Acórdão nº 50016099320138210008 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 16-02-2023
Data de Julgamento | 16 Fevereiro 2023 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50016099320138210008 |
Tipo de documento | Acórdão |
Órgão | Décima Oitava Câmara Cível |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20003192700
18ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Cível Nº 5001609-93.2013.8.21.0008/RS
TIPO DE AÇÃO: Promessa de Compra e Venda
RELATOR: Desembargador JOAO MORENO POMAR
APELANTE: SAGRES DESENVOLVIMENTO IMOBILIARIO S/A (RÉU)
APELADO: ADRIANA D AVILA OLIVEIRA (AUTOR)
APELADO: EDUARDO CORREA AZAMBUJA (AUTOR)
RELATÓRIO
SAGRES DESENVOLVIMENTO IMOBILIÁRIO S/A apela da sentença proferida nos autos da ação declaratória de inexistência de débito c/c com indenização por danos morais que lhe movem ADRIANA D AVILA OLIVEIRA e EDUARDO CORRÊA AZAMBUJA, assim lavrada:
Relatório.
Vistos, etc.
Eduardo Correa Azambuja e Adriana D Avila Oliveira ajuizaram a presente ação em face de Sagres Desenvolvimento Imobiliário S/A, todos já qualificados nos autos, sustentando, em síntese, que em 22.04.1998 adquiram o lote de n° 48, da quadra Q14, do Loteamento Pitangueiras, neste município, com registro no Cartório de Registro de Imóveis sob o n° 52.578, pelo valor de R$ 19.171,02. Aduziram que em meados de 2004 o autor ficou desempregado e atrasou as 12 (doze) últimas parcelas do contrato. Asseveraram que em 21.12.2011 adimpliram a integralidade do débito junto à requerida, pela importância de R$ 22.811,38, referente à liquidação das parcelas remanescentes, acrescidas de juros moratórios, multa e honorários advocatícios. Alegaram que, após o adimplemento do contrato, entraram em contato com a ré solicitando o termo de quitação para realização da escritura do imóvel, o que restou infrutífero. Aduziram terem sido informados de que havia saldo devedor, o qual não restou esclarecido pelo funcionário da demandada, razão pela qual emitiram uma notificação extrajudicial, que foi recebida em 01.08.2013 pela parte ré. Referiram que em 21.10.2013 foram surpreendidos com a cobrança de R$ 52.931,21 referente ao contrato sub judice, ao argumento de que o instrumento era muito antigo e possuía um outro sistema de cálculos que apresentou um valor incorreto. Requereram, liminarmente, que a ré se abstenha de qualquer cobrança ounegativação atinente ao contrato e, no mérito, postularam a declaração de inexistência do débito e a entrega do documento de quitação, bem assim a condenação da demandada ao pagamento de indenização por danos morais. Acostaram documentos (evento 3, PROCJUDIC1 - fls. 14/50 e evento 3, PROCJUDIC2 - fls. 01/03).
Indeferida a gratuidade da justiça (evento 3, PROCJUDIC2 - fls. 05/06) e recolhidas as custas processuais (evento 3, PROCJUDIC2 - fl. 11), foi indeferido o pedido liminar (evento 3, PROCJUDIC2 - fl. 12).
A ré apresentou contestação às fls. 17/26 do evento 3, PROCJUDIC2, asseverando que em 22.04.1998 as partes firmaram "Compromisso de Compra e Venda" tendo por objeto o lote n- 48 da Quadra 14 no Loteamento Pitangueiras, localizado na cidade de Canoas/RS, pelo preço de R$ 19.171,02. Aduziu que os requerentes restaram inadimplentes e em 21.12.2011 efetuaram pagamento no valor de R$ 22.811,38. Alegou que, em resposta à notificação encaminhada pelos requerentes, esclareceu que o contrato entabulado entre as partes não estava quitado. Referiu que em 31.10.2013 os autores foram notificados quanto à inadimplência, ocasião em que lhes foi apresentado o saldo da dívida que totalizava R$ 51.561,42. Sustentou a inexistência de danos morais, postulando a improcedência dos pedidos. Juntou documentos (evento 3, PROCJUDIC2 - fls. 27/50).
Em sede reconvenção (evento 3, PROCJUDIC3 - fls. 09/13), a ré/reconvinte pugnou pela condenação dos reconvindos ao pagamento do saldo devedor atualizado em R$ 62.506,08. Acostou documentos e comprovante de recolhimento das custas processuais (evento 3, PROCJUDIC3 - fls. 14/50 e evento 3, PROCJUDIC4 - fls. 01/07 e 15).
Os autores/reconvindos apresentaram contestação à reconvenção às fls. 19/22 do evento 3, PROCJUDIC4, aduzindo haverem adimplido a integralidade do débito em 21.12.2011, pelo valor de R$ 22.811,38. Requereram a improcedência dos pedidos.
Houve réplica (evento 3, PROCJUDIC4 - fls. 23/28 e 31/34).
Oportunizada a produção de provas (evento 3, PROCJUDIC4 - fl. 35), as partes pugnaram pela realização de prova oral, havendo a demandada postulado também a realização de perícia contábil (evento 3, PROCJUDIC4 - fls. 39/41 e 42/44), o que restou deferido à fl. 45 do evento 3, PROCJUDIC4.
Os quesitos foram apresentados à fl. 49 do evento 3, PROCJUDIC4 e às fls. 01/04 do evento 3, PROCJUDIC5.
Do laudo pericial (evento 3, PROCJUDIC5 - fls. 36/40), as partes se manifestaram às fls. 47/49 do evento 3, PROCJUDIC5, e fls. 06/08 do evento 3, PROCJUDIC6.
Expedido alvará em favor do perito (evento 3, PROCJUDIC6 - fl. 22), houve manifestação do expert à fl. 24 do evento 3, PROCJUDIC6, da qual foi dada vista às partes (evento 3, PROCJUDIC6 - fls. 29/30).
O perito acostou documentos às fls. 33/44 do evento 3, PROCJUDIC6, sobrevindo manifestação das partes no evento 3, PROCJUDIC6 - fls. 49/50 e evento 3, PROCJUDIC7 - fls. 04/05.
Encerrada a instrução (evento 3, PROCJUDIC7 - fl. 07), os memoriais foram apresentados no evento 22, MEMORIAIS1 e no evento 23, MEMORIAIS1, vindo os autos conclusos para sentença.
Relatei.
Decido.
Fundamentação.
No caso dos autos, tem-se que em 22.04.1998 as partes celebraram o instrumento particular de compromisso de compra e venda por meio do qual a ré se comprometeu a vender aos autores o imóvel matriculado sob o nº 52.578 do Registro de Imóveis da Comarca de Canoas, pelo valor total de R$ 19.171,02, restando estabelecido o pagamento de R$ 979,02 no ato no negócio, 72 parcelas mensais de R$ 209,00, bem assim 06 parcelas anuais de R$ 524,00 (evento 3, PROCJUDIC1 - fls. 17/22).
É incontroverso que os adquirentes restaram inadimplentes com o pagamento das parcelas consoante ajustadas no contrato, conforme reconhecido inclusive na exordial (evento 3, PROCJUDIC1 - fl. 03).
Assentadas tais premissas, verifica-se que, através de e-mail encaminhado ao autor em 20.12.2011, a funcionária da ré Raquel Lima da Costa, noticiou que o saldo devedor atualizado para pagamento do contrato era de R$ 22.811,38, ocasião em que esclareceu que, após o pagamento do saldo e das despesas de ITBI e Registro de Imóveis, seria iniciado o processo para expedição da escritura (evento 3, PROCJUDIC1 - fl. 25), in verbis:
"Sr. Eduardo
Bom Dia
Conforme solicitado, segue abaixo valor sugerido para amortização do saldo devedor de seu contrato conosco em 21/12/2011:
R$ 22.811,38 + DESPESAS DE ESCRITURA (ITBI+REGISTRO de IMÓVEIS)
Após pagamento do valor acima iniciaremos o processo para escritura.
Qualquer dúvida entre em contato."
O recibo acostado à fl. 27 do evento 3, PROCJUDIC1 evidencia que, de fato, o autor realizou o pagamento da exata importância informada de R$ 22.811,38 no mesmo dia da apuração do saldo, veiculado no email, é dizer, 21.12.2011, constando expressamente que a importância se referia à liquidação das parcelas remanescentes do contrato, acrescidas de juros moratórios, multa por atraso e honorários advocatícios.
Nessa esteira, veja-se que somente em outubro de 2012 o requerente restou informado acerca de uma suposta "diferença financeira", consoante de infere dos e-mail de fls. 33/35 do evento 3, PROCJUDIC1.
Outrossim, observa-se que em 21.10.2013, em resposta à notificação encaminhada pelo demandante, a demandada comunicou a existência de saldo devedor na importância de R$ 52.931,21 (evento 3, PROCJUDIC1 - fls. 40/42).
Nesse diapasão, a despeito da conclusão contábil do laudo pericial (evento 3, PROCJUDIC5 - fls. 36/40 e evento 3, PROCJUDIC6 - fls. 33/44), que apontou a efetiva existência de saldo devedor, o recibo de fl. 27 do evento 3, PROCJUDIC1, datado de 21.12.2011, sequer impugnado, estampa de forma expressa que o pagamento da importância de R$ 22.811,38 realizado pelo autor se refere à liquidação das parcelas remanescentes do compromisso de compra e venda entabulado entre as partes.
Além disso, cumpre salientar que a suposta diferença de valores apurados pela demandada foi informada ao autor após quase um ano do pagamento do saldo devedor do contrato consoante apurado e informado pela própria demandada (evento 3, PROCJUDIC1 - fl. 25).
Nesse passo, afigura-se manifestamente despropositado imputar-se aos consumidores equívoco da ré, que atuou de forma displicente, veiculou informações inverídicas em documentos fornecidos a terceiros e, à vista delas, obteve pagamento e declinou promessa de quitação não cumprida.
O acolhimento da tese veiculada em contestação implica vulneração da boa-fé objetiva consoante encampada pelo art. 422 do Código Civil, caracterizando venire contra factum proprium.
Assim, em face da atuação temerária e reprovável da fornecedora, cujas informações foram encampadas como verdadeiras pelos contratantes, impõe-se o acolhimento da pretensão para declarar a quitação do contrato sub judice, com o consequente julgamento de improcedência do pedido veiculado em sede de reconvenção, ante a inexistência de saldo devedor.
Por outro lado, melhor sorte não assiste aos autores em relação è pretensão indenizatória, considerando que, na hipótese, tem-se mero dissabor contratual, por certo desagradável - inexistindo, todavia, circunstancia excepcional que caracterize, na hipótese, dano moral.
Dispositivo.
Isto posto:
a) JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão deduzida na ação principal, resolvendo o mérito forte no art. 487, I, do CPC, para declarar a quitação do contrato de compromisso de compra e venda de fls. 17/22 do evento 3, PROCJUDIC1.
Em face da sucumbência de maior monta, condeno a ré ao pagamento de 70% das custas, bem como dos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% sobre o valor da causa, incumbindo à autora o pagamento do percentual restante da verba.
b) JULGO IMPROCEDENTE os pedidos formulados em sede de reconvenção,...
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