Acórdão nº 50017049720188210057 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 10-11-2022

Data de Julgamento10 Novembro 2022
Classe processualApelação
Número do processo50017049720188210057
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002824777
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5001704-97.2018.8.21.0057/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes do Sistema Nacional de Armas (Lei 9.437/97 e Lei 10.826/03)

RELATORA: Desembargadora GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

ADVOGADO: ALDEMAR OTTONE IGLESIAS BRAGHIROLLI (OAB RS064775)

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia em desfavor de NERI RUSCH, com 48 anos de idade à época dos fatos, dando-o como incurso nas sanções dos artigos 129, §9º; artigo 148, §1º, inciso I; artigo 147, caput, combinado com 61, inciso II, alínea "f" do Código Penal, e artigo 12 da Lei nº 10.826/2003, todos na forma do artigo 69, caput, do Código Penal, pela prática dos seguintes fatos delituosos:

1º Fato:

No dia 10 de agosto de 2016, pelo período da manhã, na localidade do Passo dos Limas, no interior do município de Capão Bonito do Sul/RS, o denunciado, prevalecendo-se das relações domésticas e coabitação, ofendeu a integridade corporal da vítima Marines Conte Rusch, sua companheira, causando-lhe a seguinte lesão: "[...] hematoma ocular e periocular esquerdo e escoriação à direito [...]", conforme atestado médico da fl. 11.

Na ocasião, o denunciado, sem motivo apurado nos autos, agrediu a vítima com um empurrão e com um soco no seu rosto.

2º Fato:

Nas mesmas circunstâncias de tempo e espaço do primeiro fato, o denunciado, prevalecendo-se das relações domésticas e coabitação, privou a vítima Marines Conte Rusch de sua liberdade, mediante cárcere privado.

Para tanto, o denunciado, após agredir a vítima, impediu que esta saísse de casa, mantendo-a trancada no local até o dia seguinte, quando seu filho conseguiu acionar a Brigada Militar.

O crime foi praticado contra a companheira.

3º Fato:

No dia 11 de agosto de 2016, pela manhã, no interior do município de Capão Bonito do Sul/RS, o denunciado, prevalecendo-se das relações domésticas e coabitação, ameaçou, por palavras, a vítima Marines Conte Rusch, sua companheira, de causar-lhe mal injusto ou grave.

Para tanto, após impedir que a vítima saísse de casa, ameaçou esta de morte caso relatasse os fatos a alguém.

4º Fato:

No dia 11 de agosto de 2016, por volta das 08 horas, na Localidade do Passo dos Limas, no interior do município de Capão Bonito do Sul/RS, o denunciado possuía 01 (um) revólver calibre 32, marca Taurus, niquelado, com cabo isolado por fita isolante preta, municiado com 05 (cinco) cartuchos calibre 32; 01 (um) coldre de nylon de cor preta; 01 (um) cinturão de couro marrom, com 31 (trinta e um) cartuchos calibre 32 de plástico e 05 (cinco) cartuchos de metal calibre 32; 01 (um) estojo de plástico calibre 32; 01 (uma) espingarda marca Boito, com um cano, B-750 946985, calibre 32, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, qual seja, o Decreto número 5.123, de 01 de julho de 2004 - Auto de Apreensão da fl. 07.

A denúncia foi recebida em 09.04.2018 (evento 3, PROCJUDIC2, fls. 06/07).

Pessoalmente citado, o acusado apresentou resposta à acusação por intermédio de defendor constituído (evento 3, PROCJUDIC2, fls. 16/29).

Durante a instrução processual, foram ouvidas as testemunhas, a vítima, e prosseguido o interrogatório do réu (evento 3, PROCJUDIC4, fl. 38).

Encerrada a instrução, os debates orais foram substituídos por memoriais que foram apresentados pelo Ministério Público (evento 3, PROCJUDIC4, fls. 44/47), e pela defesa (evento 3, PROCJUDIC4, fl. 50 e evento 3, PROCJUDIC5, fls. 01/08).

Sobreveio sentença de lavra do Dr. Michael Luciano Vedia Porfirio, a fim de absolvê-lo das sanções previstas nos artigos 148, § 1º, inciso I; artigo 147, caput, combinado com o artigo 61, inciso II, alínea "f" todos do Código Penal, e condenar o réu como incurso nas sanções do artigo 129, § 9º do Código Penal e do artigo 12 da Lei nº 10.826/03, às penas de 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de detenção em regime inicial aberto, bem como à pena de multa, fixada em 10 dias-multa à razão de 1/30 do salário mínimo nacional vigente à época dos fatos (evento 3, PROCJUDIC5, fls. 17/33).

A sentença foi publicada em 18.11.2020.

A defesa interpôs recurso de apelação (evento 3, PROCJUDIC5, fl. 46). Em razões, requereu a absolvição do réu sustentando a inexistência de conduta típica. Postulou pela redução da pena, e/ou substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Por fim, pugnou pelo afastamento da pena de multa em razão da condição financeira do réu (evento 3, PROCJUDIC6, fls. 02/10).

O Ministério Público apresentou contrarrazões (evento 3, PROCJUDIC6, fls. 16/18), e os autos foram remetidos a esta Corte.

Em parecer, a ilustre Procuradora de Justiça, Dra. Sílvia Cappelli, opinou pelo desprovimento do recurso de apelação (evento 7, PARECER1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Desembargadores:

Conheço do recurso, uma vez que adequado e tempestivo.

Primeiramente, no que se refere ao pedido de absolvição, não assiste razão à defesa do acusado.

Isso porque, examinando os autos se pode observar o acerto da decisão de lavra do Dr. Michel Luciano Vedia Porfirio, eminente Juiz de Direito, que condenou NERI RUSCH como incurso nas sanções do artigo 129, § 9º do Código Penal e do artigo 12 da Lei nº 10.826/03.

A tese defensiva absolutória não merece acolhida, uma vez que a prática dos crimes descritos na denúncia restou sobejamente demonstrada nos autos.

Lesão corporal:

A materialidade do delito e a autoria restou evidenciada pelos registros dos boletins de ocorrência, pelo Atestado Médico, bem como pela prova oral carreada aos autos.

No tocante à autoria delitiva, em que pese o acusado tenha negado a autoria dos fatos, a versão apresentada pelo réu não tem o condão de confrontar os demais elementos probatórios existentes nos autos.

Com efeito, os elementos dos autos foram analisados com acuidade e precisão na sentença, motivo pelo qual peço vênia para transcrevê-la, adotando-a como razão de decidir:

A vítima Marines Conte Rush, em seu depoimento em sede judicial (mídia à fl. 145), disse que estava fazendo seu serviço rotineiro e quando estava no tanque, quando o acusado lhe agrediu com socos (inclusive tendo lhe atingido o rosto), empurrões e puxões nos cabelos, sem motivos. Quando questionada se havia sido trancada dentro de casa, referiu que o acusado não lhe deixava sair, tendo lhe vigiado até o outro dia quando a polícia chegou, momento que o acusado fugiu. Relatou que o representado ficou no mesmo quarto que ela durante a noite, sendo que a depoente não conseguiu dormir. Ficou casada com o acusado cerca de vinte e seis anos; que o acusado constantemente repetia que iria lhe matar. Após a polícia ter chegado ao local, a depoente informa que foi morar com sua filha e estão separados desde então. Quanto a arma, refere que ficava guardada no roupeiro. No dia dos fatos, referiu que o acusado lhe segurou para que ela não saísse de casa, tendo ficado assim até a chegada da polícia no outro dia, pois havia conseguido pedir ajuda para seus filhos. O acusado lhe procurou pedindo para que ela voltasse para casa. Quando questionada pela defesa, que inquiriu sobre o motivo da agressão ser devido a um caminhão que estava prometido ao Maicon, respondeu que não sabia sobre, que estava “sempre na sua” fazendo o serviço de casa e não se manifestava nessas situações. A defesa questionou se o acusado havia trancado as portas da casa para que ela não saísse, sendo que a depoente respondeu que não havia trancado. Mencionou que havia pedido ajuda ao seu filho para sair de casa e ir para sua filha, que ficou sabendo do ocorrido, pois uma vizinha escutou a agressão e ligou para alertá-la do que acontecia com sua mãe, ora depoente. Então sua filha ligou para o irmão que foi em auxílio a depoente. Ao ser inquirida pela defesa sobre quem havia chamado a autoridade policial, disse que quem chamou foi seu filho, pois o acusado não lhe deixava sair de casa. Sobre as armas, respondeu ao procurador do representado que quem entregou foi seu filho e no dia dos fatos não havia sido ameaçada com o referido armamento. Informa que as vezes ia até sua vizinha, mas que o réu ficava bravo.

A testemunha de defesa Darci Chaparini, em seu depoimento em sede judicial, disse que conhecia o acusado e possui um certo grau de parentesco com ele. Referiu que não sabe nenhuma informação sobre o ocorrido, pois não reside na mesma cidade. Afirmou, dentro de seus conhecimentos, que o acusado seria uma pessoa correta e que não teria atribuições em seu caráter que comprovassem que ele seria capaz de realizar os fatos da acusação. Por fim, alegou que atualmente não possui nem um tipo de contato com Neri e que seria demasiadamente difícil ficar sabendo dos fatos ocorridos.

A testemunha Arlindo Migão, em seu depoimento em sede judicial, disse que nunca viu nenhum conflito entre o casal, sendo de seu conhecimento que a relação do acusado com seu filho seria harmoniosa. Por fim, afirmou que o caráter do réu seria íntegro, sendo que desconhece qualquer motivo para haver uma contenda entre os familiares.

A testemunha Lari Bertolio, em seu depoimento em sede judicial, disse que é vendedor e que sempre foi seu cliente e nunca observou nenhuma desavença no o relacionamento entre Neri, Maicon e Marines. Referiu por fim, que desconhece os possíveis motivos que teriam levado Neri a agredir a vítima e afirmou que não tem conhecimento a respeito de traços agressivos no caráter de Neri que pudessem justificar as suas ações.

A testemunha Fabiana Nunes, em seu depoimento em sede judicial, afirmou que na área morava Marines, Neri e Maicon, e o relacionamento entre eles seria de certa forma harmonioso. Contou que havia...

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