Acórdão nº 50017286520168210132 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 31-01-2022

Data de Julgamento31 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50017286520168210132
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001520239
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

10º Grupo Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001728-65.2016.8.21.0132/RS

TIPO DE AÇÃO: Nota promissória

RELATOR: Desembargador CARLOS CINI MARCHIONATTI

APELANTE: CALCADOS SANDRA LTDA (RÉU)

APELADO: M C F INDUSTRIA DE CALCADOS LTDA (AUTOR)

RELATÓRIO

A senteça julgou procedente a ação monitória ajuizada por MCF INDÚSTRIA DE CALÇADOS LTDA em face de CALÇADOS SANDRA LTDA. (EVENTO 3 - PROCJUDIC3, folhas 100 - 103)

A parte demandante apela e alega que intermediário, de nome Fernando Loureiro, não só levou a máquina para a demandada, bem como ajustou a forma de pagamento, mediante a quitação de débitos decorrentes de notas fiscais de venda de formas para calçados e de estoques de calçados prontos. A empresa demandada estava com as atividades industriais encerradas, não podendo receber qualquer valor em suas contas bancárias, por causa de débitos trabalhistas e de toda natureza, portanto, qualquer pagamento decorrente de venda de estoques e de máquinas apenas poderia ser realizado diretamente aos diretores da empresa demandada. A nota fiscal de venda à vista confirma que o intermediáro Fernando Loureiro detinha poderes para a venda da máquina, bem como para a percepção do valor do negócio e que a empresa não pode ser penalizada no sentido de repetir o pagamento já realizado. Requer, assim, que seja dado: a) provimento ao recurso de apelação; b) acolhido os embargos afim de reconhecer a validade do negócio e a quitação realizada; c) improcedência do pagamento de honorários advocatício de sucumbência e das custas processuais; d) reformada a sentença com inversão dos ônus da sucubência. (EVENTO 3 - PROCJUDIC3, folhas 105 - 111)

A parte demandada contrarrazoa para manuntenção da sentença. (EVENTO 3 - PROCJUDIC3, folhas 119 - 121).

Por sua importância, transcrevo a sentença para servir ao relatório e ao voto:

Vistos, etc.

I. Trata-se de ação monitória ajuizada por MCF INDÚSTRIA DE CALÇADOS LTDA. em face de CALÇADOS SANDRA LTDA..

Para tanto, a parte autora referiu que: (i) é credora da ré no valor de R$ 22.000,00, em razão de nota fiscal emitida em 02.07.2015 e que tinha por escopo a representação de negócio havido entre as partes; (ii) firmou compra e venda com a ré através de negociação intermediada por Fernando Loureiro, tendo havido a venda de uma máquina de pregar saltos à requerida; (iii) o produto foi entregue à demandada, mas esta não realizou o adimplemento dos valores, o que deveria ocorrer à vista. Discorreu sobre o direito que considera aplicável. Ao final, requereu a procedência da demanda, com a constituição do título executivo judicial, no valor de R$ 28.830,11. Ainda, juntou documentos (fls. 06/12).

Houve emenda à inicial, a fim de postular o amparo pela benesse da gratuidade da justiça e comprovar a alegada hipossuficiência financeira da parte autora (fls. 16/18).

Pelo Juízo, concedido o benefício da Justiça Gratuita e determinada a expedição de mandado monitório (fl. 19).

Citada (fl. 23), a demandada opôs embargos à monitória (fls. 24/31). Previamente, arguiu: (i) defeito na representação da embargada, porque o instrumento procuratório foi firmado por sócio cotista e não pelo administrador; (ii) a necessidade de revogação do benefício da justiça gratuita concedido à embargada, porquanto a declaração fora firmada por sócio não administrador; (iii) a denunciação da lide em desfavor de Fernando Loureiro, porque este não figurou apenas como intermediador, mas também como responsável pelo cumprimento da obrigação. No mérito, refutou os argumentos da embargada, sustentando que: (i) o débito cobrado já fora adimplido por Fernando Loureiro, o qual figurava como seu devedor e, por isso, assumiu a responsabilidade pelos valores exigidos pela embargada; (ii) o intermediador e responsável pelo pagamento não solicitou a emissão de recibo pela embargada. Postulou, ao final: (i) o acolhimento das preliminares, com o deferimento da intervenção de terceiros e a extinção do feito; (ii) sucessivamente, o acolhimento dos embargos monitórios, a fim de que fosse julgada improcedente a ação. Juntou documentos (fls. 32/45).

A parte embargada apresentou impugnação aos embargos monitórios (fls. 46/52). Preliminarmente, referiu que (i) estava anexando procuração e declaração de pobreza assinadas pelo sócio-administrador; (ii) impugnava a denunciação da lide, porque a relação jurídica se limitou às partes, não tendo havido extensão de responsabilidade a terceiro. No mérito, arguiu que: (i) Fernando Loureiro figurou como mero intermediador, aproximando as partes e possibilitando a perfectibilização do negócio; (ii) o intermediador não assumiu qualquer compromisso de cumprimento; (iii) caso a embargante tenha entabulado negociação com o intermediador, esta não poderia ser oposta contra si. Por fim, postulou: (i) o acolhimento das preliminares; (ii) a improcedência dos embargos monitórios, com a formação do título executivo judicial. Acostou documentação (fls. 52/53).

Intimada, a parte embargante silenciou (fl. 54 verso).

As partes foram instadas sobre o interesse na dilação probatória (fl. 55), tendo a embargada manifestado seu desinteresse (fl. 57), ao passo que a embargante postulou a produção da prova oral (fls. 58/60).

Pelo Juízo, indeferida a denunciação da lide porque não preenchidos os requisitos legais (fls. 61/62).

Realizada a audiência, foi ouvido o depoimento pessoal da representante legal da empresa embargada e as testemunhas Ronal e Fernando. Na oportunidade, houve o encerramento da instrução e intimadas as partes para a apresentação de memoriais (fls. 80/82).

Memoriais pela embargada (fls. 84/89) e pela embargante (fls. 90/95).

Em nova decisão, afastadas as preliminares de defeito na representação da embargada, bem como mantido o benefício da gratuidade judiciária concedido, porque sanada a nulidade relativa apontada pelo embargante (fl. 98).

Intimadas da decisão retro, as partes silenciaram (fl. 99 verso).

Vieram os autos conclusos.

Relatei. Decido.

II. Cuida-se de demanda que tem por escopo a constituição de título executivo judicial sob a alegação do descumprimento de obrigação pecuniária.

Tendo em conta que as questões prévias já foram apreciadas durante o curso da fase de conhecimento, ingresso, de imediato, na análise do mérito.

Inicialmente, tenho que a situação em tela confirma a adequação da via eleita pela demandante (procedimento especial monitório), uma vez que a relação creditícia se encontra embasada em prova escrita sem eficácia de título executivo, a saber, a Nota Fiscal n°. 008.322.654 (fl. 11).

A compra e venda da máquina de pregar saltos compreende fato incontroverso, mormente em razão das alegações de ambas as partes (art. 374, III, do CPC).

O ponto controvertido nos autos se trata do suposto inadimplemento da parte embargante, que teria recebido a mercadoria, mas não teria realizado o adimplemento do preço.

Quando da oposição dos embargos monitórios, a parte embargante afirmou ter realizado o pagamento da integralidade da quantia a terceiro, identificado como Fernando Loureiro, o qual teria recebido o adimplemento das quantias devidas por meio do alcance de sucatas de formas e pares de sapato, conforme notas fiscais alinhadas às fls. 44/45.

Todavia, em que pese a parte embargante sustente que o terceiro, Fernando Loureiro, atuou não só como mero intermediador, mas como efetivo obrigado pelo pagamento dos valores estipulados para a venda da máquina em questão, nenhum elemento material no referido sentido aportou aos autos, porquanto a documentação que forma o caderno processual indica: (i) a emissão da Nota Fiscal n°. 008.322.654, representativa da entrega de máquina de pregar saltos por MCF Industria de Calçados Ltda. em favor de Calçados Sandra Ltda. (fl. 11); (ii) a emissão das Notas Fiscais n°s. 151225 e 151322, representativas da entrega de sucata de forma e sapatos por Calçados Sandra Ltda. em favor de Dias e Loureiro Com. Comp. para Calç. Ltda. (fls. 44/45).

Logo, há certeza da relação jurídica havida entre as partes (MCF Calçados Ltda. e Calçados Sandra Ltda.), bem como da relação jurídica estabelecida entre Calçados Sandra Ltda. e Dias e Loureiro Com. Comp. para Calç. Ltda..

Contudo, o contexto dos autos não permite concluir, de forma inequívoca, que a obrigação da embargante seria honrada por terceiro em favor da embargada.

A tese dos embargos monitórios se alicerça no pagamento da totalidade do montante ajustado para aquisição da máquina (R$ 22.000,00) pela ré a Fernando Loureiro, que, a seu turno, teria repassado a integralidade da referida quantia a um dos sócios da empresa embargada, como forma de quitação. Em convergência, há o teor da prova oral colhida, consoante resumo que passo a discorrer:

Ronaldo Luis Schmidt, ouvido como informante por ser funcionário da empresa embargante. Afirmou se tratar do responsável pela compra e venda de maquinários da empresa Calçados Sandra. Referiu que Fernando Loureiro compareceu à empresa Sandra e referiu dispor de máquina para oferta, o que foi aceito. Afirmou que o pagamento da máquina foi ajustado através da entrega de produtos em favor de Fernando Loureiro. Referiu que um ano após a negociação da máquina, a empresa embargada contatou a embargante realizando a cobrança do valor referente à máquina, quando, então, contatou-se Fernando para verificar o ocorrido. Disse que o pagamento foi realizado com a emissão de notas de produtos a favorecer Fernando Loureiro, o qual havia apresentado nota fiscal emitida em nome de MCF Indústria de Calçados. Questionado, afirmou que o pagamento do valor total de R$ 22.000,00 foi...

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