Acórdão nº 50018012420178210028 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sétima Câmara Cível, 31-03-2022

Data de Julgamento31 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50018012420178210028
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Sétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001666177
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

17ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001801-24.2017.8.21.0028/RS

TIPO DE AÇÃO: Cheque

RELATORA: Desembargadora ROSANA BROGLIO GARBIN

APELANTE: FEDERACAO GAUCHA DE MOTOCICLISMO (RÉU)

APELADO: SANTO DA SILVEIRA DIAS (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por FEDERACAO GAUCHA DE MOTOCICLISMO contra a sentença que, nos autos da ação monitória ajuizada por SANTO DA SILVEIRA DIAS, extinguiu o feito em relação ao codemandado PAULO HENRIQUE DELLA FLORA e rejeitou os embargos monitórios, nos seguintes termos (fls. 46 e seguintes de evento 4, PROCJUDIC2):

(...)

ISSO POSTO:

a) JULGO EXTINTO o feito com relação ao réu PAULO HENRIQUE DELLA FLORA, com força no art. 485, VI, do CPC.

b) rejeito os embargos monitórios e, a teor do art. 487, I, do CPC, JULGO PROCEDENTE o pedido contido na presente ação monitória, para constituir o título executivo judicial (fl. 21), devendo o valor da cártula ser corrigido monetariamente através do IGP-M, desde a da de emissão e estampada na cártula, e os juros de mora de um por cento (1%), a contar da data de vencimento da obrigação.

Condeno a parte ré/embargante ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios do patrono da parte contrária, os quais fixo em 15% (quinze por cento) do valor da causa considerando o grau de zelo profissional e o trabalho realizado, com base no art. 85, § 2º do CPC. Suspensa a exigibilidade em face da Federação Gaúcha de Motociclismo, em face do benefício da gratuidade da justiça, que ora concedo com base no art. 1° do documento acostado às fls. 51/65 dos autos.

(...)”

Em suas razões (fls. 9/17 de evento 4, PROCJUDIC3), reitera a parte ré/embargante a preliminar de inépcia da inicial por falta de causa de pedir, assim como a preambular de ilegitimidade passiva, uma vez que o corréu Paulo, que assinou a cártula objeto da ação em nome da pessoa jurídica (pois presidente desta na época da emissão do cheque) não teria prestado contas de sua administração. Ainda, sustenta cerceamento de defesa, eis que o juízo a quo, ao decidir de forma antecipada, limitou o direito da recorrente de produzir prova de que não possuía nenhuma relação obrigacional com a parte autora. No mérito, "tendo a parte Apelada recebido a cártula de terceiro quando já prescrita", aduz que "não prospera a presente cobrança em relaçao a parte Apelante, pois não restou demonstrado o crédito perseguido". Pugna, ao final, pela reforma da sentença hostilizada.

Foram apresentadas contrarrazões (fls. 22 e seguintes de evento 4, PROCJUDIC3).

Vieram os autos eletrônicos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Cuida-se a demanda originária de ação monitória proposta por Santo da Silveira Dias, buscando a expedição de mandado de pagamento referente à importância representada pela cártula n.° 000050-7 da Caixa Econômica Federal, agência 0502, emitida em 26.06.2014, na quantia nominal de R$ 3.300,00.

Extinto o feito em relação ao codemandado Paulo Henrique Della Flora e rejeitados os embargos monitórios ofertados por Federação Gaucha de Motociclismo, interpõe a pessoa jurídica o recurso em análise.

De plano, impende fazer o registro de que o recurso merece parcial conhecimento, por não preenchimento dos requisitos mínimos de admissibilidade quanto à alegação de inépcia da inicial, diante da afronta ao princípio da dialeticidade recursal.

Veja-se que a insurgência da requerida em relação à suscitada prefacial se limita a transcrever ipsis litteris os parágrafos da sua peça de embargos acerca do tema (fls. 45 e seguintes de evento 4, PROCJUDIC1), sem impugnar de maneira mínima e adequada a decisão combatida, em flagrante afronta aos termos do art. 1.0101, incisos II e III, do CPC.

De acordo com Nelson Nery Junior2, "o apelante deve dar as razões, de fato e de direito, pelas quais entende deva ser anulada ou reformada a sentença recorrida"; e segue o doutrinador, registrando que "sem as razões do inconformismo, o recurso não pode ser conhecido".

Outro, aliás, não é o entendimento da Câmara no julgamento de casos análogos:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MANUTENÇÃO INDEVIDA DE INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLÊNCIA. SÚMULA 548 DO STJ. DANOS MORAIS OCORRENTES. QUANTUM INDENIZATÓRIO ADEQUADO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. I. DA INSCRIÇÃO INDEVIDA. DE ACORDO COM O PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE, NO ATO DA INTERPOSIÇÃO DO RECURSO, COMPETE AO RECORRENTE, EM SUAS RAZÕES, EXPOR OS FUNDAMENTOS DE FATO E DE DIREITO NOS QUAIS RESPALDA SUA PRETENSÃO DE REFORMA DO PROVIMENTO JUDICIAL RECORRIDO, SOB PENA DE NÃO CONHECIMENTO DA INSURGÊNCIA. NO CASO, VERIFICA-SE QUE AS RAZÕES RECURSAIS NÃO ENFRENTAM OS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. RECURSO NÃO CONHECIDO NO PONTO. II. DANOS MORAIS. (...). APELO CONHECIDO EM PARTE E DESPROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Cível, Nº 50150756820208210022, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liege Puricelli Pires, Julgado em: 27-05-2021)

APELAÇÃO CÍVEL. LOCAÇÃO. AÇÃO DE COBRANÇA E RECONVENÇÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO ANALÍTICA E DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA AOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. MERA CÓPIA DE PEÇA PROCESSUAL APRESENTADA ANTERIORMENTE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. HIPÓTESE DE NÃO CONHECIMENTO. O dever de fundamentação analítica não se restringe a orientar a prestação jurisdicional realizada pelo Magistrado, estendendo-se também às partes. Ao limitar as razões recursais à mera reprodução da contestação, não atendeu o apelante ao princípio da dialeticidade, deixando de combater, modo expresso, os fundamentos esposados na sentença vergastada, inviabilizando o conhecimento do apelo. APELO NÃO CONHECIDO.(Apelação Cível, Nº 50380066520198210001, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Deborah Coleto Assumpção de Moraes, Julgado em: 29-04-2021)

Destarte, não é caso de conhecimento do recurso no que concerne à argumentação de inépcia da inicial.

Em relação à preliminar de ilegitimidade passiva arguida, razão não assiste à apelante.

A ré figura como emitente do cheque sub judice e é titular da conta bancária de origem da aludida cártula, de modo que inafastável a sua legitimidade para responder pela demanda subjacente, ainda que tal circunstância não tenha relação direta com a procedência da demanda.

Quanto à preambular de cerceamento de defesa, tampouco prospera a irresignação recursal.

Na esteira do que estabelece o art. 371 do CPC, o “juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento”. A seu turno, o art. 370 do Diploma Processual registra que caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito.”.

Daí advém não ser indispensável que eventuais requerimentos de prova sejam exauridos pelo Magistrado, contanto que sua decisão esteja adequadamente fundamentada e seja lastreada no sistema jurídico a que está adstrito o Julgador.

Relativamente ao litígio em comento (um procedimento monitório), o conjunto probatório carreado ao caderno processual foi suficiente para impor ao sentenciante o juízo de improcedência dos embargos da parte recorrente, situação que, salvo engano, não sofreria modificação em decorrência da produção de novas provas para o debate quanto ao negócio subjacente, pois a questão é de somenos importância frente ao quadro fático em exame, o que restará inconteste com a apreciação do mérito do recurso.

Diante disto, resta desacolhida a prefacial de cerceamento de defesa.

No mérito, com uma ação monitória almeja-se, via procedimento de fase de conhecimento sumária, obter uma sentença meritória para o reconhecimento, de forma célere e prática, de direito contido em documento escrito e hábil sem eficácia executiva.

Sobre a ação monitória, preconiza o art. 700 do CPC:

Art. 700. A ação monitória pode ser proposta por aquele que afirmar, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, ter direito de exigir do devedor capaz:

I - o pagamento de quantia em dinheiro;

II - a entrega de coisa fungível ou infungível ou de bem móvel ou imóvel;

III - o adimplemento de obrigação de fazer ou de não fazer.

Para se valer da ação monitória, portanto, basta ao demandante apresentar prova escrita sem eficácia de título executivo, sendo pertinente destacar que o documento hábil a instruí-la deve demonstrar a existência da obrigação, permitindo o juízo de probabilidade do direito afirmado pelo autor.

No caso dos autos, os documentos que instruem a demanda ostentam força para exercer um...

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