Acórdão nº 50015090520178210007 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 24-02-2022

Data de Julgamento24 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50015090520178210007
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001679167
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001509-05.2017.8.21.0007/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano material

RELATOR: Desembargador NIWTON CAES DA SILVA

APELANTE: NILVA BIERHALS KONRAD (AUTOR)

APELANTE: COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE-D (RÉU)

RELATÓRIO

NILVA BIERHALS KONRAD ajuizou ação de indenização por danos materiais em face de COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE-D, alegando ter havido a interrupção do fornecimento de energia elétrica em sua propriedade rural em três oportunidades: no dia 19.12.2016 das 12 horas e 55 minutos às 16 horas e 05 minutos; no dia 30.01.2017 das 21 horas e 10 minutos às 23 horas e 25 minutos; no dia 18.022017 às 19 horas e 50 minutos até o dia 20.02.2017 às 20 e 30 minutos. Disse que tais interrupções geraram prejuízos financeiros na secagem de fumo. Defendeu que a relação havia entre as partes é de consumo, estando amparada no artigo 14 do CDC, bem como que a responsabilidade da demandada é objetiva, consoante determina o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. Postulou, assim, a procedência da ação, com a condenação da demandada ao pagamento dos prejuízos materiais suportados, no valor de R$ 13.928,47 (...), devidamente corrigidos.

Sobreveio sentença de parcial procedência da ação, para o fim de condenar a parte ré ao pagamento da quantia de R$ 4.642,82 (...), com correção monetária pelo IGP-M, a partir da data do laudo, e juros de 1% ao mês, a contar da citação. Em razão do resultado do julgamento, condenou as partes ao pagamento das custas na proporção de 2/3 para a parte autora e 1/3 para a parte ré. Quanto aos honorários de sucumbência, fixou em R$ 1.500,00 (...), que serão divididos na mesma proporção das custas (R$ 1.000,00 e R$ 500,00). Ainda determinou que do valor da condenação sejam abatidos valores das verba sucumbenciais (evento 03 doc 5 páginas 30-36 dos autos digitalizados).

A parte autora apelou aduzindo a ausência de prova da ocorrência de temporal. Defendeu que não é sua obrigação adquirir gerador para fornecimento de energia elétrica, tendo a recorrida obrigação de fornecer serviço público de energia elétrica adequado, eficiente, seguro, de qualidade e manter a continuidade do serviço no fornecimento de energia elétrica. Esclareceu que o gerador supre a falta de energia em curtos espaços de tempo. Defendeu que o conjunto probatório demonstrou que a causa dos prejuízos sofridos é a interrupção de energia elétrica durante o processo de secagem do fumo. Salientou que o serviço de energia elétrica é precário e não seguro. Discorreu acerca da aplicabilidade do CDC. Sustentou que devido ao deferimento da gratuidade de justiça não pode ser condenada ao pagamento dos ônus sucumbenciais. Requereu, por fim, o provimento do recurso com a procedência integral da ação (evento 03 doc 5 páginas 38-50 dos autos digitalizados / evento 03 doc 6 páginas 01-24 dos autos digitalizados).

A parte ré apelou aduzindo a ausência de serviço de fornecimento de energia elétrica sem interrupção. Sustentou a ausência de culpa da concessionária pela interrupção no fornecimento de energia elétrica. Defendeu que não há prova nos autos dos danos suportados pela parte autora. Asseverou a ocorrência de caso fortuito, o que afasta o dever de indenizar. Mencionou que o laudo pericial elaborado pela concessionária auferiu prejuízo inferior ao postulado. Requereu, assim, provimento do recurso (evento 03 doc 6 páginas 25-39 dos autos digitalizados / evento 03 doc 7 páginas 01-02 dos autos digitalizados).

As partes apresentaram contrarrazões.

Os autos vieram conclusos em 25 de janeiro de 2022.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas. Trata-se, consoante sumário relatório, de ação de indenização por danos materiais decorrentes de interrupção no fornecimento de energia elétrica na propriedade do autor, a qual teria causado a perda da qualidade do fumo que estava em processo de secagem em estufa, no dia 19.12.2016 das 12 horas e 55 minutos às 16 horas e 05 minutos (3h30min); no dia 30.01.2017 das 21 horas e 10 minutos às 23 horas e 25 minutos (2h15min); no dia 18.022017 às 19 horas e 50 minutos até o dia 20.02.2017 às 20 e 30 minutos (48h40min), julgada parcialmente procedente na origem.

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço dos recursos de apelação.

Inicialmente, mister destacar que a responsabilidade da empresa ré, na condição de concessionária de energia elétrica e prestadora de um serviço público, é objetiva, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, respondendo pelos danos que seus agentes derem causa, seja por ação, seja por omissão, cabendo à parte contrária a prova dos fatos, o nexo de causalidade e o dano.

Nesse sentido, precedentes jurisprudenciais do egrégio Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Estadual, in verbis:

PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS PROPOSTA POR FAMÍLIA DE VÍTIMA DE ACIDENTE FATAL. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA.

(...)

3. Mesmo antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002, já se reconhecia a responsabilidade objetiva da empresa concessionária de energia elétrica, em virtude do risco da atividade, com fundamento no art. 37, §6º, da CF/88.

4. O risco da atividade de fornecimento de energia elétrica é altíssimo sendo necessária a manutenção e fiscalização rotineira das instalações. Reconhecida, portanto, a responsabilidade objetiva e o dever de indenizar.

(...)

9. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, provido.

(REsp 1095575/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/10/2011, DJe 03/11/2011)

AGRAVO INTERNO. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MATERIAIS DECORRENTES DE SUSPENSÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. PERDA DA QUALIDADE DE FUMO POSTO PARA SECAGEM. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. 1. A ré, na condição de pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público de fornecimento de energia elétrica, tem os limites de sua responsabilidade civil estabelecidos no artigo 37, § 6°, da Constituição Federal. Trata-se, pois, de responsabilidade objetiva, cujos elementos a serem examinados são a efetiva ocorrência dos fatos, o nexo de causalidade e o dano. 2. A interrupção no fornecimento de energia elétrica ocorreu em 29.02.2012, às 08:30, regularizando-se a situação em 02.03.2012 às 12:30. A má-prestação do serviço de fornecimento de energia elétrica é fato incontroverso, uma vez que a própria requerida não nega tal fato, sendo estes verificados pelos documentos que acostou aos autos. Limita-se, entretanto, a requerer a exclusão de sua responsabilidade sob a tese de culpa da vítima, o que não é o caso dos autos. 3. A declaração da Sig Levantamentos é prova suficiente de que o demandante sofreu perda da qualidade do fumo posto para secagem, em razão da falta de energia elétrica, e que, por tal motivo, teve prejuízos financeiros. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. UNÂNIME. (Agravo Nº 70056598444, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira, Julgado em 09/10/2013)

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. JULGAMENTO COM FUNDAMENTO NO ART. 557, CAPUT, CPC. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. INTERRUPÇÃO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. CURA DO FUMO. DANOS MATERIAIS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ONUS PROBANDI DA FORNECEDORA DO SERVIÇO. É objetiva a responsabilidade civil da fornecedora de energia elétrica, tanto pelas disposições do Código de Defesa do Consumidor (art. 14, caput, CDC), quanto por força da Constituição Federal (art. 37, § 6º, CF). Não restaram comprovadas quaisquer das excludentes previstas no art. 14 do CDC, ônus que incumbia à ré. Condenação de ressarcimento dos prejuízos na cura do fumo mantida. Obrigação de ressarcimento os danos materiais suportados pelo consumidor. Precedentes do TJRS. RECURSO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE. SEGUIMENTO NEGADO. (Apelação Cível Nº 70056595317, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em 07/10/2013)

Por outro lado, a concessionária de energia elétrica, por se tratar de responsabilidade civil objetiva, ou seja, sem discussão a respeito de culpa, apenas se exime do dever de indenizar os prejuízos suportados pelos consumidores quando comprovar a inexistência de deficiência no fornecimento de energia ou algumas das excludentes do dever de indenizar (culpa exclusiva do consumidor, caso fortuito ou força maior), tendo em vista ser obrigada a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e contínuos, sob pena de ter de reparar os danos causados, nos termos do artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor, sic:

Art. 22 - Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.

In casu, o conjunto fático-probatório colacionado aos autos comprovou o dano material suportado pela autora conforme os laudos de vistorias elaborados por profissional habilitado e fotografias acostados com a petição inicial (evento 03 doc 01 páginas 23-25, 28-29 e 32-35 dos autos digitalizados), desincumbindo-se a requerente do ônus que lhe recaia, conforme o disposto no artigo 373, inc. I, da legislação processual.

Nesse torvelinho, sinalo que, consoante...

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