicação das restrições da Lei da Usura (Decreto nº 22.626 de 1933), em se tratando de instituições financeiras, não as sujeitando, pois, à limitação dos juros remuneratórios. Ademais, o §3º do artigo 192 da Constituição Federal, que dispunha sobre a limitação dos juros, foi revogado pela Emenda Constitucional nº 40, de 29/05/2003.
A jurisprudência, com o tempo, encaminhou-se, maciçamente, pela livre pactuação, com restrições pontuais em casos de prova inarredável de abusividade (Resp nº 915.572/RS). Nesse sentido a Súmula n. 382 do Superior Tribunal de Justiça:
“A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”.
E mais recentemente, o REsp nº 1.061.530/RS - julgado de acordo com o rito dos recursos repetitivos - consolidou o posicionamento no sentido de que a taxa de juros remuneratórios somente se caracteriza como abusiva quando significativamente destoante da média do mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil (BACEN) à época da contratação.
Na sedimentação sobre o critério a ser adotado, por seu turno, também indicou o egrégio tribunal superior que a análise deve ocorrer de forma casuística.
Assim aquilatadas as diretrizes supra - e revendo meu posicionamento anterior sobre o tema - entendo que no caso dos autos são regulares os juros remuneratórios pactuados (29,54% ao ano - doc. OUT4), porquanto não ultrapassam o dobro da taxa média de mercado estabelecida pelo BACEN para a data da contratação (21,26%1, em abril/2019), critério esse que vem sendo amplamente aceito pelo STJ.
CARACTERIZAÇÃO DA MORA
A matéria da caracterização da mora já foi apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme o paradigma assentado no REsp. nº 1.061.530/RS, julgado em 22/10/2008, que assim dispôs:
I. Afasta a caracterização da mora:
(i) a constatação de que foram exigidos encargos abusivos na contratação, durante o período da normalidade contratual.
II. Não afasta a caracterização da mora:
(i) o simples ajuizamento de ação revisional;
(ii) a mera constatação de que foram exigidos encargos moratórios abusivos na contratação.
Ainda, mais recentemente, dito entendimento foi convalidado pela corte superior no Recurso Especial paradigma nº 1.639.320/SP, o qual fixou tese de que “a abusividade de encargos acessórios do contrato não descaracteriza a mora”.
Dessa forma, no caso concreto, a mora não resta afastada, pois não revisados os encargos da normalidade contratual.
COMISSÃO DE PERMANÊNCIA E DEMAIS ENCARGOS MORATÓRIOS
No julgamento do REsp. 1.058.114-RS, nos moldes do art. 543-C do antigo CPC, foi amplamente debatido o tema acerca da comissão de permanência, sua natureza e seus limites. Definiu-se que a comissão de permanência possui natureza tríplice, ou seja, compõe-se de índice de remuneração de capital (juros remuneratórios), de encargos que penalizam o financiado inadimplente (juros de mora e multa) e de índice de correção da moeda (correção monetária). Assim manifestou-se o egrégio Superior Tribunal de Justiça no REsp n.º 1.058.114/RS, julgado pelo procedimento dos ritos repetitivos, conforme transcrição que segue:
“[...] Da jurisprudência pacificada é possível afirmar que a natureza da cláusula de comissão de permanência é tríplice: índice de remuneração do capital...
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