Acórdão nº 50016015420208210014 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 31-08-2022

Data de Julgamento31 Agosto 2022
ÓrgãoQuinta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50016015420208210014
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002589166
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001601-54.2020.8.21.0014/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano material

RELATORA: Desembargadora LUSMARY FATIMA TURELLY DA SILVA

APELANTE: BANCO ITAU CONSIGNADO S.A. (RÉU)

APELADO: CANDIDA PEREIRA DA SILVEIRA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por BANCO ITAU CONSIGNADO S.A. contra a sentença (evento 102, SENT1) que, nos autos desta ação de declaração de inexistência de débito cumulada com pedido de repetição de indébito e indenizatória por danos morais aforada por CANDIDA PEREIRA DA SILVEIRA, julgou parcialmente procedente a demanda.

Adoto o relatório da r. sentença, que bem narrou o presente caso:

CANDIDA PEREIRA DA SILVEIRA ajuizou a presente demanda em desfavor do BANCO ITAÚ CONSIGNADO S/A., ambos qualificados, narrando que recebeu na data de 19/12/2018 um crédito em sua conta bancária no valor de R$ 1.450,60 referente a um suposto crédito consignado junto ao réu. Aduz que nunca autorizou o depósito deste valor em sua conta, nem solicitou o empréstimo desse valor. Narra que entrou em contato com o Banco, mas não conseguiu solucionar o problema, pois foi informada de que não existia esse valor em seu nome no sistema. Pontua que se trata de uma fraude e que procurou o PROCON na cidade de Esteio, o qual entrou em contato com o réu e com o Banco BMG, e não conseguiu ser atendido. Pontua que ajuizou demanda contra o réu no juizado especial cível de Esteio e obteve sentença favorável, mas que veio a ser desconstituída pela Turma Recursal ao argumento de que se tratava de matéria complexa, demandando dilação probatória. Pugnou pela procedência da demanda, com pedido de condenação do banco réu ao pagamento de indenização por danos morais e materiais. Requereu a inversão do ônus da prova e a gratuidade da justiça. Juntou documentos (evento 1, INIC1).

Recebida a inicial, foi deferida a gratuidade da justiça à parte autora e determinada a inversão do ônus da prova (evento 3, DESPADEC1).

Citado, o réu contestou (evento 11, CONT1), arguindo, em preliminar, impugnação à gratuidade de justiça concedida à autora. No mérito, sustentou a regularidade da contratação. Referiu que o recebimento dos valores contratados na conta da autora é fato incontroverso. Impugnou a alegação de falsidade da assinatura, pois não havia sido realizada qualquer prova nesse sentido. Referiu o descabimento do pedido de declaração de nulidade do contrato, bem como da inaplicabilidade da repetição de indébito, em razão da ausência de má-fé por parte do Banco réu, bem como por não haver ilicitude na cobrança. Aduziu a ausência de dano moral indenizável, por não existir ato ilícito atribuível ao réu, nem prejuízos financeiros à autora. Requereu, ainda, a razoabilidade na avaliação do dano, em caso de reconhecimento do dever de indenizar. Por fim, sustentou o não cabimento da inversão do ônus da prova, bem como a necessidade de compensar os valores indenizatórios com o valor depositado na conta corrente da autora. Pediu a improcedência dos pedidos e a revogação do benefício de gratuidade da justiça concedido à autora. Acostou documentos.

A parte autora apresentou réplica (evento 14, RÉPLICA1).

Oportunizada a produção de provas (evento 17, DESPADEC1), o réu requereu o depoimento pessoal da autora (evento 23, PET1) e a autora requereu prova pericial - exame grafotécnico (evento 22, PET1).

Sobreveio despacho mantendo a gratuidade da justiça da autora, impugnada pelo réu, bem como designando a realização do exame pericial. As partes foram intimadas para apresentação de quesitos, e o perito intimado para manifestar a concordância quanto à sua nomeação (evento 25, DESPADEC1).

Realizadas as diligências cabíveis, o perito juntou o laudo pericial grafotécnico/documentoscópíco (evento 75, LAUDO1) bem como laudo complementar (evento 88, LAUDO1), respondendo aos demais quesitos apresentados pelas partes, sendo encerrada a instrução.

E o dispositivo sentencial foi exarado nos seguintes termos:

Diante do exposto, com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos para:

I – DECLARAR a inexistência de relação jurídica entre as partes, no tocante ao contrato objeto da lide;

II – CONDENAR a ré à devolução em dobro dos valores cobrados da autora, acrescidos de correção monetária e juros, na forma da fundamentação, valores estes a serem compensados do montante já recebido pela parte autora não devolvidos;

III - CONDENAR a ré ao pagamento de R$ 5.000,00 a título de danos morais, acrescidos de correção monetária pelo IPCA desde a data da sentença e de juros de mora de 1% desde o evento danoso (data da inclusão dos descontos no benefício previdenciário da autora), ambos até o dia do efetivo pagamento;

IV - DETERMINAR que a ré faça cessar, de forma definitiva, os descontos do benefício previdenciário da autora, referentes ao contrato em discussão.

CONDENO cada parte ao pagamento de 50% da totalidade das custas e despesas processuais, assim como honorários advocatícios ao procurador da parte contrária, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa pelo IGP-M, forte no art. 85, §2º, do CPC.

SUSPENDO a exigibilidade dos ônus sucumbenciais da parte autora, pelo prazo legal (na forma do art. 98, §3º, do CPC), em virtude de litigar amparada pelo benefício da gratuidade da justiça.

PROIBIDA a compensação da verba honorária.

Em suas razões recursais (evento 109, APELAÇÃO1), a parte ré afirma que houve o repasse dos valores contratados à parte autora. Sustenta que não apenas as assinaturas são correspondentes, mas o restante do conjunto probatório dos autos também demonstra a legitimidade das operações, afastando a possibilidade de fraude. Destaca que, em caso de fraude, o proveito econômico da contratação não seria direcionado à autora, mas a terceiro que praticou o ilícito. Disserta a respeito do zelo e dos procedimentos adotados para a concessão de empréstimos, apontando que a parte autora não informou, nos autos, extravio de seus documentos pessoais. Assevera que a perícia é falível e que há nítida similaridade entre as assinaturas dos contratos e as assinaturas dos documentos dos autos. Salienta que a conclusão do perito não vincula a decisão do juiz, aduzindo que a perícia efetuada no processo vai de encontro ao restante do conjunto probatório. Refere que, em seu laudo, o perito afirmou que não tem fundamentos para afirmar quais seriam as possíveis ações de alguém ante a situação, acrescentando que, se apenas um expert pode aferir a veracidade da assinatura, não pode ser imposto ao Banco o ônus de identificação da ocorrência de fraude por meio de seus prepostos. Argumenta que, caso se reconheça que as contratações se deram por meio de fraude, deve-se reconhecer a culpa exclusiva de terceiro como excludente de sua responsabilidade, consoante o inciso II do §3º do artigo 14 do CDC. Aduz que a sentença deve ser reformada quanto à condenação à devolução em dobro, uma vez que não restou comprovada a má-fé na cobrança. Discorre acerca da não configuração de danos morais no presente caso, referindo que, em caso de ocorrência de fraude, o Banco réu também foi vitimado. Argui que os danos morais, no presente caso, não são in re ipsa, e que não houve prova de que tenha havido prejuízo ou perturbação da ordem financeira da autora, aduzindo, ainda, que não foi inscrito seu nome em cadastro de inadimplentes. Caso se entenda pela manutenção da condenação à reparação por danos morais, busca a minoração do quantum indenizatório fixado em sentença, que entende ser desproporcional. Pede, ainda, em caso de manutenção da condenação, que os juros de mora incidam desde o arbitramento, mencionando precedente do STJ. Colaciona jurisprudência. Requer o provimento do recurso.

Apresentadas as contrarrazões pela parte autora (evento 112, CONTRAZAP1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

Tendo em vista a adoção do sistema informatizado, os procedimentos previstos nos artigos 931, 932 e 934 do CPC foram simplificados, porém cumpridos na sua integralidade.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso da parte ré é de ser conhecido, porquanto preenchidos os pressupostos de sua admissibilidade, sendo tempestivo e comprovado o pagamento do preparo (evento 109, GUIADEP2).

A autora nega a existência de qualquer contratação de serviços com o banco requerido, aludindo que os descontos mensais realizados em benefício previdenciário teriam sido perpetrados de forma infundada.

Por sua vez, o réu sustenta que os descontos foram legítimos, em virtude da contratação de empréstimo pessoal consignado, consoante documentos por ele acostados. Defende a licitude dos descontos perpetrados na folha de pagamento da demandante, aduzindo ter repassado os valores da contratação à autora.

Pois bem.

A sentença lançada no feito, conforme se depreende do relatório, foi de parcial procedência, tendo sido reconhecido pelo Juízo de Origem como devida a restituição, na forma dobrada, dos valores indevidamente descontados, bem como a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais, eis que verificada a ausência de contratação pela autora do serviço em questão, havendo a desconstituição do débito.

Em que pese o esforço argumentativo da parte ré, de uma leitura atenta do conjunto probatório contido nestes autos, não há provas que evidenciem, com convicção, a contratação do empréstimo pessoal referente ao contrato nº 586393959 por parte da demandante. Com efeito, o contrato acostado pelo réu, em sede de defesa (evento 11, CONTR2), não pode servir como prova da contratação, pois, uma vez submetido à realização de prova pericial grafodocumentoscópica, consoante laudo pericial (evento 75,...

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