Acórdão nº 50015514520178210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 23-02-2022
Data de Julgamento | 23 Fevereiro 2022 |
Órgão | Vigésima Câmara Cível |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50015514520178210010 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20001569211
20ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Cível Nº 5001551-45.2017.8.21.0010/RS
TIPO DE AÇÃO: Servidão
RELATOR: Desembargador CARLOS CINI MARCHIONATTI
APELANTE: IDA DONADEL MASOCHI (AUTOR)
APELANTE: MARGARETH SIRENA MASOCHI (AUTOR)
APELANTE: ROBERTO MASOCHI (AUTOR)
APELANTE: SERGIO DOMINGOS MASOCHI (AUTOR)
APELADO: NILVO BERTOLLA (RÉU)
RELATÓRIO
IDA DONADEL MASOCHI, MARGARETH SIRENA MASOCHI, ROBERTO MASOCHI e SERGIO DOMINGOS MASOCHI, como demandantes, apelam da sentença (Evento 7 - PROCJUDIC14 - fls. 572/578v dos autos digitalizados) que julgou improcedente a ação de reintegração de posse ajuizada a NILVO BERTOLLA, nos seguintes termos:
Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE ajuizado do pelos autores ROBERTO MASOCHI, IDA DONADEL MASOCHI, SÉRGIO DOMINGOS MASOCHI e MARGARETH SIRENA MASOCHI em face do requerido NILVO BERTOLLA, para o fim de revogar a decisão que deferiu o pedido de tutela de urgência de fls.379-380.
Sucumbentes, condenando os autores ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios dos procuradores do requerido, os quais fixo em 15% sobre o valor atribuído à causa, devidamente atualizado, na forma do artigo 85, §2.º, do CPC, restando suspensa a exigibilidade uma vez que os autores litigam sob o pálio do benefício da gratuidade da Justiça, conforme decisão de fl.156.
Intimem-se.
Foram apresentados embargos de declaração (Evento 7 - PROCJUDIC14 - fls. 580/581 e Evento 7 - PROCJUDIC15 - fls. 581v/583 dos autos digitalizados), rejeitados pelo Juízo a quo (Evento 7 - PROCJUDIC15 - fls. 589/589v dos autos digitalizados).
Em sua apelação, os demandantes postulam, preliminarmente, a concessão de efeito suspensivo ao recurso, reputando imperiosa a manutenção da liminar concedida em primeiro grau, uma vez que dependem da utilização da estrada que corta a propriedade do apelado para o escoamento da produção de suas terras. Aduzem uma segunda preliminar, assinalando que houve negativa de prestação jurisdicional no que tange à análise do mérito da ação de reintegração de posse, devendo a sentença ser anulada e os autos devolvidos ao primeiro grau para a prolação de nova decisão. No que tange ao mérito, assinalam que a servidão sub judice é por eles utilizada há mais de trinta anos, configurando esbulho a sua obstrução pelo apelado, de modo a justificar a reintegração de posse nos termos da Súmula 415 do STF e dos arts. 555, 558, 560, 561 e 562 do CPC, que conferem a possibilidade de proteção possessória à servidão de trânsito não titulada. Assinalam que, de fato, há outras formas de acesso à sua propriedade além da estrada que corta o imóvel rural do apelado, mas referem que o trânsito por outras vias é difícil e custoso, o que praticamente inviabilizaria sua atividade de produtores rurais. Sustentam que o apelado, quando adquiriu sua propriedade, estava ciente do fato de que deveria dar passagem aos autores, não sendo, portanto, um ato de mera tolerância a permissão de utilização da estrada. Colacionam jurisprudência. Ao final, pedem o provimento do recurso (Evento 7 - PROCJUDIC15 - fls. 591/597v dos autos digitalizados).
O demandado apresentou contrarrazões (Evento 7 - PROCJUDIC15 - fls. 609/611 e Evento 7 - PROCJUDIC16 - fls. 612/646 dos autos digitalizados).
Subindo os autos à Superior Instância, o pedido de suspensão da eficácia da sentença foi indeferido por este Relator, decisão revista após a interposição de embargos declaratórios (Evento 7 - PROCJUDIC16 - fls. 649/653v e Evento 7 - PROCJUDIC17 - fls. 654/658v dos autos digitalizados).
Diversas diligências voltadas a sanar incorreções na digitalização dos autos foram solicitadas pelo Juízo ad quem, tendo sido devidamente cumpridas pelas partes (Eventos 10, 11, 20, 23, 24, 33 e 36).
É o relatório.
VOTO
De início, no que tange à preliminar arguida pelos apelantes em relação à concessão de efeito suspensivo à sentença, ressalto que se trata de questão já superada, posto que o referido pedido restou acolhido no julgamento dos embargos declaratórios autuados sob o n. 70084727346, em decisão monocrática que proferi nos seguintes termos:
Vistos.
Os embargos de declaração alegam omissão e obscuridade na decisão monocrática do Relator que indeferiu o pedido de suspensão da eficácia da sentença à apelação interposta pelos peticionantes e ora embargantes. Alegam os embargantes que é contraditória a decisão quanto ao encravamento do imóvel, que a decisão determina o cumprimento provisório da sentença e impede os embargantes de fazerem uso da estrada que utilizam há mais de trinta anos e que a decisão foi omissa quanto ao direito adquirido dos embargantes.
A alegação de que o encravamento do imóvel determina o cumprimento provisório da sentença diante da colheita caracteriza fato superveniente que justifica os embargos de declaração com efeitos infringentes.
Então, considerando as alegações, principalmente, a situação ligada à passagem privada e ao risco de efeitos irreversíveis à decisão do Relator, os embargos de declaração servem como reconsideração em caráter excepcional e justificado para deferir suspensão provisória.
Para evitar prejuízo à safra, concedo o efeito suspensivo provisório até que o Relator consiga estudar a totalidade da prova com a conclusão dos autos para julgamento da apelação no Tribunal, ocasião em que se tornará a apreciar a manutenção do efeito suspensivo ou não.
Na medida em que o Relator permite isso, determina-se o depósito de caução pela parte peticionante e ora embargante para garantir a sua posição no processo, no valor que arbitro em R$ 1.000,00.
Diante do exposto, acolho os embargos de declaração com efeitos infringentes para suspender provisoriamente a eficácia da sentença até que os autos sejam conclusos para o julgamento da apelação e mediante a prestação de caução pela parte peticionante e embargante, no valor de R$ 1.000,00.
Em relação à segunda preliminar, que envolve uma suposta denegação de jurisdição por não ter sido apreciado o mérito da ação de reintegração de posse, tenho que semelhante alegação confunde-se com o mérito da irresignação trazida no recurso, e como tal deverá ser apreciada. A alegação de negativa jurisdicional é um despropósito, e advém porque os procuradores em juízo confundem deferimento ou indeferimento de pretensão ou defesa com prestação jurisdicional omissa ou positiva. Diante de sentença que não contempla o interesse buscado, a sentença ou é nula ou o juízo omitiu jurisdição. Chega-se a tal ponto que nem mesmo se percebe a gravidade da alegação.
Notado isso, passo, assim, ao exame do mérito.
Nele, voto por dar provimento à apelação.
Trata-se de ação de reintegração de posse ajuizada pelos apelantes em relação à servidão de passagem (estrada de uso comum) que atravessa o imóvel do apelado, servindo-lhes de via de acesso à propriedade, com finalidade essencialmente econômica (escoamento de produtos agrícolas). A obstrução da referida passagem, de acordo com o alegado, caracteriza esbulho possessório, impedindo que exerçam adequadamente suas atividades produtivas.
A demanda foi julgada improcedente, entendendo a Magistrada a quo não haver o direito reclamado em face da existência de outras vias de acesso igualmente possíveis à propriedade dos ora apelantes. A sentença, que é criteriosa, e o meu voto distinguem-se, porque as circunstâncias complexas do caso são daquelas propícias à divergência dos julgados judiciais.
De início, cumpre distinguir quatro situações jurídicas possíveis: a) a passagem forçada, regulada em lei, em proteção do imóvel encravado sem acesso à via pública; b) a denominada servidão de trânsito, suscetível de proteção possessória nos termos da Súmula 415 do Supremo Tribunal Federal, devido à utilização prolongada e obras verificadas que a demonstram aparente; c) a servidão predial de trânsito, como direito real, regularmente constituído e registrado; d) atos de mera permissão ou tolerância, inoponíveis ao titular do prédio dito serviente.
A...
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