Acórdão nº 50016464820178210019 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 08-02-2023

Data de Julgamento08 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50016464820178210019
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003205404
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001646-48.2017.8.21.0019/RS

TIPO DE AÇÃO: ICMS/ Imposto sobre Circulação de Mercadorias

RELATORA: Desembargadora LAURA LOUZADA JACCOTTET

APELANTE: JOSE VALMIR RUARO (EMBARGANTE)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (EMBARGADO)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por JOSE VALMIR RUARO, nos autos dos embargos à execução opostos em desfavor do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, da sentença cujo dispositivo restou assim redigido:

Pelo exposto, na forma do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, DESACOLHO OS EMBARGOS, julgando IMPROCEDENTE o pedido do embargante.

Condeno a parte embargante ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios do procurador da parte embargada, que fixo em 10% do valor da causa devidamente atualizado pelo IGP-M até o efetivo pagamento, considerando a natureza da matéria e o trabalho desenvolvido, na forma do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

Suspendo a exigibilidade dos ônus sucumbenciais, em razão da Assistência Judiciária Gratuita deferida a parte embargante.

Em suas razões, argumentou que não deveria ter sido incluído no polo passivo da execução fiscal, porquanto seria apenas sócio cotista da pessoa jurídica, e não responderia por eventuais dívidas da sociedade empresária. Colacionou jurisprudência a respeito do tema. Acrescentou que o crédito tributário cobrado pelo ente público estadual estaria fulminado pela decadência e pela prescrição intercorrente. Ainda, destacou que a multa aplicada, no percentual de 30%, seria onerosa e prejudicial ao contribuinte, em razão do que deveria ser afastada. Por fim, defendeu a nulidade da penhora, pois teria incidido sobre veículo alienado fiduciariamente em favor de instituição bancária. Nesses termos, pediu o provimento do recurso.

Houve contrarrazões.

O Ministério Público opinou pelo desprovimento do recurso.

O embargante noticiou o aprazamento de leilão para o dia 31/03/2023, postulando a suspensão.

Após, vieram os autos conclusos para julgamento.

VOTO

Conheço do recurso, pois presentes os pressupostos de admissibilidade, e passo a realizar sua análise.

Em 24/10/2008, o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL ajuizou execução fiscal em face de MERCADO LETIERI LTDA. para cobrança de ICMS não informado no montante de R$ 55.880,00 (atualização até 25/09/2008). Os fatos geradores ocorreram entre janeiro e dezembro/2002 (CDA n. 08/31468) e entre janeiro e dezembro/2003 (CDA n. 08/31469), tendo sido os autos de lançamento tributários, respectivamente, lavrados em 01/12/2003 e 29/08/2006, datas em que ocorreram as notificações do sujeito passivo.

Determinada a citação em 07/11/2008, o oficial justiça certificou que a empresa não estaria mais em funcionamento. Informado outro endereço, o oficial de justiça noticiou, novamente, não ter encontrado a empresa funcionando no local (28/11/2010).

Ao depois, o ente público requereu a citação na pessoa de seus representantes legais, JOSE VALMIR RUARO e Viviane da Rosa Ruaro, determinando-se a expedição de mandado (19/05/2011), o qual foi cumprido positivamente, na pessoa de Viviane, em 10/02/2012, noticiando-se que:

Na sequência, o Estado requereu a penhora on-line em nome da empresa, a qual restou inexitosa, sobrevindo, então, em 04/12/2012, petição na qual o ente público requereu a inclusão dos sócios-gerentes no polo passivo da execução fiscal - JOSE VALMIR RUARO e Viviane da Rosa Ruaro -, o que restou deferido pelo juízo de origem, verbis:

Em julho/2013, ocorreu a citação dos sócios-gerentes, tendo o ente público requerido a realização de penhora on-line, a qual restou inexitosa, considerando a existência de valor irrisório desbloqueado (R$ 29,44).

O Estado noticiou a inexistência de imóveis em nome da parte executada e postulou a consulta via INFOJUD, inexitosa, entretanto.

Posteriormente, em 10/12/2014, requereu a decretação da indisponibilidade de bens, o que foi deferido pelo juízo de origem.

Demais, em 09/10/2015, o ente público obteve a informação, via sistema do DETRAN, da existência de direitos e ações sobre veículo de titularidade de JOSE VALMIR RUARO, alienado fiduciariamente em favor de instituição financeira, postulando a penhora dos direitos e ações e requerendo a intimação da instituição, o que foi deferido (08/07/2016). A penhora restou cumprida, com a devida intimação de JOSE:

No dia 21/02/2017, o executado JOSE protocolou embargos à execução fiscal, os quais não foram acolhidos pelo juízo de origem.

Inconformado, o executado interpôs o presente recurso.

Pois bem.

Preliminarmente, em sede de contrarrazões, o ente público argumentou a insufiência da penhora para admissão dos embargos à execução fiscal: o veículo, cuja penhora teria recaído sobre os direitos e ações, teria sido avaliado em R$ 39.000,00, enquanto o valor atualizado da execução seria de R$ 108.229,87, sem incidência das custas e dos honorários.

No curso dos embargos à execução, foi determinada a intimação da parte embargante para demonstrar a inexistência de bens e rendas para garantir integralmente o juízo ou, eventualmente, complementar a garantia já prestada por meio da penhora realizada na execução fiscal. Intimado, o embargante juntou documentos comprovando a impossibilidade de garantir integralmente o juízo, tendo o próprio Estadomanifestado a sua ciência, sem insurgência.

Acerca dos embargos à execução, a Lei de Execução Fiscal assim disciplina:

Art. 16 - O executado oferecerá embargos, no prazo de 30 (trinta) dias, contados:

I - do depósito;

II - da juntada da prova da fiança bancária;

III - da intimação da penhora.

§1º - Não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a execução.

§2º - No prazo dos embargos, o executado deverá alegar toda matéria útil à defesa, requerer provas e juntar aos autos os documentos e rol de testemunhas, até três, ou, a critério do juiz, até o dobro desse limite.

§3º - Não será admitida reconvenção, nem compensação, e as exceções, salvo as de suspeição, incompetência e impedimentos, serão argüidas como matéria preliminar e serão processadas e julgadas com os embargos. Grifei.

A questão atinente à necessidade de prévia garantia do juízo para o recebimento dos embargos e, por consequência, a inaplicabilidade, às execuções fiscais, do art. 736 do Código de Processo Civil de 1973 (art. 914 do Código de Processo Civil de 2015) ante a prevalência do art. 16, § 1°, da Lei das Execuções Fiscais, restou definida pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1272827/PE, apreciado sob o regime do art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973, consoante ementa abaixo colacionada:

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. APLICABILIDADE DO ART. 739-A, §1º, DO CPC ÀS EXECUÇÕES FISCAIS. NECESSIDADE DE GARANTIA DA EXECUÇÃO E ANÁLISE DO JUIZ A RESPEITO DA RELEVÂNCIA DA ARGUMENTAÇÃO (FUMUS BONI JURIS) E DA OCORRÊNCIA DE GRAVE DANO DE DIFÍCIL OU INCERTA REPARAÇÃO (PERICULUM IN MORA) PARA A CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO AOS EMBARGOS DO DEVEDOR OPOSTOS EM EXECUÇÃO FISCAL.

1. A previsão no ordenamento jurídico pátrio da regra geral de atribuição de efeito suspensivo aos embargos do devedor somente ocorreu com o advento da Lei n. 8.953, de 13, de dezembro de 1994, que promoveu a reforma do Processo de Execução do Código de Processo Civil de 1973 (Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - CPC/73), nele incluindo o §1º do art. 739, e o inciso I do art. 791.

2. Antes dessa reforma, e inclusive na vigência do Decreto-lei n. 960, de 17 de dezembro de 1938, que disciplinava a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública em todo o território nacional, e do Código de Processo Civil de 1939 (Decreto-lei n. 1.608/39), nenhuma lei previa expressamente a atribuição, em regra, de efeitos suspensivos aos embargos do devedor, somente admitindo-os excepcionalmente. Em razão disso, o efeito suspensivo derivava de construção doutrinária que, posteriormente, quando suficientemente amadurecida, culminou no projeto que foi convertido na citada Lei n. 8.953/94, conforme o evidencia sua Exposição de Motivos - Mensagem n. 237, de 7 de maio de 1993, DOU de 12.04.1994, Seção II, p. 1696.

3. Sendo assim, resta evidente o equívoco da premissa de que a LEF e a Lei n. 8.212/91 adotaram a postura suspensiva dos embargos do devedor antes mesmo de essa postura ter sido adotada expressamente pelo próprio CPC/73, com o advento da Lei n. 8.953/94, fazendo tábula rasa da história legislativa.

4. Desta feita, à luz de uma interpretação histórica e dos princípios que nortearam as várias reformas nos feitos executivos da Fazenda Pública e no próprio Código de Processo Civil de 1973, mormente a eficácia material do feito executivo a primazia do crédito público sobre o privado e a especialidade das execuções fiscais, é ilógico concluir que a Lei n. 6.830 de 22 de setembro de 1980 - Lei de Execuções Fiscais - LEF e o art. 53, §4º da Lei n. 8.212, de 24 de julho de 1991, foram em algum momento ou são incompatíveis com a ausência de efeito suspensivo aos embargos do devedor. Isto porque quanto ao regime dos embargos do devedor invocavam - com derrogações específicas sempre no sentido de dar maiores garantias ao crédito público - a aplicação subsidiária do disposto no CPC/73 que tinha redação dúbia a respeito, admitindo diversas interpretações doutrinárias.

5. Desse modo, tanto a Lei n. 6.830/80 - LEF quanto o art. 53, §4º da Lei n. 8.212/91 não fizeram a opção por um ou outro regime, isto é, são compatíveis com a atribuição de efeito suspensivo ou não aos embargos do devedor. Por essa razão, não se incompatibilizam com o art. 739-A do CPC/73 (introduzido pela Lei 11.382/2006) que condiciona a...

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