Acórdão nº 50016751020128210008 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 03-02-2022

Data de Julgamento03 Fevereiro 2022
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50016751020128210008
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001498380
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5001675-10.2012.8.21.0008/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes do Sistema Nacional de Armas (Lei 9.437/97 e Lei 10.826/03)

RELATOR: Desembargador NEWTON BRASIL DE LEAO

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

1. Trata-se de apelação, interposta por JULIANO FONTES CARNEIRO, contra decidir que o condenou, como incurso nas sanções do artigo 12 caput da Lei nº 10.826/03, às penas de 01 ano e 03 meses de detenção, no regime aberto, substituída, e de 20 dias-multa, por fatos assim descritos na inicial acusatória:

"No dia 25 de julho de 2012, por volta das 11h20min, no interior da residência situada na Rua da Barca, nº 2003, bairro Mathias Velho, em Canoas/RS, o denunciado JULIANO FONTES CARNEIRO possuía uma espingarda, de pressão modificada para calibre 22 e uma espingarda de fabricação artesanal, calibre 12, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, conforme auto de apreensão e Laudos Periciais das fls. 17 e 63/68, do IP.

Na ocasião, o denunciado JULIANO FONTES CARNEIRO possuía as armas de fogo, supramencionadas, na residência acima descrita, que foram apreendidas pelos policiais militares, no momento em que averiguavam uma denúncia de uma suposta clonagem de veículo automotor.

As armas de fogo foram apreendidas e periciadas e restou constatado que, embora elas estivessem em mau estado de conservação, encontravam-se em condições de uso e funcionamento, consoante o auto de exame de perícia nº15654/2012, acostado às fls. 63/6 4 do IP."

Nas razões, preliminarmente, sustenta a nulidade da prova em razão da violação de domicílio. No mérito, argumentando ausência de materialidade por se tratar de arma de pressão e de adaptação artesanal, além de insuficiência probatória e atipicidade da conduta por ausência de lesividade, pugna por absolvição. Subsidiariamente, requer o redimensionamento da basilar.

O recurso foi contra-arrazoado.

Em parecer, a Dra. Procuradora de Justiça opina pelo desprovimento do apelo defensivo.

Esta Câmara adotou o sistema informatizado, tendo sido atendido o disposto no artigo 613, inciso I, do Código de Processo Penal.

É o relatório.

VOTO

2. O recorrente, dado como incurso nas sanções do artigo 12 da Lei nº 10.826/03, foi condenado à pena corporal de 01 ano e 03 meses de detenção.

A denúncia foi recebida em 27.11.2014 (Evento 3 - PROCJUDIC3 - fl. 08), o processo foi suspenso entre os dias 22.07.2015 e 29.06.2017 (Evento 3 - PROCJUDIC3 - respectivamente fls. 121 e 133 dos autos originários) e que a sentença condenatória foi publicada em 07.05.2020 (Evento 3 - PROCJUDIC6 - fl. 225 dos autos originários), com o que não transcorrido o prazo prescricional de 04 anos, previsto no artigo 109, inciso V, do Código Penal.

3. Passo, assim, à análise da prefacial de invalidade da prova, forte em alegada invasão de domicílio, a qual, adianto, não merece acolhida.

Sem delongas, sabido que por se tratar a posse de arma de fogo de delito permanente, faz-se desnecessário mandado de busca e apreensão quando há indícios da prática delitiva, como evidenciado no presente caso, em que, perseguido o réu na via pública após denuncia de estar conduzindo veículo clonado, adentrou a residência, local onde encontrado o artefato.

Nítida, assim, a justa causa para o ingresso na residência do infrator, não havendo cogitar nulidade do ato.

Assim a jurisprudência desta Câmara:

"APELAÇÃO CRIMINAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. POSSE IRREGULAR DE MUNIÇÃO DE USO PERMITIDO. RECEPTAÇÃO. ARTS. 14 E 12 DA LEI Nº 10.826/03. ART. 180, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINARES. AUSÊNCIA DE RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. NULIDADE DE EXAME PERICIAL. CRIMES DE PERIGO ABSTRATO. VIOLAÇÃO DOMICILIAR. REJEIÇÃO. PROVAS DA AUTORIA E MATERIALIDADE. DOLO DA RECEPTAÇÃO EVIDENCIADO. CONDENAÇÕES MANTIDAS. PENAS REDUZIDAS. 1. Inexiste nulidade por ausência de recebimento da denúncia, em relação ao réu L.A.L.D. No caso, houve recebimento tácito da exordial, porquanto, ainda que o recebimento não tenha sido explícito, o Magistrado procedeu a realização dos atos subsequentes da instrução do feito, observando as formalidades legais e as garantias do acusado, que teve oportunizada sua defesa e foi devidamente inquirido, não havendo prejuízo. Precedentes. 2. Segundo entendimento dos Tribunais Superiores, é desnecessária a realização da perícia da potencialidade lesiva da arma, caracterizando-se o crime, ainda que a arma de fogo esteja desmuniciada. No presente caso, de qualquer modo, os testes demonstraram ser a arma e as munições aptas à produção de disparos. Além disso, foram realizados por policiais civis detentores de curso superior, não se verificando qualquer nulidade, eis que atendidos os comandos legais. 3. O porte ilegal de arma defogo e a posse irregular de munição são crimes de perigo abstrato e de mera conduta, mostrando-se prescindível a demonstração de perigo concreto. Precedentes. Na esteira do entendimento dos Tribunais, em especial o Supremo Tribunal Federal, não são inconstitucionais os crimes de perigo abstrato, a exemplo daqueles previstos na Lei 10.826/03, que teve sua constitucionalidade assentada na ADI 3.112/DF. 4. Conforme a jurisprudência dos Tribunais Superiores, que interpretam o conteúdo explícito do art. 5º, XI, da CF, não há nulidade ou imprestabilidade da prova obtida durante prisão em flagrante por porte e posse de arma, por alegada violação de domicílio. Tratam-se de crimes permanentes, mostrando-se desnecessária a existência de mandado de busca e apreensão. (...) PRELIMINARES REJEITADAS. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA" (Apelação Crime Nº 70069683860, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Julio Cesar Finger, Julgado em 01/09/2016).

No mesmo sentido pronuncia-se o STJ:

"RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS COUS. POSSE OU PORTE DE ARMA DE FOGO E MUNIÇÕES DE USO RESTRITO. ILEGALIDADE DA BUSCA E APREENSÃO. CRIME PERMANENTE. DESNECESSIDADE DE MANDADO JUDICIAL. SITUAÇÃO DE FLAGRÂNCIA. DECISÃO DE RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. RECURSO DESPROVIDO. 1. Com relação às provas, o Tribunal de origem afirmou a legalidade da busca e apreensão realizada na residência do recorrente, em consonância com a jurisprudência consolidada nesta Corte Superior, no sentido de que, tratando-se de crime permanente, não há ilegalidade na busca e apreensão por violação de domicílio, uma vez que a própria Constituição Federal autoriza a entrada da autoridade policial seja durante o dia, seja durante a noite, independente da expedição de mandado judicial. (...) Cumpre destacar, ainda, que o fato dos policiais terem sido recebidos com disparos de arma de fogo realizados pelos seguranças da propriedade, que em seguida fugiram para o interior da residência, por si só é suficiente para justificar a medida de busca e apreensão em residência. Do mesmo modo, ainda que pairasse qualquer dúvida sobre a legalidade da busca e apreensão realizada, esta não seria suficiente para o trancamento da ação penal, uma vez que o crime de posse irregular de arma de fogo de uso restrito é do tipo permanente, o qual autoriza a prisão em flagrante no interior do domicílio, independente de mandado judicial. Não há, portanto, falar em flagrante ilegalidade na decisão que determina seu recebimento. Recurso ordinário desprovido" (RHC 85.831/MS, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 19/09/2017, DJe 27/09/2017).

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