Acórdão nº 50017206120208211001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 27-04-2022

Data de Julgamento27 Abril 2022
ÓrgãoVigésima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50017206120208211001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002050743
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001720-61.2020.8.21.1001/RS

TIPO DE AÇÃO: Promessa de Compra e Venda

RELATOR: Desembargador DILSO DOMINGOS PEREIRA

APELANTE: FERNANDA CELIA MROGINSKI NICOLINI (AUTOR)

APELANTE: JULIANO NICOLINI (AUTOR)

APELADO: MELNICK EVEN PINUS EMPREENDIMENTO IMOBILIARIO SPE LTDA. (RÉU)

RELATÓRIO

FERNANDA CELIA MROGINSKI NICOLINI e JULIANO NICOLINI, de um lado, e MELNICK EVEN PINUS EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO SPE LTDA., de outro, apelam da sentença proferida nos autos da ação de resilição contratual ajuizada por aqueles em face desta, cujo dispositivo enuncia:

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido contido na presente ação ajuizada por JULIANO NICOLINI em face de MELNICK EVEN PINUS EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO SPE LTDA., para o fim de declarar a rescisão do contrato objeto da presente discussão, com a declaração de nulidade da cláusula 9.2 parágrafo terceiro, reduzindo a cláusula penal para o percentual de 10% sobre os valores pagos pela promitente compradora, bem como, condenando a demandada a restituir à autora a diferença correspondente ao montante pago, devidamente abatido da quantia recebida em decorrência do distrato firmado entre as partes, valor que deverá ser apurado em liquidação de sentença, devidamente corrigido pelo IGP-M desde a propositura da ação e acrescido de juros legais desde a citação, nos termos da fundamentação acima, rejeitando-se os demais pedidos.

Em face do princípio da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de 50% das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono do réu, no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), corrigidos pelo IGP-M a contar deste julgamento, com base no art. 85, §§ 2º, 8º e 11º, do CPC, restando suspensa em razão de o autor litigar sob o pálio da gratuidade da justiça (Evento 9); condeno o demandado outrossim, ao pagamento dos demais 50% das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono do autor que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, forte no art. 85, §§ 2º e 11º do CPC/15.

Em suas razões, os autores sustentam que os valores pagos a título de comissão de corretagem lhes devem ser restituídos, pois não houve a intermediação imobiliária. Requerem o provimento do apelo, com a reforma da sentença nesse tópico.

A ré, no seu apelo, argui a ausência de interesse processual. Sustenta que celebrou um distrato com os autores, ocasião em que pactuaram a devolução do valor total de R$ 46.077,45. Registra que, após as partes se darem plena, geral, ampla e irrestrita quitação, os autores se sentiram prejudicados com os termos do distrato, razão pela qual ajuizaram a presente demanda, requerendo a restituição de 90% dos valores pagos, ressalvada a multa compensatória de 10%. Observa que o distrato foi celebrado em 30/06/2019. Discorre sobre a inaplicabilidade do CDC à hipótese dos autos, devendo ser observada a regulamentação prevista na Lei 13.786/2018. Ressalta que a sentença olvidou do distrato entabulado entre as partes, o qual dá plena quitação aos contratos anteriormente celebrados, não podendo o autor, após receber as quantias que assentiu ao entabular o instrumento, dizer que fora onerado. Assevera que o autor não demonstrou qualquer vício de vontade ou consentimento no momento de assinou o instrumento de distrato. Registra que a multa não é abusiva, pois reteve a porcentagem inclusive menor do que a prevista no contrato de promessa de compra e venda. Argumenta que nada há de abusivo na forma como foi realizada a retenção e devolução dos valores pagos para a parte autora em decorrência do instrumento de “Distrato e Transação” realizado. Discorre sobre a natureza da multa compensatória e a validade da cláusula 9.2 do contrato. Ressalta que "o autor, em razão do “Distrato e Transação” celebrado com a ré, teve oportunizado o desfazimento de contrato originalmente celebrado em caráter irrevogável e irretratável, bem como teve drasticamente reduzida a multa compensatória contratualmente ajustada para valores praticamente insignificantes dado o total dos prejuízos que sua conduta impingiu à ré." Registra que, em casos em que não fora assinado distrato e em outras circunstâncias análogas à presente – aparentemente envolvendo contratos não celebrados em caráter irrevogável e irretratável como é o caso em comento –, a jurisprudência tem acolhido a possibilidade de retenção de pelos menos 25% dos valores pagos. Salienta que, em caso de devolução dos valores, deve ser adotado o INCC e não o IGP-M. Observa que os juros de mora devem ser contados a partir do trânsito em julgado. Requer o provimento do apelo, para julgar improcedente a ação.

Com as contrarrazões, os autos vieram à apreciação desta Corte.

Registro, por fim, que, em razão da adoção do sistema informatizado, os procedimentos ditados pelos artigos 931, 934 e 935, todos do CPC, foram simplificados, sendo, no entanto, observados em sua integralidade.

É o relatório.

VOTO

Conheço dos apelos, porquanto preenchidos os requisitos de admissibilidade.

Autor e ré, como visto, celebraram promessa de compra e venda de uma sala comercial, ajustando, como pagamento, o valor de R$ 416.075,00. Desse valor, foi paga a quantia de R$ 101.959,24. O comprador, no entanto, não mais conseguiu arcar com o pagamento do preço, razão pela qual solicitou a resilição da avença. As partes, então, celebraram um distrato, pelo qual se deram ampla e geral quitação. Ao analisar o instrumento em questão, o comprador se deparou com cláusulas que entendeu abusivas. Daí o ajuizamento da ação, mediante a qual pretende invalidar o distrato, bem como a condenação da ré à devolução de quantia equivalente a 90% dos valores pagos, com a nulidade da cláusula 9.2 da promessa de compra e venda e a restituição da quantia paga a título de comissão de corretagem.

A sentença julgou procedente, em parte, a ação, para condenar a ré a devolver ao autor 90% dos valores pagos. Ambas as partes se irresignaram. O autor, requerendo a devolução também da comissão de corretagem. A ré, o reconhecimento da validade do distrato e, subsidiariamente, a validade da cláusula 9.2 da avença.

De início, registro que a preliminar de ausência de interesse processual se confunde com o mérito e com ele será apreciada.

Do exame dos autos, observa-se que, em 30/06/2019, as partes celebraram um "Instrumento Particular de Transação e Distrato de Instrumento Particular de Promessa de Venda e Compra de Unidades Autônomas",, constando o seguinte no seu item 6:

"6. A PRIMEIRA DISTRATANTE, por efeito desta transação e do decorrente distrato do Contrato referido no item antecedente, em função da composição amigável das perdas e danos consequentes, devolve ao(s) SEGUNDO(S) DISTRATANTE (S) a importância de R$ 46.077,45 (quarenta e seis mil e setenta e sete reais e quarenta e cinco centavos), o pagamento do valor referido acima será feito, pela PRIMEIRA DISTRATANTE, em parcela única em até 30 (trinta) dias a contar da assinatura do presente instrumento de Distrato, mediante depósito bancário na conta corrente de titularidade do (s) SEGUNDO(s) DISTRATANTE(s) de nº (...) da agência de nº (...), do Banco (...). Com o comprovante de depósito o(s) SEGUNDO(s) DISTRATANTE(S) dá(ão) a mais plena, geral, irrevogável e irretratável quitação. Fica claro que o documento comprobatório de depósito servirá como recibo de quitação.

Da leitura da inicial, verifica-se que não há pedido de declaração de nulidade, tampouco alegação de vício de consentimento do instrumento (art. 166 e seguintes do CC) o qual se revela, por conseguinte, absolutamente válido.

De tal sorte, o demandante possuiria óbice à análise de sua pretensão, conforme já decidiu esta Corte:

APELAÇÃO CÍVEL. RECURSO ADESIVO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CONTRATO DE COMPRA E VENDA RESCINDIDO. DISTRATO. SENTENÇA REFORMADA. SUCUMBÊNCIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS: As partes formalizaram um Distrato Particular de Promessa de Compra e Venda, momento em que deram plena, geral e irrevogável quitação na relação jurídica havida entre as partes. A ampla quitação de comum acordo, culmina na improcedência da ação em relação à Construtora ré. Aplicação do artigo 488 do CPC, com julgamento do mérito da ação. Sentença reformada. Por conseguinte, vai provido o apelo da ré para fins de se julgar improcedente a ação. RECURSO DA PARTE AUTORA: Julgado improcedente a ação ajuizada, resta prejudicado o apelo da parte autora, notadamente quanto ao pedido de redução da multa compensatória e fixação de danos morais. RECURSO ADESIVO. PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE: Não conhecido o recurso adesivo diante da ocorrência da preclusão consumativa, desaparecendo, então, a possibilidade de outras apelações da mesma parte à sentença de primeiro grau. [...] DERAM PROVIMENTO AO APELO DA PARTE RÉ. DECLARARAM PREJUDICADO O RECURSO DE APELAÇÃO DA PARTE AUTORA. NÃO CONHECERAM DO RECURSO ADESIVO DA PARTE AUTORA.(Apelação Cível, Nº 70080573801, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo João Lima Costa, Julgado em: 11-07-2019)

APELAÇÃO CÍVEL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. AÇÃO DE DESCONSTITUIÇÃO PARCIAL DE DÉBITO COM PEDIDO DE COMPENSAÇÃO DE VALORES PAGOS. PEDIDO DE ISENÇÃO DE INCIDÊNCIA DE CORREÇÃO MONETÁRIA, BEM COMO DE DEVOLUÇÃO DO PAGAMENTO DE JUROS DO FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO INCIDENTES SOBRE O IMÓVEL DURANTE O PERÍODO DE ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. INDEFERIMENTO. DESEQUILÍBRIO CONTRATUAL NÃO CONSTATADO. TRANSAÇÃO EXTRAJUDICIAL EFETIVADA, NA QUAL AS PARTES TRANSACIONARAM A COMPOSIÇÃO DE TODOS OS DANOS ADVINDOS DA ENTREGA DA OBRA, CONCEDENDO, A PARTE AUTORA, PLENA, GERAL E IRRETRATÁVEL QUITAÇÃO. Tendo as partes firmado, extrajudicialmente, Termo de Acordo e Transação compondo todos os...

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