Acórdão nº 50017529420148210025 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Câmara Cível, 19-04-2022

Data de Julgamento19 Abril 2022
ÓrgãoDécima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50017529420148210025
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001921747
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

10ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001752-94.2014.8.21.0025/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano moral

RELATOR: Desembargador JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA

APELANTE: CENTRO HOSPITALAR SANTANENSE LTDA (RÉU)

APELANTE: VANIUS DOMINGUES D AVILA (RÉU)

APELADO: CARMEN SUSANA DUARTE PRATES (AUTOR)

RELATÓRIO

De início, reporto o relatório constante da sentença.

CARMEN SUZANA DUARTE PRATES, qualificada nos autos, ajuizou a presente Ação Indenizatória em face de VANIUS DOMINGUES D'AVILA e CENTRO HOSPITALAR SANTANENSE LTDA., também qualificados. Narrou que realizou cirurgia para a retirada da glândula tireoide com o primeiro demandado, nas dependências do segundo, e que restou com sequelas na voz, sendo-lhe receitado gargorejos com sal e vinagre. Disse que procurou profissional especialista no ramo (Otorrinolaringologista), o qual lhe informou que o primeiro demandado, de maneira imperita, rompeu-lhe o nervo laríngeo, afetando as cordas vocais da autora. Frisou que com o passar do tempo a corda vocal se fechou e comprometeu sua fala e respiração, com a iminência de afetar pulmões e coração. Fez referência a documentos que instruem a inicial. Tratou da aplicabilidade do CDC ao caso concreto. Discorreu sobre a responsabilidade de ambos os demandados. Pugnou pela condenação dos demandados ao pagamento de indenização por danos materiais, morais e danos estéticos. Informou que representou criminalmente contra o primeiro demandado. Postulou a inversão do ônus da prova a expedição de ofício à ANS e órgão de classe. Ao final, requereu a procedência da ação e a concessão do benefício da AJG. Juntou documentos (fls. 18/76 e fls. 79/85).

Às fls. 92/111, o primeiro demandado contestou a ação. Disse que após exames requisitados, verificou a necessidade de realização de cirurgia de retirada da glândula tireoide, pois havia suspeita de câncer. Destacou que a paciente, ora autora, foi orientada de todas as complicações e possíveis sequelas da cirurgia, principalmente sequelas sobre a voz, porém concordou em realizar o procedimento. Informou que a autorização da autora para a realização da cirurgia foi testemunhada pelo anestesista. Frisou que a autora também concordou com o procedimento posterior, mesmo sob o risco de piora na voz. Fez observações sobre o pós-operatório, ressaltando a evolução da autora. Mencionou que não há referência de que houve lesão do nervo laríngeo no atestado emitido por otorrinolaringologista e juntado aos autos. Arguiu que são vários os mecanismos que levam à sequela sobre a voz no pós-operatório. Impugnou as afirmações quanto ao risco iminente aos pulmões e coração afirmados na inicial. Considerou que, em 03/06/2014, foi realizado procedimento (cordotomia) em Porto Alegre, com piora na voz da autora. Questionou uma eventual avaliação diante dos procedimentos pós-operatórios realizados na autora, vez que não poderia refletir o resultado do seu trabalho. Afirmou que a sequela advinda da cirurgia era tratável e curável, porém a autora não permitiu que o réu a tratasse. Citou estatísticas acerca das complicações do tipo alteração da voz em cirurgias de tireoide. Destacou que a autora jamais citou alterações da deglutição, infecções respiratórias ou outro tipo de complicação, aduzindo que a lesão direta do nervo causaria tais danos e outros maiores e mais imediatos. Frisou que os problemas com a voz são inerentes ao procedimento realizado e que utilizou os meios médicos disponíveis e indicados ao caso concreto. Tratou da responsabilidade civil do profissional médico. Impugnou os documentos que instruem a inicial e o pedido de inversão do ônus da prova. Aduziu que eventual indenização deve guardar adequação com o estamento econômico financeiro das partes. Ao final, requereu a improcedência da ação. Juntou documentos (fls. 112/138).

Às fls. 139/146, o segundo demandado contestou a ação, arguindo, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva. No mérito, disse que embora tenha sido alertada das sequelas que poderia advir da cirurgia, a autora concordou com a mesma diante da suspeita de câncer. Frisou que a paciente evoluiu bem após a alta hospitalar. Destacou que o médico otorrino que atendeu a paciente após a cirurgia não citou que houve lesão do nervo laríngeo e que fato de ter esperado 15 (quinze) meses para realizar um procedimento, afasta a alegação de risco iminente aos pulmões e coração da autora. Destacou que a responsabilidade do profissional médico não se confunde com a responsabilidade do nosocômio. Sustentou que não existe nexo causal. Requereu a improcedência da ação. Juntou documentos (fls. 146/153).

Houve réplica (fls. 155/157).

A decisão de fl. 158 relegou a apreciação das preliminares para o presente momento.

Demonstrado o interesse na produção de prova técnica pelo primeiro demandado (fls. 165/166).

O primeiro demandado juntou cópia da decisão exarada pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul, na qual foi proferida decisão pelo arquivamento da sindicância instaurada., por não haver indícios de falha técnica ou ética (fls. 203/210).

Foi nomeado perito médico (fl. 211), sendo o laudo pericial juntado à fl. 239.

A parte autora se manifestou (fl. 240), requerendo a realização de audiência de instrução.

Às fls. 241/242, o segundo demandado traçou suas considerações acerca do laudo pericial apresentado.

O primeiro demandado postulou a complementação do laudo pericial, apontando as observações realizadas pelo seu assistente técnico (fls. 243/246).

Sobreveio aos autos a complementação requerida (fl. 254).

Foi realizada audiência de instrução e julgamento (fls. 281/283 e 293/295).

Os réus apresentaram seus memoriais finais (fls. 296/303).

Deliberando acerca do mérito, estabeleceu o Juízo de 1ª Instância:

Diante do exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a presente Ação Indenizatória ajuizada por CARMEN SUZANA DUARTE PRATES, em face de VANIUS DOMINGUES D'AVILA e CENTRO HOSPITALAR SANTANENSE LTDA, extinguindo o feito, com resolução de mérito, forte no art. 487, inciso I, do CPC, a fim de condenar os demandados, solidariamente, ao pagamento de danos morais no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais) à autora, que deverá ser corrigido monetariamente pelo IGP-M, a contar desta decisão, e acrescido de juros legais, a contar do evento danoso, nos termos das Súmulas nº 362 e 54 do STJ.

Condeno os demandados ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 15% do proveito econômico da ação (art. 85, §2º, CPC).

O CENTRO HOSPITALAR SANTANENSE LTDA. apela. Suscita sua ilegitimidade passiva ad causam, argumentando que apenas o clínico deve responder por alegado erro médico, a teor do art. 951 do Código Civil e do art. 14, § 4º, do Código de Defesa do Consumidor. No mérito, aduz que a autora fora cientificada sobre as sequelas que poderiam advir da cirurgia, tendo a enferma concordado com a intervenção. Historia que, depois da alta, tudo transcorreu dentro da normalidade, com boa evolução da paciente. Sobre a sequela pós-operatório, refere ter a apelada se tratado com fonoaudiólogo, o qual apresentou laudo sem referência à lesão do nervo laríngeo. Menciona que a demandante informou ter realizado vários tratamento depois da cirurgia, uns com melhora, outros com piora da voz. Diz que a autora não aponta qual a responsabilidade do Hospital no evento, tampouco o nexo de causalidade ou dano determinado pelo nosocômio, não restando evidenciado o liame entre o procedimento e a consequência relatada. Requer, ao fim, o provimento da Apelação em seus termos, para se julgar a demanda improcedente.

VANIUS DOMINGUES D'AVILA igualmente recorre. De início, alude que a matéria objeto de presente demanda foi apreciada em sindicância havida no Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul, não sendo constatado indícios de falha técnica ou ética, sendo o procedimento arquivado. Destaca ter a Sindicância concluído que a complicação sofrida pela autora não caracteriza imperícia, pois inerente ao ato cirúrgico, passíveis em vista da localização, espessura e consistência das estruturas anatômicas, tais como o nervo recorrente laríngeo. Sustenta equívoco na conclusão de a lesão resultar de falha na cirurgia pelo fato de a paciente ter sofrido alteração de voz após a intervenção, porquanto a ocorrência resulta de complicação inerente ao procedimento, e da qual a demandante tinha ciência da possibilidade e consentiu com o ato cirúrgico. Enfatiza que a perícia atestou que a complicação é prevista na literatura médica como de possível ocorrência, não se tratando de erro médico, tendo sido adequado o tratamento proposto e realizado. Pelo princípio da eventualidade, impugna o montante indenizatório de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), que, acrescido de juros, totaliza R$ 94.726,88 (noventa e quatro mil setecentos e vinte e seis reais e oitenta e oito centavos), quantia que refere exagerada e fora do parâmetro socioeconômico das partes, sendo que caberia à autora fazer prova da situação financeira do réu, pelo que requer a minoração do quantum. Assevera que os juros de mora, por se tratar de indenização por danos morais, devem ser contados a partir da citação. Postula, ao final, seja provido o seu recurso.

A autora apresentou contrarrazões, pedindo a manutenção integral do julgamento de 1ª Instância.

É o relatório.

VOTO

Colegas.

Da Apelação do CENTRO HOSPITALAR SANTANENSE.

Sustenta a Instituição Médica a sua ilegitimidade passiva, porquanto apenas o clínico assistente haveria de responder por eventual impropriedade cometida desde o ato médico.

Não é assim.

No que diz com a paciente, responde o nosocômio por eventuais impropriedades cometidas...

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