Acórdão nº 50015318520228210137 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 09-02-2023

Data de Julgamento09 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50015318520228210137
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003094182
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

14ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001531-85.2022.8.21.0137/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATORA: Desembargadora JUDITH DOS SANTOS MOTTECY

APELANTE: JERONIMO COSTA DA SILVA (AUTOR)

APELADO: AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por JERONIMO COSTA DA SILVA, em ação revisional de contrato bancário, com cláusula de alienação fiduciária, movida em face de AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A., visando reformar a sentença que julgou improcedentes os pedidos.

Requer a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor; a limitação dos juros remuneratórios em conformidade com a taxa média de mercado; a declaração de nulidade da tarifa de cadastro, das tarifas de avaliação e registro e do seguro prestamista; a descaracterização da mora e a compensação e repetição em dobro dos valores pagos a maior. Postula, ainda, a manutenção na posse do bem dado em garantia fiduciária e a vedação ao cadastramento de seu nome em órgãos de proteção ao crédito.

Apresentadas contrarrazões (evento 38).

VOTO

A ação tramitou regularmente, encontrando-se preenchidos os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade do recurso.

Do contrato

As partes ajustaram, em 04/05/2021, cédula de crédito bancário com cláusula de alienação fiduciária. Os juros remuneratórios foram fixados em 2,01% ao mês e 26,96% ao ano.

Da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor

Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor (CDC) às operações de concessão de crédito e financiamento, na medida em que plenamente caracterizado o conceito de consumidor (art. 2°) e fornecedor (art. 3°). Entendimento que restou consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça ao editar a Súmula nº 297: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às Instituições Financeiras".

Dos juros remuneratórios

A questão foi analisada no Recurso Especial nº 1.061.530-RS, com o propósito de estabelecer paradigma de julgamento; o acórdão, relativamente aos juros remuneratórios, restou assim ementado:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. (...) I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS. a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. (...)Vencidos quanto a esta matéria a Min. Relatora e o Min. Luis Felipe Salomão. II- JULGAMENTO DO RECURSO REPRESENTATIVO (REsp 1061530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009).

No caso em exame, a taxa estabelecida no contrato não ultrapassa uma vez e meia a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central para o período (21,29% a.a.), impondo-se sua manutenção1.

Da tarifa de cadastro.

Conforme precedente do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de Recurso Especial Repetitivo, é válida a sua cobrança no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira2. Por outro lado, possível o exame da eventual abusividade do seu valor mediante comparação com o valor médio de mercado divulgado pelo BACEN.

Tem-se, assim, paradigma da superior instância no sentido da legitimidade/legalidade da sua cobrança, desde que, mediante análise do caso concreto e cotejo dos preços no mercado (valor médio de mercado divulgado pelo BACEN), inexista abuso no valor cobrado3.

Na hipótese sub judice, examinando o valor do contrato, o montante cobrado (R$ 850,00) e, ainda, o valor médio praticado no mercado em negócios jurídicos contemporâneos análogos, conforme indicado pelo Banco Central do Brasil4, não há falar em abusividade da tarifa impugnada.

Das tarifas de registro de contrato e de avaliação do bem

O Superior Tribunal de Justiça, em sede de julgamento de recurso representativo de controvérsia repetitiva (REsp. nº 1.578.553-SP), fixou as seguintes teses no tocante à cobrança das referidas tarifas:

2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a:

2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a

2.3.2. possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto.

No tocante à tarifa de registro de contrato, a inclusão do gravame junto ao sistema do órgão de trânsito evidencia a efetiva prestação do serviço; além disso, à míngua de controvérsia acerca da abusividade do valor cobrado, mantém-se a validade da cobrança.

Em relação à tarifa de avaliação de bem, acostado aos autos laudo de avaliação do veículo, resta demonstrada a efetiva prestação do serviço; assim, não comprovada a abusividade da quantia contratada, mantém-se a validade da cobrança.

Do seguro de proteção financeira

No julgamento do Recurso Especial Repetitivo n. 1639320/SP, DJe 17/12/2018, definiu-se a tese de que “nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada”. Isso significa que ao financiado-consumidor deve ser opcional a contratação do seguro (liberdade de contratar), bem como deve haver possibilidade, em optando por contratar, de escolher outra seguradora que não aquela indicada pelo credor fiduciário (liberdade sobre com quem contratar).

Assentadas tais premissas, não se verifica pelos termos da contratação a facultatividade na contratação do seguro ou na escolha da seguradora. Logo, inválida a contratação.

Da descaracterização da mora

Ausente abusividade nos encargos cobrados no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização), não há falar em onerosidade excessiva, impossibilidade ou dificuldade no cumprimento de sua obrigação, razão pela qual são exigíveis os encargos decorrentes da mora (Recurso Especial Repetitivo 1061530/RS5.

Da compensação e repetição do indébito

Constatada a cobrança de valores ilegais decorre, por lógica, o comando para compensação dos valores pagos indevidamente; no caso de inexistir débito, impende a repetição dos valores, de forma simples6, sob pena de enriquecimento injustificado da instituição financeira.

Da tutela provisória

O Superior Tribunal de Justiça, com base na Lei de Recursos Repetitivos, sedimentou a matéria em discussão (REsp 1061530/RS...

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