Acórdão nº 50017662120138210023 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50017662120138210023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002182473
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5001766-21.2013.8.21.0023/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes do Sistema Nacional de Armas (Lei 9.437/97 e Lei 10.826/03)

RELATOR: Desembargador ROGERIO GESTA LEAL

APELANTE: MARCOS ANDRE SILVEIRA MENDES (RÉU)

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação do réu Marcos André Silveira Mendes, contra sentença do Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Rio Grande/RS, que julgou procedente a ação penal para condená-lo como incurso nas sanções do art. 16, §1º, inc. IV, da Lei n° 10.826/03, às penas de 3 (três) anos e 2 (dois) meses de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas restritivas de direitos, e 10 (dez) dias-multa, à razão unitária mínima. De acordo com a denúncia:

1º Fato: No dia 11 de abril de 2013, por volta das 09h15 min, na Rua Major Assumpção, nº 127/fundos, Povo Novo, nesta Cidade, o denunciado MARCOS ANDRÉ SILVEIRA possuía e mantinha sob sua guarda, no interior de sua residência, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, 01 revólver Smith & Wesson, calibre .38, numeração 36106, 03 cartuchos calibre .38 e 01 cartucho calibre 7.62, um carregador de pistola, um estojo de arma de fogo calibre .32, um estojo de arma de fogo calibre .20, um estojo de arma de fogo calibre .38 e um estojo de plástico de arma de fogo calibre .20, conforme auto de apreensão de fls. e laudo preliminar de fls.

2º Fato: Nas mesmas circunstâncias relativas ao tempo e local do fato anterior, o denunciado MARCOS ANDRÉ SILVEIRA MENDES possuía, no interior de sua residência, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, 01 carabina marca Rossi, calibre .38, com numeração raspada, conforme auto de apreensão de fls. e laudo preliminar de fls. Na ocasião, policiais civis, em cumprimento de mandado de busca e apreensão na residência do acusado, localizaram no seu interior os objetos apreendidos, encontrando-se a carabina na parte de baixo de um roupeiro, atrás das gavetas, e o revólver no interior de uma caixa de sapato. Ato contínuo, o denunciado foi preso em flagrante delito, e encaminhado à Delegacia de Polícia local. As armas apreendidas se encontravam em perfeitas condições de funcionamento, sendo potencialmente ofensivas, conforme autos preliminares de constatação de funcionamento das armas de fogo do IP.

Nas razões, a Defensoria Pública pugnou pela absolvição do réu. Alegou atipicidade material da conduta e insuficiência probatória. Subsidiariamente, requereu o redimensionamento da pena privativa de liberdade e a redução do valor da prestação pecuniária (AP, ev. 3, 5, p. 22 e ss).

O Ministério Público, nas contrarrazões, postulou o improvimento do apelo defensivo (AP, ev. 3, 5, p. 36 e ss).

Nesta instância, o Procurador de Justiça, Dr. Gilmar Bortolotto, opinou pelo parcial provimento do recurso para que a pena privativa de liberdade seja redimensionada ao mínimo legal.

VOTO

O acusado, primário (AP, ev. 3, 3, p. 23/24), foi condenado em primeira instância pela prática do delito previsto no art. 16, §1º, IV, da Lei 10.826/03, porque supostamente possuía e mantinha sob sua guarda armas de fogo, inclusive com numeração suprimida, e munições, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar.

No mérito, a materialidade e autoria delitiva vieram demonstradas pelos documentos que integram o inquérito policial (boletim de ocorrência, auto de apreensão, mandado de busca e apreensão, auto de prisão em flagrante, autos de constatação de funcionamento de arma de fogo - AP, ev. 3, 1), pelos laudos periciais (AP, ev. 3, 2, p. 42/43 e ev. 3, 4, p. 18/19), bem como pela prova oral colhida em juízo.

O réu confessou os fatos, alegando que possuía as armas de fogo apreendidas e que os registros estavam em nome dos antigos proprietários, embora estivesse providenciando a transferência. Em relação àquela que estava com numeração suprimida, referiu que havia sido roubada e posteriormente recuperada já com o número de série raspado. Confirmou que estava presente na ocasião em que os policiais diligenciaram em sua residência, bem assim que entregou espontaneamente os artefatos

O Policial Civil Seres Senir da Silva Mattos afirmou não ter participado da investigação, apenas do cumprimento do mandado de busca e apreensão. Relatou que, na ocasião, o acusado indicou aos policiais onde estavam as armas de fogo, as quais foram apreendidas por seu colega. Destacou, também, que outro colega seu localizou uma carabina em baixo do armário. Não sabia detalhes da investigação, apenas que havia informações de que existiam drogas e armas de fogos no local.

O Policial Civil André Ricardo Luft informou que tinham informação de suposto envolvimento do réu com tráfico de drogas e posse de armas de fogo, pelo que diligenciaram no local. Na oportunidade, o acusado indicou aos policiais o local em que estariam as armas de fogo, mas também encontraram uma carabina com numeração suprimida embaixo do armário.

O Policial Civil José Carlos da Silva disse ter participado do cumprimento do mandado de busca e apreensão no local. Na ocasião, o réu teria indicado aos policiais onde as armas estariam guardadas, mas que também teriam localizado uma carabina com numeração suprimida escondida embaixo do roupeiro.

A testemunha defensiva Flávio Clair Mendes, genitor do acusado, ouvido como informante, alegou que o revólver apreendido era recordação da família, pois pertencia a seu falecido pai. Informou que a arma estava registrada em nome de seu pai e que a mantiveram por segurança, sempre dentro de casa, já que possuíam propriedade rural que já havia sido assaltada.

A testemunha defensiva Cláudio de Alencar Silveira Mendes, irmão do acusado, ouvido como informante, confirmou que o revólver apreendido era herança de seu falecido avô, em nome de quem estava registrado. Não sabia se o réu havia tentado regularizar a situação da arma. Disse que seu irmão mantinha a arma dentro de casa, até porque era artefato antigo, e servia para proteção da propriedade.

A testemunha defensiva Dejanir Augusto Silva Cabreira, vizinho do réu, referiu que a carabina pertencia a seu irmão, já falecido, em nome de quem está registrada. Confirmou ter vendido a arma para o acusado e que tinha quase certeza de que ele havia tentado regularizá-la. No mais, abonou a conduta do réu.

Essas as provas.

Com efeito, não se tem dúvida quanto à imparcialidade dos agentes públicos ouvidos em juízo, inexistindo demonstração de que tivessem interesse de prejudicar o réu. Suas alegações apresentaram-se verossímeis e coerentes entre si, estão em harmonia com o que foi dito em sede policial e de acordo com as demais provas coligidas aos autos, dando conta da apreensão de armas de fogo e outros artefatos em poder do acusado, o que foi ratificado pela sua confissão.

Os depoimentos das autoridades policiais possuem reconhecida idoneidade, porquanto revestidos de fé pública, bem assim são elementos legítimos a fundamentar o juízo condenatório, quando colhidos sob o crivo do contraditório e do devido processo lega, sendo imprescindível, para esse efeito, que suas alegações convirjam às demais provas dos autos1 - tal como ocorreu na espécie.

Outrossim, dispensável perquirir acerca de quem realmente adquiriu o armamento ou quem é seu efetivo proprietário, tendo em vista que a arma foi apreendida na posse direta do réu, sem que este possuísse a documentação necessária. Tratando-se de delito de perigo abstrato e de mera conduta, é prescindível a demonstração de lesividade ao bem jurídico tutelado, a qual é presumida pelo tipo penal. Dessa forma, o simples ato de "possuir" arma de fogo e/ou munições de maneira irregular faz com que haja a consumação delitiva. Antecipa-se a tutela penal a fim de evitar a prática de crimes mais...

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